COMPORTAMENTO DIELÉTRICO EM FREQUÊNCIA FIXA A ALTA
TEMPERATURA EM CERÂMICAS DE LiNbO3
L.O. Salmazo; W. Alves; S. Lanfredi; M.A.L. Nobre Departamento de Física, Química e Biologia
Laboratório de Compósitos e Cerâmicas Funcionais – LaCCeF
Faculdade de Ciências e Tecnologia – FCT, Universidade Estadual Paulista – UNESP
C.P. 467, CEP 19060-900, Presidente Prudente – SP, Brasil. e-mail: lesalmazo@yahoo.com.br
RESUMO
O desenvolvimento de metodologia na determinação da permissividade de cerâmicas LiNbO3 em freqüência fixa, a partir de dados de impedância tem sido
investigado. A técnica de espectroscopia de impedância, no intervalo de temperatura de 723 K a 1073 K, entre 5 Hz e 13 MHz foi utilizada. A evolução da permissividade
real, ε', em função da freqüência em diversas temperaturas mostrou-se
independente da freqüência, para valores acima de 1 kHz. Um aumento da permissividade é observado a baixas freqüências, onde próximo a 100 Hz alcança o valor de 7x105. A região < 100 Hz é associada à polarização de carga espacial, contorno de grão, mostrando elevados valores de permissividade. A curva da permissividade imaginária mostrou um comportamento semelhante ao da permissividade real. A altas temperaturas e baixas freqüências ε' apresentou alto grau de dispersão. A metodologia de obtenção dos parâmetros mostrou-se adequada, uma vez que está de acordo com recentes resultados.
Palavras-chave: LiNbO3, Espectroscopia de Impedância, Espectroscopia Dielétrica, Permissividade, Alta Temperatura.
INTRODUÇÃO
Niobatos de metais alcalinos como o LiNbO3 têm mostrado crescentes aplicações em tecnologias de ponta, atraindo interesses nos setores científicos e técnico-industriais, atuando como guia de onda óptico, armazenador de imagens holográficas, eletrólitos sólidos, materiais ferroelétricos (1), (2), semicondutores e antiferroelétricos (3). O niobato de lítio, LiNbO3, apresenta à temperatura ambiente estrutura romboédrica com grupo espacial R3c, sendo esta fase de característica ferroelétrica. Em torno de 1483 K ocorre uma transição de fase com alteração do grupo espacial para R3 c, fase a qual exibe característica paraelétrica. A transição ferroelétrica-paraelétrica do niobato de lítio é mostrada na Figura 1. Na fase paraelétrica o niobato de lítio não mostra formação de dipolos, enquanto que no estado ferroelétrico os íons metálicos carregados positivamente deslocam-se no mesmo sentido do campo aplicado, produzindo dipolos terminais (4). Esta transição de fase pode ocorrer de acordo com dois mecanismos, o primeiro está relacionado com um processo de desordem resultante da difusão atômica e o segundo com o deslocamento dos átomos de Li e Nb ao longo do eixo-c, através de sítios centrossimétricos em relação aos planos dos íons oxigênio. O deslocamento dos átomos de Li e Nb entre as estruturas centrossimétricas é de 0,45 Å e 0,25 Å, respectivamente. A ferroeletricidade apresentada por monocristais e policristais de LiNbO3 pode ser investigada através da constante dielétrica como função da temperatura, bem como da freqüência.
A ferroeletricidade apresentada por monocristais e policristais de LiNbO3 pode ser investigada através da constante dielétrica em função da temperatura, bem como da freqüência. Uma das mais importantes propriedades dos materiais dielétricos é a capacidade de polarizar-se, ou seja, a capacidade de variação da posição de partículas eletricamente carregadas na estrutura dos dielétricos, de modo a mostrar um momento de dipolo elétrico.
O momento de dipolo médio (p) por unidade de campo elétrico (E ) aplicado é
definido como polarizabilidade (αT), como mostrado na equação (A):
αT =
E
p (A)
Um dos principais interesses na teoria dos dielétricos é a dependência da constante dielétrica com a freqüência do campo elétrico aplicado, bem como a dissipação de energia em determinadas freqüências. Os mecanismos de perdas estão relacionados aos mecanismos de polarização, de modo que uma parte da energia armazenada no campo elétrico aplicado é consumida no deslocamento de cargas. Sob aplicação de campo elétrico alternado esta energia consumida na polarização é dissipada, durante o processo de relaxação, na forma de energia calorífica. Este trabalho tem como objetivo a obtenção da permissividade dielétrica da cerâmica de LiNbO3 em freqüência fixa, a partir da técnica de espectroscopia de impedância. A espectroscopia de impedância é uma técnica poderosa na caracterização elétrica de materiais cerâmicos (5), (6), podendo ser representada na forma de permissividade complexa ε*(ω).
MATERIAIS E MÉTODOS Síntese
Neste trabalho a cerâmica de LiNbO3 foi preparada a partir de síntese química (7), empregando-se o método de decomposição térmica de um sal precursor obtido por evaporação de soluções. As características dos reagentes de partida utilizados na preparação do LiNbO3 estão listadas na Tabela I.
Tabela I – Características dos reagentes utilizados na síntese da cerâmica de
LiNbO3.
Reagente Fórmula Química Pureza
Sal de Nióbio NH4H2[NbO(C2O4)3].3H2O P.A.
Ácido Oxálico C2H2O4 P.A.
Hidróxido de Amônio NH4OH P.A.
Nitrato de Lítio LiNO3 P.A.
Método de preparação dos pós precursores
O domínio tecnológico da obtenção de niobatos de metais alcalinos policristalinos depende do conhecimento dos processos de síntese de pós, bem como das características elétricas e dielétricas dos corpos sinterizados, o que torna fundamental o desenvolvimento dos processos de síntese. Os reagentes de partida utilizados foram nitrato de lítio (Merck, Damstadt-Germany) e sal solúvel de nióbio NH4H2[NbO(C2O4)3].3H2O (CBMM-Brasil). O nitrato de lítio foi dissolvido em água deionizada, adicionando-se em seguida a esta solução, ácido oxálico (C2H2O4) em excesso e hidróxido de amônio (NH4OH), formando uma solução tampão com pH final igual a 2,0. Após agitação adicionou-se o sal de nióbio. Depois a solução foi mantida em sistema de refluxo por 3 horas e, em seguida evaporada em placa de aquecimento até a formação do pó precursor.
Calcinação e sinterização
O precursor foi calcinado a 823 K por 5 horas, obtendo-se o pó de LiNbO3 monofásico e cristalino. Em seguida, pós de LiNbO3 foram compactados uniaxialmente em forma de pastilhas de diâmetro em torno de 10 mm e 1 mm de espessura. As pastilhas foram sinterizadas a 1353 K durante 2 horas, obtendo-se uma densidade relativa de 96 % da densidade teórica.
Caracterização elétrica
A técnica de espectroscopia de impedância tem sido utilizada na caracterização de cerâmicas semicondutoras (8-15) cerâmicas ferroelétricas (16-19) e antiferroelétricas (3).
A caracterização elétrica das cerâmicas de LiNbO3 foi realizada por espectroscopia de impedância no intervalo de freqüência de 5 Hz a 13 MHz, entre 723 K e 1073 K, com um potencial aplicado de 100 mV. Esta técnica consiste em submeter à amostra a ser analisada a uma tensão senoidal V, como mostra a equação (B), de freqüência variável fornecendo como resposta uma corrente alternada (I) (Equação (C)).
) exp( ) ( Vo j t V ω = ω (B) ) exp( max ) (t I jωt jϕ I = + (C)
onde, ϕ é o ângulo de fase entre a tensão e a corrente e ω é a freqüência angular (ω = 2πf). Assim, a impedância Z(ω) pode ser escrita conforme a equação:
exp( ) ) ( exp ) exp( ) ( ) ( ) ( ϕ ϕ ω ω ω ω ω Z j t j I t j V I V Z o o = − + = = (D)
sendo, Z(ω) um número complexo que pode ser representado em coordenadas polares pelo módulo |Z(ω)| e a fase ϕ, ou em coordenadas cartesianas conforme a equação (E):
Z(ω)= Re(Z)+ jIm(Z) = Z'(ω)+ jZ"
( )
ω (E)onde, Re(Z) é a parte real, Im(Z) a parte imaginária da impedância Z(ω) e j é o operador imaginário −1.
Outros três formalismos complexos podem ser medidos ou derivados da impedância: admitância, módulo elétrico e permissividade. A admitância, Y*(ω) (ou
A*(ω)), é definida como o inverso da impedância, Z*(ω):
Y *(ω)=
(
Z *(ω))
−1 =Y'( )
ω + jY"( )
ω(F)
onde, a componente real Y’(ω) é denominada de condutância. O módulo elétrico M*(ω) é relacionado com a impedância através da relação:
) ( " ) ( ' ) ( * ) ( *
ω
jω
C Zω
Mω
jMω
M = o = + (G)onde, C0 ( ) é a capacitância do vácuo da célula de medida vazia com área de eletrodo S e distância de separação d.
d S Co =εo /
A permissividade do vácuo é representada por εo (εo= 8,854x10
-12 Fm-1). A
permissividade (ω) pode ser definida como o inverso do módulo elétrico complexo
M*(ω): * ε ε *(ω) =
(
M *(ω))
−1 = (jωCo)−1Y *(ω) = ε'(ω)− jε"(ω) (H) RESULTADOS E DISCUSSÃOA Figura 2 mostra a parte real da permissividade dielétrica (ε’) em função da freqüência em várias temperaturas. Acima de 103 Hz, a parte real da permissividade mostra-se independente da freqüência. Um aumento da permissividade é observado na região de baixas freqüências, onde em torno de 102 Hz a permissividade do LiNbO3 alcança o valor próximo de 7x105. Os valores elevados da permissividade na região de baixas freqüências (< 102 Hz) estão associados ao desenvolvimento da carga espacial podendo estar relacionados à contribuição do contorno de grão.
101 102 103 104 105 106 107 100 101 102 103 104 105 106 107 log ε ` log f (Hz) 723 K 773 K 873 K 923 K 973 K 1023 K 1073 K
Figura 2: Parte real da permissividade em função da freqüência a várias temperaturas.
A Figura 3 mostra a curva da parte imaginária da permissividade em função da freqüência em diferentes temperaturas. A curva da permissividade imaginária mostra um comportamento semelhante ao da permissividade real. Uma região independente da freqüência é observa acima de 1 kHz, enquanto que em baixas freqüências, região associada a polarização da carga espacial e ao contorno de grão, observa-se uma dispersão nos valores de permissividade. Esta dispersão da permissividade imaginária aumenta com o aumento da temperatura.
101 102 103 104 105 106 107 100 101 102 103 104 105 106 107
log
ε"
log f (Hz) 723 K 773 K 873 K 923 K 973 K 1023 K 1073 KFigura 3: Curva da permissividade imaginária do LiNbO3 em função da freqüência a várias temperaturas.
A análise clássica da permissividade dielétrica em materiais cerâmicos ferroelétricos tem sido desenvolvida à freqüência fixa. A partir da espectroscopia de impedância é possível a representação dos dados na forma de permissividade complexa. Assim a evolução da permissividade em função da freqüência pode ser monitorada.
A Figura 4 mostra a curva da permissividade real em função da temperatura a freqüência fixa.
700 800 900 1000 1100 102 103 104 log ε ' Temperatura (K) 103 kHz 102 kHz 10 kHz 1 kHz
Figura 4: Curva da permissividade real do LiNbO3 em função da temperatura a freqüências fixas.
De acordo com a Figura 4, a permissividade real depende da temperatura a baixas freqüências (≤ 1 kHz) e independe da temperatura, abaixo de 923 K e a altas freqüências (≥ 10kHz), com alto grau de dispersão.
CONCLUSÕES
De acordo com os resultados, pode-se concluir que em altas temperaturas e baixas freqüências, o grau de dispersão da parte real da permissividade aumenta. A metodologia de obtenção do parâmetro permissividade mostrou-se adequada, uma vez que os valores encontrados e o comportamento das curvas estão de acordo com resultados prévios.
AGRADECIMENTOS
FAPESP, Capes, CNPq e Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM-Brasil). Ao graduando em química Gabriel Mamoru Marques Shinohara pelo auxílio.
REFERÊNCIAS
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(1966) 1019.
5. M.A.L. Nobre, S. Lanfredi, Applied Physics Letter 83, 15 (2003) 3102. 6. M.A.L. Nobre, S. Lenfredi, Journal of Applied Physics 93, 9 (2003) 5576. 7. S. Lanfredi, Preparação por via úmida, caracterização e estudo das
propriedades elétricas dos metaniobatos de lítio, de sódio e de potássio. 1993. 210f. Dissertação (Mestrado em Química) Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos – SP, Universidade
Federal de São Carlos.
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13. M.A.L. Nobre, S. Lanfredi, Journal of Applied Physics 93, 9 (2003) 5576. 14. M.A.L. Nobre, E.C. Pereira, E. Longo, J.A. Varela, E.R. Leite, Anais do 38º
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17. M.A.L. Nobre, S. Lanfredi, Journal of Physics and Chemistry of Solids 62, 11 (2001) 1999.
18. S. Lanfredi, M.A.L. Nobre, Catalysis Today 78, (2003) 529.
DIELECTRIC BEHAVIOR IN FIXED FREQUENCY AT HIGH TEMPERATURE IN CERAMIC OF LiNbO3
ABSTRACT
The methodology development in the determination of the permittivity of LiNbO3 ceramics have been investigated. The technique of impedance spectroscopy, in the temperature range of 723 K to 1073 K, between 5 Hz and 13 MHz was used. The evolution of the real permittivity, ε', as a function of the frequency was shown independent of the frequency, to values above 1 kHz, in several temperatures. An increase of the permittivity is observed to low frequencies. At frequencies close to 100 Hz the permittivity reaches values at around of 7x105. In the region < 100 Hz, the polarization mechanism is associated to space charge showing high permittivity values. The curve of the imaginary permittivity showed a similar behavior to the real permittivity. To the high temperatures region and lower frequencies, the parameter ε' presented a high dispersion degree. The methodology of deriving ε' parameters at fixed frequencies is adequate, once it is in agreement with recent results.
Key-words: LiNbO3, Impedance Spectroscopy, Dielectric Spectroscopy, Permittivity, High temperature