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REDES SOCIAIS E GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: a experiência de mulheres jovens e adolescentes de diferentes classes sociais de Belo Horizonte

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Academic year: 2021

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a experiência de mulheres jovens e adolescentes de diferentes classes sociais

de Belo Horizonte

1

Letícia Vulcano de Andrada2 Alessandra Sampaio Chacham3

Palavras-Chave: Adolescente; jovem; gravidez na adolescência; rede social.

1

Trabalho apresentado no XVIII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Águas de Lindóia/SP – Brasil, de 19 a 23 de novembro de 2012.

2 Mestre em Ciências Sociais pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade

Católica de Minas.

3

Professora Adjunta do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

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1. Introdução

Este trabalho tem como objetivo investigar como as redes sociais de mulheres jovens que ficaram grávidas na adolescência atuam no sentido de reforçar determinadas práticas e discursos em relação a esse fenômeno, apresentando uma análise comparativa entre redes de jovens pertencentes a diferentes classes sociais. Trabalhamos aqui com a hipótese de que a rede social das jovens de classe baixa apresentaria uma aceitação maior com relação ao fenômeno da gravidez na adolescência na medida em que essa atuaria no sentido de fortalecer laços sociais entre amigas, parentas e vizinhas enquanto que para as jovens de classe média uma gravidez na adolescência funcionaria no sentido oposto, isolando socialmente a jovem

Para alcançar nosso objetivo, realizamos uma pesquisa de campo de caráter qualitativo, na qual mapeamos, entre abril de 2011 e janeiro de 2012, duas redes sociais distintas de jovens entre 15 e 24 anos, sendo uma rede composta por jovens de classe baixa, residentes em uma favela da região centro-sul de Belo Horizonte, e outra com jovens de classe média, residentes em bairros da mesma região, ambas construídas tendo como ponto de referência uma jovem que ficou grávida na adolescência.

Para o mapeamento dessas duas redes sociais, foram realizadas 26 entrevistas em profundidade – sendo 13 em cada classe social – com adolescentes e mulheres jovens entre 15 a 24 anos residentes em bairros e favelas da região centro-sul de Belo Horizonte. A escolha da região centro-sul da capital mineira se deu pelo fato dessa regional abrigar ao mesmo tempo os bairros mais ricos e as favelas mais extensas da cidade. Entre as jovens entrevistadas, a primeira em cada rede deveria necessariamente ter ficado grávida na adolescência. Após a entrevista com essa jovem, pedimos que indicasse três amigas para serem entrevistadas, sem a exigência de que suas indicações fossem de jovens ou adolescentes que já tivessem experimentado a gravidez. À essas jovens, após serem entrevistadas, também foram solicitadas a indicar mais três amigas cada, e o processo foi repetido até obtermos duas redes compostas por 13 jovens pertencentes a essas duas classes sociais distintas.

Os resultados dessas entrevistas nos permitiram aceitar a nossa hipótese de que na rede social das jovens moradoras da favela, encontraríamos um maior suporte social para uma gravidez na adolescência e uma visão mais positiva dessa experiência do que entre aas jovens pertencentes a rede social da classe média.

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A seguir apresentaremos uma pequena revisão dos principais conceitos que embasaram a abordagem teórica da nossa pesquisa, seguida por uma discussão da metodologia utilizada e da apresentação dos nossos principais resultados, a discussão destes e nossas considerações finais. .

1.1 Gênero, Sexualidade e Adolescência

Ao tratarmos a adolescência e juventude como objeto de discussão nesse trabalho, nos deparamos com uma multiplicidade de questões analíticas e conceituais a respeito dessas categorias. Portanto, para se compreender como serão utilizadas as categorias jovem e adolescente em nosso trabalho, é importante explicitar que partimos aqui do pressuposto de que essas duas categorias são historicamente construídas e de que as fronteiras entre as idades podem vir a variar de acordo com a interpretação e as concepções sociais no contexto especifico.

Com na literatura são encontradas definições distintas, optou-se nesse estudo em reconhecer como adolescente aquele indivíduo ente doze e dezenove anos, principalmente por ser a faixa etária mais utilizada nas pesquisas a respeito de gravidez da adolescência. Já a categoria jovem será aquela que agrega indivíduos que apresentam entre vinte e vinte nove anos de idade. Logicamente que por si só, definir uma faixa etária não resolve de maneira satisfatória a questão do significado dos termos juventude e a adolescência, mas não deixa de ser necessária para que se sejam marcadas as delimitações iniciais básicas do período de vida a ser analisado.

Atualmente na sociedade contemporânea, os estudos modernos a respeito da identidade juvenil e construção do conceito de juventude e adolescência, reportam diferentes tipos de interpretações tendo em vista o jovem na sociedade contemporânea e moderna. É fácil de observar, por exemplo, que não se trata de uma fase homogênea, ou seja, existem diferentes tipos de juventudes, pautadas por processos distintos, ligados a fatores sociais, culturais e econômicos, o que faz com que os padrões etários sejam redefinidos em função da inserção sociocultural do jovem. (GONÇALVES; KNAUTH, 2006).

Apesar de ocorrer de maneira diferenciada em contextos sociais específicos, tanto a socialização de gênero quanto o início das parcerias afetivas e da vida sexual são partes fundamentais do desenvolvimento do adolescente e do jovem. Gênero é entendido como uma construção cultural, na qual, as diferenças percebidas entre os sexos são atribuídas de significado social e sentidos que possuem uma trajetória histórica, e que variam de acordo

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com os contextos sociais.

A construção do gênero e da sexualidade surge desde os primeiro dias de vida da criança, entretanto, é na adolescência que se intensificam as relações e se iniciam as primeiras formas de contatos. A sexualidade parece algo que temos de mais natural e também particular no ser humano, sugerindo a esta naturalidade a ordem de instintos, impulsos e decisões ligadas a fins hormonais. Apesar dessa ideia bastante recorrente na sociedade, está claro para este estudo e para a literatura estudada que a sexualidade, assim como o gênero, é uma construção social e cultural, tornando muito diversas as expressões da sexualidade humana.

Obviamente que não se pode negar a importância da fisiologia e da morfologia do corpo, pois são elas que preparam as condições do que é materialmente possível em termos de sexualidade. Mas as precondições biológicas não produzem por si só, os comportamentos sexuais, a identidade de gênero ou a orientação sexual, elas formam um conjunto de potencialidades que só adquirem sentido e eficácia por meio de significações históricas e culturais variáveis. (WEEKS, 2001; MARIANO, 2005). Nesse processo, a importância das redes socais e dos contatos construídos através do capital social dos jovens se torna parte importante para a compreensão da construção dos significados de suas ações e comportamentos ligados à sexualidade e gravidez na adolescência.

1.2 Redes sociais, capital social e pobreza

As redes sociais são importantes ferramentas de comunicação e auxilio social entre os seus membros. Segundo Marques (2010) as redes podem ser entendidas como “elementos de destaque para o entendimento das condições de pobreza e da reprodução dos padrões de desigualdade social no Brasil” (p.17), possuindo padrões complexos de relações de diferentes tipos, acumulados ao longo das trajetórias vividas e sujeitas a constantes transformações.

A manutenção das redes sociais depende em grande escala da atenção aos membros que as compõe, para que o individuo possa utilizar dos benefícios dispostos pela sua participação em determinado ambiente. O capital social nesse sentido atua como um facilitador da cooperação voluntária, fazendo com que os investimentos nas relações sociais obtenham retornos esperados (LIN, 1999). Por isso o capital social também se dá através de trocas sociais, sejam elas simbólicas ou reais, feitas principalmente por meio da constituição e participação do indivíduo nas suas determinadas redes sociais. Prates, Carvalhaes e Silva (2007), a exemplo disso, enfatizam que no estudo do capital social, as redes sociais são uma importante ferramenta de análise no acompanhamento da efetividade coletiva.

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indivíduos, o estudo de Eduardo Marques (2010), visou, entre outras vertentes, compreender as redes sociais de pessoas pobres da cidade de São Paulo, estudando a provisão de bem-estar dependendo de elementos ministrados por unidades sociais, como comunidades locais e famílias.

Para tanto, o autor comparou as redes sociais de pessoas pobres e de classes sociais mais altas, analisando, sobretudo os efeitos da segregação socioeconômica sobre as redes sociais formadas entre os membros de cada grupo específico. Marques (2010) entende que a segregação e a pobreza não são fatores voltados somente para as questões econômicas, mas “voltada a partir de elementos societais de médio alcance, associados aos padrões de relação nos quais os indivíduos se inserem” (p.12). Estudos recentes, a respeito de pobreza nas grandes cidades estão centrados na análise dos processos de produção de espaço, associando o desacerto da distribuição da estrutura social com a estrutura de fornecimento de serviços, sejam eles essenciais ou não. (MARQUES, 1999; PRETECEILLE; RIBEIRO, 1999; 2003; CALDEIRA, 2000). Entende-se, portanto que as proximidades espaciais não necessariamente significam uma “conexão social” ou mesmo um sentimento de comunidade. (MARQUES 2010).

O trabalho de Marques (2010) mostrou que a sociabilidade das redes sociais na classe média paulista era bastante diversa das dos entrevistados em situação de pobreza. Na classe média os resultados apontavam para uma diversificação muito maior de sociabilidade, apesar de ser fortemente baseada nas relações de trabalho e de estudos do que em relações de vizinhança e família, características das redes sociais dos entrevistados de classe baixa.

Por apresentarem características que fluem de acordo com diferentes tipos de atributos - renda, escolaridade, idade e ciclo de vida, sexo, migração, religião, e espaço e segregação (MARQUES, 2010, p.107-115), os estudos relacionados às redes sociais devem ao mesmo tempo captar a sua estrutura (características da rede) e a sua mobilização na sociabilidade cotidiana. Neste sentido são representadas de maneira que sua análise seja feita “através dos fenômenos sociais, cujas unidades básicas são as relações sociais, e não atributos dos indivíduos.” (MARQUES, 2010, p.43). A partir de conexões construídas por meio do uso do capital social, as redes sociais importam mecanismos de confiança e ajuda mútua entre os seus agentes, fazendo com que possivelmente seja determinada uma mobilização da sociabilidade também para a aquisição de bens de serviços, auxílios na obtenção de empregos e “bicos”, apoios emocionais e até mesmo favores, como o cuidado com crianças pequenas ou de pessoas idosas.

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das outras em diferentes aspectos. Chegamos ao ponto em que faz sentido discutir o tema principal desse artigo. Tem-se como pressuposto que em comunidades homofilicas, o auxilio a uma mulher grávida ou já com filho(s) acaba por gerar uma proximidade entre os parentes que se encontram ou se encontraram na mesma situação. Principalmente entre as mulheres, a presença de uma moça gestante faz com que se crie uma rede de ajuda mutua entre amigas, irmãs, mãe, sogras e cunhadas para o cuidado da criança, ainda mais se a nova mãe possuir menos de 19 anos.

2. Desenvolvimento da pesquisa

A presente pesquisa foi realizada em Belo Horizonte, Minas Gerais, estado localizado na região sudeste, a mais rica e desenvolvida do Brasil, apesar de diversos indicadores sociais ainda apontarem para a presença de profundas desigualdades sociais. Segundo o censo 2010, a população belorizontina é de 2.375.151 pessoas, e se divide em nove regionais administrativas. A escolha da região centro-sul, como destacado anteriormente se deu principalmente pela proximidade geográfica presente entre classes sociais. Essa peculiaridade nos permitiu comparar as experiências das jovens e adolescentes de diferentes níveis socioeconômicos que muitas vezes vivem no mesmo bairro ou localidades próximas entre si. Os dados do censo 2010 apresentaram Belo Horizonte como a cidade com o maior número de setores subnormais (favelas e aglomerados) do estado, com 169 ao todo. A região centro-sul abriga também, os dois maiores aglomerados da capital: a barragem Santa Lúcia e o Aglomerado da Serra, com três e seis vilas consecutivamente (PBH, 2009).

Para iniciarmos a construção da rede foi feita uma “entrevista chave” com uma jovem entre 15 e 24 anos. Essa primeira entrevista foi considerada o ponto de partida para a construção da rede social, portanto necessariamente a jovem que foi o ponto chave a partir do qual foi iniciada a formação da rede ficou grávida na adolescência. Cada entrevista durou por volta de uma hora, sendo que ao fim da mesma foi requisitado à jovem que indicasse três amigas próximas para serem entrevistadas – não excluindo a possibilidade de parentes – e que estivessem dentro da idade estipulada pela pesquisa, mas sem necessariamente terem ficado grávidas na adolescência. Assim foram feitas mais três entrevistas com as jovens indicadas pela “entrevista-chave”, que ao fim de suas próprias declarações também indicaram mais três amigas ou parentes, totalizando 13 entrevistas. Essa técnica, denominada pela literatura de “bola de neve”, é comumente utilizada para pesquisa de intenção de votos e marketing político, e possui como fundamento a busca de entrevistas em grupos fechados e

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de difícil acesso (VEIGA, GONDIM, 2001). No caso da nossa pesquisa o uso desta foi fundamental para possibilitar a identificação das relações de amizade entre as jovens e assim traçar as redes sociais entre amigas, parentas e vizinhas.

A Figura 1 representa o fluxograma seguido para a realização da rede entre as jovens entrevistadas. Estima-se que as entrevistadas indicariam contatos próximos - não somente próximos geograficamente, mas também aquelas com que elas tenham mais intimidade. O principal motivo para a realização das entrevistas seguindo o fluxograma acima vai de uma das hipóteses deste trabalho, de que as redes sociais que envolvem as jovens mães muitas vezes contribuem para a aceitação de uma gravidez na adolescência e possivelmente a concretização da maternidade, fortalecendo a construção da rede entre amigas, cunhadas e irmãs.

Figura 1 - Fluxograma das entrevistas

Fonte: Elaboração própria – pesquisa realizada na favela e nos bairros do centro-sul de Belo Horizonte

Uma vila/favela pertencente ao aglomerado da Serra foi escolhida para a realização da entrevista com a primeira jovem mãe. Como na favela os índices de gravidez na adolescência são consideravelmente altos em comparação com os bairros, não foi encontrada nenhuma dificuldade em realizar uma entrevista com uma mãe adolescente. Foi preciso que eu abordasse algumas jovens aparentemente da idade necessária para a realização da pesquisa, e perguntasse a elas se conheciam alguma jovem que possuísse as características para ser a “entrevista-chave”. Todos os nomes das entrevistadas foram modificados para manter a confidencialidade das mesmas.

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anos, mora na Serra a vida toda, tem um filho de 6 anos, se casou aos 17 anos com o pai de seu filho - que na época tinha 24, devido à gravidez. Ela morou por 2 anos com o parceiro, e separou porque, segundo ela, ele consumia álcool exageradamente.

Quadro 1 - Entrevistadas moradoras de Favela – Aglomerado da Serra, por principais características pessoais

Nome Idade Estado Cívil Nº de filhos Idade que ficou

grávida a 1ª vez Estudos Ocupação Com que mora

Relação com a entrevista-chave

ou indicação

Cíntia 24 Separada 1 17 8ª série

Faxineira do Hospital Evangélico

Mãe, duas irmãs,

filho e sobrinho Entrevista-Chave

Kelly 20 Namorando 1 18 8ª série Desempregada Mãe, duas irmãs,

filho e sobrinho Irmã de Cíntia

Tatiane 22 Separada 0 18 2º ano

Faxineira do Hospital Evangélico

Sozinha Vizinha de Cíntia

Marina 15 Solteira 0 - 1º ano Estudante Mãe, pai e irmão Vizinha de Tatiane

Angélica 21 Unida 1 20 3º ano Desempregada Parceira e o filho Vizinha de Tatiane

Luana 17 Namorando 0 - 3º ano Atendente de

padaria

Uma amiga e dois

amigos Vizinha de Cíntia

Tânia 23 Unida 2 15 8ª série Atendente de

loja

Marido e os dois

filhos Vizinha de Luana

Michelle 21 Namorando 0 (falecido) 17 3º ano Atendente de

padaria Prima Vizinha de Kelly

Josiele 16 Namorando 0 - 2º ano Estudante Pai, mãe e irmão Vizinha de Kelly

Marimar 15 Solteira 0 - 1º ano Estudante Mãe, irmã e

irmãos

Tia de Cíntia, Kelly e Carla.Vizinha de

Kelly

Keyla 18 Namorando 0 - 3º ano Atendente de

loja

Mãe, irmã, irmão e sobrinho

Trabalha na loja próxima a casa de

Tatiane

Carla 15 Namorando 0 14 6ª série Estudante Mãe, irmãos e

dois sobrinhos

Irmã de Cíntia e Kelly e Sobrinha de

Marimar

Indiana 16 Namorando 0 Grávida de 4 meses 8ª série Desempregada Mãe e irmãos Vizinha de Luana

Fonte: Elaboração própria - pesquisas aplicadas no Aglomerado da Serra entre abril e dezembro de 2011

Já para as entrevistas na classe média, não pudemos “escolher” em que localidade o campo seria explorado, a não ser pela condição da moradia da jovem ser na região centro-sul de Belo Horizonte. Para localizar uma jovem de classe média que atendesse a exigências da entrevista-chave, recorri a alguns contatos que pudessem conhecer alguma jovem que fosse ou tivesse sido mãe na adolescência. Apesar de algumas dificuldades em localizar a primeira entrevistada, com a ajuda de terceiros, fui apresentada a uma moça que reside no Bairro Anchieta, em um condomínio fechado próximo ao bairro Sion, área nobre da cidade. Ela tem 24 anos e, coincidentemente, também teve seu primeiro filho aos 17 anos, sendo que o pai tinha 16 anos na época. A moça mora com seus pais, seu irmão e seu filho, nunca se casou, mas mantém contato com o rapaz nos finais de semana, quando o filho vai visitá-lo.

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Quadro 2 - Entrevistadas moradoras de Classe Média – Região Centro-Sul de Belo Horizonte, por principais características

pessoais

Nome Idade Bairro Estado Cívil Nº de filhosIdade quando

teve o 1º filho Estudos Ocupação Com que mora

Relação com a entrevista-chave ou

indicação

Sofia 24 Anchieta Solteira 1 17 Superior

incompleto

Estagiária de Desing de Interiores

Pai, mãe, irmão

e filho

-Giovana 24 Sion Namorando 0 - Superior

incompleto

Estudante de

Medicina Mãe e irmã

Amiga de escola (Sofia)

Joana 24 Funcionários Namorando 0 - Superior

completo

Engenheira de computação

Pai, mãe, dois irmãos

Amiga de escola (Sofia)

Juliana 24 Serra Namorando 0 - Superior

completo

Terapeuta

Ocupacional Pai, mãe e irmã

Amiga de escola (Joana)

Ana Paula 23 Anchieta Casada 0

-Superior

completo/Pós-graduação

Assistente

judiciária, no TJ Marido e sogra

Amiga do namorado (Joana)

Patrícia 24 Funcionários Namorando 0 - Mestranda Nutricionista Pai, mãe e irmã Colega de estágio

(Giovana)

Sara 17 Sion Solteira 0 - 3 º ano Estudante Mãe e irmã Irmã de Giovana

Rafaela 18 Funcionários Solteira 0 - Ensino médio Estudante Pai, mãe e

irmão

Vizinha do prédio (Joana)

Maria 23 Cruzeiro Solteira 0 - Superior

incompleto Estágiaria de RH Irmã e colega

Amiga de escola/cursinho

(Giovana)

Nathália 24 Anchieta Solteira 0 - Superior

incompleto

Estagiária de

Engenharia Pai e Mãe

Amiga de escola (Sofia)

Amanda 24 Santo

Antônio Namorando 0

-Superior

Completo Psicóloga Mãe e irmã

Amiga de escola (Nathália)

Bárbara 23 Mangabeiras Namorando 0 - Superior

incompleto Estagiária de Direito no Fórum Pai, Mãe e irmão Amiga de escola (Nathália)

Ludimilla 24 Lourdes Solteira 0 - Superior

incompleto

Estagiária de

Engenharia Pai

Amiga de faculdade (Nathália)

Fonte: Elaboração própria - pesquisas aplicadas na região Centro-Sul de Belo Horizonte entre julho/2011 e janeiro/2012

As análises dos dados foram feitas a partir de elaboração de um quadro de categorias, no qual serão destacados os principais temas a serem retratados para esse trabalho: como as redes sociais que ela forma/pertence, trabalho, escolaridade, autonomia da mulher, uso de contracepção, autonomia financeiro, perspectivas futuras, experiência sexual, maternidade, cuidado com os filhos, iniciação sexual, violência e preconceito.

3. Resultados

3.1 As redes sociais

As redes sociais possuem diferentes características e são influenciadas por diversos atributos sociais se transformando em uma diversidade de situações. Como o objetivo aqui era formar duas redes sociais de duas jovens que experimentaram a gravidez na adolescência em diferentes classes sociais, o principal fator de comparação serão os seus contatos e as suas principais características.

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Na rede social de Sofia (24), ela indicou três amigas do tempo de escola, que conhece há muitos anos. Atualmente ela não mantém um contato grande com as amigas, mas elas se comunicam e se encontram eventualmente. O motivo que levou Sofia a indicar Joana (24), Giovana (24) e Nathália (24), se deu pelo fato de na época que ela engravidou, as três serem muito amigas. Assim, as três amigas sabem o que aconteceu na época, e como foi para elas ver uma de suas amigas próximas ser mãe aos 17 anos. Elas não moram próximas, apesar de todas viverem na mesma regional. Nenhuma delas engravidou alguma vez.

A rede social de Cíntia (24) é bem menos homogenia do que a rede de Sofia. Ela indicou duas vizinhas e a sua irmã como contatos: Luana (17), Tatiane (22) e Kelly (20). Todas moram muito próximas, sendo que Cíntia e Kelly moram na mesma casa. Luana e Tatiane não têm filhos, entretanto Tatiane já ficou grávida duas vezes, mas perdeu o bebê, e Luana está planejando engravidar no momento, já que está em um relacionamento estável e pretende se casar. Kelly foi mãe com 18 anos, e possui a ajuda de Cíntia nos cuidados com o seu filho e vice-versa.

Após esses contatos iniciais, partimos para a terceira etapa da rede, e foi a partir dessa etapa que pude notar as principais diferenças. Consistentemente, na rede das jovens da favela, era indicada uma jovem ou adolescente que já havia sido entrevistada, então eu pedia para que novamente ela se lembrasse de outra amiga. Todas as jovens da rede da favela se conhecem. Mesmo que de vista ou apenas de nome, todas sabem quem é quem e detalhes sobre a vida delas, como quem tem filho ou quem é casada. Ao contrario da rede da classe média. Apenas uma entrevistada da terceira etapa está familiarizada com Sofia, que é Sara (17), irmã de Giovana (24), de resto, nenhuma a conhece.

Essa característica encontrada da rede da favela é observada também no estudo de Marques (2010) sobre redes sociais de pessoas pobres em São Paulo. As redes de pessoas pobres comparadas às redes de pessoas de classe média atingiu uma variabilidade muito inferior no número de esferas sociais, fazendo com que elas fossem caracterizadas como homofílicas e limitadas pelo espaço geográfico.

Da mesma forma que no estudo de Marques (2010), na rede formada aqui, a proporção de indivíduos que moravam próximos e participavam da esfera da família também foi diferente entre classes. Essa foi bem maior entre as jovens da favela, no qual o parentesco foi identificado entre irmãs, tias/sobrinhas e primas.

Apenas uma conexão da classe média em relação à vizinhança foi detectada. Rafaela (18) foi indicada por Joana (24) e elas moram no mesmo prédio. Apesar disso, elas não são próximas. O seu contato é maior devido a uma amizade entre Rafaela e o irmão mais novo de

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Joana, que tem a idade da jovem. Observa-se que a maioria das jovens da rede da classe média possui idades parecidas, entre 23 e 24 anos. Isso porque a maioria dos contatos era de amigas de escola ou de faculdade, o que incita a uma homogeneização da idade entre elas.

Contrariamente, as relações de vizinhança foram as indicações mais comuns ocorridas entre as jovens da favela. Todas moravam muito próximas entre si, e como já mencionado anteriormente, todas se conhecem. Outro fator que chama a atenção na rede de jovens da favela é o número delas que já experimentaram ou experimentam a gravidez. A jovem que engravida ou tem filho acaba por ter um “apoio” das outras jovens enquanto sua condição seja fornecendo presentes ao enxoval ou cuidando da criança quando necessário. Carla (15) cuida dos filhos de suas irmãs para que elas possam trabalhar ou sair. Ela já ficou grávida, mas perdeu o bebê há alguns meses. Para ela foi normal que as irmãs tivessem tido filho, e não liga de cuidar de seus sobrinhos.

Essa condição acaba por ser aceita dentro do grupo, já que a incidência de gravidez é bastante alta entre as jovens de classe socioeconômica mais baixa e suas consequências acabam por ser partilhadas pelo grupo. A gravidez na adolescência ou entre jovens é um fenômeno de caráter heterogêneo, o discurso das jovens a respeito dessa experiência será tratado mais a adiante.

A opinião e a participação do grupo no evento foram marcados como de extrema importância pelas jovens que engravidaram ou já são mães. Entretanto as formas de reconhecimento dentro do grupo, com relação à gravidez na adolescência foram bem diferentes. Ao descobrir que estava grávida Sofia (24) diz ter sentido tanta vergonha que não teve coragem de informar a nenhuma de seus conhecidos, apenas a amigos mais próximos, deixando que à medida que a sua barriga fosse crescendo as pessoas saberiam de sua condição.

Já na rede da favela, o fato de ter se casado logo após a descoberta da gravidez, deu a Cíntia (24) uma maior segurança enquanto seu estado de adolescente grávida dentro de sua rede. Ela disse ter sido a primeira de suas amigas a engravidar, e logo depois todas arrumaram filhos também. “Ser mãe acaba que é normal aqui... eu acho normal. Ninguém

acha estranho não sabe?” (Cíntia, 24 anos, um filho, Favela)

Ela diz não ter se preocupado com a reação das amigas quando descobriu aos 17 anos que iria ser mãe. A sua maior preocupação era com a reação de sua própria mãe. Apesar disso, a mãe de Cíntia não se importou com a gravidez da filha, porque segundo ela “eu já tava pra

casar mesmo”.

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e ser expulsa de casa, mas nenhum desses medos se concretizou apesar de seu pai ter ficado meses sem lhe dirigir a palavra. Nenhuma de suas amigas, nem na época que ficou grávida nem hoje tem filhos, e isso a torna diferente de seu grupo e sua rede social.

Foi um momento muito estranho da minha vida, porque eu lembro de muita pouca coisa, eu lembro das coisas piores tipo a reação do meu pai.[...] Mas também lembro dos meus amigos, indo viajar e eu barriguda ficando em casa. Tudo bem que na época eu não liguei porque eu tava toda apaixonada com o Matheus [pai do filho] e tava esperando o neném, mas hoje eu vejo que podia ter sido diferente...a minha adolescência. (Sofia, 24 anos, um filho, Classe Média)

Ao contrário de Sofia, a rede social de Cíntia lhe proporcionou reconhecimento dentro do grupo, ela foi à primeira de suas amigas a casar e ter filho, e logo muitas delas também seguiriam esse caminho. Por isso, não foi “difícil” para ela aceitar a gravidez, na medida em que sua condição era por assim dizer “esperada” pela sua rede. “Achei legal ter um sobrinho!

Minha mãe nem ligou também dela ter filho nova não... nem ela nem eu ela ligou. Ela também ganhou a Cíntia com 17.” (Kelly, 20 anos, um filho, Favela)

A maternidade e a gravidez na adolescência possuem diversos tipos de interpretações de acordo com o contexto de cada jovem. Especialmente em se tratando das redes de cada uma delas, ficou claro que na favela as redes são mais homofílicas e constituídas por laços de vizinhança locais, enquanto na classe média, a rede possui caráter heterogêneo com pontes independentes entre os seus indivíduos.

3.2 Juventude e maternidade

São muitas as discussões sobre a definição e os papéis do jovem e do adolescente na sociedade contemporânea. As falas coletadas nas entrevistas, tanto na classe média quanto na favela, foram muito semelhantes para a definição do que é ser jovem entre elas. Entretanto, a discrepância aparece ao se indagar se a entrevistada se sente ou não como uma pessoa jovem. Percebe-se pela fala de algumas delas que a juventude é um estado de espírito, no qual a idade muitas vezes não interfere na sua forma de se sentir jovem. Essa fase é associada à irresponsabilidade, curtição e aventuras, no sentido de estar sempre sujeito a novidades e ao crescimento pessoal. O discurso entre as classes sobre a definição do jovem é muito próximo, mas a realidade se mostra diferente.

Ah não sei, pra mim jovem é aquele que tem muitos planos para o futuro, tem uma visão de futuro bem longa ainda, que gosta de aproveitar a vida do seu jeito

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Ser jovem pra mim é passar a conhecer a vida, sei lá, passar a conhecer as coisas novas que vem pela frente. (Luana, 17 anos, namorando, Favela)

Como a definição de “jovem” ficou muito agregada a essa perspectiva de novos rumos e tempo para “aproveitar a vida”, qualquer característica ligada a responsabilidade de modo geral foi contraposta a realidade de uma pessoa jovem. Quando perguntei à Cíntia (24) e a Angélica (21) se elas se sentiam como jovem, ambas me responderam negativamente dizendo:

Não acho 24 anos jovem não, jovem não paga aluguel, jovem vive bem com o seu pai e sua mãe, eu tenho filho, tenho responsabilidade [...] a partir do momento que tem filho, tem responsabilidade com menino não é jovem mais não. Têm jovens, alguns, que não tem muita responsabilidade, que é mais rebelde, uma pessoa que tem responsabilidade não tem como ficar achando que a vida é de brincadeira porque não é. (Cíntia, 24 anos, um filho, Favela)

Eu não sou jovem, depois que a gente tem filho a gente não é mais jovem não. Antes eu saia muito, não tinha responsabilidade. Sinceramente eu acho que juventude é uma fase e ser mãe é outra, eu acho que quem pode tentar, é... eu, eu tive meu filho eu tinha quase 20 anos, não me arrependo não, tive até numa idade melhor que muita, assim né? Tipo 13, 14...(Angélica, 21 anos, um filho, Favela).

Ser mãe marca, segundo os discursos das entrevistadas, uma atitude relacionada a um papel esperado de uma pessoa adulta. Por isso a manifestação contrária de algumas de entrevistadas sobre as mães na adolescência. Para estas é difícil, ou impossível, que uma adolescente possa criar uma criança sem que ela passe a se portar como com mais “responsabilidade”, ou seja, parar de sair e se divertir com os amigos. Essa idéia vai do que Gonçalves e Knauth (2006) falam sobre o lado oposto de “aproveitar a juventude” e a gravidez na adolescência.

3.3 Escola, trabalho e segregação

Como descrito na caracterização das jovens, muitas delas moradoras das favelas não completaram o ensino fundamental ou o médio, algumas estão na escola, mas bastante atrasadas para a idade. Nenhuma delas está na universidade, apesar de algumas relatarem planos de ingressar no ensino superior. Foi comum quando perguntei sobre a escolaridade, aquelas que já tinham se formado no 3º ano do ensino médio dizer “já ter acabado de estudar”. A falta de perspectiva de continuação dos estudos acontece muitas vezes em função da urgência de trabalhar para ajudar nas despesas da casa ou com os filhos.

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Eu acabei a escola com 18 anos e já comecei a trabalhar pra ajudar a minha mãe...porque lá em casa tem minha irmã e meu sobrinho também né? Fica difícil pra ela...só que ai eu fiquei desempregada depois, mas agora eu já to de atendente de loja...uma lojinha lá de roupa. (Keyla, 18 anos, Ensino Médio, Favela)

Na classe média, com exceção das entrevistadas de 17 e 18 anos, todas ingressaram ou já se formaram no ensino superior. Sara (17) e Rafaela (18) planejam entrar para a faculdade esse ano, ambas para o curso de Medicina, e estão estudando para isso. “Eu acabei o terceiro

ano agora. Agora eu vou continuar estudando, fazendo cursinho pra tentar passar e cursar medicina.” (Rafaela 18 anos, Ensino Médio, Classe Média)

A importância dos estudos varia muito de acordo com a idade das jovens, e principalmente, de acordo com a classe social. As moradoras da favela relacionam muito os estudos com um “emprego bom” no qual elas não precisem fazer muito esforço físico e ganhem um bom salário. Já na classe média a importância dos estudos foi atribuída à formação pessoal e intelectual, sendo uma ferramenta auxiliar no processo de aprendizado e socialização no mundo.

Ai! Ter um futuro melhor. Uma profissão melhor, né. Pra... Trabalhar, eu penso assim, trabalhar menos, ganhar mais. (Michelle, 21 anos, Favela, 3º ano completo) Eu acho que a escola que amplia a visão da pessoa no mundo mesmo. Que traz conhecimento. Que traz, ah, sei lá, informação nova que faz a pessoa pensar. Acho que é isso também. Trazer informações novas, me fazer pensar, me fazer refletir sobre as coisas. (Maria, 23 anos, Classe Média, Ensino Superior em andamento)

Em relação às atividades laborais, a diversidade de trabalho ou bicos nas duas classes sociais foi grande. Entretanto na classe média as jovens costumam a trabalhar focadas naquilo que elas estão estudando, como um estágio de ensino superior. As jovens de favela relataram empregos não muito especializados, que não exigiam uma profissionalização para o cumprimento das tarefas. O emprego é tido muitas vezes como um valor próprio, no sentido de dar independência, tanto financeira quanto pessoal.

A precarização das atividades laborais é um fenômeno que têm atingido todo país (OLIVEIRA, NEVES, JAYME, 2008), sendo reflexo de crises econômicas e necessidade de especialização. Uma das consequências desta precarização foi uma baixa nas taxas de emprego de jovens entre 15 e 24 anos em todo Brasil (PNUD, 2002). Por outro lado, como ressaltam Jayme, Neves e Chacham (2010), esse fenômeno, que atinge ambos os sexos, afeta com mais intensidade as mulheres jovens e de classe social baixa, e por outro exibe a necessidade de especialização e de um processo de escolarização cada vez mais longo. Essas

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características associadas a uma socialização das oportunidades de trabalho faz com que esse fenômeno atinja com mais veemência as jovens de camadas socioeconômicas mais baixas e sem acesso a estudos e qualificação profissional de qualidade, reforçando assim os padrões de desigualdade social. (p.8).

Primeira vez que eu trabalho fixado né? Mas eu já fazia faxina, fazia bicos [...] desdos 17 anos eu venho fazendo, pegando bico, sem carteira assinada. (Cíntia, 24

anos, Faxineira do Hospital, Favela)

Das entrevistadas na favela, três relatam serem funcionárias do Hospital Evangélico, Cíntia (24) e Tatiane (22) são faxineiras e trabalham 12 horas diretas e folgam 36 horas a cada semana. Angélica (21) está desempregada, mas vai começar a trabalhar como recepcionista no Hospital em breve. No momento que ela foi entrevistada, estava recebendo seguro desemprego, e por isso estava aguardando o seu término para começar o novo emprego. Todas as três ocupações no Hospital foram indicação de terceiros, bem como muitos outros trabalhos das outras jovens, em ambas as classes.

As redes sociais são ferramentas importantes para a formação de empregos. Segundo Marques (2010) as sociabilidades do indivíduo de associam fortemente a uma possibilidade de emprego, sendo esse com possíveis graus de proteção ou confiança. Dependendo do grau de contatos primários do indivíduo, esses podem contar com trabalhos de características ligadas a padrões de proteção e pouca precariedade laboral.

Na favela, por exemplo, como a relação de sociabilidade possui características homofílicas e predominantemente locais, as atividades laborais tendem a se caracterizar como precárias, reforçando a segregação entre os indivíduos pertencentes à rede. Sumarizando, Marques (2010) afirma que as formas de precariedade dos empregos obtidos variam e dependem das formas de interação social que envolve padrões relacionais e também homofílicos (p.148).

A segregação é uma das variáveis que mais influencia da formulação dos planos relacionados a trabalho e estudos das jovens, segundo Kaztman (2001), a estrutura de oportunidade se define como possibilidade de acesso a bens e serviços e ao desempenho de atividades, a segregação faz com que os vínculos sociais existentes se enfraqueçam. Para Marques (2010) a segregação contribui para a formação de redes homofílicas, limitando mecanismos que medeiam acessos, influenciando decisivamente as condições de vida.

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Foram vinte e seis entrevistas, treze na favela e treze na classe média, e ao todo nove meninas já haviam ficado grávidas, sendo que dessas, sete eram mães. Encontramos uma mãe entre as jovens de classe média e seis na favela.

A prevalência de gravidez na adolescência em classes sociais mais baixas é exponencialmente maior do que em classe sociais médias ou altas. (HEILBORN et al 2006; CHACHAM et al, 2009). Como possível explicação para essa diferença, o GRAVAD afirma que em ambientes fortemente marcados pela desigualdade de gênero e classe social, a maternidade não representa um “problema” na vida da jovem, mas um reconhecimento social entre elas, que desprovidas de projetos educacionais e laborais, seguem as expectativas tradicionais em relação ao papel de gênero. (AQUINO, 2003, HEILBORN et al, 2006). Ressalta-se também que nem toda gravidez na adolescência e indesejada ou vista como um problema – social ou econômico, sendo interpretado como um fenômeno complexo e multifacetário. (HELBORN et al, 2006).

Eu queria, queria muito, mas foi só quando eu desisti que ele veio [...] fiquei por um lado chateada, por outro, conformada, porque eu tava nova né? Tava com 17 anos. [...] a gente queria, e depois desistiu, mas também não evitou não.[...] Ele reagiu muito bem, tava com 24 anos, a família dele ficou conformada. (Cíntia, 24

anos, um filho, separada, Favela)

Se deixar eu falo assim, entre aspas, assim não é planejar vou ter não, entendeu, mas aconteceu mas foi... safadeza minha! Eu não pensava. Não porque antes, quando assim, eu namorava, eu era muito doidona. Então eu ficava com esse, eu ficava com outro sem eu pensar nessas coisas. [...](Tânia, 23 anos, dois filhos,

casada, Favela)

Na classe média a única jovem que já engravidou relatou ter sofrido muito ao descobrir a gravidez. Apesar de não ter usado nenhum preservativo na época em que namorava o pai do seu filho, Sofia (24) afirmou que não foi planejada a sua gravidez, e que ela acreditava ter algum problema hormonal, já que ela se relacionava sexualmente há um ano sem proteção e nunca havia engravidado.

Atrasou né? E como eu não tomava anticoncepcional, eu tinha uma menstruação muito louca assim, às vezes eu ficava menstruada um mês no outro não, e eu tinha certeza que nada ia acontecer comigo, não usava camisinha nem pílula e não ia acontecer nada comigo...burra né? (Sofia, 24 anos, um filho, solteira, Classe

Média)

Nesse trabalho tem-se como hipótese que a condição de mãe e mulher casada nas classes socioeconômicas baixas, apresenta uma aceitação e um reconhecimento positivo

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dentro do meio social. Luana (17), por exemplo, afirmou que engravidar não seria um problema, já que o namorado assumiria a sua condição de pai e se casaria com ela. A reação dos amigos foi algo muito explorado no roteiro, já que era a partir de contatos próximos que foi constituída a rede social da entrevistada. Como esperado observou-se uma aceitação maior em favor da gravidez pelas jovens da favela do que pelas jovens da classe média.

Minha irmã [Cíntia] engravidou com 17 anos, eu tenho outras amigas que tem filhos também, mas não sei a idade que cada uma teve não. Achei normal, ela queria ter filho mesmo ai ela teve. Comigo elas falaram que eu era doida, deu ter menino assim cedo, mas acabou que agora elas têm filho também. (Kelly, 20 anos,

um filho, Favela)

As amigas da rede de Sofia (24) aceitaram a sua condição, contudo as três indicadas na rede relataram sentir surpresa com o fato, já que todas cresceram juntas e tiveram a mesma educação. O fato de ela ter engravidado na adolescência foi atribuído pelas amigas como uma irresponsabilidade e falta juízo. No discurso de Sofia, ela atribui ao seu antigo namorado – pai de seu filho – um papel muito importante na sua vida na época. Ao estar apaixonada, ela não se importava com outros fatores com escola ou seus amigos, ela apenas o seu relacionamento com Matheus que implicava na sua vida. Segundo ela foi depois da primeira relação sexual dos dois que tudo começou a mudar.

Pra gente, a gente tinha virado adulto né? Com 15 anos! Virou adulto, “agora eu transo e sou foda!” (risos), mas assim, melhorou muito a relação, porque a gente ficou muito mais próximo, muito mais íntimo, só que a partir daí a gente ficou na nossa "bolha", era eu e o Matheus e nada mais no mundo entendeu? (Sofia, 24

anos, um filho, Classe Média)

Depois de considerar a opinião de Sofia sobre juventude e maternidade, concluímos que a jovem não "perdeu" ou pulou a etapa da juventude, como ocorreu com as jovens da favela, que abandonam os estudos e se ingressaram de maneira precária no mercado de trabalho para ajudar no sustento do filho. Sofia está perdendo o papel de “ser mãe” já que a educação e sustento de seu filho é dado na maioria das vezes pela avó e pelo avô, que o trata como filho, assim como a tratam também.

3.5 Considerações Finais

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duas redes sociais a partir dos contatos de duas jovens que engravidaram na adolescência em diferentes classes sociais. Consideramos que a pesquisa com as jovens nos possibilitou uma aproximação da forma como elas vivenciam e reproduzem o seu papel como mulher ou adolescente grávida entre si, seja por meio das experiências vividas ou por meio das representações existentes no grupo acerca daquela situação.

Ao assinalamos que os meios de socialização entre as redes sociais se diferenciam por classe social, percebemos que a grande maioria das entrevistadas moradoras da favela se conhecem através das relações de parentesco e vizinhança, enquanto na classe média as relações foram construídas por intermédio das instituições cursadas pelas jovens, como a escola, faculdade ou trabalho. Apesar de esperar que a rede social mapeada na favela apresentasse um resultado homogêneo, nunca esperaria que fosse possível constituir uma rede na qual todas as entrevistadas se conhecessem e morassem tão próximas uma das outras. Ao contrário da rede das jovens de classe baixa, a rede da classe média cumpriu as minhas expectativas, sendo bem mais heterogênea em relação ao local de moradia e ocupação, e por, em geral, não incluir parentas ou vizinhas. Entretanto, não esperava que a rede da classe média mantivesse um padrão de idade tão consistente quanto o encontrado. Apenas duas jovens não tinham entre 23 e 24 anos na rede, e isso se deu principalmente pela socialização nas classes médias terem sido produzidas inicialmente em ambiente escolar.

O estudo aponta uma aceitação bem maior a respeito do fenômeno dentro da rede da favela, no qual o discurso das jovens tende a não “dramatizar” a ocorrência da gravidez entre ela ou entre as amigas. A forma como as jovens moradoras da favela veem ou reconhecem o fenômeno dentro do grupo gera status e reconhecimento da adolescente ou da jovem com as amigas, tornando a sua condição de mãe como um elemento constituído de sua identidade dentro do seu meio social. Junto a isso, ela possui o apoio e a ajuda das amigas e parentas na maioria das vezes que precisa, reforçando o capital social entre as jovens.

Dentro de ambientes segregados e não-segregados, são formados diferentes construções de capital social. Alguns tipos de comportamentos e valores são reforçados e legitimados pelo grupo, como é o caso das jovens da favela, que, ser mãe na adolescência não é considerado como um problema grave ou uma situação ligada à vulnerabilidade social. O que pudemos perceber principalmente no grupo mais fechado e mais homofílico foi que o capital social construído entre as jovens é potencializado pela ocorrência da gravidez, intensificando as relações entre os contatos mais próximos.

A percepção do significado da gestação também variou muito entre as duas redes mapeadas. A fala das entrevistadas indicou que o impacto dessa experiência de vida no

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desenvolvimento da jovem assume diferentes contornos conforme a sua classe social. Curiosamente, apesar dos discursos das jovens da classe média ter sido em geral bem negativos à respeito da experiência da gravidez na adolescência, nessa classe social, a ocorrência do evento tende a não prejudicar o percurso de estudos e obtenção de emprego da jovem, em comparação com a favela, devido a uma maior disponibilidade de recursos e apoios na forma de lidar com essa circunstância e suas demandas. Pelo que pudemos observar a perspectiva de futuro da adolescente grávida na classe média não foi afetada tão profundamente quanto à perspectiva das jovens e adolescentes moradoras da favela, considerando-se principalmente os aspectos de escolarização e profissionalização. A segregação contribui para que essa realidade se efetue, apresentando as jovens e adolescentes da classe média maiores oportunidades de estudos e especialização no trabalho.

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REFERENCIAS

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