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Curso: Direito Civil Parte Geral. Aula: Conceito, fundamentos e teorias FUNDAMENTOS E OBJETIVOS DA DESCONSIDERAÇÃO:

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Curso: Direito Civil – Parte Geral

Aula: Conceito, fundamentos e teorias

Professor: Rafael da Mota Mendonça

Resumo

Nós podemos trabalhar a desconsideração sobre vários aspectos, seja no âmbito do direito

processual, em que é vista como um incidente, seja no âmbito do direito tributário,

empresarial, do direito administrativo e claro, no Direito Civil. Ressaltasse isso, porque

nesta aula será tratada a desconsideração no âmbito do Direito Civil, especificamente.

Conceito

do professor Ruy Rosado de Aguiar Dias: “desconsideração é a

suspensão episódica dos efeitos do registro dos atos constitutivos dos atos da

pessoa jurídica”.

Repare a palavra “episódica”, o que nos trás a ideia que é algo excepcional. E de fato é,

pois a regra é a separação patrimonial entre pessoa jurídica e sócios, ambos com

personalidades diferentes.

Excepcionalmente, todavia, podemos suspender os efeitos do registro dos atos

constitutivos da pessoa jurídica, de modo a permitir que o patrimônio pessoal da pessoa

jurídica responda por dívidas do sócio. O art. 45 do CC, diz que o registro dos atos

constitutivos é o que lhe outorga personalidade jurídica própria.

Despersonificação é diferente de Desconsideração. A primeira é a sua extinção, o fim da

personalidade jurídica da pessoa jurídica estudado no direito empresarial. Na

desconsideração, todavia, em nenhum momento termos a extinção da pessoa jurídica,

apenas a suspensão dos efeitos constitutivos, que é o fato de outorgar personalidade

jurídica própria.

FUNDAMENTOS E OBJETIVOS DA DESCONSIDERAÇÃO:

Os professores Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves de Farias sugerem que a

desconsideração tem o objetivo de aperfeiçoamento da pessoa jurídica, diante de

uma má condução por partes de seus sócios. Veja, para desconsiderar é imprescindível

preencher uma série de requisitos e a pessoa jurídica será desconsiderada quando existir

um exercício abusivo da personalidade própria da pessoa jurídica por parte dos seus

sócios.

Ora, você conduziu mal a pessoa jurídica, agora, portanto, vamos desconsiderá-la e você

vai responder som o seu patrimônio próprio para que você nunca mais conduza a pessoa

jurídica de forma abusiva ou anormal.

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a) Teoria Maior: nos dizeres do professor Fabio Ulhoa, a teoria maior exige a presença do

elemento fraude. O juiz será autorizado a ignorar essa autonomia patrimonial como uma

forma de coibir fraudes e abusos que são praticados pelos sócios ou administradores da

pessoa jurídica, através dessa própria pessoa jurídica.

Logo, quando se fala em teoria “maior”, necessariamente, terá que se comprovar a

presença do elemento fraude. Essa teoria entende que o abuso da personalidade foi

realizado. O fundamento é o art. 187 do CC, que fala do abuso de direito.

Essa teoria sofreu uma ramificação: a.1) teoria maior objetiva e a.2) teoria maior subjetiva.

A teoria maior objetiva foi desenvolvida pelo professor Fábio Konder Comparato, sendo

fundada nos aspectos funcionais da desconsideração, vale dizer, ela não leva em

consideração a intenção dos sócios ou do administrador em conduzir de forma

abusiva ou fraudulenta da pessoa jurídica. Com isso, bastaria uma disfunção da

empresa causada através do comportamento de seus sócios ou administradores.

Por exemplo: a confusão patrimonial -> quando não se consegue mais identificar o que é

patrimônio do sócio e o que é da pessoa jurídica.

Na teoria maior subjetiva é imprescindível a demonstração da intenção deliberada do

sócio ou administrador de prejudicar terceiros ou fraudar a lei.

Por exemplo: o desvio de finalidade. Esse é caracterizado por uma fuga dos objetivos

sociais da pessoa jurídica, causando prejuízos diretos ou indiretos a terceiros ou aos

próprios sócios.

b) Teoria Menor: o professor Fábio Ulhoa diz que a teoria menor permite a

desconsideração com o simples prejuízo do credor diante de um inadimplemento da

pessoa jurídica, ou seja, não precisa de provar a fraude, basta demonstrar que a pessoa

jurídica está inadimplente e que existe um credor prejudicado.

O fundamento é o simples prejuízo do credor. Por isso uma teoria “menor”, pois não há

discussão acerca da fraude.

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Curso: Direito Civil – Parte Geral

Aula: Teorias e desconsideração no Código de Defesa do Consumidor

Professor: Rafael da Mota Mendonça

Resumo

O direito brasileiro sempre teve uma inclinação para a teoria maior, exigindo a comprovação do abuso e

exigindo a presença do elemento fraude. Tanto que a legislação brasileira adota a teoria maior como regra,

ainda que isso tenha se modificado através do tempo.

Nesse sentido, o REsp nº 279273/SP de dezembro de 2003, que envolveu o caso do Shopping Center de

Osasco, no qual a teoria menor foi utilizada pela primeira vez no STJ.

EMENTA: Responsabilidade civil e Direito do consumidor. Recurso especial. Shopping Center de Osasco-SP. Explosão. Consumidores. Danos materiais e morais. Ministério Público. Legitimidade ativa. Pessoa jurídica. Desconsideração. Teoria maior e teoria menor. Limite de responsabilização dos sócios. Código de Defesa do Consumidor. Requisitos. Obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. Art. 28, § 5º. - Considerada a proteção do consumidor um dos pilares da ordem econômica, e incumbindo ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, possui o Órgão Ministerial legitimidade para atuar em defesa de interesses individuais homogêneos de consumidores, decorrentes de origem comum. - A teoria maior da desconsideração, regra geral no sistema jurídico brasileiro, não pode ser aplicada com a mera demonstração de estar a pessoa jurídica insolvente para o cumprimento de suas obrigações. Exige-se, aqui, para além da prova de insolvência, ou a demonstração de desvio de finalidade (teoria subjetiva da desconsideração), ou a demonstração de confusão patrimonial (teoria objetiva da desconsideração). - A teoria menor da desconsideração, acolhida em nosso ordenamento jurídico excepcionalmente no Direito do Consumidor e no Direito Ambiental, incide com a mera prova de insolvência da pessoa jurídica para o pagamento de suas obrigações, independentemente da existência de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial. - Para a teoria menor, o risco empresarial normal às atividades econômicas não pode ser suportado pelo terceiro que contratou com a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou administradores desta, ainda que estes demonstrem conduta administrativa proba, isto é, mesmo que não exista qualquer prova capaz de identificar conduta culposa ou dolosa por parte dos sócios e/ou administradores da pessoa jurídica. - A aplicação da teoria menor da desconsideração às relações de consumo está calcada na exegese autônoma do § 5º do art. 28, do CDC, porquanto a incidência desse dispositivo não se subordina à demonstração dos requisitos previstos no caput do artigo indicado, mas apenas à prova de causar, a mera existência da pessoa jurídica, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. - Recursos especiais não conhecidos.

- EVOLUÇÃO NORMATIVA:

Analisando o Código Civil de 1916, o mesmo não falava em desconsideração. A autonomia patrimonial da

pessoa jurídica era tratada de forma absoluta, no artigo 20 daquele Código.

O primeiro diploma a tratar foi o CDC, especificamente no art. 28 “caput” e §5º, in verbis:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

O que é isso? Fraude! O CDC no “caput” adotou a teoria maior. A doutrina ainda destacava que aqui se

tratava da teoria maior objetiva, mas isto é irrelevante. A teoria é a maior pois a fraude tem que ser provada.

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§ 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

Note que para desconsiderar basta a comprovação que a pessoa jurídica está inadimplente e que houve um

prejuízo ao consumidor, portanto, trata-se da teoria menor.

É curioso que dentro do mesmo artigo tenhamos teorias tão diferentes, é muito estranho, mas a explicação

está no §1º do art. 28 do CDC, que foi vetado. Mas afinal, o que continha no seu texto? Dizia que ocorrendo a

desconsideração os credores deverão alcançar primeiro o patrimônio do sócio administrador.

Razões do veto: esse parágrafo §1º será vetado porque disciplina uma teoria da desconsideração que se

contrapõe a teoria do “caput”. Mas qual é o parágrafo que trata de teoria diversa? Não é o 1º§ e sim o §5º,

então, PASMEM, vetaram o parágrafo errado. Era o parágrafo 5º que deveria ter sido vetado.

Durante muito tempo, especificamente até 2003, tínhamos uma resistência muito grande em aplicar a teoria

menor. Hoje, as duas são aplicadas, embora ainda haja uma preferência pela teoria maior.

Ainda, cumpre tecer algumas observações sobre os demais parágrafos §2º, 3º e 4º do mesmo artigo:

§ 2° As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.

§ 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 4° As sociedades coligadas só responderão por culpa.

Pergunta-se: esses parágrafos trabalham com desconsideração? Resposta: claro que não! Eles trabalham com

responsabilidade civil solidária ou subsidiária de pessoas jurídicas que integram o mesmo grupo econômico.

Isso é muito comum em holding, no qual se tem várias pessoas jurídicas integrando um grupo econômico.

Exemplo: o Bradesco, que curiosamente possui como símbolo uma árvore. Temos várias pessoas jurídicas ali:

o Bradesco Seguros, Bradesco Leasing, Bradesco Previdência, Bradesco Turismo, Bradesco Cartão de Crédito,

Bradesco Instituição Financeira propriamente dita, enfim, pessoas jurídicas que integram o mesmo grupo.

A segunda lei que falou sobre desconsideração foi a Lei 9.605/98, que disciplina os crimes ambientais,

especificamente no art. 4º, “caput”:

Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.

Adotou, portanto, a teoria menor. É quase que uma cópia do §5º do art. 28 do CDC.

O terceiro ato normativo foi o Código Civil de 2002, que deve ser estudado em dois aspectos: 1º) o CC/2002

pré Lei de Liberdade Econômica e 2º) o CC/2002 pós Lei de Liberdade Econômica.

A Lei 13.874/19 mudou alguns artigos do CC, entre eles o art. 50 do CC, de forma bem significativa, inserindo

alguns parágrafos.

Importante frisar que o objetivo foi reforçar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica. Em verdade,

buscou-se garantir uma intervenção menor do Estado nas atividades privadas, no que diz respeito a essa

relação sócio x pessoa jurídica.

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Curso: Direito Civil – Parte Geral

Aula: Desconsideração no Código Civil e Lei de liberdade econômica

Professor: Rafael da Mota Mendonça

Resumo

- Legislação Pré Lei de Liberdade Econômica: anteriormente, o art. 50 do CC poderia ser dividido em duas

partes: A) Teoria maior subjetiva, pois trabalhava com a expressão desvio de finalidade e B) Teoria maior

objetiva, pois trabalha com a confusão patrimonial.

Portanto, anteriormente se afirmava que o “caput” do art. 50 do CC tratava em sua primeira parte da teoria

maior subjetiva e a segunda parte tratava da teoria maior objetiva. Existia, inclusive o Enunciado 51 do CJF:

- Legislação Pós Lei de Liberdade Econômica: o “novo” art. 50 do CC:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) § 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) § 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

Ele mantém a teoria maior, mas não se precisa mais demonstrar dolo ou intenção ou culpa. A regra continua

sendo a demonstração do exercício abusivo de direito para que ocorra a desconsideração, só que o caráter

intencional, ou seja, a teoria maior subjetiva é afastada. Basta demonstrar o abuso na condução da pessoa

jurídica.

Uma outra novidade é que a desconsideração deve atingir os sócios ou administradores que se beneficiaram

direta ou indiretamente com o abuso. Evita-se, portanto que sócios que não participaram do abuso sejam

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responsabilizados, ou até mesmo aquele sócio que tem um percentual muito pequeno e não participava da

administração da pessoa jurídica.

Uma terceira observação é que os parágrafos do art. 50 do CC buscam criar critérios objetivos para a

aplicação do instituto.

O §1º tenta definir o que é o desvio de finalidade. Embora tenha-se utilizado o conectivo “e”, os requisitos

não são cumulativos. Então quando se está desviando a pessoa jurídica? Quando estou utilizando a pessoa

jurídica com o propósito de lesar credores ou quando pratico ilícito de qualquer natureza.

O §5º se preocupa em estabelecer o que não é desvio de finalidade.

O §2º tenta definir a confusão patrimonial. Vejam, não é uma separação de direitos, é uma ausência de

separação de fato.

O §3º trata da desconsideração inversa, que já era consagrada na doutrina, jurisprudência e no próprio CPC,

e que agora também consta no Código Civil. Ou seja, quando se desconsidera para alcançar o patrimônio da

pessoa jurídica, para que esta responsa por uma dívida pessoal dos seus sócios. É muito comum quando os

sócios pegam o seu patrimônio pessoal e o transferem para a pessoa jurídica.

O §4º fala sobre grupo econômico. A tentativa foi restringir, não é porque existe um grupo econômico que

estará autorizada a desconsideração, terá que, no caso concreto, identificar se um dos critérios da

desconsideração ocorreu.

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Curso: Direito Civil – Parte Geral

Aula: Observações sobre desconsideração

Professor: Rafael da Mota Mendonça

Resumo

- Uma quarta lei que trata da desconsideração é a Lei 12.529/2011, que dispõe sobre a defesa da

concorrência. Essa lei revogou a antiga Lei do CADE. Veja o art. 34 desta nova legislação:

Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social.

Parágrafo único. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

É praticamente uma cópia do art. 28, “caput” do CDC, adotando a teoria maior da desconsideração.

- Uma quinta legislação sobre o tema é a Lei 12.846/2013, a Lei Anticorrupção, veja seu artigo 14:

Art. 14. A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar confusão patrimonial, sendo estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de administração, observados o contraditório e a ampla defesa.

Claramente adota a teoria maior da desconsideração.

Com isso terminamos análise das cinco leis, no âmbito do direito brasileiro, que tratam da temática da

desconsideração.

Agora, cumpre pontuar algumas observações, levando em conta tudo o que já foi estudado sobre a temática

até aqui:

1ª observação: “não é necessária a comprovação de insolvência para que ocorra a desconsideração”

Vide o Enunciado 281 do CJF:

A aplicação da teoria da desconsideração, descrita no art. 50 do Código Civil, prescinde da demonstração de insolvência da pessoa jurídica.

Isso é muito importante pois as pessoas acham que a desconsideração só ocorre quando o patrimônio da

pessoa jurídica não existe mais. Frise-se: a insolvência pode ser uma causa, mas não é um requisito da

desconsideração.

2ª observação: “o simples encerramento irregular da pessoa jurídica, por si só, não causa desconsideração”

É o caso daquele sócio que acha que encerrar a pessoa jurídica é fechar as portas e pronto, “vida que segue”.

Cuidado, o simples enceramento não causa por si só a desconsideração, vide o Enunciado 282 do CJF:

O encerramento irregular das atividades da pessoa jurídica, por si só, não basta para caracterizar abuso da personalidade jurídica.

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O professor Flávio Tartuce critica esse enunciado, afirma o autor que o encerramento irregular não só

deveria ser causa da desconsideração como a principal causa para tanto.

Mas cuidado para não confundir esse enunciado com a Súmula 435 do STJ:

Súmula 435 - Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.

Na verdade, a súmula não traz uma hipótese de desconsideração. Dá a impressão de que é, mas não é. O que

se fala é de redirecionamento da execução fiscal. Questões de provas tentam afirmar que essa súmula

contraria o Enunciado, mas isto não ocorre e são coisas diferentes.

3ª observação: “é admitida a desconsideração das pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos”

Então, é admitida a desconsideração das associações, para alcançar o patrimônio pessoal do seu

administrador ou até mesmo de seu associado. Não há problema nenhum com relação a isso. Vide Enunciado

284 do CJF:

As pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos ou de fins não-econômicos estão abrangidas no conceito de abuso da personalidade jurídica.

É uma hipótese muito comum no caso de Ong que fazem mal uso do dinheiro público.

4ª observação: “o sócio alcançado pela desconsideração não tem sua responsabilidade vinculado aos

percentuais de cotas sociais que titulariza”

A responsabilidade, portanto, deste sócio atingido pela desconsideração não está estrita ao percentual das

cotas sociais que titulariza. A Lei da Liberdade Econômica até tenta evitar isso, mas nada impede que outro

sócio seja atingido, caso não consiga em relação a outros sócios. Evidente que depois terá o sócio atingido o

direito de regresso contra a sociedade e demais sócios.

Nesse sentido, veja o REsp 1.169.175/DF:

RECURSO ESPECIAL - DIREITO CIVIL - ARTIGOS 472, 593, II e 659, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE - INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284/STF - DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA - MEDIDA EXCEPCIONAL - OBSERVÂNCIA DAS HIPÓTESES LEGAIS - ABUSO DE PERSONALIDADE - DESVIO DE FINALIDADE - CONFUSÃO PATRIMONIAL - DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE - ATO EFEITO PROVISÓRIO QUE ADMITE IMPUGNAÇÃO - BENS DOS SÓCIOS - LIMITAÇÃO ÀS QUOTAS SOCIAIS - IMPOSSIBILIDADE - RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS COM TODOS OS BENS PRESENTES E FUTUROS NOS TERMOS DO ART. 591 DO CPC - RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, IMPROVIDO. I - A ausência de explicitação precisa, por parte do recorrente, sobre a forma como teriam sido violados os dispositivos suscitados atrai a incidência do enunciado n. 284 da Súmula do STF. II - A desconsideração da personalidade jurídica é um mecanismo de que se vale o ordenamento para, em situações absolutamente excepcionais, desencobrir o manto protetivo da personalidade jurídica autônoma das empresas, podendo o credor buscar a satisfação de seu crédito junto às pessoas físicas que compõem a sociedade, mais especificamente, seus sócios e/ou administradores. III - Portanto, só é admissível em situações especiais quando verificado o abuso da personificação jurídica, consubstanciado em excesso de mandato, desvio de finalidade da empresa, confusão patrimonial entre a sociedade ou os sócios, ou, ainda, conforme amplamente reconhecido pela jurisprudência desta Corte Superior, nas hipóteses de dissolução irregular da empresa, sem a devida baixa na junta comercial. Precedentes. IV - A desconsideração não importa em dissolução da pessoa jurídica, mas se constitui apenas em um ato de efeito provisório, decretado para determinado caso concreto e objetivo, dispondo, ainda, os sócios incluídos no pólo passivo da demanda, de meios processuais para impugná-la. V - A partir da desconsideração da personalidade jurídica, a execução segue em direção aos bens dos sócios, tal qual previsto expressamente pela parte final do próprio art. 50, do Código Civil e não há, no referido

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dispositivo, qualquer restrição acerca da execução, contra os sócios, ser limitada às suas respectivas quotas sociais e onde a lei não distingue, não é dado ao intérprete fazê-lo. VI - O art. 591 do Código de Processo Civil é claro ao estabelecer que os devedores respondem com todos os bens presentes e futuros no cumprimento de suas obrigações, de modo que, admitir que a execução esteja limitada às quotas sociais levaria em temerária e indevida desestabilização do instituto da desconsideração da personalidade jurídica que vem há tempos conquistando espaço e sendo moldado às características de nosso ordenamento jurídico. VII - Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, improvido. (REsp 1169175/DF, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/02/2011, DJe 04/04/2011)

5ª observação: “em regra, ocorrendo a desconsideração, os credores devem alcançar o sócio ou

administrador que se beneficiou direta ou indiretamente do mal uso da pessoa jurídica”

Mesmo antes da Lei de Liberdade Econômica, existiam dois Enunciado do CJF nesse sentido: 7 e 146:

ENUNCIADO 7 - Só se aplica a desconsideração da personalidade jurídica quando houver a prática de ato irregular e, limitadamente, aos administradores ou sócios que nela hajam incorrido.

ENUNCIADO 146 - Nas relações civis, interpretam-se restritivamente os parâmetros de desconsideração da personalidade jurídica previstos no art. 50 (desvio de finalidade social ou confusão patrimonial).

6ª observação: “a simples prática de um ato ultra vires, por si só, não causa desconsideração”

Vamos lembrar que essa expressão é muito utilizada no âmbito do direito empresarial para designar aqueles

atos que são realizados além dos limites do contrato social, ou seja, que extrapolam o objeto social da pessoa

jurídica.

Mas veja, é claro que com base na boa-fé objetiva e na teoria da aparência, esses atos vinculam a pessoa

jurídica a terceiros de boa-fé, mas a simples prática de um ato dessa natureza não é causa da

desconsideração.

Portanto, grave: isso não que dizer que um ato ultra vires não possa levar a desconsideração, é claro que

pode, mas não é por si só, uma causa da desconsideração. Nesse mesmo sentido os §§ 3º e 4º do art. 50 do

CC.

§ 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

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Curso: Direito Civil – Parte Geral

Aula: Aspectos processuais da desconsideração

Professor: Rafael da Mota Mendonça

Resumo

Observação: em regra, a desconsideração não pode ser realizada de ofício pelo magistrado, dependendo de

requerimento da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo. Vide o art. 133,

caput, do CPC e art. 50, caput do CC:

Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.

Importante observar que a própria pessoa jurídica também pode requerer a desconsideração, vide enunciado

285 do CJF:

A teoria da desconsideração, prevista no art. 50 do Código Civil, pode ser invocada pela pessoa jurídica, em seu favor.

O objetivo é justamente obter a responsabilização pessoal do sócio que eventualmente tenha abusado dessa

condição de sócio e a pessoa jurídica não seja conivente com isso.

De outro lado, existem hipóteses em que a desconsideração pode ser realizada de ofício:

1ª hipótese: direito do consumidor: pois todas as normas do CDC são normas de ordem pública, vale dizer, o

juiz as pode conhecer de ofício e podem ser arguidas a qualquer tempo.

2ª hipótese: direito ambiental: diante da proteção constitucional do bem ambiental como um bem difuso, é

possível também a sua desconsideração de ofício.

3ª hipótese: direito do trabalho: em razão do bem jurídico tutelado, é possível desconsiderar de ofício.

4ª hipótese: nos casos de corrupção: por força da Lei Anticorrupção (12.846/2013).

Observação: a partir do momento em que a desconsideração é tratada como um incidente processual, ela só

pode ocorrer após o aperfeiçoamento do contraditório e ampla defesa. Vide art. 135 do CPC:

Art. 135. Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias.

Destaca-se quando o requerimento já é feito na petição inicial: art. 134, §§2º e 3º do CPC:

§ 2º Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica.

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Superinteressante, pois se pede na inicial, acaba de alguma forma formando um litisconsórcio, tendo que

colocar o sócio ou a pessoa jurídica já no polo passivo, ou seja, um litisconsórcio.

Referências

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