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SEM MEDIDA: UMA REFLEXÃO ACERCA DOS PADRÕES CORPORAIS NA DANÇA

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIA HUMANAS, LETRAS E ARTES

CURSO DE LICENCIATURA EM DANÇA

RANIELE ALMEIDA DA MOTA

SEM MEDIDA:

UMA REFLEXÃO ACERCA DOS PADRÕES CORPORAIS NA DANÇA

NATAL / RN 2021

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RANIELE ALMEIDA DA MOTA

SEM MEDIDA:

UMA REFLEXÃO ACERCA DOS PADRÕES CORPORAIS NA DANÇA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para obtenção da graduação em Dança (Licenciatura) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Maria de Lurdes Barros da Paixão.

NATAL/RN 2021

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RANIELE ALMEIDA DA MOTA

SEM MEDIDA:

UMA REFLEXÃO ACERCA DOS PADRÕES CORPORAIS NA DANÇA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para obtenção da graduação em Dança (Licenciatura) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Maria de Lurdes Barros da Paixão.

Aprovada em: ________/________/________.

Banca Examinadora:

_____________________________________________ Prof.ª Dr.ª Maria de Lurdes Barros da Paixão

Orientadora

_____________________________________________ Prof.ª Dr.ª Larissa Kelly de Oliveira Marques

_____________________________________________ Prof. Esp. Maximiliano Gomes de Lira

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais Rosana Cristina e Carlos Roberto por sempre me incentivarem e me apoiarem em tudo que fiz. Vocês são a minha fortaleza! Muito obrigada por acreditarem em mim quando nem eu mesmo acreditei. Sem vocês eu não teria chegado até aqui! Amo vocês!

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus por sempre me guiar, me proteger e por me dar forças para nunca desistir. Muito obrigada por ouvir todas as minhas preces e por me mostrar que eu nunca estou só.

A minha mãe Rosana, por sempre estar do meu lado e por ser essa mulher tão incrível. Muito obrigada por me ouvir, por enxugar minhas lágrimas e por me amparar sempre com toda a sua paciência e dedicação. Você é meu exemplo. Você é meu tudo!

Ao meu pai Roberto por sempre me ajudar no que for preciso e por sempre estar presente! Muito obrigada por ser meu protetor e por me defender todas as vezes que preciso. Saiba que sou muito grata a você por tudo!

Ao meu irmão Rudson e a minha cunhada Renata por sempre estarem presentes em minha vida, me ajudando e me incentivando em tudo!

A toda a minha família pelo apoio! Sou muito abençoada por ter cada um deles em minha vida!

As minhas amigas da dança que sempre me animaram e que sempre acreditaram em mim, mandando mensagens de apoio e de carinho. É maravilhoso poder dividir camarins e palcos com vocês.

A Fernanda, Raissa, Nathállia e Bia por ouvirem todas as minhas reclamações, por acreditarem sempre em mim e por nunca soltarem a minha mão. Muito obrigada pela irmandade de sempre e por serem tão incríveis!

A Aimee e Gabriella pelos vários puxões de orelha e por sempre me incentivarem a buscar o melhor! Vocês são demais!

Aos meus colegas do curso de licenciatura em Dança por todo o companheirismo.

Ao meu grupo tão amado Lucas, Sara, Thais, Ingrid (Bielly) e Luan. Muito obrigada por todos os momentos que passamos juntos. São tantas histórias pra contar que nem parece que foram quatro anos de curso. Sem vocês esse período teria sido extremamente difícil.

A todos os meus professores do curso de Licenciatura em Dança que tanto contribuíram para a minha formação com os seus ensinamentos.

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A todos os meus professores de dança que me mostraram o poder dessa arte e o quanto ela é maravilhosa e encantadora. Vocês foram fundamentais nessa trajetória!

Ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID – Dança). Gratidão por todos os aprendizados que tive não só com a professora coordenadora Larissa Kelly, mas também com as professoras supervisoras e meus colegas de profissão.

Ao Grupo de Dança da UFRN por todo o acolhimento e por terem me ajudado tanto com o meu crescimento artístico e profissional, me tirando da zona de conforto e me estimulando a sempre buscar o melhor.

A Professora Doutora Maria de Lurdes Barros da Paixão por me orientar e me incentivar constantemente a construir esse trabalho da melhor forma possível.

A João Vítor Silva pelas belíssimas fotos de “Sem Medida”.

A André Rosa, Juciê Borges, Lucas Oliveira e Moisés Ferreira por me ajudarem na construção da videodança. Vocês são excelentes em tudo o que fazem! Sou muito grata por ter tido a oportunidade de trabalhar com vocês.

A todas as pessoas que contribuíram diretamente e indiretamente para a conclusão dessa etapa.

Enfim... Foram quatro anos de muito aprendizado, muita paciência e muito esforço! Ninguém disse que seria fácil. E realmente não foi. Porém, chego no fim dessa caminhada com o coração repleto de gratidão.

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EPÍGRAFE

“O corpo ideal para dançar é o corpo que tem alguém livre dentro dele!” (Autor Desconhecido)

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RESUMO

Seja no esporte, na moda ou simplesmente no cotidiano, o padrão de beleza estético hegemônico sempre acompanhou a rotina das pessoas. Na dança a exigência desse padrão se evidencia e abrange diferentes estilos de dança. Sabe-se que nessa área de conhecimento a cobrança de ter um corpo magro e atlético é mais evidente. Este trabalho busca abordar os padrões corporais presentes no universo da dança, bem como os preconceitos imputados às pessoas que não se encaixam no padrão estético corporal e estético exigido pela dança. Este trabalho tem como objetivo discutir acerca das concepções do corpo ideal na dança c6enica contemporânea, apresentando os estereótipos que cercam a rotina dos bailarinos e refletindo sobre o processo de transformação e autoaceitação desses no âmbito da dança. Constituído de três capítulos, o presente trabalho apresenta dados históricos sobre os padrões estéticos corporais exigidos na sociedade e seu reflexo nas artes corporais, sobretudo na dança cênica contemporânea. O trabalho também apresenta reflexões sobre o processo criativo intitulado “Sem Medidas.” Nessa perspectiva, o trabalho coreográfico em videodança faz parte das reflexões e estudos de caráter teórico prático deste trabalho.

PALAVRAS-CHAVES: Padrões corporais; Preconceito; Processo Criativo; Videodança.

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ABSTRACT

Be it in sports, fashion or simply in everyday life, the hegemonic aesthetic beauty standard has always accompanied people's routine. In dance the demand for this standard is evident and includes different styles of dance. It is known that in this area of knowledge the demand of having a thin and athletic body is more evident. This paper seeks to approach the body standards present in the universe of dance as well as the prejudices imposed on people who do not fit into the body and aesthetic standard demanded by dance. The aim of this work is to discuss the conceptions of the ideal body in contemporary scenic dance, presenting the stereotypes that surround the routine of dancers and reflecting on the process of transformation and self-acceptance of these dancers in the context of dance. The present work is composed of three chapters and presents historical data on the body aesthetic patterns demanded by society and their reflection in the body arts, especially in contemporary scenic dance. The work also presents reflections on the creative process entitled "Without Measures." From this perspective, the choreographic work in videodance is part of the reflections and studies of a theoretical-practical nature of this work.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Imagem 1: Ensaio de “Sem Medida”...25

Imagem 2: Cena do Desfile...27

Imagem 3: Retirada da roupa...28

Imagem 4: Exposição do corpo para o público...29

Imagem 5: Parte da composição com a fita métrica...31

Imagem 6: Espaço A3... 34

Imagem 7: Mapa de luz de “Sem Medida”...34

Imagem 8: Ajuste de câmera e iluminação...35

Imagem 9: Gravação no plano geral...36

Imagem 10: Gravação no plano médio...36

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 13

CAPÍTULO 1: O CORPO GORDO NA SOCIEDADE E NA DANÇA ... 16

CAPÍTULO 2: PROCESSO CRIATIVO: “SEM MEDIDA” ... 22

2.1. Etapas da composição ... 26 CAPÍTULO 3: A VIDEODANÇA ... 32 3.1. Construção da Videodança ... 32 3.2. Filmagem da Videodança ... 35 3.3. O Resultado ... 37 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 39 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 42

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13 INTRODUÇÃO

Seja no esporte, na moda ou simplesmente no cotidiano, o padrão de beleza estético corporal hegemônico é determinante para a aceitação dos indivíduos na sociedade. Para as mulheres, a cobrança social e cultural acerca do seu corpo e beleza sempre foi maior se comparado ao exigido aos homens em todos os tempos.

Na contemporaneidade, o nível de exigência quanto ao padrão corporal e beleza ideal dos corpos femininos se traduz nas palavras de ordem: magras, saradas e com baixo índice de gordura e volume na circunferência abdominal, no quadril e na cintura. Deste modo, são essas palavras de ordem que habitam as mentes e corações das mulheres na sociedade contemporânea, ou seja, ser bela é ser magra, aceita e incluída em diferentes grupos sociais e culturais.

Na dança a exigência desse padrão é ainda mais complexa. Sabe-se que nesse campo de conhecimento a cobrança de ter um corpo magro e atlético é mais evidente. Assim, este trabalho busca abordar os padrões corporais presentes nesse universo, bem como os preconceitos imputados às pessoas que não se encaixam nessas características estéticas-corporais.

Trata-se de um Trabalho de Conclusão de Curso que visa discutir o corpo feminino que está fora dos padrões estéticos corporais exigidos pela dança. Nessa direção, o presente trabalho analisa e propõe refletir criticamente sobre os preconceitos em relação aos corpos de mulheres gordas na dança. A abordagem proposta parte da perspectiva de análise e visão social dos corpos ditos fora do padrão de beleza estético, considerado hegemônico na sociedade brasileira, isto é, o corpo magro visto como ideal de beleza aceito socialmente em diferentes camadas sociais e culturais.

A escolha desse tema surge do propósito de argumentar o porquê da exigência desse padrão, e desse conceito de beleza na dança, tendo em vista que a autora deste trabalho vivencia todas essas cobranças por não possuir o corpo magro exigido nas diferentes estéticas e práticas de dança, bem como a constatação acerca da insatisfação das pessoas, em sua maioria as mulheres com o seu próprio corpo no ambiente social e, consequentemente nas diferentes práticas corporais, incluindo a dança.

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14 Diante o exposto, o presente trabalho tem como objetivo discutir acerca das concepções do corpo ideal para a dança, destacando os estereótipos que cercam a rotina dos bailarinos e refletindo sobre o processo de desconstrução e autoaceitação desses no âmbito da dança cênica.

Acredita-se que os padrões de beleza estão presentes na vida do ser humano desde a antiguidade e permanecem até os tempos atuais. A cada século, esses padrões sofrem mudanças e se adequam a diferentes culturas e costumes, deste modo, o conceito de beleza está em constante mutação e se adequa ao contexto sócio-histórico e cultural do indivíduo. Na dança essas questões têm a mesma valoração, pois o senso comum, aliás a sociedade em geral, associa magreza com competência profissional. Assim, na dança uma professora ou uma bailarina que não é magra, muitas vezes é vista como incapaz de exercer sua profissão.

Russo (2006) afirma que apesar das exigências do padrão magro da sociedade serem depositadas em ambos os sexos, são as mulheres que recebem mais cobrança e que essa busca incessante de estar no padrão considerado ideal, na maioria das vezes ocasiona um impacto negativo àquelas que não alcançam o tão sonhado “corpo perfeito”, ocasionando baixa autoestima, depressão e sofrimento. Nessa perspectiva, o corpo feminino adquire o caráter de objeto de consumo, e nesta direção, as indústrias especializadas em produtos para emagrecimento corporal dirigido ao público feminino se multiplicam e proliferam mundo afora.

A sociedade contemporânea ainda acredita que somente o corpo magro é sinônimo de beleza, saúde e sucesso, e o corpo gordo é o da feiura, doença e insucesso. A cobrança para ser magra e ter curvas perfeitas acompanham a rotina da mulher desde o seu nascimento e isso é cada vez mais reforçado pela sociedade e pela mídia contemporânea.

Associada ao padrão do corpo magro, são veiculadas as mensagens de sucesso, controle, aceitação, conquistas de amor e estabilidade psicológica. Assim, a mulher acredita que, com a magreza, alcançará todas essas qualidades positivas, sendo a prática de dietas vendida como solução para todas as dificuldades (SOUTO, FERRO-BUCHER, 2006, p. 695).

Segundo Suenaga et al (2012), esse culto ao corpo se tornou objeto de consumo e um componente de mercado, integrando e encarregando diversas indústrias a criar desejos, reforçar imagens e a padronizar ideais de beleza. A mídia reforça esse ideal de um corpo perfeito. É comum vermos campanhas publicitárias reforçando a necessidade de se ter uma aparência jovem e um corpo magro e atlético.

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15 A ideia vigente é de que a mulher só será aceita pela sociedade se estiver no ideal de beleza, ou que, só será bem-sucedida se estiver dentro do padrão de beleza hegemônico estabelecido pela sociedade.

De acordo com Souto e Ferro-Bucher (2006), esse padrão estabelecido não se atenta aos diferentes tipos de corpos e estimula as mulheres a buscarem o emagrecimento de forma inapropriada, através de dietas rigorosas e sem prescrição médica, da ingestão de remédios para emagrecimento e de comportamentos insalubres como a indução do vômito.

Apesar da discussão na sociedade acerca dos padrões estéticos corporais e de beleza hegemônicos serem amplamente difundidos, quando essa discussão se dá no campo da dança, ainda é incipiente os estudos e pesquisas relacionadas a este tema. Talvez na dança, essa discussão ainda seja incipiente devido a ausência de uma efetiva reflexão e análise crítica por partes dos profissionais da dança acerca dos malefícios que a exclusão de pessoas da dança, sejam elas crianças ou adultos fora do padrão estético ideal pode ocasionar. Esses comportamentos excludentes não contribuem para fortalecer esta área de conhecimento.

Assim, acredita-se que os preconceitos e as exclusões na dança podem contribuir muito mais para diminuir a atuação, contratação e ampliação dos profissionais da dança nas escolas e fora delas. Em se tratando da dança nas escolas e em especial nas públicas, cujo público alvo é diverso, por sua vez necessita muito mais de políticas e práticas artísticas inclusivas do que excludentes.

Alijar os corpos gordos das práticas de dança na escola e fora dela é, sobretudo, um ato de negação do valor sociocultural e educativo da dança. Nessa perspectiva, este trabalho se torna relevante, pois pode contribuir com os estudos em dança e com os profissionais que se dedicam à análise e reflexão deste tema na dança, seja no âmbito da educação formal ou informal.

O presente trabalho é constituído de três capítulos a saber: capítulo 1 discorre acerca do corpo gordo na sociedade e na dança. No capítulo 2 far-se-á a descrição do processo criativo “Sem Medida” e as etapas da composição. Por fim, no capítulo 3, será descrito todo o processo criativo realizado em videodança.

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16 CAPÍTULO 1: O CORPO GORDO NA SOCIEDADE E NA DANÇA

Em cada período da história da humanidade existiu um padrão de beleza considerado ideal e essa preocupação de se manter nele sempre esteve presente. Segundo Farhat (2008), na Grécia Antiga os corpos tinham características atléticas devido às competições e ao condicionamento físico. Para os gregos ambos eram considerados importantes. Nesse período, o corpo era admirado, exaltado, sinônimo de beleza e virilidade.

O autor acima citado, também nos diz que na Idade Média o corpo era reprimido pelo cristianismo. Qualquer tipo de cuidado e exposição era proibido. Nesse período da história, não ser magro era sinônimo de beleza. Ter o corpo volumoso nessa época representava saúde. Já no período renascentista, o corpo volta a ser valorizado e revelado, e os estudos relacionados a ele ganham importância. Para a mulher, ser bela se tornou uma obrigação.

De acordo com Freitas et all (2010), antes do século XIX, o padrão de beleza retratado por pinturas da época era de corpos volumosos e rotundos. Estar fora do peso era uma característica dos nobres e estava associado ao poder político e financeiro. Somente nas primeiras décadas do século XIX novas perspectivas estéticas foram adotadas, assim, a magreza adquire sinônimo de beleza. A partir do século XX, esses ideais são intensificados. O corpo magro se torna preferência e sinônimo de autodisciplina e virtuosidade, enquanto o corpo gordo se torna algo a ser evitado e indesejado.

Segundo Suenaga et al. (2012), em cada década do século XX o padrão estético mudou. Nos anos 60, os homens deveriam ser musculosos e obter posição de poder. Já as mulheres deveriam ter corpos magros e cultuados por meio de dietas e exercícios físicos, assim como deviam usar maquiagem, pintar os cabelos, ter as unhas feitas e os pelos do corpo depilados. Nos anos 80, o padrão corporal atlético e forte permanece. Nos anos 90, o ideal de beleza feminino são os corpos das modelos magérrimas que desfilam nas passarelas de moda. De acordo com Marques (1998), nestas últimas décadas “o corpo passou a ser um objeto de exibição e consumo, um campo de batalha contra a doença, a idade e a gordura. Mais do que nunca, a identidade pessoal está vinculada ao corpo” (MARQUES ,1998, p.76).

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17 Conforme Serpa (2016), em alguns países da África só as mulheres grandes, isto significa dizer, gordas eram cobiçadas e aptas a se casarem. Todavia, esse padrão foi sofrendo alterações com o passar dos anos e junto a ele novas visões da estética que deve ser seguida. Atualmente, o fascínio pela estética do corpo magro vem crescendo cada vez mais, fazendo com que haja mais investimento pessoal, financeiro e emocional para se chegar ao padrão estético corporal desejado. Somado a isso, a massiva divulgação dos corpos ideais veiculados pelas mídias e redes sociais.

Para Nogueira (2019), a reprodução através da sociedade de que o padrão de beleza ideal é o corpo magro, gera exclusão àqueles que não estão dentro dessas exigências e o preconceito da gordofobia1. Esse preconceito transforma o corpo gordo como incapaz e essa ideia de incapacidade intensifica o desejo por emagrecer das pessoas fora do padrão considerado ideal, além de provocar a ideia de que as mesmas só serão aceitas socialmente, afetivamente e profissionalmente se estiverem com seus corpos magros.

É válido ressaltar que a perspectiva do que é considerado o corpo ideal vem mudando junto com o passar dos anos e acompanhando os períodos históricos. Segundo Alves (2016), a dança também seguiu os padrões desses períodos, acompanhando o contexto histórico e social da época. A autora também nos diz que:

Na medida em que o corpo, na perspectiva ocidental, foi e ainda é consideravelmente sinônimo de rendimento, de performance, de protótipo da beleza grega, a dança também é influenciada por essas características. Surgem então a valorização de corpos extremamente padronizados de bailarinos clássicos, magros, esguios e com musculatura bem delineada. Quem fugir desse padrão automaticamente estará excluído da “elite” da dança, isto é, aquela que vai aos palcos, sobretudo em seu formato italiano, é realizada por bailarinos (as) com qualidades técnicas extraordinárias e que, portanto, fazem parte de um elenco seleto (ALVES, 2013, p. 13).

Sabe-se que a dança possui diversas exigências para os seus praticantes. O bailarino precisa ter uma boa técnica, disciplina, organização, comprometimento e dedicação. Mas não para por aí. Além das condições que foram mencionadas, os mesmos se deparam com as cobranças estéticas ligadas ao seu corpo.

1 Gordofobia: “A gordofobia é utilizada para denominar o preconceito, estigmatização e aversão englobados por meio de uma opressão estrutural que atinge as pessoas gordas na sociedade.” (RANGEL, 2018, p. 1).

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18 Esta visão alinha-se à concepção de corpo como instrumento da dança, como meio, "máquina" para a produção artística. O corpo nesta concepção é algo a ser controlado, dominado e aperfeiçoado segundo padrões técnicos que exigem do dançarino uma adaptação e submissão corporal, emocional e mental àquilo que está sendo requerido dele externamente. (MARQUES, 1998, p. 72).

Os padrões corporais estéticos e de beleza feminino sofreram mudanças substanciais ao longo da história da humanidade. Assim, o padrão corporal ideal das bailarinas, também sofreu mudanças ao longo da própria história da dança. Conforme matéria da Revista Vogue em sua versão digital, escrita pela especialista de beleza Wagoner (2015), a mudança dos corpos das bailarinas foi notória. Grandes nomes como Marie Taglioni2, apresentam características corporais diferentes das bailarinas clássicas atuais. Nota-se através das fotos publicadas que o corpo das bailarinas no passado apresenta características mais curvilíneas e ganham formas mais longilíneas e esbeltas com o passar das décadas.

Apesar dos padrões variarem de acordo com a época, o padrão sobre o corpo do bailarino é quase sempre o mesmo. De acordo com Mota (2015), para muitos profissionais da área, esse padrão é completamente difundido e é dito como ideal para você ser um bom profissional de dança. Esse pensamento não é algo que é imposto somente por professores e bailarinos. Os não bailarinos e não profissionais do campo da dança também acreditam que somente uma bailarina com características estéticas exigidas pelo ballet e pelo ideal de beleza imposto à sociedade, ou seja, um corpo feminino magro e longilíneo, é capaz de dançar.

Se por um lado existe hoje a possibilidade de um trabalho mais consciente com nosso corpo físico na dança, por outro, gerações de dançarinos da década de 90 voltam a martirizar-se nas barras, nos ginásios esportivos, nas salas de musculação, em busca de habilidades corporais, de virtuosismo, de "corpos ideais" (MARQUES, 1998, p. 76-77).

Esse ideal de corpo não é um pensamento que surgiu nos tempos atuais, segundo o estudo de Santos (2009), essa relação de elegância representada pelo corpo esbelto surgiu no século XIX, quando a imagem da bailarina com o corpo magro e esguio foi estabelecido pela estética do ballet romântico, onde predominava a figura

2 Marie Taglioni: “Nascida em Estocolmo em 1804, Marie Taglioni foi a primeira dançarina romântica. Foi aluna de Coulon, especialista no trabalho sobre pontas e de seu pai, Filippo Taglioni, que a acompanhou durante toda a sua carreira” (BOURCIER, 2001, p. 208).

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19 delicada, a graciosidade e a beleza, juntamente com as sapatilhas de ponta e a saia em tule. Esses aspectos marcaram a época definindo esse padrão corporal como o ideal de beleza, permanecendo até os dias de hoje como ideia dominante à cultura da dança.

Percebe-se que a relação de cada um com seu corpo apoia-se, assim, sobre duas bases de comparação imagética: uma oferecida pelos espelhos, outra difundida em outdoors, televisores, revistas, catálogos. E, a bailarina, em seu espaço de trabalho é cercada de espelhos. Ao sair deste espaço, ainda se depara com a mídia e suas artimanhas para fazer com que, a qualquer preço se obtenham um corpo perfeito (AGOSTINI, 2010, apud MOTA, 2015, p. 24-25).

De acordo com as ideias de Alves (2011), para dançar não é preciso ser magro e muito menos atender a todas as exigências da estética corporal contemporânea na dança. Ainda que ao corpo gordo seja negado o acesso e a participação em companhias profissionais e em trabalhos coreográficos semiprofissionais, acredita-se que ter um corpo alongado e longilíneo não garante que o intérprete possui um bom nível técnico e habilidade para dançar. Além disso, também ao corpo gordo não se pode atribuir inabilidade ou ausência de nível técnico compatível para dançar.

Para Simas e Guimarães (2012), por mais que não existam dados na literatura que comprovem que para dançar é preciso ser magro, estar dentro desse padrão é o desejo de muitos praticantes e amantes da dança.

Diante do exposto, é necessário fazer questionamentos a saber: para dançar é preciso estar magro e atender todas essas exigências estéticas da dança, ou seja, ter um corpo na perspectiva estética da dança clássica? As ideias de Serpa (2016) vão ao encontro da perspectiva do presente trabalho, isto é, todo corpo com o trabalho físico adequado ideal, independente do seu biótipo é capaz de dançar.

É válido ressaltar, que a virtuosidade e as exigências cobradas pelas companhias profissionais de dança e pela sociedade, estão mais presentes na dança clássica. Quando nos deparamos com outros estilos de dança, talvez esses padrões sejam menos exigidos. Na atualidade, é mais comum e cada vez mais frequente a presença da pluralidade e da diversidade de corpos na dança contemporânea, de característica estética pós-moderna. Ainda é possível constatar, que há uma significativa heterogeneidade de corpos nas intituladas danças populares contemporâneas.

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20 Para além de uma nova técnica de dança, a dança contemporânea se traduz numa nova postura diante da própria vida e da própria dança, buscando explorar o diálogo, a diversidade e até mesmo a individualidade de cada técnica e estética surgida nos vários contextos da humanidade. Nesse sentido, não cabe enquadrá-la em padrões de movimentos, mas exercita-la em seus princípios éticos e estéticos, sensibilizando-a e nos sensibilizando para a dança de cada povo, de cada época, de cada corpo individual e coletivo, de cada ser que dança, seja branco, negro, índio, deficiente, feminino, masculino, jovem, idoso, gordo, magro, rico, pobre. Que a dança possa ser ousada, criativa, múltipla, técnica, educativa, provocadora, bela, integradora, a dança de vários corpos, de várias culturas, de várias formas, de várias possibilidades existenciais (ALVES, 2011, p. 14).

Não obstante, ao observar algumas companhias profissionais de dança contemporânea é notória a pouca ou nenhuma inclusão de corpos gordos e fora do padrão estético do bailarino clássico citado anteriormente. Ainda que as exigências estéticas da dança contemporânea sejam mais democráticas comparativamente à dança clássica, é necessário desenvolver estudos e práticas inclusivas para que o corpo gordo seja inserido no mundo da dança. Embora haja iniciativas realizadas por bailarinos, coreógrafos e criadores da dança à inclusão do corpo gordo em suas práticas, ainda é incipiente a presença de dançarinos gordos nas companhias de dança. Acredita-se que ainda hoje, prevalece a ideia calcada e advinda da tradição clássica, isto é, para dançar é preciso ter um corpo magro.

Há bailarinos que estão se destacando e adquirindo visibilidade no mundo da dança, com os seus corpos fora do padrão estético visto como ideal. A título de exemplo, vale citar a bailarina contemporânea criadora do trabalho intitulado “Peso Bruto”, a artista Jussara Belchior; e a bailarina clássica Júlia Del Bianco, criadora da primeira escola itinerante de Dança Plus Size.

O termo Plus Size significa extra grande e foi criado pelos americanos. Segundo Cândido e Almeida (2014), foi usado pela primeira vez para classificar as roupas que não estavam dentro dos tamanhos convencionais comercializados pelas lojas, ou seja, os tamanhos: pequeno, médio e grande. Porém, esse termo foi ganhando mais força e reconhecimento através do movimento denominado Plus Size. De acordo com Nechar (2018), o movimento Plus Size é formado por pessoas fora do padrão corporal hegemônico, assim, esse movimento é representativo das pessoas gordas que buscam a aceitação e a inclusão de seus corpos na sociedade. Nesse movimento também é debatido o preconceito aos corpos gordos e a pressão estética imposta a eles através dos meios de comunicação.

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21 A dança Plus Size se insere nesse movimento também como meio para desmistificar preconceitos relacionados ao corpo gordo na dança. Duarte (2019), afirma que a Dança Plus Size tem como objetivo principal mostrar que a dança é para todos, independente do seu padrão corporal, promovendo através da sua prática inúmeros benefícios, como a melhora da consciência corporal, da expressividade, do autoconhecimento e o empoderamento das pessoas gordas.

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22 CAPÍTULO 2: PROCESSO CRIATIVO: “SEM MEDIDA”

“Sem Medida” é uma criação de dança que teve início no componente curricular Laboratório de Composição Coreográfica I, ministrado pela docente e orientadora do presente trabalho, no curso de licenciatura em Dança da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

O desejo de contrapor às questões relacionadas ao padrão estético magro na dança sempre se mostrou presente nas composições coreográficas criadas durante a trajetória acadêmica e profissional. Nessa perspectiva, através das memórias e lembranças desde a iniciação como bailarina clássica, foi percebido que os corpos das meninas não magras, ou seja, consideradas gordas para a prática do ballet clássico, foi e ainda é motivo de questionamento e inquietação para a autora deste trabalho. Neste viés, nasce o desejo de escrever e relatar as experiências vivenciadas na condição de bailarina, cujo corpo é considerado fora do padrão estético exigido pela dança clássica.

Neste sentido, a criação “Sem Medida” propõe problematizar o impacto que esses padrões corporais instituídos na sociedade contemporânea, ou seja, o corpo magro, causam na vida de quem sofre o preconceito de ter um corpo considerado fora do padrão corporal estético ideal imposto pela sociedade. Este processo criativo propõe estabelecer relações e possíveis analogias entre os concursos de miss e a dança.

Constata-se que tanto os concursos de miss quanto os corpos que dançam estão sujeitos às exigências inerentes aos padrões estéticos corporais preconizados por ambos. Assim, características físicas de altura, de peso, de medidas e fenótipo podem ser determinantes para incluir ou excluir os corpos nos concursos de beleza ou nas companhias de dança.

O termo estética pode ser utilizado em diferentes sentidos, nomeadamente. Num sentido mais amplo refere-se a tudo que embeleza a existência do homem. Na filosofia, a estética designa uma dimensão da experiência e da ação humana que permite caracterizar algo como belo, agradável, sublime, grandioso, alegre, gracioso, poético ou então como feio, desagradável, inferior, desgracioso, trágico. Num contexto psicológico, refere-se às experiências e comportamentos emocionais que as coisas belas provocam na pessoa (WEITZ, 1956, apud FLORIANI, MARCANTE e BRAGGIO, 2010, p. 6).

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23 Assim, “Sem Medida” é uma proposta de dramaturgia em dança contemporânea com o objetivo de provocar o público para as questões afeitas ao corpo feminino ideal exigido tanto no padrão corporal técnico e estético exigido pela dança clássica, quanto nos concursos de beleza em nível nacional e internacional (miss brasil e miss universo) no passado e no presente.

[...] a dramaturgia da dança se relaciona, em primeira instância, à habilidade de agenciar as condições atuais, sempre circunstanciais, do corpo; bem como, os desdobramentos de suas ações por meio do redimensionamento de suas propriedades. Trata-se, portanto, do modo como se dá existência formal às discussões pretendidas. Cabe lembrar que a incompletude faz parte da natureza de toda e qualquer linguagem, assim, existem questões que encontram ambientes favoráveis em uma linguagem e não em outras, dadas as suas limitações simbólicas (HERCOLES, 2011, p. 4).

De acordo com Ferraz (2011), o Miss Brasil foi o concurso de beleza mais importante do país. De seu início glamouroso nos anos 50 até a perda da fama e do glamour nos meados de 1972, os concursos de Miss Brasil do presente, se comparados aos do passado, não conseguem mobilizar o país e obter audiência significativa.

Os objetivos dos concursos de Miss Brasil não se modificaram com o passar dos anos, ou seja, um dos objetivos centrais nesse concurso é eleger a mulher mais bela do Brasil. A eleita posteriormente concorre ao título de Miss Universo.

Segundo Reis e Bastos (2012), em confronto com o conservadorismo após a Segunda Guerra Mundial, o corpo feminino passou a ser mais exposto pela imprensa e por meio dos concursos de beleza. Sobre esses eventos, os autores afirmam que os concursos de Miss Brasil exprimem a cultura da aparência feminina no país desde 1954, de modo que as participantes exibiam seus corpos por meio de desfiles sem que seus valores fossem colocados à prova. A ganhadora se tornava famosa, símbolo de beleza e exemplo a ser seguido através dos seus valores sociais importantes para a época. Vale a pena destacá-los: virgindade, recato, simpatia e juventude.

As candidatas desses concursos devem corresponder ao padrão estético exigido pela sociedade e cultura da época. Deste modo, as misses veiculam na passarela o padrão de beleza estético considerado ideal, isto é, uma mulher jovem, bela, magra, alta e branca. As misses que não estão dentro desse padrão físico são reprovadas. A título de exemplo, no concurso de Miss Universo do ano de 2017, a Miss Canadá Siera Bearchell foi duramente criticada por não corresponder ao padrão

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24 de beleza exigido para as misses, isso significa dizer que Sierra não era magra o suficiente para ser eleita como a mais bela do mundo.

Nessa perspectiva, trazer para a cena de dança o corpo volumoso e não magro, a partir da experiência vivenciada como bailarina, intérprete e criadora adquire uma postura para além das questões estéticas relacionadas ao corpo feminino. “Sem Medida” é uma criação de dança contemporânea que transgride a normatividade imposta ao corpo feminino tanto na dança, quanto nos concursos de misses.

Em todo o processo de criação, há sempre dúvida de como tratar as questões sociais, políticas e ideológicas que atravessam a prática artística, em particular a dança em seus aspectos coreográficos e dramatúrgicos. Nessa perspectiva, o processo de criação em “Sem Medida” se deu por meio da improvisação que teve início durante as aulas do componente curricular Laboratório de Composição Coreográfica I, já citado anteriormente no presente trabalho.

Segundo Guerrero (2008), a improvisação é um modo de criação em dança e a diferença entre ele e outros modos está na imprevisibilidade. Em outras formas de composição coreográfica, as partes constituintes são selecionadas e organizadas, indicando a ordem a seguir e como serão executados na cena. Já na improvisação, não há a necessidade de definir suas etapas, tendo em vista que as suas escolhas são realizadas durante a cena.

Na improvisação há seleção de movimentos, de relações com outros corpos, com contexto presente, com outras linguagens, entre outras, sua distinção está em realizar tais seleções compositivas durante sua ocorrência. Sendo assim, não conta com seleções previamente estabelecidas acerca do desenvolvimento da obra, não há necessariamente uma ordenação de ocorrências, pois a configuração é proposta em tempo real. Pode-se notar que há sim certos acordos sobre suas possibilidades de realização, sejam eles relativos aos treinamentos compartilhados ou à combinação de certas “normas” de conduta para improvisar ou aos padrões de ações cotidianos de cada improvisador, por exemplo, entretanto, não há uma composição pré-organizada, com começo, meio e fim, cenas, tempos de ocorrência, etc. (GUERRERO, 2008, p. 14).

Na primeira etapa do processo criativo, as movimentações iniciais da intérprete denotam desconfortos relativos a cada parte do corpo que é tocada. Assim os toques se iniciam de forma mais leve na região do busto, abdômen e pernas e gradativamente se tornam mais agressivos e mais fortes em todas as partes do corpo da intérprete. Esses toques são percebidos pela intérprete como gestos incômodos que se traduzem em sensações de agonia e insatisfação da dançarina com o seu corpo fora dos

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25 padrões. Corpo este que sofre preconceitos e cobranças no âmbito da dança. Os movimentos de torções, contrações e expansões foram realizados nesta cena, sem música, sem figurino definido e sem elementos cênicos.

Imagem 1: Ensaio de “Sem Medida”

Fonte: Acervo da pesquisadora, 2018.

No decorrer do processo criativo também foi investigado os materiais que seriam utilizados para dar ênfase na dramaturgia corpo-cênica. Assim, foi utilizado uma fita métrica como objeto cênico e como elemento compositivo ao figurino. Deste modo, inicialmente a fita métrica foi utilizada amarrada na cintura, embaixo da roupa. Posteriormente, ela foi trazida exposta como material cênico, tendo em vista que a fita métrica é um signo referente que leva diretamente ao espectador a pensar sobre medidas corporais.

Nessa perspectiva, houve mudança relativa ao tamanho da fita, isto significa dizer, que a fita anterior foi substituída por uma fita de aproximadamente cinco metros de comprimento. A experimentação com a fita de cinco metros de comprimento não alcançou o objetivo esperado pela intérprete, tendo em vista que a mesma dificultou os movimentos e a criação destes pela intérprete.

Neste sentido, em nenhuma dessas experimentações o resultado esperado foi alcançado por duas ordens de fatores que se faz necessário pontuar: O primeiro fator diz respeito à cena apresentada, esta não causou o impacto dramatúrgico esperado, ou seja, a composição da ação ficou aquém de sua produção de sentido. E o segundo

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26 se refere a dificuldade da intérprete em manipular e criar movimentos com a fita extensa. Após a análise acerca dos problemas vivenciados pela intérprete com a fita de cinco metros, a docente e orientadora do presente trabalho sugeriu à intérprete que utilizasse várias fitas métricas de tamanho reduzido e em separado na composição coreográfica.

Relativo ao figurino, houve a necessidade de acrescentar elementos, tendo em vista que inicialmente a intérprete utilizava uma calça e uma camisa preta e os seus pés estavam descalços. Nesse viés, foram acrescentados ao figurino: collant preto, saia preta, sapato de salto alto preto e uma faixa branca com o nome “Brazil”. Esses elementos foram escolhidos visando apresentar as características inerentes à realidade dos desfiles dos concursos de beleza.

Deste modo, o figurino é visto na criação artística em dança como um importante elemento da dramaturgia coreográfica, isto significa dizer, que a dramaturgia em dança é constituída de diferentes elementos – ações que uma vez reunidos dão significado e produzem relações de sentido e de presença na criação coreográfica.

[...] a dramaturgia da dança também se relaciona à razão das escolhas, ou seja, o porquê da seleção de certas propriedades materiais para compor as ações que, por sua vez, são constitutivas e fundantes das características e especificidades da linguagem investigada. Trata-se, portanto, de um exercício crítico constante que promova o reconhecimento das relações entre forma e sentido que a ação carrega, ou pode carregar (HERCOLES, 2011, p. 5).

A cada experimentação, críticas construtivas e estímulos eram dados de forma que facilitaram a construção do trabalho, permitindo adaptações e modificações. “Sem Medida” é um trabalho que esteve constantemente em construção. A cada apresentação do trabalho novas pesquisas e possibilidades de recriação dos movimentos e de materiais foram inseridos no trabalho, visando qualificar o trabalho de composição coreográfica.

2.1. Etapas da composição

A cena inicial faz referência e se inspira no desfile de concurso de Miss Brasil, deste modo se faz alusão a Miss Brasil Martha Rocha, eleita 2º lugar no Miss Universo no ano de 1954, perdendo o título mundial devido às suas duas polegadas a mais nos

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27 quadris. Esse fato gerou a música “Duas Polegadas” dos compositores Pedro Caetano, Alcyr Pires Vermelho e Carlos Renato. Essa música é utilizada em “Sem Medida”.

Por duas polegadas a mais, passaram a baiana pra trás Por duas polegadas, e logo nos quadris Tem dó, tem dó, seu juiz!

(Pedro Caetano, Alcyr Pires Vermelho e Carlos Renato. 1955. “Duas Polegadas”)

Nessa perspectiva, o figurino da intérprete é composto: de saia e collant na cor preta, sapatos de salto preto, faixa branca com o nome “Brazil”. Os cabelos estão presos em formato de coque, utiliza brincos de prata, maquiagem na cor nude e nos lábios batom vermelho. Na frente do palco ao chão se encontram três fitas métricas, medindo um metro de comprimento cada uma.

Imagem 2: Cena do desfile.

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28 Nesta cena, a intérprete caminha em várias direções, com firmeza e segurança, sempre com um sorriso no rosto, parodiando a gestualidade das misses, porém essa confiança deixa de existir à medida que se encerra a música e o desfile.

Ao parar de desfilar, a intérprete dirige o olhar ao público e as suas feições começam a se modificar, seu sorriso aos poucos se desfaz. Assim, ocorre uma mudança lenta e gradual do semblante da intérprete que passa a produzir tremores na face, deste modo, o seu rosto assume expressão de sofrimento.

A cena seguinte revela por meio da gestualidade expressiva da intérprete a insatisfação e a necessidade incessante de seu corpo se encaixar no padrão de beleza veiculado pelas mídias. Nesse momento ocorre a retirada dos sapatos, da saia e do collant da intérprete, visando desvelar tudo que está encoberto para si mesma e para o público.

Imagem 3: Retirada da roupa.

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29 Imagem 4: Exposição do corpo para o público.

Fonte: João Vítor Silva, 2020.

Durante o momento da retirada das vestes da intérprete, a música da rapper Sara Donato, intitulada “Peso na Mente” inicia-se. Essa música foi escolhida por veicular em sua letra diferentes aspectos do corpo fora do padrão estético aceito pela sociedade, ou seja, a música tematiza o preconceito e o sofrimento imputado aos indivíduos gordos. Corpos de seres humanos que sofrem as consequências do padrão corporal imposto pela sociedade e amplamente divulgado, publicizado e normatizado nos meios de comunicação.

Peso da mente, pesou na mente, peso da mente ou pesou na mente? Seu preconceito pesa na sua mente. Meu peso não é problema, então vai segurando, É minha mentalidade que acaba incomodando. Tenta me humilhar falando de autoestima pra alimentar seu ego e querer sair por cima. Nem tente disfarçar é visível seu preconceito, mas se o corpo é meu, no mínimo tenha respeito Minha meta não é ser aceita não preciso me camuflar quem foi que disse que pra ser linda não pode engordar? E é de se imaginar a mídia manipula constantemente Na tv antes de ter caráter você tem que ser atraente. Importante é o número do manequim e não o seu talento, no teste do sofá mais uma aprovada ficou sabendo. No país do carnaval, corpos são como mercadoria, pega o cardápio, fica à vontade, vai se sirva.

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30 Prato do dia: loira, magra, pic padrão global, sem gordura, mas não saudável porque nem tudo é natural. (...) Ei pelo amor, pelo amor, Tire seus padrões do meu corpo! Não aceito leis sobre o que devo ou não vestir, São Paulo Fashion Week ou C&A não vão me atrair nem me iludir com a nova sensação do verão, não, não vou gastar o que eu não tenho pra me encaixar no padrão. Sou fora dos padrões e do meu corpo eu que tomo as decisões. (Sara Donato, 2014. “Peso na Mente”) A última cena apresenta a intérprete vestida com um top e um short na cor bege. A movimentação possui características de peso leve, cujo movimento realizado pela intérprete com as suas mãos é o massagear da região do abdômen. Essa ação se torna mais forte e agressiva, pois os movimentos das mãos da intérprete se transformam em movimentos agressivos que se traduzem em apertos, beliscões e tapas, não somente na região do abdômen, mas também em outras partes do corpo a saber: braços, busto, pernas e glúteos da intérprete.

As fitas métricas colocadas no chão do palco também começam a ser manipuladas. A intérprete amarra cada uma delas em seu corpo. A primeira fita é amarrada na região da cintura, esta é puxada com força de forma que fique cada vez mais apertada. Essa movimentação gera a contração da parte superior do corpo, posteriormente, a fita é deixada no chão após esta movimentação.

A segunda fita é amarrada na região do busto. Assim como na primeira fita, a mesma é amarrada bem firme ao corpo, como consequência observa-se a expansão da parte do tronco em sua totalidade, bem como as torções nesta região do corpo.

Após soltar a fita da região do busto, a terceira e última fita é amarrada na região das pernas. Nesse momento, as movimentações se concentram nos membros inferiores, com flexões e extensões dos joelhos e pés. Nessa cena há também a mudança de níveis espaciais. Assim, os movimentos que inicialmente realizavam-se no nível espacial alto, também são realizados nos níveis espaciais médio e baixo. A intérprete se propõe expressar nas suas movimentações sensações de desconforto, agonia e insatisfação com o seu corpo.

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31 Imagem 5: Parte da composição com a fita métrica.

Fonte: João Vítor Silva, 2020.

Na última cena a intérprete se desvencilha da última fita métrica, a cena visa à libertação das amarras, isto é, a libertação da pressão imposta pela sociedade de estar no padrão estético corporal considerado ideal, isto é tornar-se magra. Assim, nesta cena, a intérprete denota em sua movimentação a perda do desejo de ser aceita pela sociedade e demonstra aceitação pelo seu padrão corporal e estético fora do padrão estético hegemônico.

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32 CAPÍTULO 3: A VIDEODANÇA

3.1. Construção da Videodança

O trabalho “Sem Medida” inicialmente foi criado com o propósito de ser apresentado no palco convencional. Porém, devido a pandemia do coronavírus, a composição precisou ser adaptada para o formato da tela. Essas mudanças foram necessárias em diversos ramos do cotidiano. A casa da intérprete, assim como da maioria de todos os indivíduos do mundo ocidental e oriental se transformou em escritório — o tão falado home office. Nessa direção, a sala de aula virou a tela do computador ou do celular e as compras online se tornaram cada vez mais comuns. Essas medidas de isolamento foram extremamente necessárias devido a pandemia do coronavírus.

A arte, assim como todos os outros setores, também sofreu com as mudanças que a pandemia trouxe. Teatros foram fechados, espetáculos e eventos culturais foram cancelados. A pandemia trouxe um impacto significativo na vida de vários artistas do país e do mundo. Porém, assim como a internet foi um item necessário para o prosseguimento e adaptação das atividades laborais e de estudos, a arte foi fundamental para aliviar o sofrimento e as angústias dos indivíduos em nível mundial.

É nesse contexto que com a chegada da pandemia – em meio à proibição das aglomerações, com a imposição do isolamento social –, a música, o teatro, a literatura, a arte em geral, foram saudadas como canais de escape fundamentais da solidão, como alimento da alma, como alento e esperança de tempos e vidas sãs. Seja através de suportes já consagrados, como os livros impressos, os CD de música, seja através da internet em um volume muito maior, ou ainda nas janelas e varandas das casas, por todo mundo, temos assistido à ampliação do consumo de produtos culturais, da valorização da cultura e do uso do tempo diário com atividades de arte e cultura (CALABRE, 2020, p. 11).

Diante do cenário pandêmico mundial citado se fez necessário reelaborar o formato de apresentação de “Sem Medida”. Deste modo, o trabalho que anteriormente foi elaborado para o palco se transforma em uma videodança. Essa transformação permite o surgimento de uma nova perspectiva, contudo, sem perder as ideias iniciais da criação coreográfica.’

Essa ideia vai ao encontro da afirmação de Bastos (2018), a qual nos diz que a “videodança é vídeo e é dança e é, ainda, um terceiro, resultado dessa

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33 contaminação e não da exclusão das partes para a formação de uma nova proposta. Videodança é, assim, é uma linguagem híbrida que nasce da fusão de meios distintos [...]” (BASTOS, 2018, p.11).

No início dos anos 70 surgiu uma nova forma de videoarte: a videodança. Longe de ser um registro da dança no palco, é uma forma de experimentação que conquistou domínios próprios, tanto territoriais quanto estéticos. Isso se verifica no calendário de atividades (festivais, workshops, publicações) em torno do assunto, no aumento da produção e no crescimento do interesse pelo tema. Existe inclusive uma terminologia adotada, que também pode estender-se ao cinema. Aliás, muitos coreógrafos têm usado tanto a película quanto o vídeo para investigar novas possibilidades para o movimento no espaço e no tempo, bem como a exploração de novas percepções. Seria preciso uma amostra maior e análise cuidadosa para pontuar melhor as diferenças e semelhanças entre as duas tecnologias (SPANGUERO, p. 36, 2003).

Inicialmente foi pensada a escolha do profissional para a filmagem e edição da composição em videodança. Nessa perspectiva, o artista-pesquisador e autodenominado coreoeditor André Rosa é convidado para integrar a equipe de produção e feitura da videodança. A escolha de André Rosa se deve ao fato de conhecer o seu trabalho, assim como já ter tido a oportunidade de trabalhar com o mesmo.

Após a escolha do profissional para a gravação e edição, houve o primeiro contato por meio da rede social Instagram, onde a intérprete explicou a André Rosa a proposta do trabalho. A partir dessa conversa foi agendada uma reunião para que fossem definidos mais detalhes para a gravação de “Sem Medida”.

Após os ajustes dos detalhes da gravação da videodança é feita a procura por locais de filmagem e produção da videodança que atendessem às exigências do trabalho proposto. A procura foi finalizada quando é encontrado o local denominado: Espaço A3. Este espaço está localizado na Rua Frei Miguelinho, no bairro da Ribeira, na cidade de Natal/RN. A escolha do local citado se deve ao fato do mesmo possuir uma estrutura semelhante ao local onde originalmente se criou o trabalho em palco, isto é, no Teatro Laboratório Jesiel Figueiredo, no Departamento de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

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34 Imagem 6: Espaço A3

Fonte: Moisés Ferreira, 2021.

Após a definição dos detalhes da filmagem e local para a gravação da videodança, foi realizada a escolha da iluminação e do operador/técnico de luz. Assim, o ator e iluminador Juciê Borges é escolhido, pois ele já conhecia o trabalho realizado, na condição de técnico e operador de luz nas versões iniciais de “Sem Medida”, no Teatro Laboratório Jesiel Figueredo. O contato com Juciê Borges foi realizado través do Whatsapp e por esse meio foram definidos todos os detalhes da iluminação do trabalho.

Imagem 7: Mapa de luz de “Sem Medida”

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35 3.2. Filmagem da Videodança

No dia da gravação, realizada em 26 de agosto de 2021, ao chegar no local, o ajuste e o posicionamento das câmeras e das luzes foi realizado pelo artista e coreoeditor, André Rosa. Esses procedimentos foram rapidamente concluídos e logo após os procedimentos descritos foi iniciada a marcação dos pontos de gravação da coreografia, com passagem de luz para que todos os detalhes fossem filmados.

Imagem 8: Ajuste de câmera e iluminação

Fonte: Lucas Oliveira, 2021.

A gravação foi iniciada em plano geral, com câmera fixa. Foi filmada toda a composição nessa configuração. Para Jullier e Marrie (2009), esse plano “insere o sujeito em seu ambiente, eventualmente dando uma ideia das relações entre eles” (JULLIER e MARRIE, 2009, p.24). Após esse momento, as cenas do desfile, da retirada das vestes e da fita métrica foram gravadas separadamente.

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36 Imagem 9: Gravação no plano geral

Fonte: Lucas Oliveira, 2021.

Em seguida, a gravação das cenas descritas anteriormente é realizada no plano médio, o que significa dizer, que as imagens foram gravadas da cintura para cima. Jullier e Marrie (2009), nos diz que esse plano “apresenta o sujeito em sua unidade” (JULLIER e MARRIE, 2009, p.24).

Imagem 10: Gravação no plano médio

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37 Após a filmagem dos planos geral e médio, foi iniciada a gravação no plano

close-up. Segundo Jullier e Marrie (2009) o plano close-up permite uma aproximação

e uma intimidade maior com o personagem. Nesse plano, a câmera enquadra muito próximo ao corpo da intérprete, mostrando todos os detalhes de cada movimentação realizada. Embora as cenas da retirada das vestes e da fita métrica já tenham sido gravadas em separado e no plano médio de filmagem, foi necessário também gravar essas cenas no plano close-up. Essa configuração de filmagem permitiu dar destaque às expressões faciais e as movimentações da intérprete.

Por fim, a gravação foi realizada somente na altura dos ombros. Deste modo, foi dado destaque às expressões faciais realizadas durante a composição. Também foi gravado nesse plano a retirada da maquiagem.

Todas as cenas foram gravadas repetidamente de forma que fosse possível filmar todos os detalhes e todos os momentos da composição.

3.3. O Resultado

O trabalho de edição se torna um grande aliado para trazer para a cena a dramaturgia desejada pela intérprete em “Sem Medida”, pois através da mesma é possível realizar e propor novas dinâmicas para a cena.

“Sem Medida” utilizou a técnica do registro em estúdio ou palco da dança. Segundo Spanghero (2003), esse tipo de prática permite a gravação da coreografia original sem que a mesma sofra grandes alterações. Além disso, a autora nos afirma que essa forma de videodança aproxima mais o espectador da cena, conduzindo o seu olhar para os detalhes que são mostrados na tela.

A videodança se inicia com uma imagem desfocada da intérprete, mostrando apenas a sua silhueta. Instantes depois a imagem retoma a sua nitidez, revelando nitidamente a imagem da intérprete na cena. Nesse momento são utilizadas as cenas do desfile com a câmera em plano fixo, que segundo Jullier e Marrie (2009) é o plano que não se tem movimentação de câmera para acompanhar o que está sendo filmado. Essa configuração foi escolhida na edição, pois traz um ar mais sofisticado à cena, remetendo aos desfiles de miss da década de 50.

Entre as cenas do desfile, a câmera percorre o corpo da intérprete mostrando a faixa com a palavra “Brazil”. Utiliza-se quase no final da cena um tipo de efeito de

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38 câmera fotográfica com uma sequência de fotos em preto e branco. Esses foram os únicos efeitos utilizados nessa cena, além dos cortes do fluxo de imagens.

Quando a primeira parte, isto é, a cena do desfile vai chegando ao final, a intérprete foca seu olhar para câmera e inicia os trejeitos de miss, sendo estes o sorriso, o olhar confiante e o aceno com a mão. Essa cena finaliza com um fade out, ou seja, um desaparecimento da imagem.

A câmera foca no rosto da intérprete, que desfaz o sorriso e assume uma expressão mais séria. Nesse instante, a videodança se apropria de uma característica mais dramática. As cenas das retiradas das vestes, dos toques no corpo e da fita métrica são mostradas mesclando entre sobreimpressões e filmagens no plano

close-up.

“A sobreimpressão se trata de um ponto de montagem onde um plano se sobrepõe brevemente ao outro e desaparece sem encobrir prejudicar a visibilidade do último” (JULLIER e MARRIE, 2009, p.42). Essas sobreimpressões permitem que o espectador de “Sem Medida” assista a mesma cena e o mesmo movimento em duas perspectivas: uma mais próxima e uma mais distante. Nesse momento, a filmagem que antes permanecia no plano fixo, agora adquire movimento, dando ênfase às movimentações e expressões mais agressivas da intérprete.

A última cena mostrada é a imagem da retirada da maquiagem. Retomada para o plano fixo de filmagem, essa cena dá ênfase ao rosto e às mãos da intérprete de “Sem Medida”, focando no gesto de borrar a maquiagem com as mãos e no desfazer das ações gestuais da cena, até que a imagem da cena em sua totalidade desaparece em fade out.

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39 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do que foi estudado e proposto neste trabalho monográfico, é possível afirmar que os padrões estéticos corporais e de beleza feminino impostos pela sociedade acompanharam a vida das mulheres desde os primórdios da antiguidade. Na dança esse padrão foi e ainda se faz fortemente presente, embora não haja justificativa embasada cientificamente e comprovadamente capaz de atestar que somente os indivíduos magros podem dançar e se tornar artistas e profissionais da dança. Assim, acredita-se que essas exigências correspondem muito mais à ideologia de caráter sócio-cultural-hegemônica e excludente, fortemente presente na sociedade contemporânea.

A partir da reflexão dos capítulos, observa-se que a discussão desse tema é relevante para o a área de dança, tanto no ensino formal quanto no ensino não formal da dança. Tendo em vista que desconsiderar a diversidade e heterogeneidades dos corpos de crianças, adultos, homens e mulheres nas diferentes perspectivas da dança não estimula e nem contribui para o fortalecimento da área em seus processos artísticos, educacionais e formativos.

Este trabalho também visa conscientizar os profissionais da dança em relação a essas exigências e o quanto elas podem subverter o caráter inclusivo da dança em uma perspectiva excludente e discriminatória para os indivíduos de ambos sexos e de todas as idades e corporeidades singulares. O presente trabalho pode servir de estímulo para vários bailarinos e bailarinas que não frequentam aulas de dança por medo de julgamentos dos seus corpos considerados fora do padrão estético exigido e aceito para dançar.

Bailarinas fora do padrão corporal normatizado na dança e na sociedade, isto é, corpos gordos, lutam todos os dias para derrubar as barreiras impostas por companhias e escolas de dança. Muitos desses ambientes escolares e não escolares, não revelam abertamente sobre os preconceitos imputados aos corpos gordos que desejam dançar. Preconceitos e atitudes excludentes, em sua maioria são realizados de forma sutil e disfarçada pelos estabelecimentos e academias de dança. A título de exemplo vale citar o que se observa nas escolas de dança: nessas é raro ver uma bailarina gorda, seja ela criança, adolescente ou adulto fazendo parte de um corpo de baile. É ainda mais raro vê-las fazendo um papel principal em algum espetáculo de

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40 dança. A ideia de que o corpo gordo não é capaz de fazer e executar determinadas práticas artísticas corporais é mais comum do que se possa imaginar, contudo o que causa indignação é ver profissionais da dança na escola e fora dela se comportando e agindo de forma preconceituosa e discriminatória com pessoas que talvez, precisem mais da dança do que os já considerados aptos e eleitos como merecedores de praticá-la por estarem em conformidade com o padrão estético corporal em voga.

Em relação ao trabalho artístico, acredita-se que a videodança “Sem Medida” proporciona novas possibilidades dramatúrgicas para a composição que antes só havia sido pensada para o palco. O diálogo do vídeo com a dança em “Sem Medida” permite à intérprete-criadora traduzir suas angústias e vivências de um corpo gordo encarnado que dança e se expressa artisticamente. Ainda que este corpo esteja e se veja como fora do padrão corporal e estético exigido pela sociedade. Além disso, é válido assinalar que a videodança pode alcançar um maior número de pessoas.

As inquietações apresentadas nas cenas de “Sem Medida foram tarefas desafiadoras para a intérprete-criadora. É necessário que se faça todos os dias a desmistificação desses padrões estéticos corporais vigentes. Os complexos e as inseguranças acompanham os corpos gordos desde o início de sua existência, social, cultural e simbólica.

Portanto, ao expor o corpo considerado fora do padrão estético corporal, isto é, o corpo gordo e dançante em “Sem Medida”, a intérprete-criadora desvela para o público as subjetividades constituídas em seu corpo, compostas de experiências não somente como artista, mas sobretudo, como educadora de crianças e de jovens que necessitam de aprovação e estímulo para se sentirem aceitos em uma sociedade que em sua configuração social e cultural tem dificuldade de conviver e respeitar as diferenças e todo tipo de diversidade.

O presente trabalho se constitui na busca pela aceitação corporal de uma artista e profissional da dança. É uma luta diária, com muitos altos e baixos. Deste modo, “Sem Medida” fala de feridas e dores particulares de um corpo, mas que também dialoga com outros corpos que são discriminados social e culturalmente pelo fato de serem pessoas gordas. “Sem Medida é um trabalho sensível, delicado e de peso que demandou medidas de equilíbrio em seu fazer.

Por todos os aspectos mencionados, espera-se que o trabalho possa contribuir para uma efetiva análise e reflexão crítica acerca da dança e do seu papel

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41 socioeducativo, cultural e transformador de todos os indivíduos, independente de seu peso corporal. Deste modo, “Sem Medida propõe e deixa um recado de que a dança a dança na escola e fora dela deve ser feita “Sem Preconceitos”, “Sem Exclusões”, “Sem Discriminações”, e por fim, devem ser realizadas: “com afeto”, “com paixão”, “com vontade”, “com respeito” e “sem medidas” separadoras e excludentes de qualquer natureza.

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42 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Referências

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