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O planeamento fiscal e os problemas de aplicação da cláusula geral anti-abuso : proposta de resolução

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O Planeamento Fiscal e os

Problemas de Aplicação da

Cláusula Geral Anti-Abuso:

Proposta de Resolução

Trabalho Final na modalidade de Dissertação apresentado à Universidade Católica Portuguesa para obtenção do grau de mestre em Auditoria e Fiscalidade

por

Joana Maria Araújo Antunes

sob orientação de

Professora Doutora Luísa Anacoreta Correia

Faculdade de Economia e Gestão Julho 2014

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A todos vós que tornaram este trabalho possível e que só por vós faz sentido tanto esforço e dedicação: aos meus pais, ao meu irmão, aos meus amigos (que são a família que eu escolhi) e aos meus Colegas. A Todos! Deixo-vos o meu mais sincero, Obrigado!

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Agradecimentos

Dirijo a minha primeira palavra de agradecimento à minha Orientadora, Professora Doutora Luísa Anacoreta, pelos ensinamentos transmitidos, por sempre me ter apoiado na superação dos problemas que foram surgindo ao longo desta etapa. Agradeço ainda a compreensão demonstrada com todas as dúvidas e inquietações e a demonstração, desde o primeiro dia, de preocupação com o meu percurso académico na Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa.

Dirijo, igualmente, um agradecimento a toda a equipa de Global Compliance Services and Corporate and International Tax Structuring, da PricewaterhouseCoopers, onde efetuei o meu estágio. Um agradecimento especial à Ana Reis, Senior Manager, e a toda a equipa, com quem tive a sorte e o privilégio de colaborar e aprender.

Por último, mas não menos importante, quero também agradecer a todos os meus Colegas, que trabalham comigo na sociedade Rios, Pinho e Cristo, Sociedade de Advogados pelo infindável apoio que me prestaram para a elaboração da presente dissertação e em especial ao meu patrono de estágio Dr. Paulo Rios de Oliveira, pela compreensão que sempre demonstrou face às necessidades de tempo que teve que ser despendido a favor desta investigação.

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Resumo

O presente estudo versa sobre a Cláusula Geral Anti-Abuso, como limite ao planeamento fiscal, procedendo-se à identificação e análise dos problemas suscitados na sua aplicação, indicando-se, à final, uma proposta de resolução.

Essencialmente interessa perceber quais os princípios constitucionais subjacentes à CGAA, sobretudo o princípio da liberdade de gestão fiscal, que reflete o direito dos contribuintes ao planeamento fiscal.

Assim por recurso à revisão de literatura como metodologia de investigação, procedeu-se à análise dos vários tipos de planeamento fiscal, para seguidamente analisar aquele que é considerado o maior limite ao planeamento fiscal criado no ordenamento jurídico português, a Cláusula Geral Anti-Abuso.

Aqui chegados, e perante a constatação dos problemas de aplicação da CGAA, indicar-se-á uma solução que tenha em vista garantir a segurança tributária e proteção da confiança dos contribuintes, a liberdade de gestão fiscal e finalmente o combate justo e equitativo à evasão fiscal.

Palavras-chave: Planeamento Fiscal; Cláusula Geral Anti-Abuso; Liberdade de Gestão Fiscal.

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Abstract

The present study covers the General Anti-Abuse Rule, regarded as a limitation to tax planning, through the identification and analysis of the main problems arising from its application, followed by the indication of a possible solution.

In essence, it is important to understand the GAAR’s underlying constitutional principles, mainly the freedom of fiscal management, which reflects the taxpayers’ right to an effective tax planning.

Therefore, using an investigation methodology based on the revision of literature, at first the several types of tax planning were analyzed in order to, as a next step, enable the analysis of the GAAR, considered by many the major limitation to tax planning that has been created in the Portuguese legal system.

Finally, following the identification of some problems in the application of the GAAR, this work is intended to indicate a solution that is able to ensure fiscal security and the protection of the taxpayers’ expectations, the freedom of fiscal management as well as a fair and proportional fight against tax evasion.

Keywords: Tax Planning; General Anti-Abuse Rule; Freedom of Fiscal Management

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Índice

Agradecimentos ... iv

Resumo ... vi

Abstract ... viii

Índice ... x

Índice de Figuras... xiii

Glossário ... xv

Capítulo 1 - Introdução ... 18

Capítulo 2 - O Planeamento Fiscal ... 22

1. Questão Prévia: A Justiça Tributária no âmbito das operações de planeamento fiscal ... 22

2. As situações de planeamento fiscal ... 27

2.1 A terminologia: Evasão, Elisão e Fraude Fiscal ... 29

2.2 Planeamento fiscal ... 30

2.2.1 Situações que não configuram planeamento fiscal ... 30

2.2.2 Planeamento fiscal intra legem... 31

2.2.3 Planeamento fiscal extra legem ... 34

2.2.4 A divergência das considerações sobre a natureza do planeamento fiscal: A zona cinzenta... 39

2.2.5. Planeamento fiscal contra legem ... 47

Capítulo 3 - A Cláusula Geral Anti-Abuso Face à Liberdade de Gestão da Carga Fiscal ... 52

1. Os elementos constitutivos da Cláusula Geral Anti-Abuso (analisados na perspetiva do Direito de Gestão Fiscal) ... 54

1.1 O elemento meio ... 56

1.2 O elemento resultado ... 59

1.3. O elemento intelectual ... 62

2. O abuso de direito na jurisprudência do Tribunal de Justiça na apreciação de casos de aplicação de normas anti-abuso. ... 64

3. Os Problemas Subjacentes à Cláusula Geral Anti-Abuso ... 68

3.1 Os princípios Constitucionais subjacentes à Cláusula Geral Anti-Abuso . 69 3.1.1 Princípio da legalidade tributária: a tipicidade e a determinação ... 70

3.1.2 O princípio da segurança tributária ou da proteção da confiança ... 71

3.1.3 O princípio da igualdade tributária: a Justa Tributação e a Liberdade de Gestão Fiscal ... 72

3.2 A dificuldade e a discricionariedade na aplicação da Cláusula Geral Anti-Abuso ... 75

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3.2.1 Discricionariedade na aplicação da CGAA ... 77

Capítulo 4 - Proposta de Resolução ... 80

1. Unidade de Aconselhamento à Aplicação da Cláusula Geral Anti-Abuso (UACGA) ... 80

1.1. Independência do órgão consultivo ... 81

1.2. Obrigatoriedade do parecer do órgão consultivo ... 83

1.3 Carater não vinculativo do parecer ... 85

2. A Harmonização dos Elementos de Aplicação da Cláusula Geral Anti-Abuso ... 86

Capítulo 5 - Conclusão ... 92

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Índice de Figuras

Figura 1 - Confrontação da decisão do processo n.º 47/2013-T com a do processo. n.º 43/2013 ... 42 Figura 2 - A fraude Carrossel ... 48 Figura 3 – O esquema que ficou conhecido por “Operação Furacão” ... 51

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Glossário

Autoridade Tributária – Autoridade Tributária e Aduaneira AoL – Abuse of law

CIRC – Código do Imposto sobre as Pessoas Coletivas CIRS – Código do Imposto sobre as Pessoas Singulares CGAA – Cláusula Geral Anti-Abuso

CRP – Constituição da República Portuguesa

CPPT – Código de Procedimento e Processo Tributário DL – Decreto-Lei

EUA – Estados Unidos da América

FATCA - Foreign Account Tax Compliance Act FMI – Fundo Monetário Internacional

FTA - French tax authorities GAAR – General Anti Abuse Rule HMRC – HM Revenue&Costume

IRC – Imposto sobre as Pessoas Coletivas IRS – Imposto sobre as Pessoas Singulares IVA – Imposto sobre o Valor Acrescentado Lda. – Sociedade por quotas

LGT – Lei Geral Tributária

OBEGEF – Observatório de Economia e Gestão de Fraude PIV – Pedido de Informação Vinculativo

PT – Portugal

RGIT – Regime Geral das Infrações Tributárias ROC – Revisor Oficial de Contas

S.A. – Sociedade Anónima

SEC- Sociedade Estrangeira Controlada

SGPS – Sociedade Gestora de Participações Sociais TCA – Tribunal Central Administrativo

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TJ – Tribunal de Justiça da União Europeia TOC – Técnico Oficial de Contas

UE – União Europeia

VPT – Valor Patrimonial Tributário ZFM – Zona Franca da Madeira

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Capítulo 1

Introdução

A presente dissertação vem confrontar dois grandes princípios, por um lado, o princípio da liberdade de gestão da carga fiscal e, por outro lado, o princípio da justiça na tributação.

Segundo Camus (1953) não o devemos ignorar: é difícil conciliá-las. A crer na História, pelo menos, nunca foi possível. Como se houvesse nestes dois princípios uma intrínseca incompatibilidade. Como poderiam não a ter? A liberdade para cada um é também a liberdade do banqueiro, ou do ambicioso: depressa a injustiça se instala. A justiça para todos é a submissão da personalidade ao bem coletivo: como falar então de liberdade absoluta? (…) Devemos pois renunciar a esse esforço inútil? Não, não devemos renunciar. É preciso simplesmente tomarmos consciência dessa imensa dificuldade em as conciliar e tornar essa dificuldade evidente para aqueles que, ainda que animados de boa-fé, tudo querem simplificar. Para o demais, saibamos somente que é esse o único esforço pelo qual, nos dias de hoje, vale a pena viver e lutar.

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Terminados dois semestres letivos de mestrado e após um ano de estágio na PriceWhaterhouseCoopers, no departamento de Global Compliance and Corporate and International Tax Structuring, e face à manifestação de um profundo interesse profissional pelo direito fiscal, na vertente empresarial, eis que definiu-se como tema de trabalho final de mestrado, o planeamento fiscal das empresas.

Optou-se por este tema por envolver decisões e operações societárias que têm como finalidade alcançar vantagens do ponto de vista fiscal, e ainda por ser um tema ligado à gestão, já que a carga fiscal tem impacto nas demonstrações financeiras das empresas. Desta forma, tendem sempre os gestores a incrementar o lucro das empresas, procurando medidas de poupança fiscal assumindo um maior ou menor risco nas decisões de planeamento fiscal. Considera-se, igualmente, que este será um tema intemporal, já que tal como expressou Benjamin Franklin “na vida só existem duas coisas certas: a morte e os impostos.”

Neste seguimento, a CGAA representa um dos limites impostos por lei ao próprio planeamento fiscal e tem como objetivo combater práticas de evasão fiscal, garantindo a justiça na tributação dos rendimentos.

Certo é que, os contribuintes cada vez são mais astutos nas suas práticas de planeamento fiscal, dificultando as tarefas do estado no controlo da evasão e fraude fiscal, pelo que a autoridade tributária tem vindo a deparar-se com novas operações societárias que lhe fazem indagar sobre a aplicação da CGAA.

Assim, nas operações que têm como objetivo a obtenção de vantagens fiscais, o contribuinte haverá que medir o risco de aplicação da CGAA. Sendo que, a prática leva-nos a concluir que, em todo o caso, a Administração Tributária haverá sempre de considerar legítima a aplicação da CGAA, ainda que em desrespeito pelos princípios constitucionais inerentes à liberdade de gestão da carga fiscal.

Diante mão, questionou-se, desde logo, a própria existência da CGAA, visto que, a forma como está instituída pode levar a uma atuação abusiva por parte da autoridade tributária e consequentemente à violação de princípios constitucionais, como o princípio da segurança fiscal ou confiança dos contribuintes. Porém, a

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revogação da norma que prevê a CGAA não foi o caminho defendido no âmbito desta dissertação, pois ainda que se constatem objeções e dificuldades na sua aplicação, a CGAA configura no nosso ordenamento jurídico o principal meio de limitação do planeamento fiscal.

Assim, delimitou-se o objeto de estudo da presente dissertação à CGAA, como limite ao planeamento fiscal, apreciada com base no princípio da liberdade de gestão da carga fiscal do contribuinte.

O objetivo do trabalho aqui desenvolvido é contextualizar a CGAA no planeamento fiscal, e de forma crítica perceber quais os motivos subjacente aos seus reais problemas de aplicação, fazendo-se uma análise comparada com outros ordenamentos jurídicos. Em consequência, introduziu-se uma solução, que visa uma aplicação justa da CGAA e que se entende que poderá vir ajudar o estado na luta contra a evasão e fraude fiscal.

A metodologia utilizada para a elaboração da dissertação foi a revisão de literatura.

De acordo com Hart (1998), a revisão de literatura consiste na seleção de documentos disponíveis (publicados e não publicados) sobre o tema, que contêm informações, ideias, dados e evidências escritas sob uma determinada perspetiva, de forma a alcançar determinados objetivos ou expressar um ponto de vista sobre a natureza do tema e como este irá ser investigado, e a efetiva avaliação desses documentos em relação à pesquisa proposta.

Este estudo tem relevância, desde logo pela identificação dos problemas e dos pontos negativos subjacentes à aplicação da CGAA, bem como à ponderação sobre a forma como a CGAA se encontra configurada no ordenamento jurídico português. Neste seguimento, suscitam-se questões, das quais se pretende obter resposta, nomeadamente, se a CGAA será eficaz como limitação ao planeamento fiscal? O porquê da escassa apreciação de situações de aplicação da CGAA pelos tribunais administrativos e fiscais? E do ponto de vista da constitucionalidade

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legal, haverá alguma coisa que se possa dizer? O que deve ser feito no sentido de melhorar aquilo que é hoje a CGAA?

Assim, inicia-se o presente estudo com um enquadramento das situações de planeamento fiscal, distinguindo-se entre planeamento fiscal lícito e planeamento fiscal ilícito, bem como uma abordagem relativamente à zona cinzenta de aplicação da CGAA face à subjetividade e discricionariedade do aplicador da lei na análise dos elementos da CGAA. Em seguida serão analisados criticamente os elementos da CGAA, identificando-se quais os seus problemas de aplicação.

Por último, através de uma análise de direito comparado, avança-se com uma proposta para aplicação da CGAA em Portugal, que passaria pela criação da Unidade de Aconselhamento à Aplicação da CGAA, que visaria o controlo da legalidade e evitaria igualmente situações abusivas.

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“(…) O maior jugo de um reino, a mais pesada carga de uma república são os imoderados tributos. Se queremos que sejam leves, se queremos que sejam suaves, repartam-se por todos. Não há tributo mais pesado do que a morte, e contudo todos o pagam, e ninguém se queixa, porque é tributo de todos (…)”

(Padre António Vieira)

Capítulo 2

O Planeamento Fiscal

1. Questão Prévia: A Justiça Tributária no âmbito das

operações de planeamento fiscal

O estado português, como estado de direito democrático, para poder prosseguir as suas atribuições e incumbências, visando a realização da democracia económica, social e cultural, necessita de ter recursos financeiros.

A nossa Constituição prevê um conjunto de direitos e deveres fundamentais atribuídos a todos os cidadãos. Mas, é no âmbito dos deveres fundamentais, nomeadamente os deveres ligados à vida económica, social e cultural com relevância constitucional (p. ex. direito à segurança social, à saúde e ao ensino) que assume particular importância e relevo o poder financeiro do estado, sob pena de sem o cumprimento desses deveres, se frustrar a efetivação de direitos

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fundamentais ou de interesses difusos e as correspondentes incumbências do estado. 1

Quer-se com isto dizer que, a sustentabilidade do estado social e a garantia da efetivação de direitos e liberdades fundamentais está dependente da capacidade financeira e económica do estado.

Ora, “o Estado Português, é um estado fiscal, cujas necessidades financeiras são essencialmente cobertas por impostos. Pelo que, o pagamento de impostos é essencial para a subsistência do Estado Português” (Casalta Nabais, 2005)

Tal como afirma Saldanha Sanches & Taborda da Gama (2005) “não há Estado sem Direitos, nem Direitos sem Impostos.” Acrescentam os mesmos autores,

Qualquer recurso financeiro que o Estado despenda tem como fonte quase exclusiva os impostos pagos pelos cidadãos, uma vez que, na atual configuração econômica do Estado, este não gera por si – ou gera muito pouca- receita desde que abandonou o papel de produtor. (…) Todas as tarefas que uma Constituição dirige ao Estado não passam das páginas impressas das constituições sem o mínimo de substrato financeiro. Assentaram, por isso, na concretização que se for dando (ao princípio do) Estado Social.

Assim, prevê a CRP, no artigo 103.º, o seguinte: “O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza.” Sendo que, consta do artigo 9.º, al. d) da CRP, quais as tarefas fundamentais do estado, nomeadamente: “promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efetivação dos direitos económicos, sociais, culturais e

1 Sobre esse tema confrontar: Miranda, Jorge, “Direitos Fundamentais”, Tomo IV, 3ª edição, Coimbra: Coimbra

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ambientais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais.”

Porém, o que tem vindo a acontecer é que as necessidades abruptas de tesouraria e de financiamento do estado português desencadearam uma tomada de medidas que em grande parte se traduziram num “enorme aumento de impostos”, originando uma clara asfixia económica e fiscal.

A partir de então, é geral o sentimento por parte de quem paga os impostos de que os mesmos servem antes de mais para alimentar uma máquina gorda- o estado português - e em muito pouco para a concretização dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

Com efeito, a crise económica e financeira, o crescente desemprego, e o consequente decréscimo do poder de compra por parte dos portugueses, acrescidos do aumento de impostos vem, impreterivelmente, criar e aumentar o número de situações de planeamento fiscal e, em casos mais graves, fuga, evasão fiscal e fraude fiscal.2

De acordo com Pinheiro Pinto (2009), “efectivamente, não será razoável esperar que alguém que possa legalmente pagar menos impostos opte por procurar uma via alternativa que o conduza a um pagamento acrescido.”

O que se procura esclarecer é o seguinte: até onde pode ir o direito dos cidadãos a pagar menos impostos? Por referência à afirmação supra referenciada de Pinheiro Pinto, em quê que se traduz o poder de “legalmente pagar menos impostos”?

O planeamento fiscal elisivo, ilegal, fraudulento, realizado sem qualquer transparência é causador de uma enorme injustiça tributária, que se traduz essencialmente no seguinte: por uns não pagarem os impostos que deveriam e que

2 De acordo com Afonso & Gonçalves, 2012, a economia paralela em Portugal tem vindo a aumentar e acredita-se

que no futuro mantenha a mesma tendência de crescimento. Este mesmo estudo revela que a economia paralela subiu 4% em 2012. Passando de 25,49% em 2011 para 26,74% em 2012.

Ademais, um estudo da OCDE divulgado no âmbito da apresentação do plano de ação europeu mostra que a perda fiscal associada às atividades clandestinas ou paralelas na economia vale 23% da receita fiscal total (12,3 mil milhões de euros de prejuízo fiscal), nível que está acima dos 22,1% de média comunitária.

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estão legalmente obrigados, outros terão um encargo acrescido, de forma a compensar a perda de receita fiscal do estado, por via de regra os trabalhadores dependentes.3

O que aqui se defende é que, apesar de existir um dever e obrigação geral de pagar impostos, está na liberdade do contribuinte planear, gerir, tomar opções relativamente às suas contribuições, pois a atuação dentro da lei e de acordo com princípios legais nacional e internacionalmente definidos poderá originar uma diminuição legal e legítima da carga fiscal.

Tende-se a acreditar que, num estado onde exista um sistema de impostos justo e proporcional às necessidades da população, haverá certamente uma menor procura de planeamento fiscal com vista à redução das contribuições a pagar. No entanto, a justiça e a proporcionalidade no sistema de impostos português está longe de ser alcançada.

Assim, pretende-se apelar ao leitor a ter em consideração a seguinte dicotomia, por um lado o abuso subjacente à atuação do contribuinte por querer pagar menos impostos recorrendo a planeamento fiscal, por outro lado, o abuso subjacente à atuação da autoridade tributária que, com a finalidade de angariar cada vez mais

3Taborda da Gama (1999) sobre o princípio da Justa Tributação refere o seguinte, cada um deve ser tributado de

acordo com a sua capacidade contributiva. Assim sendo, claro se torna que este princípio também é manifestamente abalado pela realidade elisiva. Sucintamente, pode dizer-se que sempre que se dá um caso de elisão fiscal:

1. Não se tributam manifestações de capacidade contributiva, nem o lucro real das empresas ou rendimento real dos contribuintes singulares.

2. Há uma desigualdade entre aqueles que cumprem os seus deveres de cidadania e solidariedade e os que, condenavelmente, o não fazem.

3. Há também uma desigualdade entre quem tem meios para recorre a uma assessoria fiscal eficaz, e os que não têm. Discrimina-se assim em função do poderio económico.

4. Aqueles que continuam a evitar actos elisivos vão ter de “compensar” as não contribuições dos outros, aumentando assim indirectamente a (sua) pressão fiscal. Com efeito, recorrendo a um lugar comum: se todos pagassem os imposto devidos, pagar-se-iam menos impostos…

5. Para quem entenda (como nós) que a livre concorrência é uma manifestação do principio da igualdade, não podem restar duvidas de que a elisão discal é um modo de financiamento anti-juridico e ilegítimo, uma mais-valia ilícita, um ganho não causal a uma qualquer prestação legítima.

Assim se vê num cenário pós elisivo, não há uma justa, racional e equilibrada distribuição da carga fiscal. O (sub-?) sistema fiscal é “ferido”, os desígnios do legislador torneados.”

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receita fiscal face às necessidades estaduais, impõe novos e aumenta os já criados impostos, de tal forma que poder-se-á falar em autênticos confiscos.4

A acrescer, o relacionamento entre a autoridade tributária e o contribuinte é de escassa comunicação, colaboração e cooperação, sendo essencialmente uma relação de efetivo conflito, divergência e permanente contradição de entendimentos, não se podendo prever um relacionamento diferente, pelo menos num futuro próximo.

Sucede que, a autoridade tributária na sua veste autoritária se preocupa unicamente em tributar, e em pouco a atender aos factos e situações em concreto dos contribuintes. Perante a eminência de uma inspeção tributária, as empresas temem pela constante divergência na aplicação das normas, e pela austeridade e desconfiança com que são abordadas as situações em concreto.

Atente-se no caso dos PIV’s, como que uma clara consagração prática do princípio da comunicação, colaboração e cooperação entre a AT e o contribuinte, dirigido ao dirigente máximo do serviço de finanças, em que pela exposição de uma situação em concreto se pretende que a AT se pronuncie sobre o respetivo tratamento fiscal.

Os PIV’s são utilizados para os contribuintes exporem à autoridade tributária situações em que a aplicação da lei ao caso é dúbia. Pois, sendo o contribuinte o maior aplicador das normas fiscais (autoliquidações) e cabendo à autoridade tributária a fiscalização da conformidade entre as normas e a respetiva aplicação, o contribuinte que não quer assumir riscos opta por questionar a autoridade tributária sobre o correto, justo e equitativo tratamento de determinadas situações.

Por exemplo, até à alteração legislativa introduzida pela Lei 83-C/2013, a autoridade tributária era frequentemente questionada sobre a aplicação do regime

4 Numa das sessões de planeamento fiscal, disciplina curricular do mestrado de Auditoria e Fiscalidade, foi referido

que os funcionários públicos que exercem funções nos serviços da Administração Tributária e Aduaneira têm objetivos de trabalho que devem ser atingidos, relacionados com a quantidade de liquidações a efetuar aos contribuintes, gerando situações em que essas mesmas liquidações, porque motivadas para cumprir objetivos, sofrem de um evidente vício de falta de fundamentação.

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de neutralidade fiscal, previsto nos arts.º 73.º e ss. do CIRC, às fusões inversas. A AT numa estrita aplicação e leitura do artigo 73.º do CIRC sempre entendeu que tal regime não se aplicaria às de fusões inversas. Ora, a recente Reforma do IRC e a nova redação desse artigo veio permitir a aplicação do regime da neutralidade fiscal aos casos de fusões inversas, como não poderia deixar de ser.

Face ao exposto, poderá concluir-se que, efetivamente, a forma como o sistema fiscal está concebido, bem como o contexto económico e financeiro em que Portugal está mergulhado - plena austeridade – desencadeiam situações de planeamento fiscal em muitos casos lícito, noutros casos, mais graves, ilícitos, como a fuga ao fisco, a elisão e a fraude fiscal, originando situações que merecem ser ponderadas sob o ponto de vista da justiça fiscal.

2. As situações de planeamento fiscal

A CGAA e o DL 29/2008 de 25 de fevereiro5, preveem deveres de comunicação, informação e esclarecimento à administração tributária, por forma a prevenir e combater o planeamento fiscal abusivo, introduzindo no sistema jurídico português definições e conceitos relacionados com o planeamento fiscal.

Tais normativos deveriam expor de forma clara e esclarecida os limites ao planeamento fiscal, para que o contribuinte pudesse medir qual o risco das suas opções, quanto à possibilidade de aplicação da CGAA ou do DL 29/2008 à operação concretamente analisada.

Atente-se, desde logo, na definição de planeamento fiscal que consta do supra referido diploma legal: “Planeamento Fiscal - Qualquer esquema ou atuação que

5 Nos termos do DL 29/2008, de 25 de fevereiro diversas entidades, nomeadamente, consultoras fiscais, entidades

financeiras, TOC’s, ROC’s, estão obrigados a dar conhecimento à autoridade tributária dos esquemas ou atuações de planeamento fiscal considerados em si mesmos e de modo abstrato.

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determine, ou se espere que determine, de modo exclusivo ou predominante, a obtenção de uma vantagem fiscal por sujeito passivo de imposto.”

Já no atual texto legal da cláusula geral anti-abuso - artigo 38.º, n.º2 da LGT - consta o seguinte:

São ineficazes no âmbito tributário os actos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios, efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas.

Destas duas definições constata-se, desde logo, um conjunto de conceitos amplos e indeterminados, designadamente, “esquema”, “atuação”, “vantagem fiscal”, “meios artificiosos”, “abuso das formas jurídicas”, que tornam difícil ao contribuinte perceber qual a verdadeira intenção do legislador, originando uma clara subjetividade na interpretação dos mesmos.

Esclarece o artigo 4.º do referido diploma legal que só deverão ser considerados para efeitos de comunicação, os esquemas ou atuações de planeamento fiscal, que se reconduzam a uma das situações seguintes:

a) Impliquem a participação de entidade sujeita a um regime fiscal privilegiado, considerando -se como tal a entidade cujo território de residência conste da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças ou quando aí não for tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou análogo ao IRS ou ao IRC ou ainda quando o imposto efectivamente pago seja igual ou inferior a 60 % do imposto que seria devido se a referida entidade fosse considerada residente em território português;

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b) Impliquem a participação de entidade total ou parcialmente isenta;

c) Envolvam operações financeiras ou sobre seguros que sejam susceptíveis de determinar a requalificação do rendimento ou a alteração do beneficiário, designadamente locação financeira, instrumentos financeiros híbridos, derivados ou contratos sobre instrumentos financeiros;

Face ao exposto e apesar dos vários conceitos indeterminados que sob o ponto de vista da segurança e confiança jurídica levantam inúmeros problemas, entende-se que, deverão entende-ser criados mecanismos que possibilitem a identificação de quais operações que, em concreto, configuram uma legal e legítima operação de planeamento fiscal, impondo-se, desta forma, alguma segurança jurídica à globalidade do sistema fiscal.

Pelo que, partindo-se destas premissas, deve-se avançar para a definição e exemplificação dos vários tipos de planeamento fiscal, no sentido de, à final, se perceber quais os limites legalmente impostos e delimitativos da liberdade dos particulares gerirem a respetiva carga fiscal.

2.1 A terminologia: Evasão, Elisão e Fraude Fiscal

A definição terminológica das atuações que envolvem a atenuação ou exclusão de carga fiscal tem levantado algumas divergências doutrinais, não existindo entre países da UE, nem tão pouco entre países dos vários continentes, leia-se EUA, concordância quanto à terminologia a adotar. 6

Entende-se não ser essencial uma análise aprofundada da terminologia adotada, uma vez que os conceitos são utilizados globalmente de forma discricionária, pelo que, optou-se por uma abordagem em torno das várias situações de planeamento fiscal.

6 De acordo com Pinto Nogueira (2009), um pouco por todo o Espaço da União, os textos doutrinais e

jurisprudenciais apresentam-se como campos férteis de germinação da sinonímia patológico-tributária. A pluralidade é de tal modo acentuada que, uma simples tentativa de tradução dos termos a que nos referimos, requer um esforço casi-hercúleo de compreensão das inúmeras especificidades acopladas aos diferentes termos.

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No âmbito da presente dissertação serão referidos conceitos e expressões como planeamento fiscal, planeamento fiscal lícito, evasão, elisão, fraude, otimização fiscal, comportamentos omissivos, poupança fiscal, fuga aos impostos, sendo que, considera-se a evasão fiscal uma atuação ilícita, por referência à denominação inglesa, “tax evasion”, e a elisão/evitação fiscal, uma prática lícita de planeamento fiscal, sem prejuízo das demais diversas opiniões e igualmente válidas.

2.2 Planeamento fiscal

Entende-se ser o mais correto, no que diz respeito à definição das situações consideradas como planeamento fiscal, e no seguimento do entendimento de Rui Morais (2003) não entrar em querelas terminológicas e sobretudo distinguir os diferentes âmbitos em que as situações concretas poderão ser analisadas e integradas.

2.2.1 Situações que não configuram planeamento fiscal

As ações e ou omissões do dia-a-dia têm não raras vezes impactos fiscais, nomeadamente, se fumo ou se não fumo, se decido passar férias no meu país ou no estrangeiro, se coloco o carro num local camarário ou privado, se celebro matrimónio ou se vivo em união de facto.

Contudo, tais atuações ou omissões não levantam questões de planeamento fiscal, mas antes, configuram autênticas atuações do contribuinte exercidas no âmbito da liberdade privada dos sujeitos. O princípio da autonomia privada, enquanto princípio elementar de direito privado, obriga ao respeito pela liberdade de cada um dos cidadãos atuarem em liberdade de consciência e no seu melhor interesse, sem quaisquer restrições, inclusive, do ponto de vista fiscal.

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2.2.2 Planeamento fiscal intra legem

Uma entidade tem ao seu alcance diversas possibilidades legítimas para, da melhor forma, gerir os seus impostos e conseguir uma legítima diminuição da respetiva carga fiscal. Existe, efetivamente, todo um universo de formas de planeamento fiscal dependendo do tipo de rendimento que se pretende ver diminuído. O simples facto de Portugal ser membro da UE cria reais oportunidades para que os contribuintes possam optar por localizar a sua fonte de rendimento onde acharem mais benéfico, dando concretização ao princípio do livre estabelecimento.

Deste modo, interessa aqui desenvolver um conjunto de situações que integram o planeamento fiscal legítimo, legal ou atuação dentro da lei.

De acordo com Vaz Antunes (2006) “diferente dos comportamentos de evasão e de fraude fiscal são os denominados actos de poupança fiscal, planeamento fiscal ou ainda de gestão fiscal ou engenharia fiscal – tax planning.”

Acrescenta Fernandes de Oliveira (2009)

Parece razoável (e pacífico) concluir que é contra natura proibir as empresas – e os contribuintes em geral, incluindo simples particulares – de atenderem à carga fiscal aquando da ordenação dos seus negócios. Isto é, é contra natura proibir o planeamento fiscal, proibir actividades mentais e materiais dirigidas à minimização dos encargos fiscais.

Ora, o aprofundado conhecimento das normas fiscais e da prática fiscal das empresas permite aos contribuintes atuarem, tanto no âmbito da previsão legal, como no âmbito das lacunas da lei, face à ausência de norma legal de incidência sobre determinado tipo de rendimentos.

Por outro lado, pode o contribuinte atuar, aproveitando benefícios fiscais, regimes privilegiados de tributação ou “jogando” com as opções do próprio

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legislador, nomeadamente no que diz respeito aos custos fiscalmente aceites previstos no artigo 23.º do CIRC.

Estas atuações podem, à final, desencadear uma atenuação ou até mesmo uma isenção total de imposto relativamente a uma categoria de rendimento, por variadíssimas vias.

Empresas de consultoria fiscal, sociedades de advogados, TOC’s, ROC’s, entre outros, frequentemente propõem-se otimizar o imposto das empresas e sujeitos individuais, pois atuando dentro da lei e no profundo conhecimento das normas criam soluções alternativas, desencadeiam verdadeiros fenómenos de otimização fiscal. Tal como afirma Rui Morais (2003),

Qualquer sistema fiscal traduz determinadas opções do legislador que, conscientemente, decidiu tributar determinadas realidades económicas e não outras ou tributá-las diferentemente, ainda que revelem igual capacidade contributiva. Nada haverá a apontar ao contribuinte que opte por orientar a sua actividade económica de acordo com a alternativa aberta pela lei (pela sua letra e pelo seu espirito) que se mostre mais favorável.

Casalta Nabais (2010) refere-se a uma liberdade constitucionalmente protegida de gestão fiscal das empresas e aponta algumas situações em que materializa essa mesma liberdade, designadamente:

 Na preparação e constituição da empresa: a constituição ex novo ou por transformação de outra empresa individual ou societária, por fusão de sociedades ou cisão de sociedades. (Por exemplo, optar por efetuar uma fusão ou cisão pode trazer alguma eficiência fiscal face ao regime de neutralidade fiscal previsto nos artigos 73.º e ss. CIRC);

 Na escolha do local da sede da empresa, afiliadas e estabelecimentos estáveis, bem como dos diferentes activos mobilizados para o exercício da actividade

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empresarial (no Continente, nas regiões autónomas, no interior do País, em município fiscalmente mais atrativo, etc.);

 Na escolha do financiamento (autofinanciamento) através da não distribuição de resultados levado a cabo mediante investimento directo ou distribuição de ações gratuitas aos accionistas, de dotações para amortizações, de variações nas provisões, etc.

 No levantamento de dinheiro da empresa por parte do empresário (distribuição de lucros, adiantamento por conta de lucros, dividendos antecipados, levantamento de suprimentos, restituição de prestações acessórias ou suplementares, aquisição de ações ou quotas próprias, etc.)

No mesmo seguimento afirma Fernandes de Oliveira (2009) o seguinte,

Uma coisa é o contribuinte utilizar uma sociedade com sede – e direcção efetiva – numa zona de baixa ou nula tributação, para levar a efeito determinadas operações ou actividades, com o objectivo de obter um diferimento da tributação resultante dessa actividade para o momento posterior da recepção dos lucros distribuídos pela sociedade participada. Na medida em que as regras fiscais do seu país de residência o não obriguem a declarar para efeitos fiscais os lucros da sociedade participada ainda não distribuídos, o contribuinte alcançará, em princípio, licitamente – sem violação da lei fiscal – os seus objetivos. Contrariamente, ao contribuinte que organiza os seus negócios utilizando sociedades residentes em zonas de baixa tributação, tirando partido do secretismo de que aí beneficie relativamente à sua situação de beneficiário efectivo da posição de acionista nessas sociedades, para, pura e simplesmente, não declarar, furtando-se assim à sua tributação, os lucros, distribuídos ou por distribuir, dessas sociedades, está a planear fiscalmente as suas actividades à margem da legalidade.

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Ademais, devido às altas taxas progressivas de tributação em sede de IRS as empresas têm vindo a estudar novas formas de conferir regalias aos seus trabalhadores, sem que isso se traduza num efetivo aumento da taxa de tributação. Assim, acontecerá que, em vez de aumentarem a remuneração base, são conferidas formas alternativas de remuneração de trabalho dependente, nomeadamente, vales de refeição pagos em forma de cartão, seguros de saúde e de vida, ticket infância, passe social, pagamento de despesas de deslocação, entre outros.

Ficou aqui indicado, de forma sumária, algumas formas do contribuinte alcançar uma diminuição da carga fiscal de forma legal.

Efetivamente, a liberdade da gestão dos impostos é um direito que assiste a cada um dos contribuintes, sujeitos individuais ou pessoas coletivas, de ver a sua carga fiscal diminuída. Seria contraprocedente, no contexto atual, alguém que tivesse a possibilidade de optar por uma via que lhe levaria a um pagamento de imposto inferior, mesmo assim optar pela via mais onerosa. O cerne da questão reside no facto de atuar, ou não, no âmbito da lei.

2.2.3 Planeamento fiscal extra legem

De acordo com Relatório emitido pela Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários (Kekus, 2013),

A elisão fiscal corresponde à utilização legal, mas incorreta, do regime fiscal em proveito próprio, com o fito de reduzir ou evitar as obrigações fiscais, pelo que requer um conjunto diferente de ações. Está intimamente ligada ao conceito de planeamento fiscal agressivo, no qual grandes empresas realizam um vasto planeamento fiscal, transferindo artificialmente os lucros, para minimizarem a sua taxa de imposto efetiva e reduzirem os seus encargos fiscais. (Sublinhado nosso)

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É às situações que configuram planeamento fiscal ilícito ou extra legem que irá ser aplicada a CGAA e, consequentemente serão desconsiderados os efeitos fiscais do ato ou negócio jurídico lícito praticado pelo contribuinte que desencadeou na obtenção de vantagens fiscais. Pelo que, aplicada a CGAA, será emitida liquidação adicional de imposto a tributar determinada situação de acordo com as normas que se quis evitar, e como tal não se produzindo as vantagens fiscais pretendidas com os esquemas efetuados.

Pois, é a própria CGAA e os seus pressupostos de aplicação que, funcionando como limite ao planeamento fiscal, delimitam o âmbito e as situações em que a mesma deverá ser aplicada.

No primeiro parágrafo deste subcapítulo ficou sublinhada a palavra “artificialmente”, justamente para chamar a atenção do leitor para o facto de no sistema jurídico português um dos elementos da CGAA ser a atuação pelo contribuinte por recurso a “meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas.” Ora, no relatório apresentado pela Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários é utilizada a palavra “artifício” ainda que associada a uma prática lícita pelo contribuinte.

Todavia, o atual normativo legal que introduz a CGAA no ordenamento jurídico português determina que, além do carácter artificioso é necessário um abuso das formas jurídicas, só assim se justificando a utilização pelo legislador da conjunção coordenativa “e”, que impõe o abuso como requisito cumulativo.

Porém, a análise de situações práticas levará a concluir que, no ordenamento jurídico português nos casos em que se admita que foi criado um artifício pelo contribuinte, com vista a obter vantagens fiscais, concluir-se-á que, a atuação do contribuinte constitui um abuso das formas jurídicas, legitimando-se a aplicação da CGAA. Entende-se que, este raciocínio, que tem sido levado a cabo pela autoridade tributária é bastante falacioso.

O que, de facto, determina a maior abertura de um determinado estado para o planeamento fiscal é o respeito que este demonstra pelo princípio da liberdade de

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gestão da carga fiscal do contribuinte. Certo é que, em Portugal, como se irá verificar, este respeito fica muito aquém do que os contribuintes pudessem querer.

De acordo com Lopes Courinha (2009),

Os casos sujeitos ao artigo 38.º, n.º2 da LGT são, via de regra, bastante complexos. São-no quanto às relações societárias, são-no quantos às estruturas contratais e são-no quanto à economia dos negócios; para não falar da diversidade de línguas em que, não raramente, se encontra vertida a documentação associada à estrutura em causa. (…) Por isso, este género de processos apresenta, quase sempre, uma factualidade densa, cuja prova cabal, é por um lado, prévia a qualquer juízo substantivo sobre a própria cláusula e, por outro, determinante do mesmo quanto a cada um dos elementos estruturantes da CGAA. Sucede, frequentemente, que cadeias de participações sociais mal explicadas, contratos não juntos aos autos, a falta de cooperação por parte de administrações estrangeira ou a demonstração (ou não) de outros factos alegados tendem a desempenhar um papel decisivo nas conclusões a pender, para um lado ou outro, o resultado da lide.

Os tribunais administrativos e fiscais pronunciaram-se duas vezes sobre a aplicação da CGAA e respetiva verificação dos seus pressupostos de aplicação, desde logo no Caso Gerónimo Martins, identificado pelo acórdão número 4255/107, e no acórdão número 5104/11,ambos do TCA do Sul.

Analisando o caso mais mediático – Caso Grupo Gerónimo Martins – e sem prescindir de uma leitura atenta dos factos dados como provados no referido acórdão, o esquema traduzia-se na obtenção de vantagens fiscais por recurso à Zona Franca da Madeira.

Acontecia que, a sociedade Recheio, SGPS, S.A., denominada sociedade autora no referido acórdão, efetuava empréstimos a outras entidades do grupo por

7 Remete-se os nossos comentários para a análise ao acórdão efetuada por Lopes Courinha, “E assim começou a

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intermédio de uma sociedade – PSQ - Investimentos Mobiliários e Imobiliários, Lda., situada na ZFM, e portanto isenta de IRC. Posteriormente, aquela sociedade viria a beneficiar de acréscimos patrimoniais enquanto dividendos dedutíveis ao abrigo do artigo 46.º do CIRC, em vez de juros suscetíveis de tributação como lucros tributáveis da sociedade Recheio SGPS, S.A., nos termos do artigo 20.º, n.º1, al. c) do CIRC.

In casu, entendeu o Tribunal que ficou demonstrado que a intenção do contribuinte seria eliminar a tributação, convertendo juros (auferidos em resultado dos empréstimos realizados pela sociedade situada na ZFM a outras empresas do grupo) em dividendos dedutíveis, ao abrigo do artigo 46.º CIRC.

Sendo certo que, o artifício gerado através do estabelecimento de uma sociedade na ZFM, as transações e acordos efetuados, a acrescer ao facto de todas as sociedades serem direta ou indiretamente detidas pela mesma holding - Gerónimo Martins, SGPS, e à clara obtenção de vantagens fiscais, levam a concluir que, de facto, existiu um abuso das formas jurídicas por parte do contribuinte.

Adiante serão melhor identificados os elementos da CGAA e será feita a devida referência ao abuso das formas jurídicas, por referência a jurisprudência do TJ, para que se esclareça quais os limites da atuação do contribuinte, que tenha em vista a obtenção de vantagens fiscais.

Atente-se ainda, quanto à estrutura de capitais próprios e alheios de determinada sociedade, no exemplo infra.

O balanço de uma determinada sociedade apresenta na rubrica do capital social, 50.000€, na rubrica relativamente aos empréstimos obtidos, 750.000€, e se obtiver um lucro de 100.000€ (ao que se subtrai um custo com empréstimos obtidos, p. ex. 52.500 €) terá um Resultado Antes de Impostos (RAI) que ascende a 47.500€. Porém, se a este resultado aplicarmos a taxa de IRC de 26,5% (25%+1,5% de derrama municipal), então teremos um Resultado Líquido de 34.912,50€. Mas, se este valor vier a ser distribuído pelos sócios na forma de dividendos, então aos

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34.912,50 € será aplicada a taxa liberatória de 28%. Ao que, o sócio só receberá 25.137€.

No entanto, aplicando a mesma estrutura de balanço acima descrita, mas ao invés da rubrica de empréstimos obtidos, teríamos uma rúbrica de suprimentos no valor de 750.000 €. Então, para que sejam obtidas vantagens fiscais na esfera do sócio, poderá este prestar suprimentos à sociedade e ser remunerado em forma de juros, evitando a tributação do rendimento em sede de IRC na esfera da sociedade. Pois que, a sociedade ao pagar juros de suprimentos ao sócio – 52.500€ (não tributáveis em IRC por serem um custo fiscalmente aceite nos termos do artigo 23.º do CIRC) tributáveis somente a 28% na esfera do sócio por aplicação da taxa liberatória, o sócio irá receber efetivamente por via de juros um total de 37.800€, a acrescer ao total de dividendos, portanto 25.137€, o sócio terá um rendimento na sua esfera individual de 62.937€, um valor muito mais aproximado do lucro efetivamente obtido (100.000€).

Entende-se que tal comportamento apresenta um grande risco de aplicação da CGAA. Atente-se na decisão do Centro de Arbitragem Tributária relativa ao processo número 224/2013, de 2 de abril de 2014, que aprecia uma situação em que, os sócios de uma sociedade (A) financiaram a sociedade através de prestações suplementares para aquisição de 80.100 quotas numa determinada sociedade (B).

Considerou a autoridade tributária que, a alienação das ações acima do valor nominal e o reembolso diferido no tempo da quantia entregue a título de prestações suplementares, assume, fiscalmente, a natureza de dividendos evitando-se qualquer tipo de tributação em sede de IRS. Em consequência, desconsidera, por aplicação da CGAA, o valor pago pelas ações acima do valor nominal e o correlativo reembolso das prestações suplementares na parte que excede o valor nominal.

In casu, a autoridade tributária concluiu que a valorização das ações acima do seu valor nominal só foi decidida para criar um crédito avultado dos accionistas em relação a Requerente para depois ser pago como reembolso de prestações

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suplementares e não como distribuição de dividendos. Tal argumentação da autoridade tributária não foi procedente e a decisão não considerou lícito a liquidação de imposto por aplicação da CGAA.

Atente-se ainda no seguinte exemplo, aquando da isenção de tributação das mais-valias pela alienação de ações detidas há mais de 12 meses. Acontecia que, os contribuintes que tinham casas com VPT bastante elevado recorriam frequentemente ao seguinte expediente: constituíam uma sociedade anónima, que tem como objeto social a simples administração de bens (artigo 6.º, n.º4, al. b) do CIRC), que passava a deter essa propriedade, na maior parte dos casos, verdadeiras propriedades de luxo. Assim, quando pretendiam vender o imóvel, em vez de tratarem o negócio como uma compra e venda de imóvel, vendiam as ações da sociedade. Como o sócio tinha as ações há mais de 12 meses, não tinha de pagar qualquer imposto numa operação que era realmente uma venda imobiliária. Note-se que, face ao regime de transparência fiscal, que se aplica a este tipo de sociedades, o imóvel estava refletido no património do sócio.

Este caso apresenta, igualmente um enorme risco de aplicação da CGAA, já que se deve considerar que de facto existe um abuso das formas jurídicas por parte do contribuinte.

2.2.4 A divergência das considerações sobre a natureza do

planeamento fiscal: A zona cinzenta.

Nem sempre é facilmente identificável a classificação das situações de planeamento fiscal lícito ou ilícito. Há efetivamente atuações do contribuinte que do ponto de vista da sua legalidade podem levantar dúvidas.

Estas dúvidas surgem essencialmente pela subjetividade na interpretação dos conceitos previstos nas normas fiscais. Conforme refere Fernandes de Oliveira, (2009) “aqui é que reside, como é sabido, o busílis da questão, nos tempos que correm. Determinar em que consistem ou o que exigem exactamente as leis aplicáveis pode estar rodeado de maior ou menor incerteza.”

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Ao longo do capítulo tem-se vindo a fazer referência à existência entre nós de um princípio de liberdade de gestão fiscal, porém concorda-se com Moura Ramos, (2001) quando refere que,

“Existe uma zona de tensão entre princípios constitucionais. Por um lado, por força do princípio da igualdade e da capacidade contributiva, dever-se-ia desconsiderar, para efeitos fiscais, os actos ou negócios praticados pelo contribuinte, e tributá-los pela norma cuja aplicação quis evitar. Por outro lado, a aplicação do princípio da legalidade e do princípio da segurança jurídica levaria à solução oposta, devendo o contribuinte ser tributado pelas normas fiscais incidentes sobre os negócios realizados, pois estes são válidos e legítimos.”

A linha que separa o planeamento fiscal legítimo do planeamento fiscal ilegítimo deve ser determinada por recurso às limitações do próprio planeamento fiscal.

Ora, o que limita o planeamento fiscal dos contribuintes são a CGAA, as cláusulas anti-abuso específicas, “a utilização de novos métodos de interpretação das leis, presunções fiscais, introduzindo nos diplomas fiscais normas antiabuso e ainda utilizando conceitos jurídicos de uma forma mais abrangente do que a normalmente utilizada noutros ramos de direito.” (Vaz Antunes, 2006)

Assim, é através do desenvolvimento de cada um dos elementos acima enumerados e na apreciação de situações concretas pelos tribunais, que vai sendo construída a fronteira entre planeamento fiscal lícito ou ilícito.

Certo é que, as considerações sobre os limites do planeamento são ainda bastantes discricionárias, no sentido em que, dependem da interpretação realizada pelo próprio aplicador da lei relativamente à norma fiscal que se tentou evitar, e ainda da análise e verificação dos elementos constitutivos da CGAA, que por sua

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vez também é suscetível de uma grande discricionariedade aquando da sua aplicação.

Tem sido escasso o contributo da jurisprudência relativamente à melhor definição e determinação da linha de fronteira entre o que deve ser considerado planeamento fiscal legítimo ou planeamento fiscal ilegítimo.

Além dos casos julgados nos tribunais supra referidos a jurisprudência do Centro de Arbitragem Tributária, já se pronunciou por diversas vezes relativamente à legalidade da liquidação por aplicação da CGAA.

Quer-se, desde já, dar uma especial atenção à decisão proferida no processo número 47/2013-T a qual se considera trazer um enorme contributo para a discussão do presente tema.

Sucede que, a AT tem vindo a proceder a liquidações adicionais de imposto em sede de IRS, designadamente tributação de mais-valias pela alienação de ações, que beneficiavam de um regime de isenção nos termos do artigo 10.º, n.º2 do CIRS, redação dada pelo DL 228/2002, de 31 de outubro.

Ora, até 27 de julho de 2010 a mais-valia decorrente da alienação de ações não era tributada, contrariamente ao que acontecia com as quotas e demais participações sociais. Então, o que vinha a acontecer era que, o contribuinte que detinha participações, por exemplo, em sociedades por quotas, usando da sua liberdade de gerir os seus impostos, transformava a sociedade por quotas em sociedade anónima, e posteriormente alienava as ações, beneficiando de um regime de total isenção de mais-valias mobiliárias.

A estes casos, a AT, por aplicação da CGAA, atribuiu ineficácia, do ponto de vista fiscal, a essa operação de transformação da sociedade, tributando a mais-valia que se gerou da venda da participação social.

A apreciação da legalidade dessas liquidações tem vindo a ser apreciada pelo Centro de Arbitragem Tributário, o qual tem vindo a decidir pela ilegalidade do ato de liquidação que aplica a CGAA ao ato de transformação da sociedade, com a exceção da decisão proferida no processo número 47/2013-T.

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Assim, de forma a comprovar a dificuldade de determinar a linha de (i)licitude do planeamento fiscal procede-se à confrontação de duas decisões do Centro de Arbitragem Tributária que em tudo se assemelham quanto aos factos, situação e rendimento que se pretendeu evitar (Figura 1). Para efeitos da referida confrontação utilizou-se a decisão identificada com o número de processo 47/2013-T, que considera legal o ato de liquidação de imposto e a consequente aplicação da CGAA e a decisão que consta do processo número 43/2013, de 26 de novembro de 2013, que considera ilegal o ato de aplicação da CGAA.

Todos os casos objeto de apreciação pelos tribunais têm vindo a ser analisados com base nos elementos meio, intelectual, resultado e normativo, pelo que serão estes os fatores comparativos que irão ser aqui utilizados.

Figura 1 - Confrontação da decisão do processo número 47/2013-T com a do processo número 43/2013

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ELEMENTO MEIO ELEMENTO MEIO

Processo nº 47/2013, de 26 de novembro de 2013 Processo n.º 43/2013, de 26 de novembro de 2013 O elemento meio, in casu, é a transformação da sociedade em sociedade

anónima, que o Tribunal considera ser “vontade inequívoca das partes.” Da análise da operação de transformação o Tribunal afirma que “quanto às justificações invocadas pelo contribuinte e o timing da transformação não isentam a operação de suspeita no que toca à sua motivação real.”

Acrescenta ainda “no limite, o factor que suscita a suspeição, e bem, da AT face ao negócio é o (curto) espaço de tempo que medeia entre a alteração da forma e a venda. A este factor de suspeição alia-se a incapacidade de apresentar uma justificação económica que dissipe essa suspeita.” (Sublinhado nosso)

O elemento meio é a transformação da sociedade em sociedade anónima.

Considerações da AT sobre a atuação do contribuinte:

1) A sucessão de actos – contrato promessa, transformação da sociedade e venda das participações – configura um esquema artificioso.

2) A transformação da sociedade não teria qualquer justificação do ponto de vista dos adquirentes, seria sim uma mera imposição dos alienantes.

3) A transformação de uma sociedade por quotas numa sociedade anónima, imediatamente seguida da venda das ações da sociedade acabada de transformar, só explicável por intuitos fraudulentos.

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ELEMENTO INTELECTUAL ELEMENTO INTELECTUAL

Processo n.º 47/2013-T, de 20 de dezembro de 2013 Processo n.º 47/2013-T, de 20 de dezembro de 2013 O Tribunal faz referência a três indícios fortes:

1.º) Entre a transformação da sociedade e a venda das participações ter mediado um curtíssimo período de dois dias. A tónica da suspeita assenta sobre uma operação que se afigura “apressada” e apenas justificável face à vantagem fiscal que seria obtida automática e imediatamente após a venda sob a forma de ações.

2.º) As razões económicas apresentadas, das quais já se demonstrou não aproveitarem os vendedores, não serem determinantes para o comprador. “De facto, embora o contrato-promessa aponte no sentido da transformação ser uma condição essencial, a verdade é que admite a sua derrogação.” 3.º) “Para os vendedores seria indiferente a forma societária da sociedade, e ambas as partes afirmam a sua irrelevância na formação do preço, pelo que, e mais uma vez, não se provando com razoabilidade a justificação económica da transformação para a compradora, resta apenas um motivo plausível: aquele que se prende a vantagem fiscal subjacente à operação.” Concluindo o Tribunal que, os indícios revelados demonstram a motivação fiscal subjacente à operação de transformação, não se considerando provada a justificação económica apresentada pelo contribuinte para a operação.

O Tribunal vem considerar que “a proximidade das datas dos negócios, não significa, por si só que os adquirentes não tivessem um interesse na efetivação da mudança da forma da sociedade antes da aquisição das participações.”

Anteriormente à transformação existia um contrato promessa, de onde decorria a obrigação para os vendedores de transformarem a Sociedade em sociedade por ações antes da venda de 90% do seu capital. O Tribunal conclui que da leitura do contrato promessa parece decorrer a quase certeza de que essa transformação ocorreria, embora a sua ausência não fosse obstáculo à execução do contrato.

Basta a comprovação de que a aquisição de uma sociedade já transformada em sociedade por acções constituía um negócio mais conforme ao interesse da compradora – ainda que a eventual não transformação prévia não fosse fundamento para obstar ao negócio da venda – para se concluir que não está suficientemente indiciada a existência, por parte do Contribuinte, de uma prática lida à luz da “step by step transaction doctrine”, como artificiosa e apenas visando a fraude à lei fiscal.

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ELEMENTO RESULTADO

Processo n.º 47/2013-T, de 20 de dezembro de 2013 Processo n.º 43/2013, de 26 de novembro de 2013 Quanto a este elemento não se apresentam divergências entre os

acórdãos uma vez que está em causa o mesmo tipo de rendimento tributável – mais valias - e pretende-se obter exatamente os mesmos resultados.

As mais-valias, resultantes da diferença entre o preço de realização e o preço de aquisição (artigo 10, n.º 4, al. a), artigo 44 e 48 do CIRS) de quotas, eram tributadas a 10% (artigo 72, n.º 4, conjugado com o artigo 10, n.º 1, al. b), do CIRS na redação em vigor em 2008,), sendo que a alienação de participações sociais não o era (artigo 10, n.º 2, al. a), conjugado com o artigo 43, n.º 4, al. b), do CIRS, na redação em vigor em 2008), pelo que o regime que regia a última era obviamente mais vantajoso.

O resultado económico, qualquer das formas societárias que assumisse a sociedade, seria sempre o de obter o controlo da titularidade da sociedade e da direção e administração.

A suspeita resulta do timing da operação de transformação, face às vantagens fiscais que daí advêm, e a não verificação das correspondentes vantagens económicas naquele espaço de tempo.

Quanto ao resultado, em si, comparando o negócio efetuado (venda das ações após transformação da sociedade em sociedade anónima) com o negócio equivalente de venda da quota (que seria feito sem a transformação prévia da sociedade), não restam dúvidas que a opção realizada teve como resultado a aplicação do artigo 10.º, n.º 2 do CIRS, na redacção do Decreto-Lei n.º 228/2002, de 31 de Outubro.

Aplicação de um regime fiscal mais vantajoso do que o aplicado às sociedades por quotas, caso em que o rendimento obtido da alienação da quota seria considerado uma mais-valia, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, al. b) do CIRS, e tributado a uma taxa de 10%, nos termos do artigo 72.º, n.º 4, do CIRS, na redação do Decreto-Lei n.º 192/2005, de 7 de novembro.

Considera o Tribunal que “a verificação deste resultado é insuficiente para se concluir que existiu abuso.” (Sublinhado nosso)

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ELEMENTO NORMATIVO

Processo n.º 47/2013-T, de 20 de dezembro de 2013 Processo n.º 43/2013, de 26 de novembro de 2013 O Tribunal faz, desde logo, um juízo de valor relativamente ao

raciocínio defendido por Saldanha Sanches dizendo que o mesmo “impediria qualquer aplicação da CGAA pois, ou a conduta está expressamente proibida por lei, ou, nos casos de aplicação de cláusula geral anti-abuso, bastaria haver uma lacuna ou uma disposição menos clara, que o contribuinte poderia ‘manipular’ a teleologia da norma.” O Tribunal afirma que “a teleologia do artigo 38, n.º 2, é clara: sancionar comportamentos elisivos, portanto, comportamentos que só aparentemente são legais, que se escondem sob operações artificiais, às quais não subjaz uma verdadeira razão económica.”

Assim, partindo desta permissa conclui que “o contribuinte optou por uma atuação que traduz uma mudança meramente artificial - como se demonstrou - e o Direito não tolera esta artificialidade.”

Quanto ao argumento de que a operação realizada é tutelada pela liberdade de empresa e de iniciativa económica, considera o Tribunal que “estes direitos não são absolutos e consentir num exercício abusivo destes direitos, consistiria numa perversão e consequente negação dos mesmos.”

Concluindo-se que o contribuinte “atenta contra o espírito das próprias normas que invoca para se defender, merecendo, assim, a reprovação normativo-sistemática quanto à vantagem que abusivamente obtém.”

O Tribunal considera o seguinte: “Se a verificação do interesse objetivo de alguns dos sócios na transformação da sociedade, por desta resultar a exclusão de tributação, fosse suficiente para concluir pelo abuso, correr-se-ia o risco de a prática administrativa acolher uma interpretação da norma anti abuso que pressupunha uma obrigação geral de os contribuinte deverem fazer, em cada momento, as opções negociais de que resultasse maior tributação.” Acrescenta o Tribunal:

“Mesmo que a transformação de uma sociedade por quotas em sociedade anónima fosse motivada por razões exclusivamente fiscais, não se estaria perante um ato condenável face ao ordenamento jurídico tributário, uma vez que o próprio legislador fiscal optou por tributar em sede de IRS os ganhos decorrentes da venda de quotas e por não tributar em sede daquele imposto os ganhos resultantes da venda de ações.” (Sublinhado nosso)

Uma situação destas, em que o legislador resistiu longamente a eliminar tal regime mantendo uma “lacuna consciente de tributação”, não se mostra suscetível de aplicação da cláusula geral anti-abuso. E não cabe ao aplicador da lei substituir-se às opções de tributar ou não tributar certas realidades seguidas pelo legislador fiscal.

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2.2.5. Planeamento fiscal contra legem

Este tipo de situações não configuram o objeto de estudo da presente dissertação, por tal só uma breve enunciação será realizada a este respeito. Rui Morais (2003) afirma que,

Este tipo de situações configuramcomportamentos do contribuinte (acções ou omissões) que são claramente contra a lei, constituem um ilícito (um crime ou contra-ordenação) tipificado na lei. O contribuinte realiza os pressupostos de facto da tributação (existe a manifestação de capacidade contributiva tributável) mas, nas suas relações com o Fisco, procura esconder tais factos ou adulterar a sua apresentação de forma a obter uma redução da sua carga fiscal. O paradigma de tais comportamentos será a fraude fiscal, pelo que alguns autores utilizam tal expressão para designar este fenómeno.

A enunciação dos casos mais paradigmáticos de fraude fiscal transmite uma visão mais prática deste tipo legal de crime, permitindo uma melhor diferenciação das formas de planeamento fiscal descritas anteriormente. Assim, de acordo com o artigo 103.º do RGIT,

Constituem fraude fiscal, punível com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, as condutas ilegítimas tipificadas no presente artigo que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias. A fraude fiscal pode ter lugar por:

a) Ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria colectável;

Imagem

Figura 2 - A fraude Carrossel
Figura 3 - O esquema que ficou conhecido por Operação Furacão  Fonte: Público (2013)

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