Mãe
da
mulher
que
matou
três
bebés
não perdoa
SEM EXPLICAÇÃO
Maria
AlexandraGomes não compreende os
homi-cídios cometidos pela filha, Alexan-dra. PAISPAGS.I4EISMulher
que
mata
três
filhos
"será
sempre
censurada
11
Figueiró
dos
Vinhos.
Mãe
da
jovem
que
matou
três
recém-nascidos
está
destruída pelo
desgosto.
"Não
sei
se
volto
a
olhar
para
ela"
ALFREDO TEIXEIRA
Aporta
éaberta amedo.Maria
Alexandra Gomes não tem explicação para os atos dafilhaAlexandra, de28 anos, detida pelaPolícia Judiciária (PDpelos homicídios de
pelo menos três bebés, asfixiados logo
após os partos. "Continuo àprocura de
uma explicação para o que ela fezea
ver-dade éque eu estou completamente
des-truída de desgosto.
Nem
consigo tratar de mim", disse amãe aoDN.
Alexandra está presa preventivamente naprisão deSan-ta Cruz do Bispo, em Matosinhos, mas a
mãe não consegue ainda perdoar afilha. "Não seisea vou visitar àcadeia. Não sei se
teria
coragempara olhar para
acaradela", justifica.
Ervideira
éuma pequena aldeia
do concelho de Figueiró dosVinhos.Aloca-lidade tempouco mais devinte casas elá
todos seconhecem, todos falam sobre o assunto, mas ninguém avança com qual-quer comentário sobre os factos. "Tem a
ver
coma vida
pessoal deles ecadaum
sabe desi",
afirmou
aoDN um
dosvizi-nhos da família.
Maria
Alexandra ainda está em estado dechoque por tudo oqueaconteceu, fazagora umasemana, enem ofacto de
vol-tar
aser avó dentro de dez dias deuma
outra filha, que écasada eestá grávida, lhe
devolve a alegria. Os pais damulher
deti-da estão reformados e com-plementam aspequenas
pen-sões com oque
cultivam
eti-ram
daterra.
Opai, "andades-norteado
epoucopara
em casa"Maria
Alexandra passa odia deitadaenem sequer come. "Hoje foi uma vizi-nha que me trouxe o almoço", conta, ao
mesmo
tempo
que recorda afilha
que "sempre foiuma
rapariga pacata esem dargrandes preocupações".Há
seis anosengravidou
deuma
relação eteveuma
menina, hoje com seis anos eagora
entre-gue a familiares para "fugir" aestes dias de agitação. Oque sepassou depois nunca
foi do conhecimento dafamília. Alexan-dratrabalhava esporadicamente e
sem-pre que arranjava emprego eranaáreada
restauração. Presentemente estava
num
café de Figueiró dosVinhos.
Os dias eram todos iguais na aldeia até sexta-feira, dia 31de agosto, quando
Ale-xandra pediu a ajuda da mãe por não con-seguir estancar
uma
hemorragia. "Está-vamos emcasa eelacontou-me quetinhauma inflamação
eque devia ser deum
mioma. Como vique a coisa era grave,
de-cidi que omelhor era
ir
ao hospital",con-ta a mãe. O resulcon-tado nãopodia serpior. A
equipa médica
que observou ajovem
logo seapercebeu de que a
hemorragia
em causa resultara de
uma
gravidez equestionou a existência do bebé. "Eu não
queria acreditar porque eununca avi
grá-vida!
,dizMaria Alexandra
Ocerto éque as
autoridades foram avisadas do
estranho caso e,fazhoje
uma
se-mana, ajovem foiinterrogada. Acabou
por
confessar queti-nha
asfixiado o bebé comum
saco deplástico eque o
tinha
co-locado noguarda-vestidos atépo-der desfazer-se do corpo. ÀPJ
con-tou ainda que omesmo tinha feito a
outros dois bebés nascidos
nos últimos anos. Nunca optou pelo aborto,
mas terascrianças
edepois matá-las. "Sei que elatem
um
advogado oficioso, mas
não posso ir vê-la. Élonge efica
dispendioso eaverdade éque eu não
seiseseria capaz de aolhar nacara",
ta a mãe, que acredita que a filha será
con-denada enunca mais vai voltar àaldeia. Na Ervideira "será sempre censurada".
4
PERGUNTAS
A...
"O
quadro
indicia
perturbação
da
mulher"
CARLOS POIARES Professor de Psicologia ForenseUma mulher
quelevou acabo três gravidezes paradepoismatar
ostrês recém-nascidos podeter
alguma perturbaçãopsicológica?
À partida, o quadro que
descre-veu indicia perturbação da
mu-lher. Mas épreciso, antes detirar
conclusões, estudar a situação da
mulher efazer-lhe uma avaliação psicológica.
Eépossível conseguir ser
uma
mãe
normal para uma filha
e depois decidirmatar
os outros três recém-nascidos?Sim, épossível.
Lembro-me
deum
caso ocorrido háalguns anos deuma mulher
que teve ecriouum filho bem
edepoisdecidiu
matar
osegundo filho. Mais tardefoi mãe de
um
terceiro filho ere-dimiu-se docrime cometido com
osegundo.
Sãodistúrbios psicológicos
gra-ves?
Sem dúvida. Há, a este
propósi-to,
um
caso paradigmáticoocor-rido
noinício
do séculoXX
emLisboa. O deuma mãeque guar-daratrês recém-nascidos mortos,
que embrulhou ecolocou na
ga-veta de
uma
cómoda. Veio a serdetida mas acabou confinada ao
hospital
Miguel
Bombarda por-quesofria dedesordem mental. Mas pode acontecer que estamulher
não venha aserconsi-derada perturbada
psicologica-mente?
Teoricamente
tudo
épossível. Mas só depois deuma
avaliação psicológica àarguida serápossí-vel saber.
Objetivamente
seria menos grave para ela teraborta-do aborta-do que
matar
osfilhos. R.C.Premeditou
o
crime
e
por
isso
foi
indiciada
por triplo homicídio
penal
Só éinfanticídio
quando
a
mãe
mata
recém-nascido
sob oefeito da
emo-ção
do parto. Alexandra
pla-neou matar
ostrês bebés
Alexandra, 28anos, ficou em
pri-sãopreventiva, indiciada por três
crimes dehomicídio qualificado, punido com uma penaque pode ir de 12a 25anos deprisão (apena
máxima
em Portugal), devido à "especial censurabilidade ouper-versidade" da morte. Planear e exe-cutar amorte de
um
filho ésempre homicídio qualificado.Ofacto de amulher terasfixiado obebé logo a seguir aoparto podia fazer apontar para
um
quadro deinfanticídio, cuja moldura penal é
bemmenor, de
um
a cinco anos de prisão. Masa confissão deAlexan-dra, de que tinha asfixiado este
re-cém-nascido emorto outros dois
bebés, pelo mesmo método, ao
longo de seis anos, convenceu o
Ministério Público de Figueiró dos Vinhos de que a arguida não éuma
infanticida
mashomicida.
"Para serinfanticídio
amulher tem
deagir sob a emoção doparto,
pertur-bação que a leva a matar o recém-nascido. Neste caso nãoterá sido isso. Trata-se deumapessoa que
ti-nha premeditado friamente matar
obebé", explicou fonte judicial ao
DN.
Emseisanos esteé oterceiro
re-cém-nascido que Alexandra
con-fessou ter assassinado logo a seguir aoparto. Desde os22anos que a
jovem teve gravidezes indesejadas fruto de relações ocasionais, como confessou aos inspetores da
Polí-cia Judiciária de Coimbra. Nos três casos omesmo padrão: decidiu
le-varas gravidezes até ao
fim
ede-pois matar osrecém-nascidos por asfixia, emvez de abortar.
Asimples confissão dos
homicí-dios seria suficiente, nesta fase
in-diciaria,
para
colocarAlexandra
emprisão preventiva, referiu
fon-te policial ao
DN.
Ainvestigação daPJprossegue, com buscas para en-contrar osoutros dois corpos.
Oúnico cadáver já localizado foi
odoúltimo bebé, nascido no sába-do passasába-do. Alexandra entrou em trabalho de
parto
sozinha, teve o bebé, colocou-o num saco de plás-tico easfixiou-o. Sofreu uma forte hemorragia epediu auxílio àmãe parair àMaternidade deCoimbra.Ofilho
morto
recém-nascidofoi
escondido no roupeiro do quarto.
Segundo apurou o
DN, terá
sidoumapessoa que teve conhecimen-to do caso aalertar aPJ.Alexandra
está agora em prisão preventiva na
cadeia
feminina
deSanta Cruz do Bispo.Matar
um
filho éum
dos crimesmais malvistos em ambiente
pri-sional,
apar
da violação ou abuso sexual. Isto implica colocar a deti-da emcelaindividual eresguardá-ladas outras. RUTE COELHO
Hospitais
não
comunicam
casos
às
autoridades
protocolo
Prioridade
éo
tratamento
clínico.
Todos
os
anos
morrem
sete
mu-lheres na sequência
do
parto, com hemorragias
A maternidade deCoimbra onde Alexandra
foi internada
devidoauma crise hemorrágica não te-rá comunicado ocaso às autori-dades. E, a
tê-lo
feito, nãoterá
sido de
forma
oficial,uma
vez queoprotocolo deadmissão dedoentes
-
aque todos oshospi-tais públicos eprivados estão
su-jeitos
-
compreende
apenas a atuação clínica, sendo válido atéemcasos demulheres que apre-sentam sinais departo recente,
talcomo aconteceu com
Alexan-dra.
Para efeitos de registo, os
hos-pitais só podem referir o
recém-nascido caso oparto tenha
ocor-rido dentro
das instalações. E,até nesses casos, o registo só
acontece seocordão
umbilical
tiver sido cortado dentro da
uni-dade hospitalar. "Caso contrário, édada entrada dacriança como
recém-nascido", explica odiretor
do Serviço de
Obstetrícia
doHospital
de São João, no Porto, onde oregisto informáticocon-templa
"tudo oque sepassou,desde oquadro clínico do
doen-te,àscausas prováveis emedidas tomadas". "Mas
nunca reporta
nada àsautoridades", garante omédico Nuno Montenegro.
Além
disso, oquadro clínicoapresentado porAlexandra
obri-gava a
uma intervenção
de ur-gência e isso terásido a priorida-de dos médicos que estavam de serviçonaquela
sexta-feira, do dia 31 de agosto.Em Portugal,
num total
de 100mil
nascimentos anuais,5 a7mulheres
morrem
nase-quência do parto, duas delas
de-vido a hemorragia. Classificadas
como "emergência obstetrícia", estas situações obrigam muitas
vezes os doentes a receberem
transfusões de sangue e
deriva-dos, assim como
tratamentos
farmacológicos. Emcertos casos, garante o médico, "não se conse-gue
evitar
amorte
da mulher"."Num quadro mais avançado, é
retirado oútero da mulher, que
compromete apossibilidade de
voltar aterfilhos." Não foi ocaso deAlexandra, que acabou
por
confessar amorte de três filhos recém-nascidos por asfixia. A.R.