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Afetividade na Terceira Idade: repensar os sentimentos, as possibilidades e as relações interpessoais

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Academic year: 2020

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AFETIVIDADE NA TERCEIRA

IDADE: REPENSAR OS

SENTIMENTOS, AS POSSIBILIDADES

E AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS*

EDIANEZ SEHN**, JANETE CARRÉR***

O

envelhecimento é um processo natural que caracteriza uma etapa da vida do ho-mem e acontece através de mudanças físicas, psicológicas e sociais que acometem de forma particular cada indivíduo com sobrevida prolongada.

O envelhecimento populacional é hoje uma realidade mundial. No Brasil, em par-ticular, nas duas próximas décadas, a proporção de idosos na população passará de 9% atual-mente, para 22% significando 25 milhões de idosos no país em 2020. Segundo as projeções estatísticas da Organização Mundial de Saúde (1985), entre 1950 e 2025 a população de idosos no Brasil será a sétima maior do mundo, com mais de 32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais.

Ao relatar esta transição, Salles (2007, p. 39), afirma que “Nos países desenvolvidos, a transição demográfica ocorreu gradualmente ao longo de um maior período de tempo, con-sequentemente a um maior desenvolvimento socioeconômico e cultural.” Já essa mudança foi brusca e despreparada nos países em desenvolvimento, incluindo o Brasil.

Resumo: pretende-se discutir as transformações e necessidades do sujeito na Terceira Idade, considerando as influências das expectativas e valores presentes na sociedade capitalista, a partir dos resultados de uma Oficina realizada no programa de Geron-tologia Social da Pontifícia Universidade Católica de Goiás.

Palavras-chave: Terceira idade. Relações interpessoais. Afetividade. Ramain-Thiers.

* Recebido em: 09.10.2014. Aprovado em: 18.10.2014.

** Especialista em Psicopedagogia e Sociopsicomotricista Ramain Thiers. Pedagoga. Orientadora Educacional. E-mail: profedia@hotmail.com.

*** Mestre em Educação. Professora no Departamento de Educação da PUC Goiás. Orientadora. Psicóloga. Psicoterapeuta de adolescentes, adultos e idosos. Sociopsicomotricista Ramain Thiers. Coordenadora de oficina na UNATI-PUC Goiás. E-mail: netecarrer@hotmail.com.

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O contraponto desta realidade indica que o suporte para essa nova condição não evolui com a mesma velocidade, apesar de que nos últimos anos vem sendo realizadas, inú-meras discussões e estudos com o objetivo de fornecerem dados que subsidiem o desenvolvi-mento de políticas e programas adequados para essa parcela da população. Dentre os temas tratados destacam-se: a aposentadoria, a importância da família e as relações interpessoais.

O prolongamento da vida não é uma atitude isolada, necessitando de uma integra-ção entre idoso, família e/ou, instituiintegra-ção e profissionais especializados. A atuaintegra-ção dos diversos profissionais não deve ser centrada somente nas doenças, mas também nas principais condi-ções que causam incapacidades e consequente declínio no grau de dependência funcional e prejuízo na qualidade de vida. Esse é o novo desafio da saúde do idoso no Brasil.

Ao discutir o processo de envelhecimento, Carvalho Filho (2007, p. 105) afirma que “pode ser conceituado como um processo dinâmico e progressivo, no qual há alterações morfológicas, funcionais e bioquímicas que vão alternando progressivamente o organismo, tornando-o mais suscetível às agressões intrínsecas e extrínsecas”.

O envelhecimento atinge o corpo e os aspectos psicológicos, de acordo com Gon-çalves, (2010, p. 23), “proporcionando perdas na tomada de decisões, lentidão na capacidade de analisar e sintetizar informações, insegurança, dependência e confusões mentais.” Acres-centa ainda que outras características como dificuldade no equilíbrio, nas relações interpesso-ais e perda de autoridade podem também ocorrer. Essas mudanças levam o idoso a tornar-se intolerante, irritável e impaciente.

A Terceira Idade vem geralmente acompanhada de associações a sentimentos des-trutivos de inutilidade e perda, que agravam ainda mais a condição existencial do idoso, pois acirra conflitos internos. Esses conflitos estão relacionados às mudanças psicológicas mais visíveis com o avanço da idade, como: dificuldade de adaptação a novos papéis; desmotivação e dificuldade de planejar o futuro; necessidade de trabalhar as perdas acima citadas e adaptar-se a mudanças; afetividade mal resolvida durante toda a vida, que se agravam no limiar da idade mais avançada. O idoso precisa ser agraciado por uma reeducação que lhe permita um ama-durecimento saudável. Segundo Néri (2001, p. 60) “trata-se de preparar e de oferecer meios à pessoa para que possa envelhecer bem, cuidando não apenas do aspecto físico, social e eco-nômico, mas também das questões de vida interior”.

A necessidade de considerar todos os aspectos que envolvem a natureza humana de forma integralizada é destacada por Fabietti (2010, p. 77) ao afirmar que: “envelhecer saudavelmente significa, o resultado multidimensional entre saúde física, saúde mental, in-dependência na vida diária, integração social, suporte familiar e inin-dependência econômica”. Para Fabietti, o idoso pode descobrir e conquistar novas aptidões e fontes de prazer, se abrindo para novas experiências, ampliando o seu relacionamento social e buscando em seu envelhecimento uma nova organização de sua vida.

O bom desenvolvimento da afetividade e a integração do idoso na sociedade são fundamentais, de acordo com Paschoal (2007), para que o idoso tenha autonomia e o máxi-mo de independência. Para vivenciar um processo de envelhecimento saudável é necessário que o sujeito se mobilize fisicamente, psicologicamente e socialmente e isso exige a presença de um trabalho de equipe interdisciplinar e o envolvimento de toda a sociedade.

O autor supracitado (2007, p. 620) afirma que: “Se as políticas sociais e de saúde conse-guirem promover a habilidade funcional da população idosa e construir um sistema adequado de suporte para ela, aumentará as chances de uma velhice saudável, uma vida com mais qualidade”.

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Entre as estratégias utilizadas para manter o idoso no convívio em sociedade estão os trabalhos, atividades e atendimentos grupais, que permitem a troca de carinho, experiências, ideias, sentimentos, conhecimentos, dúvidas, além de uma troca permanente de afeto. O atendimento grupal é uma forma de manter o sujeito engajado socialmente, a relação interpessoal democrática contribui de forma significativa para sua qualidade de vida. A UNIVERSIDADE ABERTA A TERCEIRA IDADE E O TRABALHO COM

A AFETIVIDADE ATRAVÉS DA SOCIOPSICOMOTRICIDADE RAMAIN-THIERS Na sociedade brasileira, cada dia é maior o contingente de idosos que estão impedidos de viver essa etapa de vida com dignidade, alegria e prazer. Conhecendo esta reali-dade, profissionais de várias áreas e algumas instituições educacionais têm procurado oferecer cursos, vivências e atendimentos variados objetivando melhorar a qualidade de vida do idoso.

Nessa perspectiva, algumas instituições de Ensino Superior têm oferecido um pro-grama denominado Universidade Aberta à Terceira Idade, UNATI, com o objetivo de opor-tunizar uma variedade de cursos e vivências grupais que possam contribuir para a qualidade de vida e a integração do idoso no seu grupo social.

Os estudos desenvolvidos pela psicologia, geriatria, sociologia e gerontologia têm apontado que entre as mudanças psicológicas mais visíveis com o avanço da idade estão, au-mento da ansiedade, dificuldade de adaptação a novos papéis; desmotivação, dificuldade de planejar o futuro; necessidade de trabalhar perdas e adaptar-se a mudanças; alterações psico-lógicas e de autoimagem e autoestima rebaixada. Conhecendo essa realidade psicossocial do idoso, a UNATI tem interesse em disponibilizar oficinas que trabalhem os aspectos afetivos tão significativos para o idoso, sua família e a comunidade a qual pertence.

Orientada pela preocupação em atender o idoso em suas necessidades afetivas, cognitivas e sociais foi proposta uma oficina na UNATI organizada a partir do referencial teórico-prático da Sociopsicomotricidade Ramain – Thiers. Essa oficina teve como objetivo promover a integração entre o pensamento, raciocínio lógico, memória, argumentação e pla-nejamento, com os sentimentos – emoção, desejo, motivação e a interação social.

A Sociopsicomotricidade Ramain – Thiers é uma metodologia terapêutica que se fundamenta na articulação teórica das contribuições da Psicanálise, da Psicomotricidade e da Psicoterapia de Grupo. Sua operacionalização acontece através de vivências com atividades que incluem vários tipos de propostas proporcionando aos idosos a compreensão do próprio processo de envelhecimento, o reconhecimento de suas potencialidades, a ressignificação de suas limitações, a redescoberta do otimismo, da alegria, do bom humor e estimulando essen-cialmente as mudanças afetivas.

Os encontros grupais estruturam-se dinamicamente em três momentos com ativi-dades de Trabalho Corporal, de Psicomotricidade Diferenciada e Verbalização.

O Trabalho Corporal possibilita vivências de sensibilização e estimulação da per-cepção corporal promovendo uma maior integração do sujeito com seu próprio corpo. Nesse trabalho são usados materiais como bolas, cordas, tecidos e música. Para Thiers (2009) a música é de crucial importância no trabalho corporal, tendo em vista que associada aos mo-vimentos da Sociopsicomotricidade, favorece ao idoso condições para combater o estresse, melhorar a autoestima e estimular a reaprendizagem afetiva, melhorando a qualidade de vida. A esse respeito, a autora citada (2009, p. 226) acrescenta que: “As propostas com temas

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mu-sicais propiciam ao indivíduo uma redescoberta de suas emoções e contribuem para ajustar e adaptar no tempo e no espaço limite aceitar o outro, liberar o inconsciente e permitem ao individuo reencontrar fontes de vida motora, mental e afetiva”.

As Atividades de Psicomotricidade Diferenciada encontram-se detalhadas no Orientador Terapêutico Thiers, material organizado para atender uma faixa etária específica, criança, adolescente e adulto. É composto por uma série de conjuntos ou agrupamentos de propostas com atividades que envolvem dobraduras, cópias, trabalhos com arame, quebra-ca-beças, texturas e recortes, entre outras. Ao realizar as propostas o grupo vive emocionalmente etapas do desenvolvimento afetivo e trabalha também a percepção visual, tátil, a memória, a atenção, a capacidade de discriminação de elementos, a criatividade, a ampliação do pen-samento crítico e o controle motor. Nas atividades que requerem o uso do lápis, a borracha não é utilizada quando ocorre o erro, para corrigi-lo utilizam-se lápis de cores diferentes. Essa troca de lápis permite a descoberta de que na vida pode-se recomeçar e encontrar novos caminhos, novas saídas.

A Verbalização é o momento do encontro em que cada componente do grupo fala livremente a respeito do que vivenciou, das lembranças que foram evocadas, das atitudes que precisam ser tomadas.

A Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers se preocupa em compreender o sujeito como ser social, inserindo-o em seu contexto, de acordo com Thiers (1994, p. 19):

Ramain Thiers visa à compreensão do sujeito psíquico, que engloba o sujeito social, seu aprendizado de vida em coletividade, o respeito a si próprio, ao outro. Para Ramain Thiers, é impossível conceber o sujeito fora de sua sociedade, sem sofrer as influências da macroestrutura com sua política e economia, atingindo gravemente o psiquismo individual e social.

O trabalho grupal desenvolvido em Ramain Thiers proporciona através do contato com o outro, a oportunidade do sujeito entrar em contato com seu próprio corpo, seus sen-timentos e sua forma de pensar, dessa forma vai descobrindo diferentes alternativas para se transformar em um ser social e produtivo.

As vivências em Ramain-Thiers podem possibilitar que o idoso se conheça, se aceite e aceite e respeite o próximo. Ao conhecer suas potencialidades e habilidades, o idoso pode acreditar mais em si mesmo e viver melhor com saúde e felicidade. O cultivo de boas rela-ções familiares e grupais, a aceitação e a inclusão, certamente farão surtir efeitos positivos. É interessante salientar que, para alguns autores, as pessoas que aceitam a velhice com suas limitações e vantagens, procurando viver esta fase da vida com as possibilidades que ela ofe-recer, conseguem ser felizes, aproveitam seu tempo com atividades que propiciem prazer e bem estar. Essa forma de viver desencadeia um equilíbrio emocional e uma vida feliz e plena.

Conhecendo a relevância da afetividade e da interação social esta oficina se propõe a fortalecer os aspectos positivos da afetividade através do autoconhecimento, da autoaceitação e do resgate da autoestima.

Ao participar do grupo, o idoso entrará em contato com a manifestação de suas emoções, conviverá com seus limites e poderá buscar a transformação dos seus hábitos. Dessa forma, trabalhando a afetividade que é o combustível para enfrentar novos desafios, o idoso poderá criar novos projetos e perspectivas de vida.

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METODOLOGIA Contexto

Este estudo foi realizado com um grupo de mulheres matriculadas no Programa de Gerontologia Social (UNATI), Universidade Aberta a Terceira Idade, da Pontifícia Universi-dade Católica de Goiás (PUC Goiás), como parte do Estágio Supervisionado para Conclusão do Curso de Especialização em Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers.

Participantes

Participaram da Oficina de Qualidade de Vida na 3ª Idade: O desafio de integrar pensamento, sentimento e interação, onze mulheres, com idade entre 62 e 73 anos, todas aposentadas e/ou pensionistas, com nível de escolaridade variando entre ensino fundamental e ensino superior, nível socioeconômico baixo.

Procedimento

A proposta de estágio foi apresentada para a coordenação do programa de Geron-tologia Social da PUC Goiás. Após a aprovação o projeto da Oficina “A Qualidade de Vida na 3ª Idade: o desafio de integrar pensamento, sentimento e interação” foram apresentados em uma reunião geral com mediadores de todas as oficinas, os alunos e alunas. Nessa opor-tunidade vinte e seis pessoas se interessaram em participar da oficina. Foram formados dois grupos, organizados de acordo com a disponibilidade de horário e dias da semana. O grupo, apresentado neste estudo, contou com onze participantes.

A referida oficina tem como referencial teórico-prático a abordagem dinâmica e te-rapêutica, denominada Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers. Foi desenvolvida em encontros realizados uma vez por semana, nas quartas-feiras. As vivências desenvolvidas em cada encontro foram estruturadas de acordo com a proposta de Thiers (1998) em três momentos, já explicita-dos no item anterior: trabalho corporal, psicomotricidade diferenciada e verbalização.

Para conhecer as participantes do grupo, identificar as características predominan-tes no funcionamento grupal e a fase psicossocial que o grupo estava no momento, ou seja, se era fase oral, anal, fálica ou genital, foram realizadas nas primeiras sessões: Atividades Livres, Semi-Diretivas e Propostas Corporais.

Materiais

As sessões foram realizadas em uma sala ampla, com boa claridade, ventilação ade-quada situada na área I, da PUC Goiás, contendo carteiras, uma mesa, um quadro com opção de giz e caneta magnética.

Os materiais utilizados foram: papeis cópia de máquina, sulfite, crepom, quadri-culado de um cm, camurça, cartão, cartolina e ofício em cinco cores diferentes, lápis preto, de cor e de cera, canetas hidrocor, adesivos, etiquetas, tesoura, cola branca e colorida, arame, barbante, durex, palito de picolé, lantejoulas coloridas, cianinhas coloridas, bolas, balões, fitas e materiais diversos para confecção de caixa e v a, power point, aparelho de som e cd.

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APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE CASO

Durante o desenvolvimento desta oficina percebeu-se a importância de um olhar sistêmico em relação ao grupo, admitindo, contudo, a individualidade de cada uma das inte-grantes do grupo.

A seguir serão apresentados alguns encontros, expondo os resultados e discutin-do-se os dados.

No primeiro encontro do grupo foi apresentada a metodologia Ramain Thiers, através da leitura de um texto explicativo com a participação de todas as participantes. Em seguida realizou-se a atividade corporal, uma dinâmica com o objetivo de proporcionar e facilitar as apresentações das componentes do grupo.

Nesta dinâmica as participantes pegaram cada uma um balão, elas o encheram e caminharam com este pela sala ao som de uma musica. A cada quatro toques para cada moda-lidade, palma da mão, costas da mão, cotovelos, dando soquinhos, mudavam o balão de mão. A seguir foi solicitado que trocassem o balão com uma colega que estivesse com um balão da mesma cor que o seu e continuassem a realizar os movimentos sugeridos. Em seguida, todas deveriam jogar os balões para cima e rebater todos que estivessem no ar, independente de ser o seu, sem deixar cair no chão. Após uma movimentação intensa e com muito riso foi solici-tado que cada uma voltasse ao circulo e estourasse o balão que estava na sua mão. Dentro de cada balão havia uma pergunta e com a resposta a essa pergunta iniciou-se a apresentação das componentes do grupo.

O grupo expressou ter gostado desta brincadeira: “foi bom para distrair e relaxar”. Algumas colegas tiveram dificuldade para encher os balões, neste momento percebeu-se o companheirismo e a preocupação com o bem estar do outro, pois várias participantes se ofe-receram para auxiliar as outras diante do obstáculo.

No decorrer do encontro, foi proposta a atividade diferenciada, que consistia em construir um objeto reunindo todas as peças de lego que ali se encontravam. Este momento possibilitou perceber a participação de cada uma no trabalho grupal, favorecendo condições para a vivência de cooperação, autoconhecimento, socialização, respeito, desenvolvimento da capacidade de liderança, criatividade e atenção. Todas expressaram que foi mais fácil fazer esta atividade em grupo, porque surgiram novas ideias e sugestões. Durante o processo de montagem do objeto duas participantes expressaram a dificuldade em utilizar as peças na construção, pois estavam com medo de quebrá-las. Sentiram-se mais confiantes e capazes quando outra colega juntou-se a elas para ajudar.

Percebeu-se que essa atividade estimulou as expressões de cooperação, respeito e socialização estabelecendo um clima de confiança e aceitação que é muito benéfico para o desenvolvimento do trabalho em grupo. Com o apoio nas relações interpessoais, cada inte-grante do grupo pode iniciar uma ressignificação da sua autoestima, pois essa, de acordo com as relações que o idoso estabelece com o seu ambiente familiar e social, pode revestir-se de conotação negativa, levando a apatia, isolamento e falta de motivações para a realização de tarefas mais simples.

A produtividade do grupo se concretizou, na construção do objeto, “uma mesa” com as peças de cada uma, graças à parceria e ao diálogo que se fizeram presente durante todo o tempo das atividades. Esse primeiro encontro estimulou o relacionamento, a comunicação, a confiança e a coragem de ser, estimulando as participantes a cultivarem o desejo e a alegria.

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A vivência possibilitou ao grupo enfrentar o desafio expresso por Néri (2001, p. 173): “En-velhecer confronta-nos com aquilo, priva-nos daquilo e ameaça-nos naquilo que nos é mais querido: nosso desejo de ser.”

No sexto encontro, trabalhou-se com a atividade diferenciada focalizando a sime-tria. Duas atividades do conjunto CR-10/3, apresentavam figuras simétricas desenhadas sepa-radamente e uma do conjunto CR-10/7, que apresentava a metade de uma figura preenchida com sinais 0 e X. Na primeira atividade elas deveriam recortar as partes das figuras, montá-las de acordo com a simetria e colar as figuras em um papel ofício. Dando sequência ao encontro, realizou-se a segunda atividade, cada participante recebeu a cópia do material e os lápis ver-melho e azul. Orientou-se as participantes a copiar os sinais completando a simetria, todos os sinais que estivessem de um lado deveriam ser copiados do outro lado na mesma sequência e deveriam utilizar o lápis de cor vermelha para copiar o O e lápis de cor azul para copiar o X.

De acordo com o embasamento teórico da Sociopsicomotricidade os motivos si-métricos mobilizam integração, ou seja, permitem lidar com o outro lado, conteúdos que são negados e, ainda, com a integração entre passividade - atividade.

Na atividade corporal, trabalhou-se o relaxamento das tensões corporais, com a liberação de músculos e energia bloqueada. Com um fundo musical lembrando movimentos de água, as participantes deveriam fechar os olhos e pensar nas imagens descritas pela coorde-nadora, fazendo uma reflexão. A leitura foi realizada lentamente e com voz suave.

No momento de verbalização as integrantes do grupo recordaram o passado, revi-veram as emoções das perdas e até mesmo as experiências boas daquela época. Expressaram as dificuldades que passaram, o sofrimento vivenciado com a aposentadoria, o conflito entre a expectativa de uma vida mais tranquila após a aposentadoria e a dura realidade que estão enfrentando. Relataram suas histórias de vida, relembrando através da atividade corporal, os momentos da infância, os sapos cantando, das viagens ao rio Araguaia e realmente se sentiram na água.

A proposta de relaxamento mobilizou a afetividade e promoveu reminiscências que são muito relevantes para o trabalho com as emoções, de acordo com Oliveira (1999, p. 111): “as recordações, quando não em exagero, auxiliam a manter vivo o sentimento de continui-dade, permitindo ascender uma consciência profunda e definitiva da própria individualicontinui-dade, na qual tem muita importância à questão relacionada à autoimagem e a autoestima”.

A importância da afetividade nos relatos e lembranças expressos pelos idosos é res-saltada também por Néri (2001, p. 134): “Ao pensarmos em vida afetiva, narraremos a histó-ria de nossos afetos, permeado por encontros e desencontros, aleghistó-rias e tristezas, realizações e frustrações.”. A autora complementa que afetar significa produzir efeitos, noção desvinculada de qualquer juízo de valores.

A velhice é uma etapa em que a crescente experiência pode compensar capacidades em declínio, porém, são necessários ajustes e reconfigurações de ordem interna e externa, sobretudo, como sujeito capaz de amar e criar, com o vigor e as limitações, encantos e desen-cantos, características da meia idade e de todas as idades.

Durante esse encontro, ouvir as histórias das colegas, falar da sua história de vida, dialogar, sorrir e lembrar com alegria das experiências vividas, permitiu uma ampliação do autoconhecimento, bem como da flexibilidade e da busca pelo prazer de viver.

O último encontro do grupo foi iniciado com a confecção do cartão coletivo, a coordenadora explicou as participantes que cada uma deveria escolher um cartão colorido

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disposto sobre a mesa e personalizá-lo, ou seja, escrever o seu nome. Quando batesse palmas elas deveriam de imediato passar o seu cartão para a colega da direita. Com o novo cartão em mãos deveriam registrar duas qualidades positivas da pessoa cujo nome estivesse escrito na parte superior do papel. Todas escreveram em todos os cartões. A escrita deveria ser em posições diferenciadas, ou seja, para direita, para cima, para baixo, na transversal, poderiam inventar o jeito de escrever. Ao finalizar a atividade cada uma das participantes estava com o seu cartão com o registro das qualidades que as colegas lhe atribuíram.

Na sequência, foram apresentados alguns slides com fotos das participantes reali-zando as atividades em todos os encontros. Elas se divertiram se identificando nos slides e lembrando-se dos acontecimentos daquele dia. A seguir, as coordenadoras da oficina entrega-ram a cada uma a caixa que havia sido confeccionada no encontro anterior.

A atividade corporal desse encontro foi realizada com tema musical, cada parti-cipante recebeu diferentes trechos de refrão das músicas: Índia; Trem das Onze; Bate Bate Coração; Quem parte leva Saudades e Amigos para Sempre. Elas deveriam cantar baixinho o trecho da música recebida até encontrar as parceiras que estavam com a continuidade do refrão. Ao se unirem, duplas ou trios, deveriam cantar a música e fazer a coreografia. Como a música resgata o afeto, a sensibilidade e as emoções o grupo pôde cantar, interagir e vivenciar momentos de alegria e fortalecimento da amizade.

O encontro foi finalizado com uma confraternização, cada participante levou um tipo de alimento, frutas e sucos naturais. O grupo se preocupou em organizar uma refeição com alimentos saudáveis. Todas estavam muito alegres e dispostas, as coordenadoras tiraram fotos com o grupo e foram realizadas várias brincadeiras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O envelhecimento, não obstante constitua-se parte inerente do ciclo vital, precisa ser considerado de forma sistêmica, não perdendo de vista a realidade que envolve os idosos, ou seja, o aspecto social passado e presente, aspectos físicos e cognitivos, sentimentos a respei-to de si, seu relacionamenrespei-to com as outras pessoas, bem como o meio no qual vive e funciona. A dimensão psicológica do envelhecimento, tema deste estudo é merecedora de maiores cuidados considerando que muitos dos sintomas de ordem física e social podem estar relacionados ao desenvolvimento emocional de sujeito.

Os autores citados no desenvolvimento desta pesquisa mostraram que o idoso para se sentir inserido na sociedade, produtivo e capaz de realizar intervenções transformadoras é fundamental que ele si permita entrar em contato com a sua afetividade, reconhecê-la e expressá-la. Esse movimento só é possível se o idoso se autoconhecer e se aceitar, valorizar a si e ao outro, elevar a autoestima conhecendo suas possibilidades e limitações, bem como as de seus companheiros.

Para que o sujeito na terceira idade conserve o equilíbrio emocional e um estilo de vida realista e otimista é imprescindível que vivencie em seu grupo social e familiar a valoriza-ção do seu potencial e das experiências pessoais e profissionais, e se sinta respeitado.

A oficina realizada com o grupo de Terceira Idade UNATI possibilitou uma análise bastante consistente acerca das necessidades presentes nessa faixa etária.

Observou-se nas idosas, durante todos os encontros, uma intensa necessidade em compartilhar seus anseios, medos e frustrações, muitas queixasdesintomas físicos, tais como

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dores generalizadas, tontura, indisposição, dificuldade de realizar as atividades com precisão e ausência de produção escrita. Esses sintomas poderiam estar associados a uma falta de atenção e de afeto, pois, na medida em que os encontros aconteciam eles foram diminuindo e em alguns casos até desapareceram. Muitas idosas reclamavam da falta de reconhecimento de sua experiência e do seu saber, não se sentiam produtivas e sim estigmatizadas pela família e pelo seu grupo social.

A partir das observações e discussões de todos os encontros realizados no decorrer desta oficina, foi possível perceber também como a troca de conhecimento, carinho, expe-riências, ideias, sentimentos e a circulação permanente de afeto, permitiu que os vínculos afetivos se aprofundassem e desenvolvessem a produtividade, a criatividade, a valorização do potencial humano e a harmonia de viver em coletividade.

A oficina Qualidade de vida na Terceira Idade: desafio de integrar o pensamento e interação através da Sociopsicomotricidade Ramain-Thiers, possibilitou a esse grupo de idosas repensar os seus limites, acreditar em suas possibilidades e resgatar a sua dignidade. As reflexões sobre as transformações pelas quais passaram, as descobertas que realizaram em cada atividade e as vivências caracterizadas pela aceitação levaram esse grupo de mulheres a adotar uma postura mais saudável diante da vida, compreender as relações entre limites e possibilida-des, melhorar relação interpessoal e aumentar a sua participação social. Suas habilidades afe-tivas, cognitivas e sociais se desenvolveram como confirmam os relatos apresentados a seguir: “Esses encontros foram importantes para mim, sinto mais segura de realizar as ati-vidades, a percepção, o social, o motor e o cognitivo, senti diferença com poucos encontros.” “Adquiri mais confiança para falar de mim mesma diante de outras pessoas, ou seja, me expor sem medo e sem vergonha.”

“Foi muito importante o envolvimento nas atividades, muito bom trabalho de gru-po para me comunicar com as colegas.”

“Eu avalio uma grande mudança no meu corpo inteiro. Relação, percepção motora e social, e mais facilidade para fazer amizade, eu considero uma família.”

“Eu me senti mais solta, menos nervosa, aprendi muito com vocês. Fiz amizades com minhas colegas. Foi ótimo em todos os sentidos.”

“Minha participação e envolvimento nas atividades com o grupo foi bom e mesmo individual, foi satisfatório. Relacionei bem, fui mudando meus aspectos emocionais, motores, cognitivos e sociais, houve melhora, porque aprendi bem com a turma e as professoras que nos entenderam, ajudaram, enfim, senti bem e com alegria.”

“Melhorei muito com o grupo, mais do que o esperado, estou melhor em relação a amizades, estou mais falante.”

“Esses encontros foram importantes para mim. Me sinto mais segura ao realizar atividades. A cada aula saía com a minha autoestima em alta.”

As análises do material escrito, dos relatos e das observações realizadas durante a ofi-cina descrita indicaram que ela conseguiu atingir os seus objetivos. As mudanças de posicio-namento em relação à interpretação dos fatos, a consciência crítica, a aceitação, a percepção das possibilidades, o entusiasmo pelas descobertas e o investimento nas relações interpessoais mostraram que através da afetividade é possível contribuir para a melhoria da qualidade de vida na terceira idade.

Como uma das integrantes, coordenadora deste grupo, me senti muito feliz por po-der vivenciar os avanços no desenvolvimento global de cada participante, percebi a

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importân-cia da participação de cada uma no trabalho grupal e do papel da troca de experiênimportân-cias para a socialização e aprendizagem. Aprendi ainda mais a respeitar e admirar o grupo da terceira idade, pela sabedoria que existe na maturidade.

AFFECTION IN THE ELDERLY AGE: RETHINKING THE FEELINGS, THE POSSIBILITIES AND THE INTERPERSONAL RELATIONS.

Abstract: we intend to discuss the transformations and the individual’s needs in the elderly age, considering the expectations influences and values occured within the capitalist society, as of a workshop results held in the Gerontology Social program of Puc- Goiás.

Keywords: Elderly age. Interpersonal relations. Affection. Ramain-Thiers. Referências

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