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Da prática fisioterapista à fisioterapia como profissão

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Academic year: 2021

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Ana Luiza de Oliveira e Oliveira

DA PRÁTICA FISIOTERAPISTA À FISIOTERAPIA

COMO PROFISSÃO

CAMPINAS

2011

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Ana Luiza de Oliveira e Oliveira

DA PRÁTICA FISIOTERAPISTA À FISIOTERAPIA

COMO PROFISSÃO

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-graduação em Saúde

Coletiva, do Departamento de Medicina

Preventiva e Social da Faculdade de

Ciências

Médicas

da

Universidade

Estadual de Campinas, para obtenção do

título de Mestre em Saúde Coletiva, área

de concentração Ciências Sociais em

Saúde.

ORIENTADOR: Prof. Dr. Everardo Duarte Nunes

CAMPINAS

Unicamp

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FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA

BIBLIOTECA DA FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DA UNICAMP

Bibliotecária: Rosana Evangelista Poderoso – CRB-8ª / 6652

Título em inglês: From the physiotherapist practice to physiotherapy as a profession Keywords: • Physiotherapy • History • Sociology • Medicine • Nursing • São Paulo (SP)

Titulação: Mestrado em Saúde Coletiva

Área de concentração: Ciências Sociais em Saúde

Banca examinadora:

Prof. Dr. Everardo Duarte Nunes Prof. Dr. André Mota

Prof. Dr. Eliete Maria Silva Data da defesa: 11-02-2011

Oliveira, Ana Luiza de Oliveira

Ol4p Da prática fisioterapista à fisioterapia como profissão. / Ana Luiza de Oliveira e Oliveira. -- Campinas, SP : [s.n.], 2011.

Orientador : Everardo Duarte Nunes

Dissertação (Mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas.

1. Fisioterapia. 2. História. 3. Sociologia. 4. Medicina. 5. Enfermagem. 6. São Paulo (SP). I. Nunes, Everardo Duarte. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Ciências Médicas. III. Título.

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Dedico este trabalho... Aos meus pais Paulo Roberto e Maria Aparecida; Às minhas manas, Maria Virgínia e Tereza Cristina; Aos meus avós Jaime, Cesária e Graciana; A todos os fisioterapeutas que dentro das inquietudes do trabalho diário encontram razões

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AGRADECIMENTOS

A elaboração de uma dissertação se faz de forma processual, o que nos dá a possibilidade de nos recriarmos enquanto pessoas e nos aproximarmos de pessoas durante o percurso intelectual. Sem essas pessoas que recheiam o caminho, tornando-o mais leve, não seria tão prazerosa minha formação profissional e humana nestes dois anos percorridos. Somadas aos grandes colaboradores de minha trajetória na vida estão as pessoas desta instituição, a FCM/Unicamp, que se fizeram fundamentais na construção do que sou hoje e do trabalho que agora apresento.

Agradeço de forma justa e verdadeira:

A meus pais pelo apoio constante, permeados de confiança, orgulho e amor. À minha “mana” Tereza Cristina de Oliveira e Oliveira, substância da qual a magia é feita, a substância que forma minha alma.

À Professora Conceição Reis, alma iluminada que me incentiva sempre.

Aos (as) queridos(as) amigos(as) Cristiane Spadacio, Manoela Carvalho, Thais Ottani, Lucas Melo, Fabiana Peroni, Carmem dos Santos e Larissa Veríssimo, companheiros(as) que em muitos momentos me seguraram em suas as mãos.

À Eduardo de Oliveira Belleza pelo respeito.

Aos professores, funcionários e alunos do Departamento de Medicina Preventiva e Social, sempre incentivadores na construção do conhecimento em Saúde Coletiva, em especial ao Prof. Dr. Nelson Felice de Barros, Prof. Dr. Gastão Wagner de Souza Campos e

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à Profa. Dra. Solange L’Abbate. À Maísa, Vera, Regina, Rogério e Stela pela disposição em ajudar na burocracia da Universidade.

À Profa. Dra. Maria Lúcia Mott por me guiar pelos sinuosos percursos da História em minha primeira aproximação com este campo do conhecimento.

Ao Prof. Dr. André Mota por generosamente confiar-me a documentação do Museu Histórico Professor Carlos da Silva Lacaz da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (MHPCSL/FM/USP0 e por ser um grande amigo. À Profa. Dra. Márcia Regina Barros da Silva pela sempre disposição em ajudar e iluminar meus passos.

À Profa. Dra. Eliete Maria Silva e ao Prof. Dr. Mauro Antônio Pires Dias da Silva pela disposição em ajudar nesta caminhada.

Ao Grupo de Estudos História das Ciências da Saúde (Gehcsaude) e aos amigos da Rede Interdisciplinar de Pesquisa em História da Medicina e da Saúde de São Paulo (RedeHiss) que se fizeram fundamentais para minha implicação nos estudos históricos.

Aos funcionários do Museu Emilio Ribas e do MHPCSL/FM/USP pelos momentos em que submersa em documentos me ajudaram a enxergar novas possibilidades.

Meu reconhecimento e gratidão a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio financeiro.

Por fim, um especial agradecimento ao meu orientador, Everardo Duarte Nunes, mestre generoso e companheiro, sempre disposto a ensinar, iluminando o trajeto com carinho e paciência. Por confiar em meu trabalho e me mostrar o sentido dos estudos sócio-históricos.

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SUMÁRIO

Pág.

LISTA DE ABREVIATURAS ...xv

LISTA DE ILUSTRAÇÕES ...xvii

LISTA DE FOTOGRAFIAS ...xix

LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS...xxi

RESUMO ...xxiii

ABSTRACT... xxv

APRESENTAÇÃO DO TEMA ... 27

i Desenvolvimento do trabalho: como montar um quebra cabeça ... 36

ii O que e como tentaremos montar ... 38

CAPÍTULO 1... 43

A moldura: comece um quebra cabeça pelas bordas... 43

1.1 Sociologia das Profissões: uma possibilidade de olhar ... 45

1.2 Sociologia das profissões na saúde ... 57

CAPÍTULO 2... 69

Ilumine o jogo: virando as peças para cima... 69

2.1 A política de saúde do Brasil na primeira metade do século XX ... 71

2.2 As transformações paulistanas... 81

2.3 A saúde ‘especializada’ da primeira metade do século XX ... 85

2.4 A formação médica e da enfermagem nos anos 1930 e 1940 ... 91

CAPÍTULO 3... 105

Dando forma à imagem: separe as peças por cor ... 105

3.1 A medicina paulistana se abre às práticas fisioterapistas: Raphael de Barros, Rezende Puech e Godoy Moreira... 107

3.2 As práticas fisioterapistas ... 125

3.2.1 Hidroterapia: a cura e o cuidado pela água ... 130

(14)

3.2.4 Eletroterapia... 147

3.2.5 Termoterapia e fototerapia... 152

3.3 As primeiras associações profissionais: a legitimação das práticas fisioterapistas .. 155

3.3.1 A Fisioterapia na Inglaterra ... 157

3.3.2 A Fisioterapia nos Estados Unidos... 166

3.3.3 A institucionalização da fisioterapia na segunda metade do século XX no Brasil ... 174

3.4 A Fisioterapia na legislação de saúde da primeira metade dos século XX e os Livros de Registro Livros de Fiscalização do Exercício Profissional ... 178

CAPÍTULO 4... 191

Encaixe as peças: montando o quebra-cabeça ... 191

4.1 Da prática fisioterapista à fisioterapia como profissão... 193

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 199

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 205

ANEXOS ... 219

Anexo 1 Registro profissional de enfermeiro massagista no livro 3 da Coleção Livros de Registro do Serviço de Fiscalização do Exercício Profissional do Serviço Sanitário de São Paulo ... 221

Anexo 2 Registro profissional de enfermeiro fisioterapista no livro 5 da Coleção Livros de Registro do Serviço de Fiscalização do Exercício Profissional do Serviço Sanitário de São Paulo ... 223

Anexo 3 Registro profissional de enfermeiro massagista e duchista no livro 6 da Coleção Livros de Registro do Serviço de Fiscalização do Exercício Profissional do Serviço Sanitário de São Paulo ... 225

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LISTA DE ABREVIATURAS

AACD Associação de Assistência à Criança Deficiente ABBR Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação APTA American Physical Therapy Associatin

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CAPs Caixas de Aposentadoria e Pensão

CSMMG The Chartered Society of Massage and Medical Gymnastic CSP Chartered Society of Physiotherapy

DNSP Departamento Nacional de Saúde Pública

EE/USP Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo

FEB Expedicionária Brasileira

FM/USP Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo FMC/SP Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo GEHCSAUDE Grupo de Estudos História das Ciências da Saúde

HC Hospital das Clínicas

IAP Instituto de Aposentadoria e Pensão

IGM Primeira Guerra Mundial

IIGM Segunda Guerra Mundial

IMRG Institute of Massage and Remedial Gymnastic

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INAR Instituto Nacional de Reabilitação INPS Instituto Nacional de Previdência Social IOT Instituto de Ortopedia e Traumatologia

IR Instituto de Reabilitação

IS/SES-SP Instituto de Saúde da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo ISTM Incorporatede Society of Trained Masseuses

LESF Lar Escola São Francisco

LRSFEP/SSP Livros de Registro do Serviço de Fiscalização do Exercício Profissional do Serviço Sanitário de São Paulo

MESP Ministério da Educação e Saúde Pública

MHPCSL/FM/USP Museu Histórico “Professor Carlos da Silva Lacaz”da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

NHS National Health Service

OMS Organização Mundial de Saúde

ONU Organização das Nações Unidas

PPA Private Practioners Association

REDEHISS Rede Interdisciplinar de Pesquisa em História da Medicina e da Saúde de São Paulo

SBOT Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologias SNFM Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina

STM Society of Trained Masseu

SUS Sistema Único de Saúde

USP Universidade de São Paulo

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Pág.

1. Documento em homenagem à Raphael de Barros...111

2. Pavilhão Fernandinho Simonsen, 1930...113

3. Caderneta de anotações de Godoy Moreira, 1924-1926... 116

4. Logotipo do Instituto ortopédico e clínica de fraturas Dr. Godoy Moreira, 1930... 118

5. Carta enviada por Luthero Vargas à Godoy Moreira no final da década de 1940... 123

6. “Hydrotherapy cures” no início do século XX... 131

7. “Hydrotherapy cures” no início do século XX... 131

8. Hidroterapia no século XIX na Inglaterra... 132

9. Trecho da caderneta de anotações de Godoy Moreira, 1924-1926... 136

10. Propaganda de serviço de massagem na imprensa brasileira, 1915... 139

11. Trecho da caderneta de anotações de Godoy Moreira, 1924-1926... 140

12. Anúncio do Instituto Zanders, 1914...143

13. Trecho da caderneta de anotações de Godoy Moreira, 1924-1926... 146

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LISTA DE FOTOGRAFIAS

Pág.

1. Pacientes em “blanket paks”/hidroterapia, 1926...134

2. Departamento de hidroterapia, 1943... 134

3. Hidroterapia/Duchista, 1942...134

4. Hidroterapia/Duchista, 1942...134

5. Setor de Hidroterapia, 1949...134

6. Setor de Hidroterapia, 1949...134

7. Tratamento com fototerapia e massagem...139

8. Vichy massage...139

9-15. Aparelhagem desenvolvida por Gustav Zander no século XIX...144

16. Sala de massagem e exercícios terapeuticos...145

17. Cinesiotrerapia, 1923...145

18-19. Eletroterapia para estimulação facial, 1830...148

20. Estudo das expressões faciais humanas por eletroestimulação...149

21. Foto e hidroterapia, 1944...153

22. Fototerapia, 1944...153

23-25. Fototerapia em pacientes do exercito americano 1943...153

26. Coleção dos livros de registro dos profissionais práticos habilitados, 1938-1978...183

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LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS

Pág.

1. Gráfico 1: Porcentagem de registros por sexo...185

2. Gráfico 2: Idade dos profissionais ao se registrar...186

3. Gráfico 3 Número de registros por nacionalidade...187

4. Gráfico 4 Número de registros por categoria profissional...188

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RESUMO

A partir da análise sócio-histórica dos anos 1930 e 1940 no município de São Paulo, a pesquisa se propôs estudar como se organizavam as práticas fisioterapistas como uma prática profissional singular anterior à institucionalização da Fisioterapia como profissão. É um estudo que combina fontes primárias e secundárias, como a coleção dos livros de registros de fiscalização do exercício profissional, documentos pessoais de Godoy Moreira, Rezende Puech e Raphael de Barros, além de fotografias e a legislação federal e estadual do período em análise. O alinhamento de fontes diversas permitiu alcançar um conjunto de elementos que determinaram a existência de uma expertise própria no campo da saúde circundante ao problema da pesquisa. O olhar histórico possibilitou compreender como se estabeleceram as relações entre saber e prática no movimento de constituição da profissão. Tratou-se de verificar os indícios das práticas fisioterapistas e sua relação com os profissionais médicos(as) e enfermeiros(as) em sua trama histórica. Analisadas sob a lente da sociologia das profissões, os conceitos desenvolvidos por Eliot Freidson como expertise, credenciamento e autonomia emolduram o trajeto do estudo. Os pressupostos levantados constatam a dependência institucional da prática fisioterapista para ser aceita como ciência médica e posterior credenciamento pelo Estado, antes mesmo de uma estruturação formal de ensino. Os argumentos e fatos, em nome do movimento de institucionalização e regulamentação da profissão, concentram-se no encontro, no interior da instituição hospitalar, de médicos e enfermeiros, além de um contexto sócio-histórico permeado pela necessidade social em estabelecer as práticas fisioterapistas em São Paulo nos anos 1930 e 1940. Os dados do trabalho comprovam que havia uma aproximação entre os saberes e práticas. O estudo termina por revelar que a fisioterapia se consolida como profissão a partir da criação do “Curso técnico operador em fisioterapia Raphael de Barros” no interior da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, provocando um movimento que tomou força, culminando na institucionalização da profissão concretizada em 1969. Abrem-se, assim, novas possibilidades de estudos que desejam compreender a prática fisioterapista a partir de sua trama histórica.

Palavras-chave: fisioterapia (profissão), história, sociologia, medicina, enfermagem, São

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ABSTRACT

This research proposed to study the way in which physiotherapeutic practices were organized prior to the institutionalization and regulation of physiotherapy as a profession, starting from a socio-historical analysis of the emergence of singular practice, the physiotherapist practice, in São Paulo during the 1930’s and 1940’s. The research combined data arising from different historical sources, such as the collection of books regarding the oversight of the professions, personal documents of Godoy Moreira, Resende Puech and Raphael de Barros, photographs and federal and state legislation of the period being studied. The analysis of different sources allowed a set of elements that demarcated knowledge in the health field surrounding the research question. The historical overview allowed the understanding of how relationships between knowledge and practice were established in the constitution of the profession. It worked to substantiate evidence of the physiotherapists practice as an expertise and its relation with physicians and nurses in the health field. Examined under the lens of sociology of professions, the concepts developed by Eliot Freidson such as expertise, autonomy and accreditation mold the path of study. The assumptions raised demonstrate the institutional dependency of the physiotherapist practice to be accepted as a medical science and its posterior accreditation by the State even before a formal structure of education. The reasons that set up the movement of institutionalization and regulation of the profession are focused in encounters of physicians and nurses inside the hospital as well as in a socio-historical context permeated by the social need to establish a physiotherapist practice in São Paulo in 1930-1940. The research finishes by revealing that physiotherapy as a profession is consolidated by the creation of the technical course in physiotherapy, titled Raphael de Barros, leading the movement which was strengthened after the regulation of physiotherapy was established in 1969. The research opens up new possibilities for studies yearning to understand the physiotherapist practice from its historical plot.

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“História é um estudo da dinâmica das sociedades humanas no tempo, e não um amontoado de elementos desconexos, mas, sim, totalidades organizadas” (1).

Sempre gostei de quebra-cabeça, um jogo no qual o jogador deve resolver um problema proposto encaixando peças entre si para formar um todo. O gosto por juntar as partes na intenção de formar uma figura com linhas tênues que possam se desfazer a qualquer momento, acrescentando ou retirando elementos, é o motivador desse estudo, tido que “o desafio apresentado pelo quebra-cabeça constitui parte importante da motivação do cientista para o trabalho”(2).1

O quebra-cabeça aqui é uma alegoria. Uma representação de pensamentos por elementos simbólicos como modo de olhar para a solução de um problema, minha pergunta de partida: “Como se configurava a prática fisioterapista nas décadas de 1930 e 1940 em São Paulo?”

Considerando que depois de montado, esse problema poderá ganhar novas peças e transformar-se em uma nova imagem, este estudo se propõe um jogo sem solução totalizante já que, após terminado, todo ele se transformará em mais uma peça a ser selecionada de dentro de uma caixa para solução de novos problemas.

Dessa forma, esse é um trabalho sobre as oportunidades político-sociais e epistemológicas que possibilitaram a consolidação de uma prática terapêutica que será a partir dos anos 1950 hegemonicamente defendida como reabilitadora. Temos como objetivo fornecer novas peças para a interpretação da História da Fisioterapia, mostrando

1 Kuhn entende a ciência normal, firmemente baseada em realizações científicas passadas, como uma

atividade de resolução de “quebra-cabeças” e que solucionar o jogo não é simplesmente “montar um quadro”, mas alcançar o antecipado de maneira diferente (2).

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o processo pelo qual não só a medicina, mas também a enfermagem influenciaram a Fisioterapia em sua fase de incorporação pelo paradigma científico dominante no Brasil na primeira metade do século XX.

Neste ponto abro um parêntese importante para que o leitor compreenda o motivo pelo qual usaremos o termo práticas fisioterapistas para designar as atividades desempenhadas pelos “fisioterapeutas” nos anos 1930 e 1940. Concordamos com Alves(3) que “o campo semântico diz respeito à significação do que é dito, (…) é pelo campo semântico que se constitui, como ponto de partida, um corpus de significados capaz de organizar os dados da experiência”. Questionamos então que verbete usar: prática fisioterapista, fisioterapística, fisioterápica ou fisioterapêutica? Tais derivações da palavra fisioterapia merecem uma breve análise pra justificar a escolha dos verbetes utilizados ao longo do texto.

A palavra Fisioterapia, do grego physis (natureza), therapeia (tratamento) e por definição, aplicação dos agentes físicos e naturais no tratamento e prevenção das doenças, é uma especialidade da saúde que emprega agentes físicos (água doce ou salgada, sol, calor, frio, eletricidade etc.), massagens e exercícios no tratamento de doenças, conforme definição de dicionários publicados ao longo do século XX (4 - 8).

As derivações fisioterápica(o) e fisioterapêutica(o) são terminologias dicionarizadas desde 1913 (8) e remetem, no senso comum, uma prática voltada para a reabilitação visto que a fisioterapia científica da segunda metade do século XX volta-se primordialmente para essa prática terapêutica. Assim optou-se pela exclusão dos dois verbetes para designar a prática exercida nos anos 1930 e 1940 para que houvesse ao longo do texto

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uma perceptível diferenciação entre uma prática incipiente no cenário paulistano e a fisioterapia consolidada no campo da saúde. O conflito agora se dava entre os termos fisioterapística(o) e fisioterapista.

O conhecimento etimológico das palavras pretende apresentar a história, a origem e o significado de determinado verbete através da análise dos elementos que as constituem. Por isso, fazse necessária a discussão acerca da derivação sufixal ístico(a) e

-ista entendendo que morfologicamente, toda palavra tem significado e que a mudança

nominal deve ser levada em consideração, pois está relacionada ao amadurecimento de uma profissão (9).

Nas gramáticas da língua portuguesa do século XIX e início do século XX há, segundo datações do dicionário Houaiss, um aumento de vocábulos formados pelo sufixo -ístico(a), considerando-o uma forma proveniente da junção dos sufixos -ista e -ico(a). Concordando assim com outros gramáticos como Ferreiro e Sandmann apud Aréan-Garcia (10), que mencionam a forma ístico(a) como uma particularidade da formação do sufixo

-ico nos processos cuja base é uma palavra já derivada com o sufixo -ista.

Uma das formas de compreender o sufixo -ista está relacionado aos traços semânticos existentes em sua utilização. Nele, há um traço que indica “ocupação”, “ofício” e um traço referente à especialidade2 (11). Uma das definições dicionarizadas de especialista sugere: “que(m) possui habilidade num assunto ou numa atividade” (8). Tal constatação é condizente com o período em estudo por ser um momento de forte

2 Podemos perceber no campo da saúde um crescente número de verbetes referentes à profissionais

especializados, na primeira metade do século XX, como oftalmologista, ginecologista, dermatologista, nutricionista, dentre outros.

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especialização da medicina e consequente necessidade de “novos” profissionais. Se olharmos então a forma fisioterapista, podemos tomar a categoria profissional enfermeiro fisioterapista ou médico fisioterapista, explicitada no decorrer da dissertação, como uma especialização da prática da enfermagem/medicina no período analisado. Deste ponto em diante ao nos referirmos à fisioterapia e suas práticas anteriores ao processo de profissionalização em 1950 usaremos o termo práticas fisioterapistas.

Dessa forma trilharemos nossa pesquisa, tentando “montar” com a leitura dos documentos encontrados, uma imagem com significados, cruzando os dados obtidos com os que já possuímos dentro do nosso universo de referência para elucidar da prática fisioterapista à fisioterapia como profissão. Além disso, ressaltamos sem nos aprofundar, que a fisioterapia é uma das conseqüências das práticas fisioterapistas, mas não a única. Outras profissões e diferentes formas de terapia na saúde se desdobraram de tais práticas.

Entendemos que “não há realidade histórica acabada, que se entregaria por si própria ao historiador” (12). Faremos uma escolha, o que não significa aleatoriedade ou simples coleta, mas sim uma construção científica do documento cuja análise nos auxiliará na explicação do passado. Escolhemos a fisioterapia como desdobramento das práticas fisioterapistas.

Pretende-se revisitar as práticas fisioterapistas nas décadas de 1930 e 1940, problematizando sua prática social e seu objeto de trabalho. A revisitação pretende olhar de novo e com olhos novos formando um retrato que nos convide a ver, apreciar, refletir

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e compreender a configuração de uma profissão recente no país. Dessa maneira, o trabalho servirá como instrumento para reflexão sobre a profissão do fisioterapeuta atual. A institucionalização da Fisioterapia foi possível devido ao encontro de uma prática utilizada milenarmente, incorporada pela enfermagem e pela medicina e da necessidade de especialização destes dois modos de saber-fazer terapêutico decorrente dos avanços científicos que levavam à fragmentação do corpo e conseqüente demanda por técnicas específicas. Além do fato de haver forte necessidade social decorrente das duas Grandes Guerras e das epidemias, principalmente de poliomielite, que estiveram presentes no país na periodização aqui proposta.

* * *

Minha inquietação acerca da história da fisioterapia me acompanha desde a graduação. A história da profissão foi uma disciplina secundária, sem argumentos convincentes e com pouco caráter reflexivo durante a formação acadêmica. Acredito que por esse motivo havia pouco interesse pelos alunos(as). Pude perceber a escassez de referências sobre o tema e que uma profissão sem identidade fica limitada em suas atividades. Tentando situar historicamente a fisioterapia e a identidade profissional do fisioterapeuta alguns estudos foram feitos buscando compreende-la em diferentes áreas do saber como a História, Ciências Sociais, Saúde Coletiva, Geografia, Educação (13-19).

Não querendo sair do campo da Saúde, busquei um estudo que contemplasse de forma analítica a história da fisioterapia, fugindo de mitos fundadores para estabelecer

(33)

um diálogo com estudos nas áreas de História, Ciências Sociais e a Saúde Coletiva. Entendendo Saúde Coletiva como campo estruturado e estruturante de práticas e conhecimentos teóricos e políticos (20), encontrei um terreno fértil para explorar esses questionamentos.

Como aluna, em 2007, do Programa de Aprimoramento Profissional (PAP) em Saúde Coletiva do Instituto de Saúde da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (IS/SES-SP), vinculei-me ao projeto História das(os) Trabalhadoras(es) da Saúde3 coordenado pela Professora Doutora Maria Lúcia B. Mott. O projeto contava com fontes primárias ricas e intrigantes: os Livros de Registro do Serviço de Fiscalização do Exercício Profissional do Serviço Sanitário de São Paulo (LRSFEP/SSP). A documentação contemplada no projeto referia-se à fisioterapia além de outras profissões da Saúde. Trata-se de uma documentação inédita, preservada pelo Centro de Memória de Saúde Pública no IS/SES-SP4 que segundo Mott e colaboradores “não se têm notícia da preservação em arquivo brasileiro de coleção similar. A diversidade de dados compilados nos registros torna a série de importância ímpar e urgente sua divulgação” (21). Neste período tive meu primeiro contato com a pesquisa histórica e submersa em documentos pude viajar pelo tempo e tentar significar fontes em sua interface com a fisioterapia. No Museu Emilio Ribas “vivi” o passado no tempo presente.

3

História das/os Trabalhadoras/es da Saúde do Centro de Memória da Saúde Pública, Instituto de Saúde da Secretaria de Estado da Saúde, Núcleo de Memória e Historia da Saúde Pública, São Paulo.

4 O museu Emilio Ribas pelo Decreto estadual nº 55.315, de 5 de janeiro de 2010 foi transferido do

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Como trabalho final no PAP do IS/SES-SP, apresentei um projeto de mestrado na intenção de ingressar no Programa de pós-graduação em Saúde Coletiva, da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM/UNICAMP). A linha de Ciências Sociais possibilitou o desenvolvimento dessa pesquisa com orientação do Professor Doutor Everardo Duarte Nunes.

Entrar em um campo distinto da minha formação me expôs a vários conflitos e em novas perspectivas. Não abandonar a Fisioterapia, caminhando em uma zona de fronteira entre as Ciências Humanas e Sociais e a Saúde se fez duplamente difícil, mas triplamente gratificante, pois esse estranhamento possibilitou a descoberta de elementos para instrumentalizar meu estudo. Aprendi a olhar e tentar, além de construir, habitar as pontes entre os conhecimentos peculiares de cada área do saber.

Em 2010 tive a oportunidade de trabalhar a documentação dos médicos Dr. Godoy Moreira e Rezende Puech no Museu Histórico “Prof. Carlos da Silva Lacaz” da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Novamente estive em outro tempo, com outros personagens e turbilhões de pensamentos que deixaram meu estudo mais claro.

A história se faz por pontos de vista, por modos de olhar. Assim, esta dissertação é delimitada pelo meu olhar, meus interesses e questionamentos, não havendo uma história estanque, mas sim uma contribuição para desdobrar o conhecimento aqui desenvolvido. Buscaremos, alinhavando alguns elementos, compreender a formação de uma categoria profissional, contextualizando a fisioterapia como profissão de saúde no percurso histórico por ela realizado nos anos 30 e 40 do século XX.

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A construção dos fatos históricos requer uma avaliação crítica de aspectos estreitamente relacionados com a variedade de eventos sócio-culturais e políticos de uma época, além do desvelamento dos valores e elementos que configuram o todo social, a fim de detectar a importância e o grau de expressão de cada acontecimento. Ao penetrar na dinâmica dos acontecimentos da primeira metade do século passado, encontraremos elementos que tencionam a prática fisioterapista e a fisioterapia como profissão a partir da segunda metade o século XX com a criação do curso para técnicos e operadores em Fisioterapia no início dos anos 1950 em São Paulo5. Encontraremos aqui indícios da existência de uma prática anterior a profissionalização da fisioterapia.

Neste estudo, a sociologia das profissões se faz importante por discutir, apesar de não haver consenso nesta vertente do conhecimento, o que caracteriza uma profissão e uma ocupação. Sendo assim a teoria será necessária para moldurar o objeto do trabalho dando-lhe propriedade teórica para comprovar o que se pretende montar.

Em todo quebra-cabeça encontramos diferentes formatos de peças. Sempre quando vou me aventurar em montar uma figura sigo três etapas antes de fechar a imagem. Começo separando as peças retas, que sugerem ser a moldura da figura. Enquanto procuro as bordas, viro todas as peças para cima. Depois as separo por cor, assim fica mais fácil visualizar onde cada tonalidade deve se encaixar. Em uma superfície lisa todas as peças são possibilidades de encaixe.

5

Há uma vasta discussão acerca da origem primeira da formação formal de fisioterapeutas no país. O pioneirismo é “disputado” por São Paulo (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) e Rio de Janeiro (Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação). Não é intenção deste estudo afirmar a prática fisioterapista fora de São Paulo já que as fontes primárias aqui utilizadas se referem apenas à este

(36)

Não é diferente realizar um estudo de investigação. São necessários três atos do procedimento científico para a construção metodológica de um estudo coerente e eficaz: a ruptura, na qual se rompe com os preconceitos e falsas evidências; a construção, que consiste na elaboração de um sistema conceitual organizado e lógico para a explicação do objeto de estudo; a verificação, momento em que a proposição deve ser verificada pelos fatos (22).

i Desenvolvimento do trabalho: como montar um quebra cabeça

Acreditamos que a emergência da fisioterapia como especialidade da saúde em São Paulo deve ser compreendida como parte de um processo mais amplo de especialização da medicina e da enfermagem acadêmica a partir do século XX. Salientamos que as transformações que se processaram na prática fisioterapista, as mudanças em seus fundamentos práticos e teóricos, suas estruturas institucionais e as estratégias implementadas pelos profissionais que se dedicavam ao cuidado e a cura das “doenças” com utilização de recursos físicos e naturais em busca de autoridade profissional, seguiu o paradigma dominante no período em estudo, o paradigma biomédico. Não sendo explicita tal afirmação, montaremos este quebra-cabeça nos valendo do conceito de história indiciária de Carlo Ginzburg (23) pretendendo “ler” as pistas encontradas nos documentos para provar a emergência das práticas fisioterapistas.

Como em um quebra cabeça, este estudo será dividido em ‘peças’. No primeiro capítulo, “A moldura: comece um quebra-cabeça pelas bordas”, faremos uma revisão da teoria da sociologia das profissões a fim de dar suporte teórico na leitura dos documentos acerca do desenvolvimento da fisioterapia em São Paulo. Pretendemos neste capítulo

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“vestir os óculos” dos conceitos e relações desenvolvidas por Eliot Freidson em seu estudo Profissão Médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado, além de dialogar com outros estudiosos da sociologia das profissões (24).

O segundo capítulo, “Iluminando o jogo: virando as peças para cima” busca delimitar pela história os caminhos já percorridos pelas políticas de saúde brasileira nos anos 1930 e 1940 época em que Getúlio Vargas esteve à frente da presidência da República brasileira. O contexto sócio-histórico se mostrará relevante para definir a relação entre práticas terapêuticas e ciência na formação dos profissionais da saúde retomando o processo de construção das especialidades da saúde, dentre elas a fisioterapia. A partir da análise dos trabalhos sócio-históricos da medicina, enfermagem e da própria fisioterapia, poderemos constatar que a gênese da fisioterapia vinculou-se não apenas às mudanças nos pressupostos da medicina e da enfermagem, e na necessidade social e política de expandir novos conhecimentos e novas abordagem das técnicas terapêuticas.

No terceiro capítulo, “Dando forma à imagem: separe as peças por cor”, apresentamos a fisioterapia como material empírico. Pretendemos verificar o desenvolvimento da Fisioterapia e a influencia de outros países para a entrada da prática fisioterapista em São Paulo. Isto posto analisaremos a legislação estadual (São Paulo) e federal referentes à fisioterapia, os Livros de Registros do Serviço de Fiscalização do Exercício Profissional nas categorias referentes aos fisioterapistas como os enfermeiros(as) duchistas, massagistas e fisioterapistas, e compreender a postura de

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figuras importantes para o desenvolvimento da fisioterapia neste período como os professores Raphael de Barros, Rezende Puech e Godoy Moreira na medicina paulistana.

Finalmente, “Encaixe as peças: fechando o quebra-cabeça”, discutiremos da prática fisioterapista à fisioterapia como profissão analisando-a sob a lente da sociologia das profissões. Alinhavando a metodologia adotada com as fontes documentais resignificadas, analisaremos o desenvolvimento de uma nova especialidade na saúde. Na ausência de um campo institucional para tal, os enfermeiros e médicos fisioterapistas buscaram criar espaços, de acordo com as demandas de saúde, para sua atuação culminando na introdução do ensino oficial dos técnicos em fisioterapia vinculado ao Serviço de Fisioterapia do Hospital das Clínicas de São Paulo em 1951.

Não pretendemos aqui rotular o estudo como uma historiografia das profissões ou historiografia sobre as profissões, sociologia das profissões ou sociologia sobre as profissões, concordamos com Nunes (25), que ao realizar uma profunda revisão da sociologia médica/sociologia da saúde nos Estados Unidos, Grã-Bretanha e França, levanta a possibilidade de se pensar uma sociologia com os profissionais de saúde. Estendendo tal sugestão ao trabalho historiográfico supomos que este trabalho pretende dialogar com os campos da fisioterapia/saúde, sociologia e história.

ii O que e como tentaremos montar

Fazer pesquisa sócio-histórica, especificamente, em fisioterapia, é uma tarefa que exige certo desprendimento, paixão e paciência. A primeira barreira enfrentada pela História das Ciências Médicas é a sua constituição como ciência. São poucos os espaços para ela nos departamentos das Ciências da Saúde e das Ciências Humanas e Sociais. Esta

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“disciplina” tenta se organizar neste entremeio e ensaia sinais de ocupação sendo valorizada em algumas instituições de pesquisa e ensino. Mas para mim, foi um percurso em muitos momentos solitário.

Nosso trabalho inscreve-se na vertente das questões que vêm recebendo destaque, principalmente a partir da década de 1950, pelos estudos preocupados com as transformações na área da saúde como a história e a sociologia das profissões. Cientes de que o passado não existe senão no imaginário do presente, resignificá-lo refletirá na representação do presente. A metodologia aqui utilizada é, em sua maior parte, de análise documental e busca nas fontes primárias e secundárias o alicerce sobre o processo e a realidade da prática fisioterapista no período analisado.

As fontes primárias são aquelas que proporcionam dados diretos do passado e são a matéria prima para qualquer estudo histórico. Incluem livros e artigos de investigação original, material inédito, correspondência pessoal, diários pessoais, escritos autobiográficos, fotografias, legislações, comunicações verbais ou respostas daqueles que testemunharam algum evento. As fontes secundárias compreendem os trabalhos baseados nas fontes primárias e anteriores. Para Le Goff (12) as fontes primárias e secundárias fazem parte da memória coletiva e da história, pois são monumentos, heranças do passado, documentos. Cabe a nós, pesquisadores, escolhê-las.

Para utilizar tais fontes concordamos com Rodrigues (26), ao defender que a história crítica para análise do passado deve seguir seis problemas distintos: 1 - quando a fonte, escrita ou não, foi produzida; 2 - onde foi produzida; 3 - por quem foi produzida, 4 - de que matéria pré-existente foi produzida; 5 - em que forma original foi produzida; 6 -

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qual é o valor da certeza do seu conteúdo. Assim, acreditamos que, se nos atentarmos aos referidos problemas nos aproximaremos do processo da crítica histórica para verificarmos a autenticidade das fontes históricas que estamos analisando. Atentamo-nos ao fato de que a ausência de fontes referente à fisioterapia como profissão no período analisado também nos indica a forte influencia dos profissionais médicos nas políticas que, dominantes na saúde, concentravam em suas mãos a hegemonia do conhecimento e seu reconhecimento social.

Ressaltamos que para essa visão da história como método fomos influenciados pelo pensamento da Escola dos Annales por permitir uma transformação em nosso modo de olhar para o objeto em estudo. Marc Bloch na obra Apologia à História (27) busca delinear como objeto do historiador “os homens no tempo” levando-nos a pensar em “um conhecimento através de pistas” e assim, não restringir a produção do conhecimento sobre o passado aos fatos e mitos fundadores indo ao encontro com a história indiciária de Carlo Ginzburg (23) influenciador deste trabalho.

A sociologia das profissões, assim como a crítica histórica, também não foge aos nossos objetivos. Esta vertente de estudo apresentou grande desenvolvimento na segunda metade do século XX impactando fortemente a produção de conhecimento nas ciências sociais brasileiras. Porém, a penetração dessa perspectiva nas análises sobre a fisioterapia como profissão revela-se quase inexistente. Ao nos debruçar sobre as obras de autores que moldaram a tradição da sociologia das profissões, procuramos extrair os pontos que julgamos relevantes para a investigação, usando, primordialmente, conceitos propostos por Eliot Freidson (24, 28,29)

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Assim, identificaremos, na abordagem freidsoniana das profissões, principalmente os conceitos de expertise relacionado à uma ocupação que intenciona sua institucionalização através das complexas relações entre profissões, cultura e sociedade, credenciamento como forma de reconhecimento e construção social de uma prática e, autonomia que, possibilita a real definição de uma prática como profissão. Extrapolando a corrente da sociologia das profissões buscaremos em Harry Collins e Robert Evans(30) uma discussão mais aprofundada sobre o conceito de expertise e sua relação com as práticas fisioterapistas.

Consideramos, além daqueles constitutivos da sociologia das profissões, o trabalho de Pierre Bourdieu (31)6. Embora a referência não esteja na maioria das vezes explicita no corpo do texto, permeou toda a pesquisa e marca sua presença seja pela seleção dos aspectos analisados, seja pela forma de relacioná-los dentro de um enfoque mais amplo dos fenômenos de institucionalização e de profissionalização do pensar e do fazer fisioterapista.

6

Da obra de Bourdieu, utilizaremos o conceito de campo e corpo nas análises desenvolvidas pelo autor sobre grupos profissionais, onde este defende a idéia de que todo grupo profissional é potencialmente campo e potencialmente corpo conforme o momento de sua evolução. Para o autor, uma ocupação tida como campo significa dispersão, conflito ou contradição. Paralelamente, face as disputas com outros segmentos do mercado, pode se compor como corpo, demarcando os espaços de conflitos internos em nome de um grupo de interesses.

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CAPÍTULO 1

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É certa a interação e o encadeamento que deve existir entre as peças ao longo de uma investigação. Iniciaremos a montagem do nosso quebra-cabeça pela moldura buscando as peças que possam dar a sustentação ao nosso quadro. Neste capítulo pretendemos usar como eixo condutor do debate conceitos propostos por Eliot Freidson7 dentro da sociologia das profissões. Segundo Pereira Neto, Freidson é “considerado um dos fundadores da sociologia médica, seus críticos e admiradores no campo médico e sociológico reconhecem que sua obra é de referência internacional” (32). Ao adotar uma noção de profissão que se aplica, mas não se restringe, ao campo da saúde, explica que serão enfatizados os dois lados do significado da palavra “profissão”, ou seja, como um tipo especial de ocupação e como reconhecimento de uma promessa, pois se trata de um conceito sociológico cujo exercício é controlado pelos pares (colegas de profissão), pelo Estado e pelos clientes (leigos).8

A sociologia das profissões é um dos campos mais heterogêneos e controversos da sociologia. Percebemos que há um grande problema de definição para a identificação das profissões, o que vem preocupando este campo de estudo. Não faremos uma revisão da produção na literatura, dos debates e consensos referentes à sociologia das profissões apesar de reconhecer o crescimento deste campo de saber. Faremos uma breve menção

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O sociólogo Eliot Lazarus Freidson (1923–2005) foi professor emérito de sociologia da Universidade de Nova York, onde trabalhou durante 30 anos desde 1961, e contribui fortemente para o debate da sociologia das profissões e sua relação com a medicina.

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Freidson aborda a diferença entre as ocupações e as profissões de fato para, a partir daí, discorrer sobre a autonomia e a organização inerentes à profissão. Analisa também a posição dos médicos enquanto conhecedores por excelência das especificidades de sua área, discutindo até onde a expertise pode se apresentar como benéfica à sociedade leiga, na sua função de salvar vidas, e a partir de que ponto torna-se um disfarce para garantir o privilégio e o poder da função médica. Freidson, então, passa a analisar o trabalho profissional e a estudar a doença como um conceito social definido pela Medicina, que determina quando a queixa de um indivíduo é considerada uma doença ou não segundo critérios próprios de seu campo de conhecimento (24).

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aos trabalhos mais relevantes da área pontuando alguns elementos para a compreensão da trajetória deste campo da sociologia e os principais conceitos por ele desenvolvidos, sem esgotar sua potencialidade.

Acreditamos que a prática e o discurso dos grupos profissionais que procuram estabelecer-se no mercado de trabalho, requer argumentos que tenham em sua base uma ideologia de profissionalismo visando um estatuto social ou processo de profissionalização ímpar. Esta ideologia de profissionalismo surge e/ou é reforçada em determinadas circunstâncias e reflete a tomada de consciência profissional desses grupos ocupacionais. Por profissionalismo entendemos um processo social desenvolvido por certas ocupações e sua relação com outras esferas da vida social, tais como as instituições, o Estado e outras profissões intencionando sua legitimidade social.

Na perspectiva sociológica aqui utilizada, a profissionalização de um grupo ocupacional dependerá, portanto, de negociação da divisão do trabalho, criação de espaços próprios no mercado de trabalho, conquista e valorização social. Assim faz-se importante analisar as condições que permitiram às ocupações seu desdobramento como profissão ligado ao domínio de uma expertise, e as formas através das quais os indivíduos que possuem certo conhecimento especializado criam a partir de suas redes de relações, mecanismos que possibilitem o monopólio da prática profissional.

1.1 Sociologia das Profissões: uma possibilidade de olhar

Qual o interesse e a importância em estudar as profissões? Pergunta recorrente em grande parte dos estudos da sociologia das profissões, podemos dizer que no mundo

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contemporâneo, onde as profissões extrapolam os limites das profissões tradicionais esta temática é importante por delinear as transformações e a ampliação de um campo de conhecimento.

Temos aqui “profissão”9 como conceito sociológico central e seu uso em diferentes sociedades têm suscitado na literatura sociológica inúmeras controvérsias. Podemos compreender o conceito de profissão, apesar de não ser suficiente, como atividade ou ocupação especializada e que supõe determinado preparo.

“Profissão”, em seu uso mais antigo, anterior ao século XVI, refere-se a declaração, expressão de intenção ou propósito. Na Idade Média, passa a ser usado para designar as ocupações com formação específica oferecida pelo Estado ou por instituições religiosas passando a ser consideradas como atividade ou função especializada. Durante o Renascimento as profissões tradicionais (medicina, direito e teologia)10 foram secularizadas. Com a Revolução Industrial e o progresso da ciência, aumentam o número e tipos de profissões resultantes da necessidade de especialistas em uma época em que a ordem política e social exigia técnicas capacitadas. A partir do século XIX inicia-se uma diferenciação entre os profissionais com grau de conhecimento formal nas universidades e os demais trabalhadores. Segundo Rodrigues (34), desde o final do século XIX pensadores como Spencer, Weber, Durkheim, dentre outros, refletiram sobre o fenômeno das profissões tendo em comum o fato de considerá-las como formas “superiores” de

9

Edmundo Campos Coelho faz uma detalhada análise da evolução conceitual de “profissão”, afirmando que antes do século XX o termo não teria sido usado no Brasil a não ser na linguagem coloquial (33).

10

As três profissões, medicina, direito e teologia caracterizam da Idade Média até a Renascença o tripé das profissões. (Informação de aula ministrada pelo Professor Everardo Duarte Nunes, na disciplina Tópicos

especiais: introduçãoà sociologia da saúde e da doença, do programa de pós-graduação em Saúde Coletiva

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organização social para a compreensão das trajetórias, na conformação dos campos de saber e na construção e manutenção dos elos que compõem a trama das relações em sociedade no mundo atual.

A partir da segunda metade do século XX tal fenômeno é abordado pela sociologia de forma sistemática se constituindo como um campo especializado, a sociologia das profissões. É importante sublinhar que o contexto socioeconômico do entreguerras e do pós 2ª Guerra Mundial (IIGM) foram fundamentais para a consolidação desta nova abordagem sociológica decorrente, dentre outros fatores, da necessidade em compreender a emergência de diferentes grupos ocupacionais que aspiravam o estatuto de profissão. A sociologia das profissões se colocaria como “um produto de vínculos sociais e ideológicos, limitada por visões do mundo, da sociedade e do homem orientadora do seu desenvolvimento” (34). Assim, tendo como questões norteadoras em sua lógica cognitiva: O que é uma profissão? Como uma ocupação se transforma em profissão? Qual o sentido da evolução das profissões? A sociologia das profissões se constitui e se consolida ao longo dos últimos 60 anos.

Podemos reconhecer na história desta disciplina dois grandes períodos. O primeiro, com abordagens majoritariamente funcionalistas, anterior à década de 1970; e o segundo, de caráter interacionista, no qual emerge uma pluralidade de modelos analíticos decorrente de um forte movimento de críticas à vertente funcionalista.

A vertente funcionalista classifica as profissões segundo seu funcionamento e organização social estando os autores desta corrente intelectual preocupados em atribuir

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às profissões e sua emergência importância estratégica para o desenvolvimento social. Preocupados em distinguir as profissões do conjunto de ocupações defendem que

uma profissão emerge quando um número definido de pessoas começa a praticar uma técnica fundada sobre uma formação especializada, dando resposta à uma necessidade social. (...) a constituição das profissões decorreria de especialização de serviços, criação de associações profissionais e estabelecimento de uma formação específica fundada sobre um corpo sistemático de teorias (34).

O primeiro autor que buscou construir um modelo teórico de gênese e funcionamento das profissões foi Talcott Parsons em 1939 (35). Parsons introduz no debate, predominantemente econômico, a relação do profissional-cliente, assimetria de poder e o controle profissional suportado pela ideologia do profissionalismo. Para esta dissertação cabe ressaltar que o autor sugere uma dimensão em que se articulam normas sociais e valores culturais para a legitimação de uma profissão referindo-se à articulação do saber prático fundado na experiência ou na ciência aplicada com o saber teórico adquirido durante longa formação. Apenas no final dos anos 1960 as Universidades são consideradas por Parsons fundamentais para a institucionalização e legitimação entre o conhecimento e a sociedade afirmando que “a origem fundamental do sistema profissional moderno residiu no casamento entre acadêmicos profissionais e determinadas categorias de práticos” (34). As profissões constituíam assim, a mais importante mudança que havia ocorrido no sistema ocupacional das sociedades modernas e para os funcionalistas, a profissionalização e a legalização profissional tornavam-se fundamentais para garantir a qualidade dos serviços prestados, uma vez que os clientes não dispunham de competências para apreciar tais serviços. Nessa perspectiva, o Estado

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tinha meramente o papel de conceder o monopólio legal às profissões reconhecendo a superioridade técnica das atividades profissionais.

Seguindo a vertente funcionalista podemos citar Merton, Goode, Moore dentre outros que acrescentaram suas interpretações ao campo da sociologia das profissões (34). De modo geral, mas não restritivo, os estudos que seguiram tal orientação viam as profissões como comunidades cujos membros partilham uma mesma identidade, valores, linguagem e um estatuto adquirido, tendo controle sobre si e seus membros, sobre a seleção e admissão de novos membros, bem como sobre a sua formação. Para eles, a divisão do trabalho é resultado da capacidade técnica de responder a necessidades sociais.

A segunda abordagem acerca das profissões tem no interacionismo sua principal corrente intelectual. Pondo em debate grande parte dos pressupostos do modelo dominante – o funcionalismo – autores como Everett Hughes inauguram uma nova abordagem ao analisar temas como trabalho e profissão. Hughes inova ao enunciar que o trabalho humano deve ter como ponto de partida sua divisão social (36). Tal processo implicaria uma hierarquização de funções com seleção profissional através de licença, por autorização legal para o exercício de certas atividades, e de mandato como forma de assegurar uma função específica. A diferença entre ocupação e profissão residiria assim, nas condições de exercício de determinada atividade para o processo de transformação das ocupações em profissões.

O aparecimento das profissões, nas sociedades modernas vem, portanto carregado de ideologias para a organização da sociedade. Esta ideologia profissional vai

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desempenhar um forte papel de regulação e equilíbrio social. A existência deste papel social (o profissional) possibilitou compreender a emergência de um modelo de profissão concomitante às transformações econômicas e políticas associadas à crescente e continuada massificação do ensino e ao alargamento dos mercados que lhe conferiam uma nova realidade social e profissional. Sendo assim, podemos supor que o surgimento das profissões é próprio das sociedades industriais, onde o trabalho se especializa e se tecnifica, permitindo-nos identificar interesses sociais dirigidos a determinadas práticas ocupacionais, embasadas em marcos científicos e técnicos. Neste processo algumas ocupações desenvolvem uma autonomia diante do trabalho. Para Freidson (28) o que diferencia um ofício de uma profissão reside nesta autonomia que os indivíduos empregam no exercício de suas práticas. O trabalho das profissões se distingue do trabalho das ocupações por ser uma especialização criteriosa teoricamente fundamentada e não somente uma prática extensivamente treinada.

Freidson salienta as características especiais do conhecimento, das habilidades das profissões e sua orientação ética e altruísta frente aos clientes. O autor revela que o desempenho das profissões poderia ser analisado sob outro ângulo e não apenas focada aos interesses econômicos e corporativos até então defendidos. As profissões deveriam ser vistas como forma de suprir as necessidades públicas e de serviço desconhecidas do público leigo. Vemos assim, que o processo de profissionalização das atividades ocupacionais não representam apenas uma forma de controle sobre a atividade e as reservas de espaços no mercado de trabalho, mas constituem os confrontos pela definição dos recursos legítimos para o ingresso e exercício profissional.

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A partir dos anos 1960 há intensa crítica às profissões. Ressaltamos que neste momento as relações das profissões com as elites políticas e econômicas, Estado, mercado e classes sociais se mostravam efervescentes. Assim, a ênfase nos estudos sobre profissões se direcionou ao conceito de poder tanto nas análises marxistas, estruturalistas e foucaultianas. Para Fox (37) alguns sociólogos consideram que profissões podem ser analítica e empiricamente distintas de alguns tipos de ocupações; outros acreditam ser (as profissões) indistinguíveis das ocupações já que buscam entender o processo pelo qual as ocupações tendem a ganhar o status profissional.

Na década de 1970, a crítica à escola funcionalista centrava-se em relacionar o processo de profissionalização à formação de um monopólio de mercado. Relacionar a preservação do controle profissional e a organização para manter a autonomia nos processos de interação social passou a ser eixo central nas discussões. Por outro lado, a crítica ao modelo interacionistacedeu lugar às novas teorias sobre as profissões, que se desenvolveram no curso dos anos 1970 e 1980 (38).

Ao longo dos anos 1970 e 1980 há uma pluralidade de orientações paradigmáticas e metodológicas. Neste contexto Eliot Freidson, um dos responsáveis por esse movimento crítico, ganha proeminência por relacionar o processo de profissionalização a um conjunto de estratégias coletivas para estabelecer o monopólio sobre um mercado específico de serviços com a ajuda do Estado introduzindo ao debate o conceito de poder profissional. Nesse sentido, o Estado concede à profissão a autoridade legal para selecionar, recrutar, examinar, licenciar, reavaliar desempenhos e estabelecer os limites formais de sua jurisdição. Ao construir uma política própria, as profissões protegem-se dos interesses

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específicos do mundo da política pelo domínio da perícia (expertise) e a demarcação de fronteiras no trabalho são as características principais da profissionalização.

Podemos definir assim, profissionalização como um processo pelo qual uma ocupação organizada, geralmente, por alegar uma competência esotérica11 especial e cuidar da qualidade de seu trabalho e de seus benefícios para a sociedade, obtém o direito exclusivo de realizar um determinado tipo de trabalho, controlar seu treinamento e acesso além de se responsabilizar pela avaliação e pelo modo como o trabalho é realizado (39). Esta definição se aproxima do conceito de autonomia defendido por Freidson. Porém, nesta dissertação acreditamos que a identificação de uma expertise se dá em fase anterior ao processo de profissionalização. Tal expertise não alcançará, necessariamente, um estatuto profissional próprio, mas é importante para que haja a organização de um novo campo de conhecimento e consequentemente de nova organização profissional. A partir da identificação desta expertise o Estado ou Universidades operam como os credenciadores de tais práticas dando à certo grupo ocupacional que busca autonomia no mercado de trabalho, legitimidade para sua atuação.

A partir dos anos 80

as novas formas de interpretar o profissionalismo enfatizam a força deste projeto na sociedade brasileira, apontando como o fenômeno é reelaborado e se consolida, apesar do pessimismo que predominara na literatura na década anterior. Nesta perspectiva registramos tanto as críticas ao credenciamento das profissões, que assinalam o conteúdo ideológico, as conseqüências nefastas das reservas de mercado para a

11

Esotérico entendido como pouco compreensível pelos leigos. De acordo com Collins esotérico é o antônimo de exotérico definido como entendido por aquele que não foi iniciado; popular ou lugar comum (30).

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qualidade dos serviços e difusão do corporativismo, como também os olhares que destacam o sucesso de profissionalização e seus resultados para a coletividade (40).

Do começo do século XX até os dias atuais muitas foram as transformações ocorridas tanto na sociedade como nas concepções sobre o trabalho e as profissões. Com a instituição do campo da sociologia das profissões muitos debates foram estabelecidos não havendo, até o presente momento, um consenso teórico acerca do assunto.

Alguns sociólogos direcionam as pesquisas para desvelar o processo pelo qual algumas ocupações alcançam o status de profissão analisando trabalho e profissão em diferentes vertentes, inicialmente, como resposta a necessidades sociais (35,41). Outros vêem profissão baseando-se na noção de que alguns grupos ocupacionais professam ter características especiais, qualificações e responsabilidades que lhes garantam privilégios e autoridade sobre determinada prática a partir de certa construção social resultante de interações (36). As profissões como ação coletiva voltada para assegurar o controle ocupacional (42) ou para garantir o monopólio do poder profissional (28,29) ou ainda como monopólio e fechamento social sobre um mercado de serviços profissionais mediado por projetos de mobilidade social (34), são debates recorrentes neste campo de conhecimento.

Percebemos que em determinados contextos sociais, políticos e econômicos, a história das profissões tem sido marcada pela progressiva autonomia concedida pelo Estado a determinados grupos profissionais, para realizar a função de reprodução e controle do mercado (24,39).

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Para isso Freidson sugere três conceitos: autonomia, expertise e credenciamento (24,28,29). Autonomia está ligada ao ideal do trabalho, e pressupõe ao profissional o controle de seu trabalho exigindo dele uma visão global e das particularidades de sua prática. Por expertise entendemos uma combinação entre treinamento e experiência que possibilita a autoridade implícita de um segmento profissional conferida por monopólio de certo conhecimento. O credenciamento pressupõe um sistema organizado de treinamento, bem como algum método de certificar e intitular especialistas potenciais por associações profissionais ou pelo Estado. Ao categorizar tais conceitos o autor considera que a característica principal de ocupações consideradas profissões é o conhecimento esotérico adquirido por meio de uma formação especifica e prolongada. Com isso, defende-se o monopólio do saber, o controle sobre o trabalho e, assim, a independência no desenvolvimento de sua prática.

Apesar de estar a sociologia das profissões inteiramente articulada com o contexto sócio cultural e econômico de uma época, afirmamos que as comunidades profissionais se colocam em certo momento do processo de profissionalização para além dos lugares de aprendizado sendo elementos essenciais para a delimitação do mercado de trabalho e do reconhecimento social de determinada atividade laboral. Assim, devemos salientar que ao analisarmos profissionalização, é preciso observar que as ocupações não obedecem a um único padrão e as formas de organização podem variar (43). Acreditamos que se nos atentarmos a abordagem sócio-histórica do desenvolvimento das ocupações reconheceremos que não existe uma lista cronológica para explicar tal transformação mas sim um processo de negociação social.

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Para isso, ao utilizar o conceito de expertise apenas no sentido freidsoniano que supõe um conhecimento esotérico formalmente adquirido não conseguiríamos compreender os períodos e os processos que antecedem essa formalização. Porém a aquisição de expertise segundo Collins e Evans12 é um processo social sendo a informalidade uma etapa importante para adquirir certa competência. Como em todo processo social, após aprendida, a expertise é mantida por interação social e legitimação de um conhecimento esotérico (30).

Collins e Evans propõem dessa forma uma tabela periódica de expertises. Em um primeiro nível de expertise disserta sobre e expertise ubíqua, ou seja, um conhecimento geral que surge a partir do acúmulo de conhecimento tácito ou subentendido. Por

expertise ubíquas entendemos, portanto os conhecimentos necessários para se viver em

dada sociedade. Partindo desta expertise o autor avança para as expertises especializadas que nos interessa nesta discussão acerca das profissões.

Por expertise especializada, dividida em duas categorias - conhecimento tácito ubíquo (conhecimento de boteco, compreensão popular e conhecimento de fonte primária) e conhecimento tácito especializado (expertise por interação e expertise contributiva) - compreende certo grau de capacidade em realizar tarefas a partir de um acúmulo de conhecimentos adquiridos por experiência ou sabedoria. Nesta dissertação utilizaremos a forma de conhecimento tácito especializado de expertise por interação na intenção de constituir-se como expertise contributiva, mesmo sabendo que a discussão

12 Em seu livro “Repensando a expertise”, Collins tenta construir um modelo explicativo para desmistificação

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acerca da expertise é maior e mais completa, nos dando possibilidade de buscar encaixes com outras formas de desenhar a expertise.

Por expertise por interação Collins admite a existência de um conhecimento subentendido em certa área que pode ser adquirida por outros iniciados pela enculturação na linguagem deste campo na ausência de uma expertise em sua prática (30). É a constituição de um campo no interior de outro, compondo assim um único campo. O desenvolvimento da expertise por interação pode ser o meio de intercâmbio entre os fisioterapistas e os médicos e enfermeiros já legitimados. Porém ainda que com grau elevado de expertise por interação, este tipo de expert não terá um reconhecimento formal, para isso será necessária uma expertise contributiva baseada em um completo conhecimento tácito especializado que capacita os experts a contribuir com o domínio ao qual pertence. Tal tipo de expertise coincide com o conceito de Freidson que, como visto anteriormente supõe uma formação longa e formal de conhecimento esotérico como o inicio de um processo de profissionalização.

Porém, em um processo de profissionalização não há consenso sobre um modelo analítico que enquadre todas as ocupações ou ofícios e dessa maneira optamos por mostrar que as práticas fisioterapistas eram um tipo de expertise por interação sendo, portanto uma prática existente antes de iniciado o processo de sua legitimação e profissionalização como proposto por Freidson.

Referências

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