• Nenhum resultado encontrado

Padre H Ouandn a iiatma revelo um revolucionário

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Padre H Ouandn a iiatma revelo um revolucionário"

Copied!
19
0
0

Texto

(1)

■ Revista Entrovlsta

En t r e v i st a co m P a d r e H a r o l d o Co e l h o , 3 0 de j u n h o d e 2 0 0 4 . P r o d u ç ã o , r e d a ç ã o e e d i çã o : L o r e n a S á , P e d r o M a c a m b i r a e S i m p l íc i a V i a n n a T e x t o d e Ab e r t u r a : M ô n i c a M o u r ã o D i a g r a m a ç ã o : S i m p l íc i a V i a n n a P a r t i ci p a çã o : A l i n e B a i m a , C a m i l l e S o a r e s , C a r o l i n a d o V a l e , D e l l a n o R i o s , E u g ê n i a C a b r a l , j K e l l y G a r c i a , L o r e n a S á , L u c i a n a A n d r a d e , M ô n i c a M o u r ã o , P a t r i c k B a c h i , P e d r o M a c a m b i r a e

(2)

Mõnica Mourão

O b e d e c e r n ã o é c o m

e le . D e s d e q u e e n t r o u

n o s e m i n á r i o , a o s 12

a n o s d e i d a d e , H a r o l d o

C o e l h o r e v e l o u - s e u m

c o n t e s t a d o r . A

m a n s i d ã o d a f a l a e a

s e r e n i d a d e d a f r o n t e ,

n o e n t a n t o , n ã o d i z e m

a q u e e l e v e i o . M a s

b a s t a q u e c o m e c e a

c o n v e r s a r p a r a q u e s e

p e r c e b a e m p a d r e

H a r o l d o u m h o m e m d e

c o n f r o n t o d e i d é i a s ,

q u e s t i o n a m e n t o d e

r e g r a s e s e n s i b i l i d a d e

p a r a a s n e c e s s i d a d e s

d o p o v o .

D i f e r e n t e d e m u i t a s

c r i a n ç a s d e s e u t e m p o , q u e

i a m a o s s e m i n á r i o s p o r q u e

o s p a i s b u s c a v a m u m a

e s c o l a o n d e s e p o d e r i a

e n c o n t r a r

e d u c a ç ã o

d e

q u a l i d a d e e s ó l i d a f o r m a ç ã o

c r i s t ã , H a r o l d o , a p e s a r d e

t ã o j o v e m , já q u e r i a m e s m o

e r a s e r p a d r e . M a s n ã o

q u a l q u e r u m . Q u e r i a s e r

d a q u e l e s

a l e g r e s

e

e x p a n s i v o s ,

q u e

o r g a n i z a v a m

f e s t a s

e

c o s t u m a v a m f r e q u e n t a r s u a

c a s a - u m s í t i o n o b a i r r o

A n t ô n i o B e z e rra , e m Fortaleza.

P o i s f o i n o s e m i n á r i o ,

o n d e a d i s c i p l i n a e r a b e m

d i f e r e n t e d a l i b e r d a d e a q u e

H a r o l d o e s t a v a h a b i t u a d o

p e l o s s í t i o s d o b a i r r o o n d e

m o r a v a , q u e s u a â n s i a

c o n t e s t a d o r a f o i t o m a n d o

f o r m a .

V o c ê

a n d a

le n d o

lite r a tu r a m a r x i s t a !

- a c u s o u o

p r o f e s s o r d e H a r o l d o . A

p r o v o c a ç ã o , a o i n v é s d e

i n t i m i d a r , s e r v i u d e e s tí m u lo .

H a r o l d o , q u e d e M a r x n ã o

s a b i a n a d a , aí s i m r e s o l v e u

b u s c a r tal l i t e r a t u r a e f a z e r jus

à a c u s a ç ã o d o p r o f e s s o r .

L e i t u r a s às e s c o n d i d a s e

f u g a s p a r a a s s i s t i r a f i l m e s

p r o i b i d o s t r a n s f o r m a r a m a

r o t i n a d o e n t ã o s e m i n a r i s t a

H a r o l d o .

Q u a n d o

f o i

o r d e n a d o p a d r e , n o a n o e m

q u e e s t o u r o u a d i t a d u r a

m i l i t a r , o s s u b t e r f ú g i o s q u e

u s a v a p a r a “ e n g a n a r ” o s

s u p e r i o r e s n o s e m i n á r i o

f o r a m d e g r a n d e u t i l i d a d e

e m s u a a t u a ç ã o p o l í t i c a e n a

c o l a b o r a ç ã o c o m m i l i t a n t e s

q u e t i n h a m d e s e r e u n i r

c l a n d e s t i n a m e n t e .

D e s d e e n t ã o , p a d r e

H a r o l d o n u n c a d e i x o u d e

a g i r e m p r o l d a p o p u l a ç ã o

d e b a i x a r e n d a e m a r g i ­

n a l i z a d a . E e n c o n t r o u u m a

f o r m a d e e n t e n d e r o m u n d o

q u e u n i u s u a p r e o c u p a ç ã o

c o m as q u e s t õ e s s o c i a i s a o

e s p í r i t o l i b e r t á r i o - a T e o l o ­

g i a d a L i b e r t a ç ã o . I m p r e g ­

n a d o d a m í s t i c a c a t ó l i c a q u e

c o n t a g i o u n ã o a p e n a s e l e ,

m a s t a m b é m m u i t o s d o s

j o v e n s

d a é p o c a , p a d r e

H a r o l d o v iv e u a d é c a d a d e 60

a c r e d i t a n d o i n t e n s a m e n t e n a

r e v o l u ç ã o . S e n e c e s s á r i o ,

c o m u s o d e a r m a s . O q u e

n ã o t r a n s g r e d i r i a o p r e c e i t o

c a t ó l i c o d e n ã o m a t a r - se as

t r a n s f o r m a ç õ e s n ã o f o r e m

v i o l e n t a s ,

q u e m i r á

c e d e r ?

A n o s d e p o i s , a a t u a ç ã o

p o l í t i c a d e p a d r e H a r o l d o se

c o n s o l i d o u - h o u v e u m

m o m e n t o e m q u e ele a g i u até

d i r e t a m e n t e n a p o l í t i c a

p a r t i d á r i a . C h e g o u a s e

c a n d i d a t a r a g o v e r n a d o r d o

E s t a d o

e m

1 9 8 7

p e l o

P a r t i d o d o s T r a b a l h a d o r e s

( P T ) e a s s u m i u a S e c r e t a r i a

d a E d u c a ç ã o n a g e s t ã o

M a r i a

L u i z a

F o n t e n e l e

( 1 9 8 5 - 1 9 8 8 ) , e m b o r a n ã o

a c r e d i t a s s e q u e e s s a f o s s e a

f u n ç ã o d e u m p a d r e .

P a r a a l é m d e t u d o i s s o ,

H a r o l d o c o n t e s t a o m u n d o

d a I g r e j a C a t ó l i c a , c o m s u a

r í g i d a

h i e r a r q u i a .

A s

p o s i ç õ e s p e s s o a i s d e p a d r e

H a r o l d o

s o b r e

h o m o s ­

s e x u a l i d a d e ,

c e l i b a t o

e

r i t u a i s c a t ó l i c o s s ã o d e

p r o v o c a r t r e m o r e s n a a l a

c o n s e r v a d o r a d a I g r e j a , a

q u e m n a o i n t e r e s s a a f é

l i b e r t a d o r a . A q u e m n ã o

i n t e r e s s a u m p a d r e q u e

a c r e d i t e n o p o d e r d e u m a

p e s s o a c o m u m i n v o c a r a

D e u s ;

d o

l a i c o ,

d e

c o n c e l e b r a r a m i s s a . Q u e

n ã o

u s e

c r u c i f i x o

p o r

p r e f e r i r o C r i s t o r e s s u s ­

c i t a d o - a l e g r e c e s p l e n ­

d o r o s o . T r a t a - s e , c e r t a ­

m e n t e , d e u m p a d r e q u e foi

n a c o n t r a m ã o d a c u l t u r a d e

d i s c i p l i n a e o b e d i ê n c i a a q u e

o s

j o v e n s

s e m i n a r i s t a s

(3)

A

p

r

o

d

u

ç

ã

o

d

e

s

ta

e

n

t

r

e

v

is

t

a

fo

i

a

m

a

is

d

e

m

o

r

a

d

a

.

O

p

r

im

e

ir

o

n

o

m

e

in

d

ic

a

d

o

p

a

r

a

a

e

n

t

r

e

v

is

t

a

n

ã

o

p

ô

d

e

p

a

r

ti

c

ip

a

r

.

O

o

u

tr

o

n

o

m

e

in

d

ic

a

d

o

fo

i

o

d

e

P

e

.

H

a

r

o

ld

o

.

Pa d re H

Ouandn a iiatm a re v elo um rev o lu cio n á rio

S im p líc ia : N a é p o c a e m q u e o s e n h o r e n tr o u p a r a o s e m in á r io , c ra m u it o c o m u m q u e a s c r ia n ­ ç a s , o s jo v e n s , in g r e s s a s s e m p a r a e s tu d a r , p a r a te r u m a e d u c a ç ã o m e l h o r . Q u a n d o o s e n h o r e n ­ t r o u , o s e n h o r t in h a c o n s c iê n c ia d e q u e q u e r i a s e r p a d r e ?

P a d r e H a r o ld o : M eu c a so foi di­ ferente, p o rq u e eu n asci n u m a fa­ mília religiosa, e m in ha casa era m u ito fre q u e n ta d a p o r p ad re s. E claro q ue o a m b ie n te a ju d a . M as e u tin h a aquela v o n ta d e ro m â n tic a , p oé tica. E u sab ia q u e havia jo v en s, crianças q u e en tra v am só p a ra estudar. M as a m aio ria n ã o c o n tin u a v a , p o rq u e v o c ê n ão ag uen tav a. N à o ag u e n ta ­ va in te rn a to de sem in ário , prin cip al- m e n te naquela ép o ca, m u ito fech a­ do. Se b e m qu e, e u disse ate na ú lti­ m a re p o rta g e m (o p a d re refere-se à p ré- entrevista), m eu sem inário , a p esar dos p esares, fo i u m d o s m ais a b e rto s da é p o c a . E r a o S e m in á r io d e S ão V icen te , n o (bairro) A n tô n io B ezer­ ra. A lgun s e n tra v am , m as esses n ão d e m o r a v a m m u ito n ã o , p o r q u e p a ra se su b m e te r àq uela disciplina...

L u c ia n a : E c o m o e r a a v id a d e n ­ tro d o s e m in á r io ?

P H : A vida era p rin c ip alm e n te d e e stu d o s, m as havia ta m b é m a p a rte “ div ersio n al” . F u te b o l, vôlei. T in h a cin em a, to d a se m a n a a g e n te tin h a u m filme. C oisas q ue o u tro s sem i­ n á rio s n ã o tin h am .

L o r e n a : A q u e t i p o s d e f ilm e s v o c ê s a s s is tia m ?

P H : F ilm e d e g u e r r a , film e d e faro este. F ilm e d e tese tam b ém .

D e l l a n o : T i n h a r e s t r i ç ã o a o s f i l m e s ?

P H : A h , sim! O s film es, an te s o s padres viam . C en su rav am antes. M as m u ito difícil... A s v ezes, eles d eix a­ vam passar. M as era cen su ra d o.

L u c i a n a : E t i n h a o u tr o s t ip o s d e r e s ­ t r i ç õ e s q u e i n c o ­ m o d a v a m o s e ­ n h o r ?

P H : A g e n te n ã o ti­ n h a m u ita lib e rd a d e d e s a ir n ã o . T u d o s u p o rta v a , só isso aí q u e m e m a c h u c a v a : a re s triç ã o d a lib e r ­ d a d e . R e striç ã o , p o r e x e m p lo , a u m e s ­ p írito crítico . S ó isso aí q u e m e m a c h u c a ­ va.

M ô n ic a : O s e n h o r f a lo u q u e , q u a n d o e n tr o u n o s e m i n á ­ rio , já p la n e ja v a s e r p a d r e ...

P H : E m b o ra fo sse p rim e iram e n te u m a v o c a ç ã o p o é tic a e ro m ân tic a.

M ô n ic a : A lé m d e s s a i n f l u ê n c i a d o s p a d r e s q u e f r e q u e n ta v a m a c a s a d o s e n h o r , te v e a lg u m a o u ­ tr a c o is a q u e o m a r c o u , q u e fe z o s e n h o r te r e s s a v o n ta d e ?

P H : A h , sim ! H o u v e ta m b é m o te s t e m u n h o d e p a d r e s . “ E u q u e ­ ria s e r p a d r e c o m o a q u e le p a ­ d r e a li” [fa la com o se estivesse a p o n ­ ta n d o p a r a a lg u ém). D e m is s ã o . H o u v e p a d r e s q u e m e d e r a m o t e s t e m u n h o , c o m o o u t r o s q u e n ã o m e a tr a ía m .

L o r e n a : E o s s e u s p a is tiv e r a m a lg u m a in f lu ê n c ia ?

P H : N ã o . I n te re s s a n te . A m in h a m ãe, ela era p ro fu n d a m e n te religi­ osa e q u a n d o c u tava te rm in a n d o o sem in ário m e n o r, q u e é o c u rso de h u m a n id a d e s , o coleg ial, n é? N a s ú ltim as férias q u e eu passei, d ep o is q ue eu term in e i o cu rso d e H u m a ­ n id ad es, ela m e c h a m o u assim em p articu lar e disse: “ H a r o ld o , e u te ­

n h o m u ito g o s to d e te r u m filh o p a d re . M as, m e u filh o , se v o c ê q u i­ s e r s e g u ir p a ra m e s a tis fa z e r, saia im e d ia ta m e n te ” . N e s s e p o n to , era b e m f o rm a d a m in h a m ãe. E la s a ­ b ia q u e h a v ia g e n te q u e e n tra v a p a ra s a tis fa z e r p a i, s a tis fa z e r tia , s a tis fa z e r a v o v ó .

L o r e n a : O s e n h o r f a l o u d e s s e s o n h o r o m â n t i c o d e s e r p a d r e . C o m o e r a e s s e s o n h o ?

(4)

m e n t a l i d a d e d e m i s s i o n á r i o , é c o n sc ie n tiz a r o p o v o na su a pátria m esm o , n o s lu gares o n d e vo cê iria ser colo cado.

M ô n i c a : D e n t r o d o s e m i n á r i o e x is te m u i t a d is c ip lin a , n é ?

P H : É existe.

M ô n ic a : Q u a l a d if e r e n ç a d a d i s ­ c ip lin a q u e e x is tia d e n tr o d o s e ­ m in á r io p a r a a s u a c a s a ? O q u e m u d o u n o s e u c o tid ia n o ?

P H : O q u e m u d o u foi o seguinte: n a casa da g e n te , a g e n te via tu d o c o m n a tu ra lid a d e . M in h a casa foi se m p re u m a casa m u ito alegre, m u i­ to freq u en ta d a p o r jovens. P o r ra­ p azes e m o ç a s, e m b o ra eu tivesse ap en as d u as irm ãs. P o rq u e, n aq u ela ép o ca, eles (do sem inário) n ã o tin h a m con sciên cia dc q u e eles tin h a m q ue fo rm a r p rim e iram e n te o h o m e m , o cristão, p ara , em cim a disso, fo rm a r o fu tu ro p ad re . E n tã o , d e p o is a se­ g u n d a coisa (as moças) q u e era u m perigo... M as a g e n te c o m p r e e n d e q u e e ra a m e n ta lid a d e d a é p o c a , n in g u é m p o d e ju lg a r c o m o s c ri­ té rio s d e h o je . O u tr a c o isa q u e eu a c h a v a e rra d a e ra q u e n ó s é ra m o s u n s 7 0 , 8 0 e a f o r m a ç ã o e r a m a ssific a d a . P o rq u e , às v e z e s, h á u m s e m in a ris ta , u m jo v e m m u ito a le g re , h á o u tr o m e n o s e x p a n s i­ vo , e a c h o q u e eles n ã o o lh a v a m m u ito e ssa s d ife re n ç a s.

M ô n ic a : E o s e n h o r e ra q u a l d e ­ le s? E r a o m a is e x p a n s iv o ?

P H : A h , eu e ra m a is e x p a n siv o . Q u e s tã o d a prática d o silêncio - eu tirei m u ita n o ta b aix a p o r cau sa de falar (risos). E claro q ue isso n ão era feito assim , c o m a q u e la in te n ç ã o m aléfica. Vai ver é a m entalid ade d o s p a d re s, aquela fo rm a ç ã o de o rig em fra n cesa d o s lazaristas.

P e d r o : Q u a l a d if e r e n ç a d o s s e ­ m in á r io s d o A n tô n io B e z e r r a , d e

S ã o V ic e n te , p a r a o s e m in á r io d a P r a in h a n a f o r m a ç ã o d o p a d r e ?

P H : É p o rq u e a P rain h a fo rm av a p a d r e s d i o c e s a n o s , d o c le r o d iocesan o , e o A n tô n io B e zerra fo r­ m av a p a d re s p a ra a v id a religiosa. V iv er em equ ipes. E essa a d ife re n ­ ça. P o r isso que se ch am a “ p ad re s reg ulare s” . É p o rq u e eles têm u m a regra. E o p a d re d io ce sa n o é ch a­ m ad o “ secu lar” . S ecular q u e r d izer “ d o m u n d o ” , e havia p esso as q u e tin h am co m p le x o d essa palavra. E u não, p e lo co n trário . E u m a g ran d e h o n ra. P o r isso q u e eu fiz to d o o m eu sem in ário m e n o r, fiz n o v iciato p a ra ser lazarista. Aí eu saí. E já fui à filosofia d o sem in ário diocesano .

S im p líc ia : Q u a n d o o s e n h o r e n ­ tr o u , o s e n h o r q u is s e r la z a r is ta . D e p o is , p o r q u e r e s o lv e u m u d a r p a r a d i o c e s a n o ? P o r q u e e s s a o p ç ã o p e la m u d a n ç a ?

P H : A g e n te v a i c o n h e c e n d o a c o n g re g a ç ã o . V ai c o n h e c e n d o a m a n e ira d e ele s v iv e re m . E a v id a re lig io sa n ã o se e n q u a d ra v a m u i­ to c o m m e u te m p e ra m e n to . T u d o é re g ra d o , tu d o é p r e v is to , tu d o p re c is a dc lic e n ç a d o s u p e rio r. A g e n te é q u a se u m a c ria n ç a .

M ô n i c a : E , n a c a s a d o s e ­ n h o r , q u a n d o o s e n h o r e r a c r i ­ a n ç a , a s c o i s a s n ã o e r a m t ã o r e g r a d a s a s s i m ?

Padre Haroldo

Onaiulo a liatina revela uni revolucionário

L o r e n a : E c o m o e ra a p r e ­ s e n ç a d a r e lig io s id a d e n o s s e u s p a is ? E le s e r a m m u it o r e li­ g io s o s ? „

P H : M am ãe era m ais religiosa qu e p ap ai, e m b o ra p ap ai fo sse to d o d o ­ m in g o à m issa. E le ia se m a n a lm e n ­ te. A m am ãe era m ais religiosa, c o ­ m u n h ã o diária, né? P o r aí.

M ô n ic a : T e v e a lg u m a c o is a d e n ­ tr o d a s u a c a s a , a lg o q u e s e u s p a i s f a l a r a m , a l g u m a s i t u a ç ã o q u e m a r c o u o s e n h o r q u a n t o à r e lig io s id a d e ?

P H : Q u a n to à religiosidade, eu p ro ­ curava tam b é m “in stru ir” m eu s pais. P o r ex em p lo , q u a n d o algu ém v in h a de férias, havia fam ílias, às v ezes fa­ m ílias g ran d e s, e tin h a p o u c o s q u a r­ to s, n ão dav a p ara u m sem in arista ficar e m u m q u a rto so zin h o . E u di­ zia: “ O lh â , tem lug ar aq u i” . E u d o r ­ m ia n a sala, p o rq u e n o o u tro dia eles iam trab alh ar, p recisav am esta r d e s­ can sa d o s, e eu estava dc ferias. P o r­ q u e o sem in ário se p re o c u p a v a m u i­ to c o m as férias, c o m as p rim a s. “ C u id a d o c o m as p rim a s ” (risos). M as é o tip o da coisa q u e n ã o m e p e rtu rb av a . E u fui se m p re m eio de g rau , m eio livre. E u a c h o q u e nã o nasci p a ra se r en c la u su ra d o não.

P e d r o : O s e n h o r c h e g o u a te r a l­ g u m a n a m o r a d in h a a n te s d e e n ­ tr a r n o s e m in á r io ?

P H : Claro que a gente não fazia o que queria não. Senão tinha levado algumas pisas (dá umaspalmadas na mesa e ri).

L o r e n a : C o m o e r a a e d u c a ç ã o d a d a p e lo s s e u s p a is ?

P H : E r a fo rm a ç ã o m u ito ab e rta. R elarivam en te au tê n tic a, d ev id o ao a m b ie n te em q u e a g e n te m o rav a. A g e n te m o ra v a, n aq u ela ép o ca, em A n tô n io B e zerra . A n tô n io B e zerra , n aq uela cp o ca, era u m a fam ília só. Iss:> ta m b é m favorecia.

P H : A h , is s o e u tiv e . A n a m o ­ r a d in h a , 50 a n o s a trá s , a g e n te se e n c o n tr a v a e ra : “ O i, n ã o s e i o q u ê ” . E r a a s s im , d e s s e je ito . A g e n te n a m o ra v a as m en in as, p eg a­ va n a m ão...

P a tr ic k : O s e n h o r d is s e q u e s u a m ã e e r a m u ito r e lig io s a . P o r q u e e la n ã o q u is q u e o s e n h o r s e g u is ­ s e a c a r r e ir a ?

P H : N a o , ela tin h a u m a co n v ic ção de que a v o c a çã o p a ra p a d re rinha

7 9

Q

u

a

n

d

o

c

o

m

e

ç

a

m

o

s

a

p

r

o

d

u

ç

ã

o

,

u

m

d

o

s

ir

m

ã

o

s

d

e

P

e

.

H

a

r

o

ld

o

fa

le

c

e

u

.

T

iv

e

m

o

s

q

u

e

a

d

ia

r

a

d

a

ta

d

a

p

r

é

-e

n

t

r

e

v

is

t

a

(5)

P

e

.

H

a

r

o

ld

o

é

v

ig

á

r

io

d

a

p

a

r

ó

q

u

ia

d

e

S

ã

o

F

r

a

n

c

is

c

o

,

e

m

J

a

c

a

r

e

c

a

n

g

a

,

m

a

s

c

e

le

b

r

a

m

ís

s

a

t

o

d

o

s

o

s

d

o

m

in

g

o

s

n

a

I

g

r

e

ja

d

o

C

a

r

m

o

,

à

s

lO

h

.

Pa d re H a ro ld o

W F

Ouandn a batina revela bui revolucionário

p o r m o tiv o s e x te rn o s, d e agrad ar o u te r u m statu s. E la q ue ria q u e fo s­ se pela vocação. N ã o sei o q ue ela n o to u em m im q u e ela m e c h a m o u em p a rticu la r e disse: “ O lh a, se v o c ê n ão q u iser ser p a d re , v o cê saia, saia ag o ra m e s m o ” . “ N ã o , eu v o u p o r­ que eu q u ero !” .

M ô n ic a : O s e n h o r falo u q u e e s ta ­ v a a c o s tu m a d o c o m a lib e rd a d e . D e v e te r tid o a lg u n s c o n flito s d e n ­ tro d o s e m in á rio p o r iss o , n ã o é?

P H : C laro! P o r c a u sa d o e sp írito crítico, m esm o n ã o te n d o aquela ro u ­ p a g e m q u e a g e n te ad q u ire dep ois. E u e ra m u ito crític o e m u ito sensí­ vel à injustiça.

M ô n ic a : E m q u e s e m o s t r a v a e s s a s u a “ c r i t ic id a d e ” ?

P H : Q u a n d o u m p a d re lá - n ã o era a m aioria, graças a D eu s! - tra tava o s alu no s d e orig em rica d ife ren te d o s alu no s de o rig e m p o b re . A í, eu nã o aceitava isso não.

M ô n ic a : E d iz ia a e le s q u e n ã o a c e ita v a ?

P H : N ão ! Se fo sse d izer ao p ad re , n a q u e la é p o c a , ele m a n d a v a lo g o e m b o ra {risos). U m a coisa q u e m e to cav a era a falta d e lib erd ad e, da c o n sciê n cia livre, crítica. E u tin h a m u ito s c h o q u e s a s s im . N a a u la d e r e lig iã o , e u t in h a m u it o s c h o ­ q u e s , p o r q u e e u e ra a f a v o r d a e v o lu ç ã o d a s e s p é c ie s e , n a q u e ­ la é p o c a , s e r a f a v o r d a e v o lu ­ ç ã o d a s c s p c c ic s c r a s e r c o n tr a a p r e s e n ç a d e D e u s n o a to c r ia ­ d o r . U m a c o i s a q u e n ã o te m n a d a a v e r. L e v a r a m a o c o n s e ­ lh o , p o r q u e e u d is s e q u e é m u i ­ to m a is p r o v á v e l e m u ito m a is d i g n o a g e n t e d e s c e n d e r d o m a c a c o d o q u e d o b a r r o , d o q u e d o m u n d o m ineral.

D e l l a n o : E s s e s e u p o s i c i o ­ n a m e n t o c r ític o te v e a lg u m a in ­

f lu ê n c ia d e u m d o s p a d r e s q u e o in f l u e n c i a r a m n a in fâ n c ia ?

P H : P a ra falar a verd ad e... In te re s ­ sa n te , eu n ã o sei de o n d e v eio essa in tuição. P o rq u e foi d e m im m e s ­ m o (folheia a B íblia). P o rq u e a g en te falava m u ito , n a q u e la é p o c a , d o s tr ê s r e i n o s d a n a tu r e z a : o r e in o a n im a l, o r e in o v e g e ta l e o r e i ­ n o m in e r a l. E n tã o , o n ív e l s u p e ­ r io r , r e i n o a n im a l. I n f e r i o r , lo g o a b a ix o , r e i n o v e g e t a l . A í, e m c im a d is s o , e u tire i m e u racio cí­ nio. O ra , se m a c a c o p e r t e n c e a o r e in o a n im a l, o r e in o s u p e r i o r , e n tã o c ra m e l h o r p r a g e n te .

L u c i a n a : N o s s e m i n á r i o s p o r o n d e o s e n h o r p a s s o u , o s e ­ n h o r c h e g o u a s e r t r a t a d o d e f o r m a d i f e r e n t e , c o m o u m a l u n o - p r o b l e m a , p o r t e r e s s e e s p í r i t o c r í t i c o m u i t o a g u ç a ­ d o ?

P H : E c la r o q u e e u tiv e d i f i c u l ­ d a d e s . M in h a ú ltim a d ific u ld a d e : e u tiv e q u e m e t r a n s f e r i r d o s e ­ m in á r io , p o r q u e o p a d r e a c h a v a q u e a m in h a m en talid ad e n ão se coadunava. A í o últim o seminário, não. J á fui prevenido.

D e lla n o : E s s e s c o n flito s c o m as id é ia s d a I g re ja , o s e n h o r já tin h a a n te s d e e n tr a r n o s e m in á rio ?

P H : N ã o , eu n ã o tinh a. E u en trei c o m 12, 13 ano s. A g e n te n ão rem ainda essa c rític a . A g o r a , e s se r e ­ l a c i o n a m e n to c o m o s p o b r e s eu já tin h a .

P e d r o : C o m o fo i q u e o s e n h o r p e g o u e s s a s e n s i b i l i d a d e c r í ­ t i c a e f o i e m b a s a n d o c o m t e ­ o r i a s , c o m l i v r o s n ã o n e c e s ­ s a r i a m e n t e m a r x i s t a s ?

P H : J u s ta m e n t e . O s liv r o s q u e a g e n te e s tu d a v a m e le v a r a m a e s se e s p ír it o c r ític o , e m b o r a n ã o f o s s e m a o e n c o n t r o d o q u e eu

p e n s a v a . A p a r tir d o s p r ó p r io s li­ v ro s da Ig re ja, eu m e co n scie n tiz ei.

M ô n ic a : E e s s a a t e n ç ã o , e e s s e o lh a r q u e o s e n h o r já t in h a c o m o s p o b r e s , c o m o s e m a n if e s ta v a ?

P H : L á em casa, a n o ssa fo rm a ­ ção era sem p re assim , d e resp e ito ao s o u tro s , resp e ito ao p o b re . A té eu c o n te i a v o c ê s da o u tra v ez {refe­ re-se à pré-entrevista) d a p rim eira c o ­ m u n h ão . E u fui fazer m in h a p rim e i­ ra c o m u n h ã o , é claro q u e a g e n te fic a e n tu s ia s m a d o . R o u p a n o v a . D e p o is da p rim e ira c o m u n h ã o , tem u m b a n q u e te . S a p ato no vo . O ra , eu d o id o p o r u m sa p ato novo. A í, na v é sp e ra d a p rim e ira c o m u n h ã o , o p ad re disse assim : “ O lh e, to d o m u n ­ d o virá fazer a p rim eira c o m u n h ã o d e p é n o c h ã o ” . T o d o m u n d o de p é n o ch ão , p o rq u e h av ia m u itas crian ças m ais p o b re s d o q u e eu. E u cra p o b re , m as n ão era o m ais p o ­ b re. M eu p ai era fu n cio n á rio p ú b li­ co, p e lo m en o s tin h a aq u ilo c e rto to d o m ês. A í eu fiquei m u ito triste e fui d izer à m am ãe: “ Ô m am ãe, m eu sa p ato n o v o n ão foi in au g u ra d o no dia d a p rim eira c o m u n h ã o ” . E ela m e d e u u m a lição. “V ocê vai d e sa­ p a to , 2 0 e ta n to s v ão d e sap ato , e os o u tro s p o b re z in h o s v ã o d e p é no chão. E le s v ã o ficar h u m ilh ad o s, e Je su s q u e r to d o m u n d o igual” . E n ­

tão , fo i isso q u e aco n teceu .

M ô n ic a : Q u a n d o e la f a lo u is s o , o s e n h o r n ã o f ic o u c h a te a d o ?

P H : E u n ã o fiquei teim an d o . F ui co m m u ita alegria. E u a c h o q u e d e ­ p e n d e m u ito d a fo rm ação . Q u em não tiver um a boa form ação hum ana, não terá um a b o a form ação cristã.

(6)

P H : P o r exem p lo , aquela v isã o r o ­ m ân tic a de q u e o p a d re é feito para celebrar, c o n sa g ra r n o p ã o e v in h o , o c o rp o e o san gu e de Je su s C risto , é claro q u e isso é v erd ad e. M as fui m e c o n sc ie n tiz a n d o de q u e n ó s fo ­ m o s en v ia d o s. A g e n te lia t a m ­ b é m a B íb lia . A s E p í s t o l a s d e S ã o P a u lo . S ã o P a u lo d iz ia a s ­ sim : n u m a c o m u n id a d e , n ã o sei s e e r a n a c o m u n i d a d e d e C o r í n ti o s , e s ta v a h a v e n d o u m a b r ig a , p o r q u e u m tin h a s id o b a ­ tiz a d o p o r A p o i o , q u e e r a u m d i s c í p u l o d o a p ó s t o l o . O u t r o f o i b a tiz a d o p o r P e d ro . E le (S a o P aulo) dizia: “ G ra ç a s a D e u s n ã o batizei n e n h u m d e v o c ê s, p o rq u e o c re sc im e n to d a fé é u m se rv iç o e n in g u ém b atiza p a ra si. E e m n o m e d e Je su s C risto q ue a g e n te b a tiz a ” . E n tã o , u m faz u m a co isa, o o u tro c o m p le ta . U m lan ça a se m e n te, o o u tro rec o lh e. E essa idéia d e São P au lo m e e n tro u m u ito n a cabeça. E u dig o qu e n ó s so m o s p a d re s para p reg ar. A m issa é u m p o n to alto, i m p o r t a n t e , é o n d e v o c ê v a i ex plicitar su a fé. E x p lic ita r suas c o n ­ v icç õ e s e v an g élic as e p e d ir fo rç a para a batalha.

S im p líc ia : O s e n h o r é u m p o u ­ c o c r i t i c a d o p o r c h a m a r o s f i­ é is p a r a a c e l e b r a ç ã o d a m i s s a , p a r a a c o n s a g r a ç ã o

(n o c a t o l i ­

c is m o , a c o n s a g r a ç ã o é a p a r ­

te d a m i s s a e m q u e o p ã o e o

v i n h o s e t o r n a m o c o r p o e o

s a n g u e d e C r i s t o y s i g n i f i c a n ­

d o a m o r t e n a c r u z ) ,

p a r a a

l e i t u r a . P o r q u e o s e n h o r f a z i s s o ?

m e p r o ib ir a m d e u s a r a p a la v ra “ c o n c e le b ra r” , e n tã o e u d ig o “ p a r­ tic ip a r” .

K elly : P o r q u e p r o i b i r a m o s e ­ n h o r d e u s a r e s s a p a la v r a ?

P H : N ã o , é q u e q u e re m q u e seja b em d ife re n c ia d o o leigo e o p a ­ d re. O p a d re é c o n s a g r a d o p a ra “ aq u ilo ” , o leigo é c o m o se não fo s­ se. O ra , to d o s são c o n sag rad o s, l o ­ d o s sao c o n s a g ra d o s n o b a tism o . T o d o s são b atizad o s, crism ad o s. O p a d re é u m d e v o cês. T o d o s são c o n sag ra d o s p e lo batism o. O caso é d o m isté rio pascal. São P a u lo é incisiv o nisso. E le diz q u e n ão há m ais n e m g reg o , n e m ju d eu , n e m escrav o, n em livres, n e m h o m e m , n e m m ulher. T o d o s sao iguais. M as vai à e x trap o la ção da palavra sagra­ d a. A liás, a p a la v ra “ leig o ” h o je , q u e m p e n s a n u m a visão teo ló g ica m ais lib erta d o ra , n ã o se usa m ais o te rm o “ leig o ” . U sa u m q u e tem o m e sm o significado, m as é m elh o r: “ laico ” . P o rq u e laico v em d o g reg o laiósy q u e significa “ p o v o co n sag ra ­ d o ” . P o v o q u e foi tirado. P o v o que foi ch am ad o . L eig o q u e r d ize r c o n ­ sagrado, m as c o m o a p alav ra “lei­ g o ” to m o u u m sen tid o pejo rativ o , d esv alo riz o u o term o . P o r isso, n ó s e sta m o s a c o n se lh a n d o a c h a m a r o leigo de laico. U m a palavra q u e d i­ ferencia, e m b o ra seja a m esm a raiz.

L o r e n a : E n t ã o , o s e n h o r a c h a q u e o s fié is d e v e m te r u m a p a r ­ tic ip a ç ã o m a i o r n a m is s a ?

P I I : A h sim , m aior.

Padre Haroldo

Quando a batina rerajã um revolucionário

d o E sp írito S anto. O ra , se os laicos p o d e m rezar e p e d ir a d escid a d o E sp írito S an to , p o rq u e eles n ão p o d e m in v o ca r d e n tro da m issa? A g o ra , a co n sag ração eu nao m a n d o o p o v o d izer não , m as tem p a d re q u e m an d a. Q u a n d o eu faço, ch am a atenção. H á u m a co isa aí q u e eu n ã o e n te n d i a té h o je . V o u m o r ­ r e r se m e n te n d e r.

C a m ille : E s s a p r á t i c a , o s e n h o r te v e d e s d e a s p r im e ir a s m is s a s ?

P H : M in h a m issa foi se m p re p a rti­ cip ad a, m as a g e n te vai evoluin do. P o r ex em p lo , q u a n d o eu m e o rd e ­ nei, e m 1964, 29 de n o v e m b ro , a m issa e ra m e ta d e e m p o r tu g u ê s , m e ta d e em latim . E u já c o m e c e i tu d o e m p o rtu g u ê s. A língua é se­ cu n d ária, você pode celebrar em fran­ cês, inglês, português, ladm, grego O que vale é o valor da missa em si m esm o, o que ela significa. E p ra m ostrar aos laicos que a missa nao existe p o r causa do p a­ dre, ela existe p o r causa da com unida­ de. E p o r isso que quando não h á ne­ nhum m otivo para eu celebrar... O pes­ soal se escandaliza se eu n a o celebrar to d o dia. E u n ã o ce le b ro to d o dia, p o rq u e eu ce le b ro p a ra u m a c o m u ­ nidade. V o u c e le b r a r s o z in h o n o d ia q u e tiv e r só . A g o ra , o p a d re é o b rig ad o , p o rq u e tem os fiéis to d o d ia p a ra a s sis tir, p a ra p a rtic ip a r. V o c ê vê q u e , d e v e z e m q u a n d o , a c o n s c iê n c ia d a g e n te tra i.

E u g ê n ia ; A tra n sfo rm a ç ã o d a h ó s­ tia e m C orpo d e C risto, o se n h o r tam ­ b é m c h a m a o s f i é i s p a r a p a r t i ­ c i p a r e m d e s s a h o r a ?

P H : O lh e , c o n s a g r a ç ã o eu n ã o fa ç o n ã o , p o r q u e o p e s s o a l se e s ­ c a n d a l i z a . P r i m e i r a m e n t e , a té e s s a p a la v r a “ a s s is tir à m is s a ” é u m a p a la v r a e r r a d a . V o c ê a s s is ­ te a u m film e , m a s v o c ê n ã o e s tá n o film e . V o c ê a s s is te a u m a p a r ­ tid a d e f u te b o l, m a s v o cê n ã o está n o fu te b o l. A m issa não, v o cê tem qu e p a rticip a r, co n celeb ra r. A g o ra

M ô n ic a : O s e n h o r já p e n s a v a n is ­ s o q u a n d o e s ta v a n o s e m in á r io ?

P H : Já pensava. M as q u a n d o a gente se o rd e n a , a g e n te ex trav asa m ais aqu ilo q u e p en sav a. E n tã o , eu n ão d ig o q u e faço a co n sag ra ç ão , m as eu faç o até e m p o siç ã o das m ao s (ergue as m ãos abertas p a ra o alto). A g en te p õ e as m ão s e p e d e a descida

P H : E u p o d e r ia c h a m a r , m a s n ã o c h a m o p a r a e v ita r o e s c â n d a lo . S ão P a u lo d iz ia a ssim : “ C a r n e d c p o r c o p o d e c o m e r à v o n t a d e , n ã o te m p r o b le m a n e n h u m . M as se te u ir m ã o se e s c a n d a liz a , tu n ã o f a z e s ” . A í, n e s s a f u x ic a d a to d a , u m a d a s c o is a s q u e a r g u ­ m e n ta v a m e ra q u e e u m a n d a v a d iz e r a c o n s a g r a ç ã o . N ã o ,

81

N

o

in

íc

io

d

a

e

n

tr

e

v

is

ta

,

P

e

.

H

a

ro

ld

o

d

a

v

a

r

e

s

p

o

s

ta

s

c

u

r

ta

s

e

n

ã

o

p

a

re

c

ia

d

is

p

o

s

to

a

r

e

p

e

ti

r

a

s

in

fo

r

m

a

ç

õ

e

s

q

u

e

h

a

v

ia

d

a

d

o

à

e

q

u

ip

e

d

e

p

r

o

d

u

ç

ã

o

n

a

p

r

á

-e

n

tr

e

v

is

ta

(7)

A

e

n

t

r

e

v

is

t

a

fo

i

r

e

g

a

d

a

a

s

u

c

o

s

d

e

la

r

a

n

ja

e

d

e

a

c

e

r

o

la

,

c

o

m

d

ir

e

it

o

a

b

o

la

c

h

a

s

p

a

r

a

a

c

o

m

p

a

n

h

a

r

.

Pa d re H a r a ld o

W F

Ouandn a lmtma revela bui revolucionário

n ao m an d av a. D e p o is ali, o p esso al fica e m silêncio e é até b o m q u e fi­ q u e c m silêncio n aq u ela h o ra , p o r ­ q u e é u m a h o ra e m q u e a g en te re ­ p e te a ação d o C risto. “ E s te é o m eu c o rp o , este é o cálice d o m eu san ­ g u e ” . T o d o m u n d o o u v e ali e a c o m ­ p a n h a e m p e n sam e n to .

L o r e n a : V o lta n d o u m p o u c o p a r a a f o r m a ç ã o id e o ló g ic a d o s e n h o r n o s e m in á r io . O q u e m a is o s e ­ n h o r lia ? A lé m d o s liv ro s d a I g r e ­ ja , t in h a a lg u m liv ro q u e e ra p r o i­ b id o , m a s m e s m o a s s im o s e n h o r e s tu d a v a ?

P H : O ú n ico livro p ro ib id o q u e eu li, no sem in ário m e n o r, q ue tem até a capa assim c o m o se fo sse a cap a d o livro de S an ta T e rez in h a, foi “A V ida S exual, A E n c iclo p é d ia S exu ­ al” . Isso n o sem in ário m e n o r, ain d a n o ginasial. P o rq u e eu já estava p ara ir p ro m aio r, c o m 18 a n o s, e n u n c a tin h a Lido u m livro so b re fo rm a ç ã o sexual. E u sabia, p o rq u e a m in h a fam ília era um a fam ília larga (ele quer d izer liberal) , a g e n te n ao rinh a essa p re o c u p a ç ã o c o m sexo. E o u tra fo r­ m ação, eu v im d e u m m u n d o u m p o u c o d ife ren te d o sem inário.

L o r e n a : E q u a n d o o s e n h o r le u e s s e liv ro d e f o r m a ç ã o s e x u a l?

P H : D e p o is eu li u m o u tro livro qu e dav a u m a v isã o m ais teológica q u e “A V ida S exual” , aí c o m p le to u a m in h a visão.

S i m p l í c i a : O c e l i b a t o f o i u m p r o b l e m a ?

P H : E u a c h o q u e o c elib ato é u m a luta. E u a c h o qu e q u e m diz que fez o v o to e está reso lvido ... E u ach o q u e o celib ato é um a p e rd a que v oc ê q u e faz (opta). A g o ra, eu a c h o q ue o s p a d re s ... N ã o p r e p a r a r a m o s p a d re s n e m p a ra scr c e lib atá rio s, e n tre asp as, n e m p a ra o ca sa m en to , p o r q u e v iam na m u lh e r u m a o c a ­ sião d e p ecad o. Isso é co n seq u ên cia

da m á in te rp re ta ç ã o da Bíblia. P o r isso, e u c o stu m o d ize r q u e o p r o ­ b lem a h o je da relig io sid ad e n ã o é u m p ro b le m a de fé, é u m p ro b le ­ m a cultural. P o rq u e à m ed id a que a p e sso a in te rp re ta a BíbLia ao p é da letra, ela vai agir e m cim a d essa vi­ são, d essa in te rp re ta ção . E m b o ra os E sta d o s U nidos... O s E s ta d o s U n i­ d o s são u m país terrív el, lam e n tá ­ vel. E les ago ra têm u m a ala de te ó ­ log os q u e d iz e m q u e tu d o p ro v a o “ fixism o” . Q u e r d izer, D e u s crio u de u m a vez só o h o m e m e a m u ­ lher. S o p ro u ali (sopra), aí ficou de p é o m o le q u in h o . A í d ep o is tiro u a costela. E les d ize m q u e é p ro v á v e l q u e te n h a h a v id o isso . E u tav a fa­ z e n d o u m a p a le s tra n o s e m in á rio de Q u ix a d á (cidade lo ca liza d a uo S e r­ tão C e n tra l do C eará, a 1 6 0 quiló m e­

tro s de F o rta leza ) e sa iu e sse p r o ­ b le m a . S a iu e s s e p r o b l e m a d e b io g en é ric a . A í d isseram : “A h , m as lá n o s E s ta d o s U n id o s ...” . D e ix e e sse p r o b le m a p a ra o s a m e ric a n o s c o m a su a te o ria . P o r q u e é q u e v e m a c rise d a fé n o s jo v e n s d a u n iv e rs id a d e ? P o r q u e é? P o rq u e v o c ê e n tr a , faz a p rim e ira e u c a ris ­ tia , n o m á x im o c h e g a à c rism a e v ai c o m a q u e la “ f o r m a ç ã o z in h a ” d e s se ta m a n h o (m ede com os dedos). A g o ra , a su a c u ltu ra e stá b e m aq u i (m ede com os braços abertos). E u m p r o b le m a sé rio . E u n ã o sei p o r q u e n ã o a ta c a m iss o ...

P e d r o : P a d r e , o s e n h o r c h e ­ g o u , e m a l g u m m o m e n t o d a s u a v i d a , a d e s c u m p r i r o u q u a s e d e s c u m p r i r c o m o c e ­ l i b a t o ?

P H : N ã o , e u s e m p r e p r o c u r e i c u m p rir. N a o q u e r d iz e r q u e eu n ã o s in ta as p a lp ita ç õ e s d e to d o h o m e m .

L o r e n a : M a s o s e n h o r c o n c o r ­ d a q u e t e r i a q u e h a v e r o c e l i ­ b a t o n a I g r e j a ?

P H : A m in h a o p in iã o é essa so b re

o celibato: eu n ã o so u c o n tra o celi­ b a to e m si, m as o q u e eu v ejo é qu e o e s ta tu to d o c elib ato te m q u e m u ­ dar. T e m q u e m u d ar. E n tã o , o no vo e sta tu to seria esse: é p e rm itir ao s p a d re s q u e q u iserem o p ta r p e lo ce­ libato, m u ito b e m , ótim o . E o s qu e q u ise re m se ca sar se casam . E u so u to ta lm e n te (afavor) e assinei lista para m o d ific a r o celibato.

D e lla n o : Q u a l a s u a p o s iç ã o e m r e la ç ã o à h o m o s s e x u a lid a d e ?

P H : E n tã o , o h o m o sse x u a lism o : eu te n h o u m a v isã o que, é claro, não é a visão da Igreja. E u a c h o q u e n ó s s e re m o s ju lg a d o s n ã o p e la n o s s a o p ç ã o sexual, se c h e te ro sse x u a l, se é h o m o sse x u a l. E u a c h o q u e n ó s sere m o s ju lg ad os p e lo am or.

D e lla n o : O s e n h o r ju lg a q u e a h o m o s s e x u a lid a d e é u m p e c a d o ?

P H : Se é u m p ecad o ? N ã o , n a o jul­ go. A n ão ser que... E u assisti a um film e, eu ev o lu í m u ito n essa m e n ta ­ lidade. U m a v ez eu assisti a u m fil­ m e d e u m alem ão, o h o m e m que fez é h o m o ss e x u a l. E n tã o , a tese d esse film e era m o stra r q u e o h o ­ m o ssex u al n ão é m argin al. E p o r ­ q u e , n o m e io p o b r e , o h o m o s s e x u a lis m o é e m p u r r a d o p ara a m arginalizaçào . P o rq u e to d o m u n d o ach a natural...

L o r e n a : O s e n h o r a c h a q u e e s tá e m to d o s o s m e io s s o c ia is ?

P H : E stá , está. T o d o s os m eios. N a Igreja tam b ém .

M ô n ic a : P a d r e , q u a n d o o s e n h o r e s ta v a n o s e m in á r io , a lé m d e s ­ s a s c r ític a s a c o is a s m a is e s p e c í ­ fic a s d a I g r e ja , o s e n h o r d e s e n ­ v o lv e u t a m b é m u m a c r ític a s o ­ c ia l. O s e n h o r já t in h a a lg u m a id e n tif ic a ç ã o ?

(8)

sem in aristas q ue se con scien tizaram a p a rtir d o c o n ta to c o m a realida­ de. E u n â o deixei de te r tid o esse c o n ta to , m as foi a p ró p ria realidade m esm o reacionária, conservadora que m e d e sp erto u pra o u tra condição.

M ô n ic a : C o m o ?

P H : P o r exe m plo, a v isã o q u e o se­ m in ário rinha do socialism o, de m ar­ x ism o era b e m “ a n d ” . M as eu fui p e n sa n d o , refletin d o . O reflex o das inju stiças q u e a g e n te via lá d en tro. A g o ra, n ã o tem ilu sõe s, o sem in á­ rio é um re tra to d o m u n d o . A g e n ­ te, q u a n d o en tra n o sem inário, a g en ­ te... A té u m a m e n in a p e rg u n to u : “ C o m o é esse in fantilism o? ” . A g en ­ te p e n sav a q u e n ã o p ecav a n o sem i­ nário. E u m e le m b ro q ue eu dizia à m in h a m ãe, m u ito in g é n u o ainda: “ O lh a , m in h a m ã e , a g e n te n ã o p re c is a se c o n fe s s a r, a g e n te n ã o p e c a ” . N ã o p e c a! E m q u a lq u e r lu g a r o h o m e m p e c a .

P e d r o : C o m o o s e n h o r f a z i a p a r a l e r liv r o s m a r x i s t a s d e n t r o d o s e m i n á r i o ?

P H : E sc o n d id o . U m a vez, e n g ra ­ çado, (vou di%er) q u e m teve in flu ê n ­ cia in te rn a m e n te . D e p o is eu v o u di­ z e r e x te rn a m e n te , q u e foi a A ç ão C atólica, q u e co n trib u iu m u ito ,JE C , JU C , J O C , JA C [m ovim entos da ju v e n ­

tude católica), esses m o v im e n to s p io ­ neiros. F o i graças a esses m o v im e n ­ t o s d e a ç ã o c a t ó l i c a q u e a in te lectu alid ad e ad eriu às ideias cris­ tã s, e v a n g é lic a s . G o s t o m a is de “ e v a n g é lic a s ” q u e “ c ris tã s ” . M as v o c ê p e rg u n to u o q ue foi, hein?

L o r e n a : C o m o o s e n h o r f a z i a p a r a le r...

P H : A h , sim . A g o ra , o d e s p e rta r m e sm o eu já c o n te i p ara ele (aponta

p a ra Pedro, cjue particip ou da

pré-enire-vistd). O p ro fe s s o r q u e passava, eu go stava . A qu i, q u a n d o a g e n te vai p a s s a r u m liv ro p ra tu r m a , A ve

M aria! (Pe. H aroldo éprofessor aposen­ tado da U niversidade E sta d u a l do Cea­

rá, onde ensinava A ntropolo gia e Sociolo­

gia). E u m c h o ro tão g ran d e q u e eu d ig o “Ave M aria!” . E le dava era, às vezes, u m livro (todo)... E sse , c o m o era m u ito g ro sso , fico u m eta d e p ra m im , m e ta d e p ara o u tro colega. E a g en te rin h a q u e e x p o r d ian te d o s trê s curso s. E u estava n o p rim e iro an o d e F ilosofia. E v in h am até te ó ­ log os escu tar. E n tã o , tin ha u m livro lá c h a m a d o “ O D ir e ito N a tu r a l c o m o B ase d o D ire ito P ositiv o ” . E a p a rte q u e ch e g o u p a ra m im foi a p arte m ais prática. E o a u to r, isso foi em 1957, seu s p ais n ã o p e n sa ­ v a m n e m e m c a sa r (fa la apontando p a ra íaorend). A í o a u to r in te rro g av a

c o m q u e p o d e r, b a s e a d o e m q u e p rin cíp io , em q u e direito, os países ocidentais, am ericanos, franceses, ita­ lian os in v ad iam os países, ab afav am os m o v im e n to s lib ertá rio s n o n o rte da Á fric a c n o O rien te -M é d io . A í eu m uito... E claro, se eu tava a b a ­ fando. A b a fa n d o n a m en talid ad e d o jo v em . E x p o n d o o re su m o d o li­ v ro e eu disse: “ E u p e ç o licen ça ao se n h o r p ro fesso r...” . O p ro fe sso r era u m h o m e m terrível,

m u ito in te li g e n te , m a s r e a c i o n á r i o , c o n se rv a d o r. E r a o ú n ico q u e falava la­ tim d ireito , n ã o era m a c a r r ô n ic o . P o r ­ que, n aq u ela ép o ca, a g en te tin ha aula e m latim , dav a aula em latim . E n tã o , eu d is­ se: “P e ç o licen ça aos senh o res professores e m eu s q u e rid o s c o ­ le g a s p a r a a t u a l i ­ zar...” . P o rq u e o livro cra d e 1922, q u a n d o fo m o s ab rir, d e m o s v ário s esp irro s, o b i­ c h o ta v a c h e io d e p o e ira . E p o r isso qu e, às vezes, a p e s­ s o a te m u m liv r o v e lh o e diz: “ V o cê

q u e r p ra v o cê?” . “ E u q u e ro ” . P o rq u e se m p re e n c o n tra coisa nova. Se n ão ex istisse p assa d o , n ão se c o n stru iria o fu tu ro . A í eu atuali­ zei: “ C o m q u e d ire ito a F ra n ça e a In g la terra estão e sm a g a n d o os m o ­ v im e n to s n o s países e tal e tal? E p o rq u e n ã o te m lib erd ad e, n ã o es­ tão p re p a ra d o s p a ra o exercício da lib e rd ad e ” . A í eu d e fe n d i o n a c io ­ nalism o. Q u a n d o ch e g o u u m te m ­ p o , ele (oprofessor) ficava passeand o . E s s e c u a c h o q u e tem u m p ro b le ­ m a d e celib ato , p o rq u e o h o m e m to d a aula falava à g e n te so b re celi­ b a to . E a c a b o u c a s a n d o (a tu rm a toda ri). F ez b e m e m te r casado. E u a c h o q u e n in g u ém p o d e ser cristão se n ão está feliz n a su a p e le . A í e le : “ O s e n h o r já t e r m i n o u ? ” . “ T e r m i n e i ” . “ E u q u e r o s a b e r que livros m arx istas o se n h o r a n d a len ­ d o ” . E u disse: “ P a d r e , p o r in c rív e l q u e p a re ç a eu n u n c a li u m livro fei­ to p o r marxista. Leio livros críticos do marxismo, católicos, de teólogos”. “Mas o seu linguajar é marxista, leninista. Cui­ dado com esse seu c o m u n is m o , c u i­ d a d o ” . E u sei q u e ele m e a r r a s o u . U m c o le g a q u is m e d e f e n d e r ,

8 3

O

s

p

a

is

d

e

P

e

.

H

a

r

o

ld

o

e

r

a

m

fu

n

c

io

n

á

r

io

s

d

o

s

C

o

r

r

e

io

s

,

s

e

c

o

n

h

e

c

e

r

a

m

e

m

B

a

t

u

r

it

é

e

t

in

h

a

m

c

o

m

o

p

r

e

o

c

u

p

a

ç

ã

o

n

ú

m

e

r

o

u

m

a

e

d

u

c

a

ç

ã

o

d

o

s

s

e

is

fi

lh

o

s

(9)

A

fa

m

íl

ia

d

e

P

e

.

H

a

r

o

ld

o

e

r

a

a

n

t

i-c

o

m

u

n

is

t

a

,

c

o

m

o

q

u

a

s

e

t

o

d

a

s

a

s

fa

m

íl

ia

s

c

a

t

ó

li

c

a

s

d

a

é

p

o

c

a

.

Pa d re H a ro ld o

O uandn a Iw tin a re v e la um rev o lu cio n á rio ele arraso u tam b ém . M as eu fui p i­

o n e iro aí. A té aq uela data, n e n h u m alu no tin h a e n fre n ta d o o p ro fe sso r, e n fre n ta d o n o sen tid o alto da p ala­ vra. T e rm in o u a aula, e c o rri p ra fa­ lar c o m o reito r. Se o re ito r rec e ­ b esse a v ersão dele an te s da m in h a, eu estava pe rd id o . E d e p o is ele ter­ m in o u b e m co m ig o , já h av ia ta m ­ b é m m u ita fux icad a de alunos.

L o r e n a : O s e n h o r d e p o is fo i p r o ­ f e s s o r d e T e o lo g ia . C o m o m in is ­ tra v a a s a u la s ? Q u a l a d if e r e n ç a d o s s e u s p r o f e s s o r e s p a r a o s e ­ n h o r?

P H : O p ro b le m a é q u e a m en ta li­ dade deles era diferen te. N a o tin h am u m e sp írito crítico. E o p esso al está a c o stu m a d o à g e n te m astig ar tu do , m astig a r. D á tu d o m a s tig a d in h o , traz as fichinhas. O pessoal n ã o gosta de p e n sar nao. N ã o g o sta d c esq u en ­ ta r a cabeça. M eu s a lu n o s, m u ito s g o s ta v a m , m u ito s n ã o g o s ta v a m não. E sp írito crítico. M as eu g o ste i de te r en sin ado . A g o ra g o ste i m ais da un iv ersid ad e.

S im p líc ia : E s s e p r o b le m a d o s jo ­ v e n s , d a s p e s s o a s n ã o g o s ta r e m d e p e n s a r , n ã o é u m p r o b le m a d e e d u c a ç ã o ?

P H : D e e d u cação e, p rin c ip a lm e n ­ te , d e p o is d e 1 9 6 4 . D e p o i s d a Q u a rte la d a (golpe m ilita r de 1 9 6 4 ). V o cês sao a ju v en tu d e d o silêncio. V ocês n ã o v iv eram aquela m ística da co nsciência cristã rev olucion ária. A s co isas n a o são assim p o r g era ção e s p o n tâ n e a , tem que ter u m a causa. N ã o existe nada sem causa. C o m o diz o p rin cíp io filosófico: “N a o h á causa se m efe ito e n ã o h á efeito...” . N ã o é? P o r exe m p lo , a situ ação d o país é a m ais p erig osa, p o rq u e ela já p asso u . A d ife ren ça é q u e, an te s de 1 9 6 4 , e s ta v a h a v e n d o u m a efe rve scên cia. O s jov ens, o s tra b a­ lh ad o re s ru rais e o o p e ra ria d o esta ­ vam m ais co nscien tes. O p esso al ti­ n h a m ais c o n v ic ç ã o de q u e aquela

situ ação de m iséria n ão p o d ia c o n ­ tinuar. T in h a q u e fazer a revolução.

D e lla n o : O s e n h o r falo u q u e o se u p r o fe s s o r tin h a c o m p a r a d o o se u d is c u r s o a u m d is c u r s o m a rx ista . A n te rio r a e s se m o m e n to , o s e n h o r tin h a le itu ra s s o b re p o lític a ? O s e ­ n h o r a c o m p a n h a v a p o lític a ?

P H : A c o m p a n h av a atrav és de jo r­ nais, d e livros. A g o ra, a p a rtir daí, não. A p rim eira folga q u e eu tin h a, saía, às q u artas-feiras, p ra d a r ca te ­ cism o n o s colégios. A p rim e ira co i­ sa q ue eu fiz foi c o m p ra r “ N o v o s R u m o s” , q u e era u m jo rn al c o m u ­ nista. C o m p re i “ O C ap ita l” {princi­ p a l trabalho de K a rl M a rx , um dos m ais

im portantes pensadores do ocidente, p u b li­

cado em 1893) e o u tro s livros mais. C o m ecei a ler. A g o ra, n o q u a rto ano de filosofia, ha n o q u arto . T em e s­ sas band eiro las assim , né {mostra como se fosse um combongô), p egava u m p a ­ pelão, p egava u m q u eb ra-lu z, b o ta ­ va u m c o b e rto r aqui e ficava lendo. F oi o tem p o e m que eu m ais li na m in ha vida. H á certos m ales que vêm para o bem .

L o r e n a : O s e n h o r s e o r d e n o u n o a n o d o g o lp e m ilita r. C o m o e ra a p o s tu r a d o s e n h o r , e c o m o e ra a p o s tu r a d a I g r e ja f re n te à “ r e ­ v o lu ç ã o ” ?

P H : E m 1964, a Ig reja, d e p o is do g o lp e, a p o io u o go lp e. Saiu u m m a ­ n ife sto da C N B B {Conferencia N a cio ­ n a l dos B ispos do B rasil) d ize n d o que agora d ev iam se p re o c u p a r c o m os p ro b le m a s de o r d e m e c o n ó m ic a , m e n o s p o l ít ic a , n a o s e i o q u ê . S a iu u m m a n i f e s t o . A t e D o m H é l d e r (o arcebispo D . H é ld e r C â ­ m a ra na sceu em F o r ta le z a em 1 9 0 9 .

D u r a n te a d ita d u r a m ilita r , to rn o u

-se u m líd e r c o n tra o a u to rita ris m o e

os a b u so s aos d ire ito s h u m a n o s p r a ­

tic a d o p e lo s m ilita r e s . F a le ce u em

1 9 9 9 , v ítim a de u m a p a ra d a

cárdio-respiratórid) assin o u . D e p o is, ju sta ­ m e n te , eles p reg av am o qu ê? D e ­

m o cracia, fam ília. C h eg av a se m p re a falar em p ro p rie d a d e , m as ao m e s­ m o te m p o p reg av a isso. E n tã o , d i­ an te disso, falava-se n a liberd ade. A p rim eira coisa q u e fizeram foi vigi­ ar o se rm õ e s d o s p ad re s. P re n d e r p ad re s, lideres o p e rá rio s, líd eres e s­ tudan tis, a to rtu ra. A í a Igreja se afas­ to u . A cú p u la d a Igreja. M as só uns dez b isp o s q u e fo ra m co n te stad o re s m esm o. D o m H é ld e r era um .

P e d r o : O b i s p o a o q u a l o s e n h o r e ra lig a d o e ra ?

P H : 1 £.ra u m h o m e m d e m u ita v i­ são, p o rq u e n essa altura... E r a um h o m e m d c m uita visão. D o m C le­ m en te Isn ard . E le era u m beneditino, m u ito b o m . A c a b eça d ele m u ito bo a. B asta d izer q u e, na Q u a rte lad a , ele e s c o n d e u g e n te n o se m in á rio m e n o r q u e tin h a lá. G e n te q u e a policia perseguia.

L u c ia n a : C o m o o s e n h o r s e i n ­ s e riu n e s s e c o n te x to ? C o m o o s e ­ n h o r p e n s a v a n e s s a é p o c a ?

P H : N aqu ela ép o ca, eu já estava bem c o n scien te . A g e n te n ão p o d ia fazer re u n iõ es, e n tã o a g e n te m etia um a p ro c is s ã o . P ro c is s ã o d e S ão J o s é T rab alh ad o r. E u arranjei lá u m o p e ­ rário p ra fazer u m a e stá tu a d e um São Jo sé m ais o p erá rio . P o rq u e essa estátu a de São J o s é c o m u m cajado c h eio de flores n ã o m e en tu siasm a n ão {risos da turm a). N a q u e la ép o ca, p arecia u m a p o se n ta d o d o Ia p i (In s­ tituto de A p o se n ta d o ria e P ensões dos

In d u striá rio s). E u c o m e c e i a fa z e r essa p ro c is s ã o . U m a co isa q u e m e s a lv o u m u ito é q u e e u p r e g a v a s e m p re c o m a B íb lia . A B íb lia c u m a f o n te in e sg o tá v e l p a ra se f u n ­ d a m e n ta r u m a a ç ã o c ris tã , ju n to c o m o A n tig o T e s ta m e n to .

(10)

P H : E u ach o qu e a g en te n ã o p o d e scr ing én uo . B isp o n ao tem essa fo r­ m ação, essa lib erd ad e q ue n ó s, p a­ d res, te m o s. É m ais fácil a g e n te vivenciá-la. B isp o é u m a c o lu n a d o V aticano. T od a ação dele... U rn a vez, D o m A lo ísio (Lorscheider) m e disse a ssim : “ O lh e , fe liz e s sã o v o c ê s. V o c ê s fa lam e n ã o tem n in g u é m p a ra ob serv ar. M as se eu d o u u m p r o n u n c i a m e n t o a q u i , a n u n c ia t u r a já m a n d a u m a c a r ta à S a n ta S é . B e s ta é q u e m q u e r s e r b is p o , m a s tê m p a d r e s q u e g o s t a m ” .

S i m p l í c i a : P o r i s s o o s e n h o r n ã o q u i s s e g u i r c a r r e i r a ?

P H : N ã o , n ã o . E q u e e u s o u c o n tr a e s s a m e n ta lid a d e . É p a ­ d r e , t e m q u e s e r m o n s e n h o r . N ó s s o m o s c o n t r a i s s o . N e ­ n h u m p a d r e p o d e s e r b is p o d i­ r e t a m e n t e . N ó s s o m o s c o n t r a iss o , o c a r r e ir is m o . P r a m im , é u m c â n c e r o c a r r e ir is m o e c le s i­ á s tic o . Q u e m q u e r , q u e r d a r e x ­ p a n s ã o a o s e u t r a b a l h o p a s t o ­ ra l. “ N ã o v a i f a z e r is s o , p o r q u e p o d e a c o n te c e r i s s o ” , p o r q u e vai t o c a r n o s p o d e r o s o s .

M ô n ic a : O s e n h o r f a lo u q u e p r o ­ c u r a v a d e n tr o d a B íb lia a ju s tif i­ c a t i v a p a r a s u a s a ç õ e s . Q u e a ç õ e s o s e n h o r f a z ia n o p e r ío d o d a d i t a d u r a m ilita r?

P H : E u fazia ta m b é m u m tra b a lh o de c o n s c ie n tiz a ç a o . R e u n ia o s j o ­ v e n s , a p r o v e ita v a d e t o d o s o s m e i o s . D a r c o n f i s s ã o , p o r q u e p r a g e n te e n t e n d e r a m ilitâ n c ia c r is tã , q u e e ra q u e n te a n te s d e 1 9 6 4 , a g e n te p r e c is a e n t e n d e r o c o n t e x t o d a A m é r ic a L a tin a n a q u e la é p o c a . N ã o p o d ia só ir r e z a r n ã o . E r a o t e m p o d a s g u e r r ilh a s . E r a o t e m p o e m q u e o s c r is tã o s r e s o lv e r a m se e n g a ja r n a lu ta . N a lu ta c a m p o n e s a , n a lu ta ... (a sen h o ra cjue tra b a lh a com o p a d r e t r a \ um a bandeja com sucos de

m aracujá e de acerola, além de biscoitos, e

interrom pe a fa la ) A h... o n d e eu e sta ­ va? N o tra b a lh o q u e eu fazia. F azia co n scien tiz ação , fazia reu n ião c o m o s cam p o n eses. N o m ato , n o m ato. P o rq u e se fizesse na cidad e, c h a m a ­ va m u ita aten ção. T in h a u m g ru p o d e jo ven s m u ito b o m . Seis an o s de tra b a lh o co m u m g ru p o de jo v en s co n scien te s. E ra u m lu g ar q u e eu estava nessa ép o ca m ais q u e n te e u m lug ar q u e jam ais seria u m lug ar p ara p a rtir alg u m a ação rev o lu cio n ária . Seria u m lugar, u m ap oio . D a r u m ap o io ao s o u tro s m o v im en to s.

P e d r o : C o m o o s e n h o r v ê a p a r ­ t i c i p a ç ã o d i r e t a d o s p a d r e s n a lu ta , p e g a n d o e m a r m a s e e s s e tip o d e c o is a ?

P H : É claro q u e a g e n te era a fa­ vor. A fav o r c o m o ú ltim o rec u rso . E ta m b é m o c a ris m a , n e m to d o m u n d o p o d e fazer a m esm a coisa. E u adm irava m u ito o C am ilo T o r­ res (sacerdote e sociólogo colombiano, p r i meiro p a d re guerrilheiro da A m érica

I

m-

tina). C a m ilo T o rre s foi m o rto pelo exército. E n tã o , o m eu tra b a lh o era atrav és d a m in h a p reg ação .

D c lla n o : E r a a s s im q u e o s e n h o r a p o ia v a o s m o v im e n to s r e v o lu ­ c io n á r io s n a q u e la é p o c a ?

Padre KaroSdO Quando a batina revela u t r L kj u:

d o s os setores. A g o ra, o se to r

d e Ig re ja é im p o rta n tís s im o ,

1111I1S

p o rq u e lá é q u e está o índice m aio r 0 ^ ' d e alienação. E n tã o é p re c iso q u e

HHÍH

haja u m rev o lu c io n á rio aq u i, co m o é preciso que haja u m revolucionário c o m um a Bíblia n a m ão. A go ra, eu esto u co n ve n cid o dc que a revolução continua!

D e l la n o : E , d o p o n t o d c v i s t a c r is tã o , c o m o o s e n h o r v ia a a t u ­ a ç ã o d o s g u e r r ilh e ir o s ?

P H : E u vejo o seguinte: T o m ás de A q u in o n o sécu lo X I I I disse a se­ g u in te frase: “A n te u m a tiran ia p e r­ m a n e n te , o p o v o tem o d ire ito de se reb elar” . Iss o é m u ito atual, tem m u ita in flu ência . São T o m ás é do sécu lo X III. E claro q u e n in g u ém deseja a violência pela violência. Q u er v io lên cia p io r q u e essa q u e está aí? V ocê sabe q u e o País cre sceu e c o ­ n o m ic a m e n te , m as de q u ê adianta? A ren d a p e r capita n ão diz n ad a. A ren d a p e r capita diz q u e e stá circu ­ la n d o d in h eiro , m as n ão d iz se v o cê está c o n se g u in d o v e n c er suas difi­ culd ad es, das fam ílias, a ed u cação , a saúde. E s tá u m a v e rg o n h a a saúde. E u sei p o rq u e tem a n o s q u e a c o m ­ p a n h a a g en te.

D e lla n o : E m ata r?

P H : E ra .

D e lla n o : E m a lg u m m o m e n to , o s e n h o r p e n s o u e m p a r t i c i p a r d e a lg u m m o v im e n to c o m o a g u e r ­ r ilh a d o A r a g u a ia

(A g u e r r ilh a do

A r a g u a ia ocorreu n o in íc io d a d é ­

c a d a d e 70, no S u l d o P a rá . F o i

u m m o v im e n to r u ra l a r m a d o co n

-

tr a o re g im e m ilita r , o r g a n iza d o e

d ir ig id o n a c la n d e s tin id a d e p e lo

P a r tid o C o m u n is ta do B r a s il)

o u

a g u e rr ilh a u rb a n a ?

P H : N ã o , p e n se i não , p o rq u e eu te ­ n h o u m a v isã o dc to ta lid a d e . E u acho q u e a tra n sfo rm a ç ã o d a so cie­ dade tem q u e ser c o n stru íd a em

to-P H : N ão. M as a pessoa não vai matar, vai se defender. N ão tem a autodefesa pessoal? T em a autodefesa coletiva.

S im plícia: O se n h o r a d m ira o C h c G u ev ara...

P H : A h, admiro!

S im plícia: E ele m a ta v a se m d ó n e m p ied ad e...

P H : N ã o é sem dó, sem piedade. Ele gostaria que o p e s s o a l se t r a n s f o r ­ m a s s e . O l h a o e x e m p lo da vida dele. D iz o evangelho q u e n ã o h á m a io r a m o r q u e d a r a v id a p e lo s irm ã o s. E le d e ix o u d e ser ministro,

c o

t

o . .tfO 'U' ro

—j ±->

■D tg

e §

a £

" 8 • § '<U

§ £

cr 2

. (D

o r

ro

i !ro -r=

cu

o _ £ jU C (U CLT3

Referências

Documentos relacionados

19.2 As Listas de Aprovados Diferenciadas (Cotas) serão compostas, exclusivamente, pelos candidatos aprovados ao mesmo curso/turno/campus que declararam ter cursado integralmente

Analisando-se os resultados obtidos, utilizando-se das tabelas e gráficos apresentados, nota-se que no inverno, em relação à troca de paredes externas e cobertura, o conjunto

Com o intuito de ampliar e consolidar o conhecimento adquirido, no decorrer do curso de Engenharia de Produção na modalidade de Ensino a Distância, bem como promover a

Especificamente, objetivou-se: (a) Identificar o nível de atividade física de idosas que frequentavam um grupo de convivência social e de atendimento para idosos, de uma cidade

1º - O Prefeito Municipal de Indaial - SC, por meio do FUNDO MUNICIPAL DE SAÚDE, no uso de suas atribuições legais, DIVULGA o resultado preliminar das provas escritas

O que já se pode ir percebendo é “o reflexo dessa noção de distanciamento social no modo como se olha para outros indicadores”.. “Os indicadores de distribuição espacial

(60h) 10ª Fase Noturno Engenharia de Produção Luzia de Miranda Meurer Psicologia Escolar e Educacional I (60h) 4ª Fase Noturno Psicologia Luzia de Miranda Meurer

Adentrar no campo de estudo a fim de compreender o fenômeno consubstanciado pelos sujeitos, através da observação participante, na concepção de Angrosino (2009, p. 17),