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Estudo das representações sociais do suicídio e do terrorismo nos católicos e nos muçulmanos

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Academic year: 2021

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ESTUDO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO SUICÍDIO E DO

TERRORISMO NOS CATÓLICOS E NOS MUÇULMANOS

Carina Terra

Orientador de Dissertação VÍCTOR CLÁUDIO

Coordenador de Seminário de Dissertação VÍCTOR CLÁUDIO

Tese submetida como requisito parcial para a obtenção do grau de: MESTRE EM Psicologia

Especialidade em Psicologia Clínica

(2)

II

Dissertação de Mestrado realizada sob a orientação do Doutor Professor Victor Cláudio, apresentada no Instituto Superior de Psicologia Aplicada para obtenção do grau de Mestre na especialidade de Psicologia Clínica conforme o despacho da DGES, nº 19673/2006 publicado em Diário da Republica 2ª Série de 26 de Setembro, 2006.

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III

AGRADECIMENTOS…

À Prof.ª Dra. Maria Gouveia-Pereira e ao Prof. Dr. Victor Cláudio, pela orientação paciente e interessada.

À Instituição ISPA, que forneceu os meios que possibilitaram levar a cabo, em geral, a minha formação em Psicologia e, em particular, este estudo.

Aos meus pais e restantes familiares, pelo constante apoio e pela contínua confiança que depositaram em mim e no meu trabalho.

Ao meu namorado, Ruben Rodrigues, pelo suporte, pela compreensão e pelo companheirismo que me dedicou nas piores horas.

Aos colegas que me acompanharam neste trabalho, em especial, à Filipa Araújo, pela força e pela ajuda que me deram.

Ao Dr. Liakatali Fakir, pelo seu estímulo, a sua confiança, a sua ajuda e a sua paciência, ao Mohammed pela sua ajuda, simpatia e boa disposição e ao Dr. Mohammed Adamgy, pela sua ajuda e orientação, que possibilitaram a realização deste trabalho.

Ao Sheik David Munir, pela sua amabilidade em me receber e possibilitar a realização deste estudo na Mesquita de Lisboa.

Por último, e talvez o agradecimento mais importante, às pessoas que aceitaram, gentilmente e com muito interesse, colaborar neste estudo, sem as quais, sem dúvida, este trabalho não teria sido possível.

A todos, o meu Muito Obrigada!

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IV RESUMO

Com o intuito de verificar se a Representação Social que os Católicos e os Muçulmanos têm dos fenómenos do Suicídio e do Terrorismo é semelhante ou divergente, ou seja, se a pertença a uma determinada Religião é ou não uma variável que influencia o que a pessoa pensa, sente e simboliza sobre os fenómenos em estudo, desenvolveu-se um estudo comparativo, com duas amostras aleatórias independentes, com um total de 74 adultos e jovens adultos (42 Católicos e 32 Muçulmanos). Foi aplicado um questionário com questões de resposta aberta, de metodologia associativa, e com quadros de conceitos metafóricos, construído especificamente para este estudo. Os dados obtidos foram tratados qualitativa e qualitativamente através da Análise de Conteúdo e da Análise Estatística, respectivamente. Os resultados demonstram que, relativamente à Representação Social do Suicídio, os grupos em estudam evocam, maioritariamente, conteúdos que remetem para uma Dimensão

Intra-Individual (Afectos e Doença/Perturbação Psicológica). Numa percentagem menos

expressiva, são ainda evocados conteúdos que remetem para uma Imagem Crítica/Negativa do Suicídio – a componente Externa ou Inter-Individual apenas surge ao nível das Causas apontadas para a sua ocorrência.

Quanto à Representação Social do Terrorismo, os dois grupos evocam, na sua maioria,

Imagens – imagens de Morte/Violência e uma Imagem Negativa/Crítica do Terrorismo –,

nomeadamente ao nível do que pensam e das causas que associam a este fenómeno. Os grupos também evocam, de forma significativa, conteúdos que remetem para uma Dimensão

Intra-Individual (Afectos e Doença/Perturbação Psicológica), quando se referem ao que

sentem e à caracterização/descrição da pessoa que comete um acto terrorista – aqui, ao nível das causas apontadas para a ocorrência do Terrorismo, a componente mais Externa e

Inter-Individual torna-se mais significativa, à semelhança do que acontece na Representação Social

do Suicídio.

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V

ABSTRACT

In order to verify if the social representation that Catholics and Muslims have the phenomena of Suicide and Terrorism is similar or different, that is, if belonging to a particular Religion is a variable that affects what a person thinks, feels and stands on the phenomena under study, it was developed a comparative study, with two random and independent samples, with a total of 74 adults and young adults (42 Catholics and 32 Muslims). It was applied a questionnaire with questions to open answer, by an associative methodology, and with tables of metaphorical concepts, built specifically for this study.

The resulting data show that, concerning the Social Representation of Suicide, groups in study mentioned, mostly, content referring to an Intra-Individual Dimension (Affection and

Psychological Disease/Disturb). In a less significant percentage, are still evoked content

referring to a Negative/Criticism Image of Suicide – the External component or the

Inter-Individual Dimension appears only at the Causes identified for its occurrence.

As for Social Representation of Terrorism, the two groups evoke, mostly, Images – images of Death/Violence and a Negative/Criticism Image of Terrorism – in particular at the level of Thinking and of associating Causes of this phenomenon. The group also refer, in a large extent, content referring to an Intra-Individual Dimension (Affection and Psychological

Disease/Disturb), when they refer to what they Feel and to Characterization/Description of

the person who commits a terrorist act – here, at of the reasons given for the occurrence of Terrorism, the External component or Inter-Individual Dimension becomes more significant, as is the case in Social Representation of Suicide.

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VI ÍNDICE INTRODUÇÃO 1 1. As Representações Sociais 3 1.1 Como se formam 7 1.1.1 A Objectivação 7 1.1.2 A Ancoragem 9

1.2 Tipologia das Representações Sociais 11

1.3 Funções das Representações Sociais 11

1.4 Análise das Representações Sociais através das Metáforas e dos

Protótipos 13

1.4.1 As Metáforas 14

1.4.2 Os Protótipos 15

2. O Suicídio 16

2.1 Definições 17

2.2 O Suicídio ao longo dos tempos – Perspectiva Histórica 17

2.3 Breve Teorização – O Suicídio e o Suicida 18

3. Estudos desenvolvidos no âmbito das Representações Sociais do

Suicídio 22

4. O Terrorismo 25

4.1 Definições 25

4.2 Breve Teorização: O Terrorismo e o Terrorista – Perspectiva Histórica 26

5. A Religião 31

5.1 Cristianismo 32

(7)

VII

5.1.2 Posição do Cristianismo face ao Suicídio 34

5.1.3 Posição do Cristianismo face ao Terrorismo 35

5.2 Islamismo 35

5.2.1 Orientações Gerais 35

5.2.2 Posição do Islamismo face ao Suicídio 37

5.2.3 Posição do Islamismo face ao Terrorismo 38

5.2.4 O Fenómeno Islão – A Nova Presença Islâmica em Portugal 38

6. Objectivos, Hipóteses e Problemas de Investigação 40

6.1 Objectivos 40

6.1.1 Objectivos 1e 2: Problemas de Investigação 1 e 2 40

MÉTODO 43 1. Participantes 43 2. Design 45 3. Instrumentos 45 3.1 Questionário 45 4. Procedimento 47 RESULTADOS 49

1. Tratamento dos Dados 49

2. Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados 71 2.1 Apresentação e Discussão dos Resultados relativos à Temática do Suicídio 72

2.1.1 Experiência/Vivência Pessoal do Suicídio 72

2.1.2 Importância atribuída à Religião na ausência de Ideação Suicida 75

2.1.3 Representação Social do Suicídio 77

(8)

VIII

2.2.1 Representação Social do Terrorismo 86

2.3 Discussão dos Resultados – Suicídio/Terrorismo 95

CONCLUSÃO 98

1. Algumas Observações e Sugestões finais… 102

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 103

TABELAS

Tabela 1: Distribuição das Percentagens relativas à existência de Ideias de Suicídio nos Homens e nas Mulheres, tanto Católicos como Muçulmanos (n=74)

Tabela 2: Resultados relativos às razões pelas quais os Católicos e os Muçulmanos consideram que a sua Religião os ajuda a não ter Ideias de Suicídio (n=74) Tabela 3: Resultados relativos aos Pensamentos despoletados pelo Suicídio nos Católicos e

nos Muçulmanos (n=74)

Tabela 4: Resultados relativos aos Sentimentos suscitados pelo Suicídio nos Católicos e nos Muçulmanos (n=74)

Tabela 5: Resultados relativos aos Protótipos que os Católicos e os Muçulmanos têm da pessoa que comete um acto suicida (n=74)

Tabela 6: Resultados relativos às Causas atribuídas pelos Católicos e pelos Muçulmanos ao fenómeno do Suicídio (n=74)

Tabela 7: Resultados relativos às Metáforas mais utilizadas pelos Católicos e pelos Muçulmanos para definir o que é o Suicídio (n=74)

Tabela 8: Resultados relativos aos Pensamentos despoletados pelo Terrorismo nos Católicos e nos Muçulmanos (n=74)

Tabela 9: Resultados relativos aos Sentimentos suscitados pelo Terrorismo nos Católicos e nos Muçulmanos (n=74)

Tabela 10: Resultados relativos aos Protótipos que os Católicos e os Muçulmanos têm da pessoa que comete um acto terrorista (n=74)

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IX

Tabela 11: Resultados relativos às Causas associadas pelos Católicos e pelos Muçulmanos ao acto terrorista (n=74)

Tabela 12: Resultados relativos às Metáforas mais utilizadas pelos Católicos e pelos Muçulmanos para definir o que é o Terrorismo (n=74)

GRÁFICOS

Gráfico 1: Distribuição das Percentagens relativas à existência de Ideias e de Tentativas de

Suicídio, ao Contacto com o fenómeno do Suicídio e à Importância da Religião na ausência de Ideação Suicida nos Católicos e nos Muçulmanos (n=74)

Gráfico 2: Percentagens referentes à existência de Ideias de Suicídio nos Católicos e nos Muçulmanos (n=74)

Gráfico 3: Percentagens referentes à existência de Tentativas de Suicídio nos Católicos e nos Muçulmanos (n=74)

Gráfico 4: Percentagens referentes ao Contacto dos Católicos e dos Muçulmanos com o fenómeno do Suicídio (n=74)

Gráfico 5: Distribuição das percentagens referentes ao Contacto dos Católicos e dos Muçulmanos com o fenómeno do Suicídio através de Amigos, Conhecidos,

Vizinhos, Colegas e Familiares (n=74)

ANEXOS

Anexo A: Guião das entrevistas realizadas para a construção do quadro de metáforas

referentes ao Terrorismo

Anexo B: Questionário Final referente às Representações Sociais do Suicídio e do Terrorismo (Versão I e Versão II)

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1

I. INTRODUÇÃO

O Comportamento Suicidário, isto é, o Suicídio, o Para-Suicídio e/ou outras formas de comportamento de risco, constitui um dos maiores flagelos da sociedade contemporânea. Nesse sentido, conhecer, desmistificar, reconhecer os sinais, saber a quem e aonde recorrer, e como ajudar alguém que diariamente se cruza connosco e mostra sinais de dor, angústia, solidão e desespero, são alguns dos pré-requisitos necessários na abordagem do Comportamento Sucidário.

O Suicídio é um problema complexo, para o qual não há uma única causa ou solução; é o resultado de uma complexa interacção de factores biológicos, genéticos, psicológicos, sociais, culturais e ambientais. Os factores e situações de risco variam de país para país e de continente para continente, dependendo dos aspectos culturais, políticos e económicos dos mesmos (Fleischmann & Bertolote, 2000).

Em 1999, a OMS lançou uma iniciativa à escala mundial (SUPRE), com o intuito de reduzir a crescente mortalidade devido a comportamentos suicidas. Esta iniciativa teve por base os seguintes pontos:

℘ Em termos gerais, a morte por suicídio cresceu em cerca de 60% nos últimos 45 anos e esta tendência observa-se tanto em países desenvolvidos como em países em vias de desenvolvimento;

℘ Durante estes 45 anos, o maior índice de suicídios passou duma população de idade avançada para uma mais jovem (35-45 anos; 15-25 anos em alguns lugares), até ao ponto de ultimamente o suicídio estar entre as 5 primeiras causas de morte entre os jovens (Fleischmann & Bertolote, 2000).

Hoje defrontamo-nos com um novo flagelo na nossa sociedade: o Terrorismo! As causas deste fenómeno são diversas e complexas, podendo este assumir várias formas. O terror, no seu sentido mais amplo, é a violência cometida contra alvos não militares devido a fins políticos, ou seja, os alvos do terror são civis inocentes, cujo único crime é, aos olhos dos terroristas, representarem “o outro”. Este é um acto desprovido de qualquer justificação

(11)

moral, considerado por muitos como um crime cometido contra a humanidade (Adamgy, 2001).

Analisando de uma forma mais profunda este fenómeno do Terrorismo, pode-se constatar que os motivos sociais, económicos e políticos que muitas vezes lhe são associados são mesclados com motivos religiosos, sendo a Religião frequentemente usada como cobertura ideológica para esse tipo de actos (actos terroristas). Tal como é referido no diálogo inter-religioso promovido pelo Expresso, “nos textos sagrados pode encontrar-se tudo e o seu contrário” (p.53), o problema é a forma como esses textos são hoje instrumentalizados e deturpados por alguém para “justificar/legitimar” actos que atentam contra a liberdade e a vida de outrem (Câmara & Robalo, 2006).

O presente trabalho inscreve-se numa perspectiva psicossociológica, de forma a conseguir apreender a grande abrangência destas temáticas, pretendendo dar um contributo válido para um melhor conhecimento das Representações Sociais dos fenómenos em estudo (Suicídio e Terrorismo), tendo como pano de fundo a Religião e a forma como ela pode

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1. As Representações Sociais

“Ao imaginar um mapa da Europa, sem nenhuma indicação nele com excepção da cidade de Viena (perto do centro) e da cidade de Berlim (a norte de Viena), onde se localizariam as cidades de Praga e de Budapeste? Para a maioria das pessoas que nasceram depois da II Guerra Mundial, ambas as cidades pertencem à divisão do Leste da Europa, enquanto Viena pertence ao Oeste e, consequentemente, tanto Praga como Budapeste deveriam se localizar a Leste de Viena” (p. 7). Ao olhar efectivamente para o mapa da Europa e vendo a localização real dessas duas cidades, Budapeste está com certeza afastada, mais a Leste, bem abaixo de Viena (ao longo do Danúbio), e Praga está, na verdade, a Oeste de Viena (Moscovici, 2004). Este pequeno exemplo ilustra, em parte, o fenómeno das representações sociais, demonstrando como padrões de comunicação, nos anos do pós-guerra, influenciaram a representação social da Europa e fixaram uma imagem específica desta. Mas, para além de ilustrar o papel e a influência da comunicação no processo da representação social, este exemplo também mostra a forma como essas representações se tornam em senso comum, ou seja, como entram para o mundo comum e quotidiano em que cada um de nós vive e se move. Assim sendo, pode-se dizer que as Representações Sociais, sustentadas pelas influências sociais da Comunicação, são um instrumento privilegiado de estabelecimento de associações que nos permitem interagir e relacionar uns com os outros (Moscovici, 2004), constituindo, desse modo, uma verdadeira realidade social (Páez, 1987).

A pesquisa que ainda hoje é considerada como a pioneira sobre as Representações

Sociais foi levada a cabo por Moscovici em 1950, quando este desenvolveu a noção

sociológica de “Representações Colectivas” de Durkheim. Tudo começou pelo seu interesse pelo fenómeno emergente da psicanálise na sociedade francesa da época, nomeadamente, pela forma como as ideias sobre a teoria psicanalítica eram absorvidas na cultura e em 1961 introduziu, pela primeira vez, o conceito de Representação Social, definindo-o como um sistema de valores, de noções e de práticas relativas a objectos, aspectos ou dimensões do meio social que permite não só a estabilização do quadro de vida dos indivíduos e dos grupos, como também constitui um instrumento de orientação da percepção das situações e de elaboração de resposta (Moscovici, 1998). E assim definiu as bases da Teoria das

Representações Sociais que, de uma forma muito simplista, se refere às representações

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pertença ou referência (Páez, 1987). Mas, tomando como seu centro a Comunicação e as Representações, a Teoria das Representações Sociais espera elucidar as ligações que unem a psicologia humana com as questões sociais e culturais contemporâneas (Moscovici, 1998).

Mais tarde, Brewer & Kramer (1984, cit por Hewstone, Jaspars & Lalljee, 1982)

consideram o estudo dos estereótipos grupais e da sua influência no processamento da informação um eixo central das Representações Sociais. No entanto, trabalhos recentes desenvolvidos sobre as Representações Sociais, principalmente pelos franceses, têm demonstrado a riqueza das crenças sociais numa maior e mais ambiciosa pesquisa do que a que é oferecida pela pesquisa tradicional americana dos estereótipos. A ênfase é colocada no sentido de a Representação Social não ser apenas um sinónimo para estereótipo, isto é, uma lista de características atribuídas a um grupo social, mas antes um conceito mais extenso, mostrando semelhanças com os mitos e os sistemas de crenças (Moscovici, 1981, cit por Hewstone, Jaspars & Lalljee, 1982).

A partir dessa altura, muitos estudos foram realizados nesse âmbito e muitas definições do conceito de Representação Social foram delineadas.

Uma delas foi a de Páez (1987), que considerou que a Representação Social se pode definir como um conceito ou esquema conceptual, produto da função simbólica, mas construído e partilhado colectivamente, socialmente. Como parte da actividade simbólica, a Representação Social apresenta, desse modo, alguns aspectos do processo cognitivo que se deve ter em conta, tais como:

℘ O termo Representação supõe, enquanto representação, a reprodução mental de um objecto (Páez, 1987). O acto de representar é um acto de pensamento pelo qual a pessoa se liga a um objecto (pessoa, objecto, acontecimento material ou psíquico), tornando-o presente no espírito, na consciência (Jodelet, 1984). Representar é, assim, “tenir lieu de, être à la place de”1 (p. 362);

℘ A substituição simbólica do ausente é associada à capacidade de representação, de substituir a percepção da realidade; a representação é o modelo interno que tem por função a conceptualização imediata do real pela activação do conhecimento prévio. No entanto, embora seja conceptual e possua aspectos operacionais e organizativos, também possui aspectos figurativos e de reprodução mediante imagens analógicas do real (Páez, 1987);

1

(14)

℘ O aspecto figurativo da “cópia” imaginada ou da reprodução simbólica é inseparável do seu aspecto significativo (Moscovici, 1984). A representação tem, assim, duas faces indissociáveis, à semelhança de uma simples moeda (assim como a moeda tem a cara e a coroa, a representação social tem a face figurativa e a face simbólica), fazendo corresponder a toda a figura um sentido e a todo o sentido uma figura (Jodelet, 1984; Palmonari & Doise, 1986);

℘ A representação social não é um reflexo puro do mundo exterior, um traço, uma impressão que é mecanicamente impressa e guardada no espírito; não é uma reprodução passiva dum exterior pelo interior, sendo estes concebidos como radicalmente distintos (Jodelet, 1984). A representação social forma mais do que simula, tendo um efeito socialmente criativo e construtivo (Moscovici, 1998); ela “exprime a relação de um sujeito com um objecto, relação que envolve uma actividade de construção e simbolização” (Vala, 2002, p. 461). Nessa relação, o sujeito selecciona a percepção e atribui-lhe um significado, construindo activamente a representação do objecto;

℘ As representações sociais referem-se a estruturas cognitivo-afectivas que servem para processar a informação do mundo social, assim como para planificar as condutas sociais. Se todo o conhecimento, no geral, é social, porque resulta do processo de socialização, as representações sociais, em particular, correspondem às cognições ou esquemas cognitivos complexos gerados por grupos que permitem a comunicação e que servem para orientar as interacções (Páez, 1987).

Resumindo, a Representação Social “est toujours représentation d’un objet, a un caractère imageant et la propriété de rendre interchangeable le sensible et l’idée, le percept et le concept, a un caractère constructif, a un caractère symbolique et signifiant et a un caractère autonome et créatif”2 (Jodelet, 1984, p. 365).

Como fenómeno, as representações sociais apresentam-se sob variadas formas, mais ou menos complexas; apresentam-se como “images qui condensent un ensemble de significations; systèmes de référence qui nous permettent d’interpreter ce qui nous arrive, voire de donner un sens à l’inattendu; catégories qui servent à classer les circonstances, les

2 “é sempre a representação de um objecto, tem um carácter imagético e a propriedade de tornar intermutável o perceptível e a ideia, o percepto e o conceito, tem um carácter construtivo, tem um carácter simbólico e significante e tem um carácter autónomo e creativo”

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phénomenes, les individus auxquels nous avons affaire”3 (p. 360). A Representação Social é,

assim, “une manière d’interpreéter et de penser notre realité quotidienne, une forme de connaissance sociale”4

(Jodelet, 1984, p. 360). Esta definição debruça-se sobre a “concepção dos modos de pensamento que nos relacionam com o mundo e com os outros, os processos susceptíveis de interpretar e de reconstituir de modo significativo a realidade, os fenómenos cognitivos que suscitam a pertença social dos indivíduos com implicações afectivas, normativas e práticas e configuram aos objectos uma particularidade simbólica própria dos grupos sociais” (Neto, 1998, p. 438) – representações são, assim, a expressão de identidades individuais e sociais.

O conhecimento espontâneo, naif, que tanto interessa às ciências sociais nos dias de hoje neste contexto, é o que vulgarmente chamamos de conhecimento do senso comum. Este conhecimento constitui-se a partir das nossas experiências, mas também das informações, dos saberes, dos modelos de pensamento que recebemos e transformamos através da tradição, da educação e da comunicação social. É, sob vários pontos de vista, um conhecimento socialmente elaborado e partilhado por todos (Jodelet, 1984). Para Moscovici, todo o pensamento e conhecimento baseia-se nas representações sociais e cada representação social é composta por uma mistura de conceitos ou ideias e imagens que se encontram tanto nas mentes das pessoas como a circular na sociedade, através das conversas, dos contactos sociais/interpessoais e da imprensa escrita (Potter, 1996). Ela visa, essencialmente, “à maîtriser notre environnement, comprendre et expliquer les faits et idées qui meublent notre univers de vie ou y surgissent, agir sur et avec autrui (…), repondre aux questions que nous pose le monde (…)”5 (p. 360). Dito de outra forma, a Representação Social é uma modalidade

de pensamento prático orientada para a comunicação, para a compreensão e para o domínio do meio social, material e das ideias (Jodelet, 1984).

3 “imagens que condensam um conjunto de significados; sistemas de referência que nos permitem interpretar aquilo que nos chega, até de dar sentido ao inesperado; categorias que servem para ordenar as circunstâncias, os fenómenos, as pessoas com as quais nos relacionamos”

4 “uma maneira de interpretar e de pensar a nossa realidade quotidiana, uma forma de conhecimento social” 5 “o domínio do nosso meio ambiente, compreender e explicar os factos e ideias que enriquecem o nosso

universo de vida onde esses factos e ideias surgem, agir sobre e com o outro (…), responder às questões que nós colocamos ao mundo (…)”

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1.1 Como se formam

A noção de Representação Social tem uma longa história e contou com a contribuição de várias ciências sociais interrelacionadas – o trabalho antropológico de Lévy-Bruhl sobre os sistemas de crenças de sociedades tradicionais, o trabalho sócio-cognitivo de Piaget sobre a compreensão e a representação que a criança tem do mundo que a rodeia, o trabalho sociológico de Durkheim sobre os conceitos de “representações colectivas”, de “representações sociais” e “representações individuais”, como distintos uns dos outros, o trabalho de Moscovici no âmbito da psicologia social sobre as representações sociais da Psicanálise, etc (Moscovici, 1998). Estas últimas duas contribuições foram as de maior relevância no estudo das Representações Sociais. Durkheim defendeu a especificidade do pensamento colectivo em relação ao pensamento individual, tal como a tese de que os fenómenos sociais são irredutíveis aos fenómenos psíquicos individuais. Mas enquanto Durkheim via as representações colectivas como formas estáveis de compreensão colectiva, com o poder de integrar e conservar a sociedade como um todo, Moscovici estava mais interessado em explorar a variação e a diversidade das ideias colectivas nas sociedades modernas, em estudar como as coisas mudam, na estrutura e nos conteúdos, nessas sociedades – a transformação do senso comum (Moscovici, 2004; Palmonari & Doise, 1986). É no contexto de tais transformações que Moscovici põe em evidência dois importantes processos que dão conta do modo como o social transforma um conhecimento em representação e como essa representação transforma o social – Objectivação e Ancoragem. Estes processos revestem-se de uma grande relevância, demonstrando a interdependência entre a actividade psicológica e as condições sociais (Jodelet, 1984).

1.1.1 A Objectivação

Muito daquilo que nos interessa na vida do dia-a-dia e de que falamos a toda a hora não se reveste de uma realidade concreta. O processo da Objectivação permite tornar o abstracto em concreto, materializar a palavra ou dar corpo aos esquemas conceptuais (Jodelet, 1984), permitindo, dessa forma, concretizar o que está na mente na forma de algo que exista no mundo físico (Moscovici, 2004). A Objectivação diz, assim, respeito “à forma como se organizam os elementos constituintes da representação e ao percurso através do qual tais elementos adquirem materialidade e se formam expressões de uma realidade vista como natural” (Vala, 2002, p. 465).

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Este processo compreende três momentos:

a) Construção Selectiva

“As informações, crenças e ideias sobre o objecto de representação sofrem um processo de Selecção e Descontextualização (Vala, 2002, p. 466). Este processo de selecção e de reorganização das informações que circulam relativas ao objecto não é neutro nem aleatório, faz-se em função de critérios culturais (nem todos os grupos têm o mesmo acesso às informações) e, sobretudo, de critérios normativos (retiram-se as informações em concordância com o sistema de valores em vigor no meio circundante). Essas informações são destacadas do campo científico e do grupo de peritos aos quais pertencem e são apropriadas pelas pessoas que, assim, as podem conhecer e projectar como factos do seu próprio universo (Jodelet, 1984). Allport & Postman fazem notar que os elementos do objecto são alvo de uma redução para que se torne mais simples, breve e preciso, ou seja, “mais comunicável e útil” (p. 466); paralelamente, alguns desses elementos são acentuados, tornando-se nos elementos estruturantes da representação (Vala, 2002). A representação serve e exprime, nesse sentido, interesses, normas e valores grupais.

b) Formação dum “Núcleo Figurativo”

Há uma organização ou uma Esquematização Estruturante dos elementos – as “noções básicas que constituem uma representação social encontram-se organizadas de forma a constituírem um padrão de relações estruturadas” (Vala, 2002, p. 466) – a criação de uma estrutura imagética que “va reproduire de manière visible une structure conceptuelle”6 (p.

368). Dessa maneira, os conceitos teóricos organizam-se num conjunto imagético e coerente, que possibilita compreendê-los individualmente e nas suas relações (Jodelet, 1984).

c) Naturalização

O modelo figurativo vai permitir concretizar, em coordenação, cada um dos elementos da representação que se tornam, dessa forma, naturais – “les figures, d’éléments de la pensée, deviennent éléments de la réalité, référents pour le concept. Le modèle figuratif utilisé comme s’il démarquait effectivement des phénomènes acquiert un statut d’évidence: tenu pour acquis, il integre les éléments de la science dans une réalité de sens commun”7 (Jodelet, 1984, p.

6 “vai reproduzir de maneira visível uma estrutura conceptual”

7 “as figuras, os elementos do pensamento, tornam-se elementos da realidade, referidos pelo conceito. O modelo figurativo utilizado como se ele desmarcasse efectivamente os fenómenos, adquirindo um estatuto de evidência; tido por adquirido, ele integra os elementos da ciência numa realidade de senso comum”

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368/369). “Não só o abstracto se torna concreto através da sua expressão em imagens e metáforas, como o que era percepção se torna realidade, tornando equivalentes a realidade e os conceitos” (Vala, 2002, p. 467).

Na apropriação das teorias científicas, dos conceitos teóricos pelo senso comum, o processo de Naturalização ou “Transformação”, isto é, a materialização de uma ideia abstracta numa imagem, pode-se realizar através da Personificação, da Figuração e/ou da Ontologização.

Personificação: considerada o principal processo da naturalização, faz com que a

teoria (abstracta) adquira uma existência concreta em função da sua assimilação a um personagem (real) (Amaral, 2004). A Personificação pode assumir duas modalidades, consonantes com as duas hipóteses sobre o processo de categorização social – a tradução de uma ideia em exemplares e a tradução de uma ideia em protótipo (Vala, 2002);

Figuração: “processo através do qual as imagens e metáforas substituem conceitos

complexos” (Moscovici & Hewstone, 1984, cit por Vala, 2002, p. 469);

Ontologização: consiste em “atribuir às ideias ou às palavras coisas, qualidades ou

forças” (p. 469), em transformar entidades lógicas ou mesmo verbais em “coisas” (Moscovici & Hewstone, 1984, cit por Vala, 2002).

1.1.2 A Ancoragem

A Ancoragem é o processo que permite transformar algo estranho, perturbador e intrigante em algo familiar, ao integrá-lo no sistema particular de categorias pré-existentes da pessoa e enquadrando-o na categoria mais apropriada. No momento em que determinado objecto ou ideia é enquadrado numa categoria, adquire características dessa categoria, sendo simultaneamente reajustado para nela integrar. Ancorar é, dessa forma, classificar, dar nome a alguma coisa anteriormente desconhecida (Moscovici, 2004). A Ancoragem é, então, num sentido mais lato, a inserção do novo objecto “num sistema de categorias sociais, culturais ou linguísticas, ou ainda práticas existentes num dado momento” (Amaral, 2004, p. 36).

A intervenção do social traduz-se na significação e na utilidade que são conferidos ao objecto e à sua representação (Jodelet, 1984). O processo de Ancoragem equivale, assim, numa perspectiva mais instrumental, a uma atribuição de funcionalidade; “devient, à la limite,

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un système d’interpretation s’étendant à d’autres systèmes conceptuels; elle fournit des systèmes de classification et des typologies de personnes et d’événements”8 (Palmonari &

Doise, 1986, p. 23), demonstrando “a intervenção da representação no social” (Neto, 1998, p. 459).

A Ancoragem pode preceder a Objectivação ou situar-se na sua sequência. Preceder na medida em que, quando um indivíduo pensa num objecto desconhecido, é por referência a experiências e a esquemas de pensamento já estabelecidos que esse objecto vai ser pensado; situar-se na sua sequência na medida em que “se a objectivação explica como os elementos representados de uma teoria se integram enquanto termos da realidade, a ancoragem permite compreender a forma como eles contribuem para exprimir e constituir as relações sociais” (Moscovici, 1961, cit por Vala, 2002, p. 474).

A Ancoragem promove transformações nas representações já estabelecidas, assemelhando-se, neste âmbito, ao modelo sócio-cognitivo de Piaget – “num primeiro momento verificam-se reacções de assimilação tendentes a incorporar o novo objecto no sistema de categorização já existente; num segundo momento, verificam-se reacções de acomodação nesse mesmo sistema de categorização” (Vala, 2002, p. 475).

Situada numa relação dialéctica com a Objectivação, a Ancoragem decompõe-se em múltiplas modalidades que permitem compreender como a significação é conferida ao objecto representado, como a representação é utilizada como sistema de interpretação do mundo social, quadro e instrumento de conduta, e como se opera a sua integração num sistema de recepção e a conversão dos elementos desse último que aí se encontram produzidos (Jodelet, 1984).

Podem-se encontrar, segundo Doise (1992, cit por Correia, 2004), três grandes tipos de Ancoragens, que se propõem estudar as lógicas individuais, sociológicas e psicossociológicas que regulam o processo da Ancoragem. Mais especificamente:

Ancoragem Psicológica: as representações sociais das pessoas e/ou grupos podem ancorar

nas suas experiências individuais ou inter-individuais;

Ancoragem Sociológica: analisa a relação entre as pertenças sociais e os conteúdos de uma

representação, partindo do pressuposto de que membros de um

8 “torna-se, no limite, um sistema de interpretação que se estende a outros sistemas conceptuais; ela fornece os sistemas de classificação e as tipologias das pessoas e dos eventos”

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mesmo grupo social com experiências e vivências comuns apresentam representações sociais semelhantes;

Ancoragem Psicossociológica: também analisa as relações sociais, embora a partir de uma

perspectiva analítica. Desse modo, “inscreve os conteúdos das representações sociais na maneira como os indivíduos se situam simbolicamente relativamente às relações sociais e às divisões posicionais e categoriais de um dado campo social” (Doise, 1992, cit por Vala, 2002, p. 476).

1.2 Tipologia das Representações Sociais

Segundo alguns autores (Amaral, 2004; Vala, 2002), existem três modalidades de Representações Sociais: as Hegemónicas ou Colectivas, as Emancipadas e as Polémicas. Para Vítor Amaral (2004), o conceito de Representação Social Hegemónica ou Colectiva é equivalente ao conceito de “Representação Colectiva” proposto por Durkheim, que diz respeito aos sistemas de crenças e valores ou formas de entendimento e significados amplamente partilhados por um grupo estruturado. Quanto ao conceito de Representação

Social Emancipada, o autor considera que reflecte a cooperação entre grupos e resulta das

interacções (diálogos, troca de significados diferentes sobre um mesmo objecto) entre os sujeitos sociais (pessoas ou grupos); este tipo de representação apresenta alguma autonomia relativamente aos grupos sociais que estão na sua origem, na medida em que expressa experiências partilhadas. Relativamente ao conceito de Representação Social Polémica, Jorge Vala (2002) considera que o mesmo tem origem nos conflitos entre os grupos sociais, sendo determinado pelas relações antagonistas ou de diferenciação e reflectindo pontos de vista exclusivos sobre um mesmo objecto.

1.3 Funções das Representações Sociais

Toda e qualquer interacção humana, seja entre duas pessoas ou entre dois grupos, pressupõe a presença de Representações Sociais. É isso que as torna específicas – “toujours et partout, lors qu’on se rencontre, qu’on entre en contact avec des personnes, des choses, on véhicule certains attentes, un certain contenu mental correspondant à des jugements et à une

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connaisance des groupes, des personnes et des choses en présence”9 (p. 13). Se

negligenciarmos essa realidade, não acedemos a mais do que às mudanças, às acções e às reacções pobres e elementares da grande riqueza das relações humanas (Palmonari & Doise, 1986).

Paez (1987) considera que as Representações Sociais, quando activadas, actuam como modelos ou mini-teorias que organizam e estruturam internamente os conteúdos da realidade, intervindo na identificação, reconhecimento e evocação dos objectos. Neste âmbito, Jodelet (1984) considera que elas permitem compreender “comment la signification est conférée à l’objet représenté, comment la représentation est utilisée comme système d’interprétation du monde social, cadre et instrument de conduite et comment s’opère son intégration dans un système d’accuil et la conversion des éléments de ce dernier qui s’y trouvent rapportés”10 (p.

372). Pode-se, então, considerar que as representações são, definitivamente, estruturas cognitivas que processam a informação e lhes atribuem um sentido, que acabam por servir de guia às condutas humanas.

Esta questão da importância das Representações Sociais para o entendimento das relações entre os grupos sociais foi uma questão discutida por alguns autores como Moscovici (2004), Jodelet (1984) ou Palmonari & Doise (1986). À luz dessa questão, estes mesmos autores conseguiram identificar algumas das funções sociais das representações. Assim sendo, Moscovici (2004) fala nas funções de Desejabilidade (construção de uma realidade social orientada pelo indivíduo), de Equilíbrio (as representações sociais tendem a reconstituir um equilíbrio perdido, visando repor o equilíbrio dos novos saberes adquiridos pelo indivíduo através de uma compensação imaginária), de Controlo (indivíduo filtra a informação que vem do exterior, de modo a poder controlar o comportamento individual) e de Familiaridade (representações sociais como um saber prático – a sua criação corresponde a um esforço de adaptação das pessoas e/ou grupos face a informações novas e abstractas, tornando-as mais usuais, familiares e ligadas a aspectos da sua realidade e vida quotidianas). Esta última função surge dos principais mecanismos sócio-cognitivos geradores das representações sociais: a Objectivação e a Ancoragem. Já Jodelet (1984) identifica as funções Cognitiva (integração da novidade), de Interpretação da realidade (possibilita ao indivíduo tornar a sua realidade social

9 “sempre e por toda a parte, quando alguém se encontra, quando alguém entra em contacto com as pessoas, com as coisas, veicula certas expectativas, um certo conteúdo mental correspondente aos julgamentos e a um conhecimento dos grupos, das pessoas e das coisas presentes”

10 “como o significado é conferido ao objecto representado, como a representação é utilizada como sistema de interpretação do mundo social, quadro e instrumento de conduta, e como se opera a sua integração num sistema de acolhimento e a conversão dos elementos desse último que ai se encontram produzidos”

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compreensível) e de Orientação das condutas e das relações das Representações Sociais. Palmonari & Doise (1986), por sua vez, atribui às representações uma função Selectiva (ex: reparar-se nas características desejáveis do grupo de pertença e nas características indesejáveis dos outros grupos), uma função Justificadora, que serve para justificar a acção que é empreendida (ex: uso de estereótipos dos grupos sociais “inferiores” para manter a distância social e a subordinação económica), uma função de “Antecipação” do desenrolar das relações sociais (actua no sentido de pré-determinar interacções entre as pessoas e/ou grupos), uma função de Atribuição (forma segundo a qual as representações influenciam ou determinam explicações do campo social – esta função será especialmente importante como uma forma de mudar a ênfase individual das teorias tradicionais da atribuição) e uma função de Identidade Social (a pesquisa sobre a Identidade Social e as Relações Intergupais demonstrou que as pessoas agem de acordo com os membros do seu grupo ou categoria de referência, procurando uma identidade social positiva na comparação do seu grupo com os restantes grupos).

1.4 Análise das Representações Sociais através das Metáforas e dos Protótipos

O indivíduo não se limita, na sua relação com o outro e com o mundo, a receber e a processar a informação, é também construtor de significados, teorizando, assim, a realidade social em que se move. O social intervém neste processo sob diversos aspectos, nomeadamente, no contexto concreto onde se situam as pessoas e os grupos, na comunicação que se estabelece entre eles, nos quadros perceptivos que fornecem a sua bagagem cultural e nos códigos, valores e ideologias ligadas às suas posições ou pertenças sociais especificas (Jodelet, 1984).

Nesta acepção, as Representações Sociais são “um conjunto de conceitos, proposições e explicações criado na vida quotidiana no decurso da comunicação inter-individual” (Moscovici, 1981, cit por Vala, 2002, p. 458), que funciona como uma modalidade de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um cariz prático, e contribuindo para a construção de uma realidade comum a um conjunto social (Jodelet, 1984).

Do ponto de vista dinâmico, as Representações Sociais aparecem como uma “rede” de ideias, metáforas e imagens (Moscovici, 1998), como um conjunto dinâmico que visa a produção de comportamentos e interacções sociais; nesse sentido, as representações sociais “são tanto um produto como um processo” (p. 140). São produto na medida em que permitem

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o estudo do seu conteúdo que, circulando como uma versão do real, impregna os discursos, as imagens, as opiniões e as atitudes que os processos de interacção e comunicação tratam de veicular; são processo porque remetem para os mecanismos psicológicos e sociais que estão na origem da formação, organização e transformação de tais conteúdos, e porque remetem para as suas funções e eficácia sociais (Sampaio, Oliveira, Vinagre, Gouveia-Pereira, Santos & Ordaz, 2000).

Dessa forma, apesar de na sua construção estarem envolvidos mecanismos cognitivos e processos intra-psíquicos, as Representações Sociais dependem em grande medida da pertença categorial da pessoa, dos seus contextos de vida, das suas interacções, e do seu lugar na estrutura social, mostrando-se como uma forma de ler o real e dando sentido à vida dos grupos, que se organizam em torno de interesses comuns, partilhados (Sampaio, Oliveira, Vinagre, Gouveia-Pereira, Santos & Ordaz, 2000).

Os conteúdos das Representações Sociais são regulados pelos processos da Objectivação e da Ancoragem, processos esses que dão conta do modo como o social transforma um conhecimento em representação e do modo como essa representação transforma o social (Moscovici, 1998).

1.4.1 As Metáforas

Para a compreensão/integração do novo, para a difusão de uma nova ideia ou conceito num grupo, as pessoas preferem fazê-lo segundo as imagens, as metáforas e os símbolos que fazem parte do seu quotidiano, que estruturam a sua experiência e o seu pensamento (Ordaz, 1995).

No processo de Objectivação, mais especificamente, nos processos de Figuração e Ontologização, as Metáforas representam um papel fundamental, segundo Lakoff e Johnson (1980, cit por Ordaz & Vala, 1997). Estes autores sustentam que a nossa actividade quotidiana é estruturada metaforicamente, pois não sendo meras expressões linguísticas, são expressões do próprio processo de pensamento. A Metáfora pode ser definida como “an iconic illustration of a non-iconic mental figure”11 (Wagner e tal, 1993, cit por Ordaz, 1995, p. 46).

11

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1.4.2 Os Protótipos

A concepção prototípica das categorias baseia-se em estudos de objectos naturais; no entanto, alguns autores chegaram à conclusão de que certos elementos das categorias naturais prototípicas eram válidos para as categorias sociais (Cantor & Mischel, 1979, cit por Páez, 1987).

Um protótipo é um membro de uma categoria conceptual que compartilha o máximo de características comuns com outros membros dessa categoria, e o mínimo de atributos comuns com os membros de categorias diferentes ou opostas (Páez, 1987). O protótipo é, essencialmente, o membro mais representativo de uma categoria, o que implica que nem todos os membros de uma categoria têm o mesmo grau de representatividade. Mas um protótipo não é somente definido pelas diferenças com os membros de uma outra categoria, também é definido pelas diferenças com os outros membros da categoria à qual faz parte; desta forma, “quanto mais um objecto possui atributos da categoria, mais é prototípico dela e mais a representa (…), e quanto mais um objecto for prototípico de uma categoria, menos atributos terá das categorias contrastantes” (Ordaz, 1995, p. 68).

De acordo com Rosch (1978, cit por Amaral, 2004), dois princípios regulam a formação de categorias – (1) “um sistema categorial existente numa dada cultura fornece o máximo de informação aos indivíduos com o mínimo esforço cognitivo para estes” (p. 39); (2) a categorização social permite ordenar e compreender o mundo social, reforçando o seu carácter estruturado e diferenciado.

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2. O Suicídio

O Suicídio é um fenómeno complexo e multi-determinado que desde sempre atraiu a atenção de filósofos, teólogos, médicos, sociólogos e artistas. Simultaneamente ligado à ideia de vida e à ideia de morte, o Suicídio é definido à luz da sociedade em que os indivíduos se inserem, não se podendo por isso desprezar os factores culturais que se lhe encontram associados (Ballone, 2004). Apesar de ser um acto individual, o suicídio surge muitas vezes carregado dum significado relacional, na medida em que o “suicida pode pretender pedir ajuda ou agredir alguém com a sua atitude” (p. 400), acabando o seu acto por ter importantes

repercussões sociais – considerado um constructo social, o suicídio será um “acto

significativo” para as sociedades onde ocorre (Sampaio, 2002b).

O Comportamento Suicidário, que vai desde pensamentos suicidas a tentativas ou a actos consumados, é uma tragédia pessoal e familiar, causando grande sofrimento à pessoa que comete o acto e a todas aquelas que estão em seu redor (Fleischmann & Bertolote, 2000). O Suicídio está entre as 10 primeiras causas de morte em todos os países e entre as 3 primeiras causas de morte entre os jovens, dos 15 aos 34 anos. Os maiores índices de Suicídio (para homens e mulheres) encontram-se na Europa, mais particularmente, na Europa de Leste (Estónia, Letónia, Lituânia, Finlândia, Hungria, Rússia) e em países asiáticos, tais como a China e o Japão. Índices médios encontram-se em países do Norte e do Centro da Europa, da América do Norte, do Sudeste Asiático e Pacífico, e do Ocidental, tais como Austrália, Nova Zelândia, Canadá, Índia e EUA. As taxas mais baixas encontram-se na América Latina, nos países árabes e em alguns países asiáticos como, por exemplo, Argentina, Brasil, Kuwait e Tailândia. A informação relativa à maioria dos países africanos é mínima, no entanto, algumas ilhas relativamente isoladas têm taxas de suicídio surpreendentemente altas, como Cuba, Sri Lanka, Fiji, Samoa e Seicheles (Fleischmann & Bertolote, 2000). O maior número de suicídios verifica-se na Ásia, pois quase 30% de todos os casos de suicídio no mundo são cometidos na China e na Índia (Fleischmann & Bertolote, 2000).

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2.1 Definições

Sendo um sério problema de saúde pública, a questão do Suicídio exige a nossa maior atenção, pois a sua prevenção e controlo, infelizmente, não são tarefa fácil (Bertolote, 1999). Talvez a primeira coisa a fazer no sentido da detecção e prevenção de possíveis situações de suicídio é tentar definir o conceito de Suicídio.

O Suicídio, “assassino de si, corresponde ao desfecho fatal de um acto deliberado para provocar a sua própria morte” (Houzel, Emmanuelli & Moggio, 2004, p. 972). Ou, segundo Sampaio (2002b), corresponde à “auto-destruição provocada por um acto executado pelo sujeito, com intenção deliberada de pôr termo à vida” (p. 396). Mas já em 1897 Durkheim (1991) tentava definir o Suicídio como “todo o caso de morte que resulta directa ou indirectamente de um acto positivo ou negativo praticado pela própria vítima, acto que a vítima sabia dever produzir esse resultado” (p. 10) e já nessa altura a definição deste conceito levantava algumas questões como, por exemplo, a da Intencionalidade. Nesse sentido, já Durkheim chamava a atenção para o facto de a ideia de morte não estar presente, da mesma maneira, em todos os gestos auto-destrutivos (Sampaio, 2002b) – existência de casos em que a intencionalidade não é clara, tais como o jogo da “roleta russa”, as mulheres indianas que eram enterradas juntamente com o marido falecido, etc.

2.2 O Suicídio ao longo dos tempos – Perspectiva Histórica

A atitude da sociedade face ao Suicídio não tem sido uniforme ao longo dos tempos e a sua compreensão só pode ser feita se se ponderarem as diversas vertentes do seu enquadramento cultural (Sampaio, 2002a).

Na Roma Clássica já predominavam atitudes de neutralidade ou de crítica face ao Suicídio quando, mais tarde, Santo Agostinho critica abertamente o comportamento Suicidário. No período Medieval havia uma notória hostilidade em relação aos suicidas, com patentes atitudes de rejeição – o corpo do suicida não tinha direito a enterro cristão, sendo exposto publicamente como forma de dissuasão. Surge, neste sentido, no século XIII, S. Tomás de Aquino a proclamar que apenas Deus tinha o direito de dar e de tirar a vida, fazendo com que a ideia de “suicídio-pecado” se instalasse por muitos anos. Até aqui, há uma visão profundamente negativa do suicídio pela sociedade, que só começa a ser alterada a partir do século XVIII com Jean-Jacques Rousseau – ele coloca a compreensão dos gestos

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humanos (e, em particular, a do gesto suicida) segundo uma dupla perspectiva, individual e social, ao considerar que o homem é, à partida, bom, sendo influenciado positiva ou negativamente conforme o seu percurso social. Também David Hume, em 1777, encara o suicídio sem o associar à ideia de pecado, pois defende a conduta auto-destrutiva em casos de dor, doença, vergonha ou miséria (Sampaio, 2002b). No entanto, só no fim do século XIX e início do século XX é que a discussão sobre este tema se alarga a vários domínios e atinge uma dimensão verdadeiramente científica. Para isso contribuiram os trabalhos de três autores: Émile Durkheim, que abre caminho às teorias sociológicas sobre o suicídio, dando uma importância sistemática aos factores sociais na génese do impulso suicida, e Sigmund Freud e Karl Menninger, que salientam, sobretudo, a dimensão interna do gesto suicida (Sampaio, 2002a).

Actualmente, o problema da conduta auto-destrutiva é visto como uma situação complexa e multi-determinada, que exige esforços conjugados de especialistas de diversos ramos, desde o técnico de Saúde Mental ao Sociólogo ou Antropólogo, para que o resultado final não constitua apenas uma visão parcelar da realidade. Deste modo, defende-se a importância da colaboração interdisciplinar em Suicidologia, duma abordagem do comportamento suicidário fundamentalmente contextual, partindo sempre dum Diagnóstico Sistémico e duma compreensão e articulação das dimensões interna e externa do indivíduo (Sampaio, 2002a).

2.3 Breve Teorização – O Suicídio e o Suicida

Especialmente frequente e característico da Adolescência e da Terceira Idade, o Suicídio traduz geralmente um extremo sofrimento pessoal, um intenso sentimento de solidão e a presença de perturbações nas relações familiares. Nesse âmbito, no plano psicológico, qualquer ataque a si, sobretudo quando é efectuado num estado de perda de controlo, é um índice de gravidade que deve ser tomado muito a sério, independentemente das consequências imediatas para a saúde física do indivíduo” (Houzel, Emmanuelli & Moggio, 2004, p. 973); como tal, nenhuma tentativa de suicídio deve ser descurada, devendo cada uma ser sistematicamente sujeita a consultas psicológicas individuais e familiares, de forma a que o indivíduo e o seu sistema familiar possam compreender o sentido de tal gesto e munir-se dos meios necessários à tal mudança (Sampaio, 2002ª).

O comportamento suicidário resume múltiplas estratégias e intenções. Assim, quando um indivíduo decide recorrer a ele, este nunca responde apenas a um único significado; a

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pluralidade dos sentidos desta conduta é habitual. Ao nível consciente, o indivíduo “procura muitas vezes fugir a uma situação desagradável (fracasso escolar, decepção sentimental,

conflito amoroso, familiar ou ambos…); de forma mais profunda, a tentativa de

suicídio/suicídio pode produzir uma adesão a ideias de morte, a uma temática depressiva (a

vida não tem interesse, não vale a pena viver nesta sociedade…)” (p. 177), ou ainda revelar

uma necessidade exacerbada de controlo do corpo e de conservar uma omnipotência sobre o seu destino. “Mais profundamente ainda, alguns indivíduos procuram martirizar o corpo, tudo o que ele simboliza e tudo o que ele contém (…) o ataque a este corpo pode corresponder a angústias extremamente importantes, sendo o objectivo do suicídio fazer parar estas angústias” (p. 177), ou pode ainda traduzir uma raiva interna (Braconnier & Marcelli, 2000). O Suicídio constitui-se, assim, como um ataque contra o corpo e tudo o que ele representa, como um virar da agressividade contra si próprio (muitas vezes num clima de impulsividade), mas também como uma forma de provocar a reacção dos outros e/ou de comunicar com eles – o indivíduo não realiza os seus actos só para si, mas também os realiza para os outros; agir é um meio de entrar, de algum modo, num “diálogo comportamental” quando os outros meios de comunicação não funcionam. O Agir e o Comportamento oferecem desta maneira uma vertente colectiva social, na medida em que os actos se inscrevem na família, nos grupos, nos outros indivíduos, enfim, na sociedade, e é nestes que os actos ganham o seu significado (Braconnier & Marcelli, 2000).

Três aspectos são particularmente característicos nos suicidas:

℘ Na sua maioria, as pessoas com pensamentos suicidas têm sentimentos contrários acerca do Suicídio, vivendo uma grande ambivalência. O desejo de viver e de morrer provocam uma batalha interna na pessoa – ela sente uma urgência em deixar a dor de viver e ao mesmo tempo sente desejo de viver. Muitos suicidas não querem realmente morrer, somente são infelizes;

℘ O Suicídio é também um acto impulsivo;

℘ Os pensamentos, sentimentos e acções dos suicidas são rígidos e restringidos – pensam constantemente no suicídio, não sendo capazes de ver outras saídas para os seus problemas (Fleischmann & Bertolote, 2000; Peixoto & Azenha, 2006).

O Acto Suicida é, raramente (se alguma vez o é), um acto verdadeiramente voluntário; antes, é um caminho que a pessoa se sente muitas vezes forçada a seguir, porque não vê outra saída/solução para os seus problemas, para a sua dor ou miséria. A situação parece-lhe, assim,

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insuportável, e os seus problemas (internos e/ou externos) sem solução possível. Mas geralmente há outras saídas, e alguém tem de as assinalar, mostrar à pessoa, ajudando-a a seguir essas outras saídas. Há que procurar um maior entendimento na comunicação e interacção entre o suicida e as pessoas que o rodeiam; há que discutir o assunto com a pessoa, tendo em conta a sua situação pessoal e social, tentando identificar os factores que contribuíram para a sua tentativa de suicídio (Fleischmann & Bertolote, 2000).

A Sociedade Portuguesa de Suicidologia (SPS) define o que chama de “Cenário Suicida” como a realidade em que a pessoa que se suicida normalmente se movia; a SPS caracteriza-a, assim, por uma Dor Psicológica Intolerável (devido à não satisfação das necessidades psicológicas elementares), pela Perda da Auto-Estima (com incapacidade para suportar a dor psicológica), por uma Constrição da Mente (perspectiva de menos horizontes e menos tarefas), pelo Isolamento (acompanhada por uma sensação de vazio e de falta de amparo), pela Desesperança (acompanhada por uma sensação de nada valer a pena) e por uma

Egressão (apenas se vê a Fuga como única solução para acabar com a dor intolerável sentida)

(Peixoto & Azenha, 2006). Para além disso, aponta vários factores de risco ou facilitadores do impulso suicida de diversas ordens – Psicopatológicos, Psicológicos, Sociais ou Pessoais. Estes factores influenciam a psicodinâmica do Suicídio, entrelaçando-se e exercendo uma pressão que mobiliza o comportamento em busca da morte, sendo, assim, adjuvantes na génese do fenómeno suicidário (Areal, 1996). Assim sendo, os Psicopatológicos incluem a presença de perturbações mentais (nomeadamente, depressão endógena, esquizofrenia, distúrbios de personalidade e situações de alcoolismo ou de toxicomania), a presença de modelos suicidário, quer sejam familiares, pares sociais, ou através de histórias de ficção e/ou notícias veiculadas pelos media, e a existência de Tentativa(s) de Suicídio prévia(s) ou de ameaça/ideação suicida com existência de um plano elaborado; quanto aos Psicológicos, eles incluem a ausência de projectos de vida, a existência de uma crise existencial com um consequente e acentuado sentimento de desesperança (pessoa coloca questões quanto à existência e ao significado da vida, vivendo sentimentos de culpa ou de auto-desvalorização, que condicionam uma visão negativa da vida), , e o sofrimento da rejeição ou perda de figuras significantes (pais, irmãos, cônjuge, amigos íntimos, filhos…); já os Sociais se reportam a certos acontecimentos sociais, como por exemplo, o desemprego, a mudança de residência e/ou emigração, o isolamento sócio-familiar, a reforma, o acesso fácil a agentes letais (armas de fogo, pesticidas…) e o estar encarcerado; por último, mas não menos importantes, os

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ou renais, doentes que perdem a mobilidade, a visão ou a audição, etc…), à ocorrência de frequentes hospitalizações (psiquiátricas ou outras), à desagregação da família – por separação, divórcio ou viuvez – e/ou conflitos familiares constantes, e a situações de abuso ou violência (física ou psicológica) (Areal, 1996; Fleischmann & Bertolote, 2000; Peixoto & Azenha, 2006).

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3. Estudos desenvolvidos no âmbito das Representações Sociais do Suicídio

Alguns autores desenvolveram estudos relativos às Representações Sociais do Suicídio, já em relação ao Terrorismo não se pode dizer o mesmo – não se encontraram quaisquer estudos relativos às Representações Sociais do Terrorismo. Apresentam-se em seguida alguns dos estudos encontrados no âmbito das Representações Sociais do Suicídio.

Quanto às Representações Sociais do Suicídio, em 1995, Ordaz estudou, na sua Tese de Mestrado, as Representações Sociais do Suicídio na Imprensa Escrita, nomeadamente nos jornais Semanário, Independente, Expresso, Público, Diário de Notícias, Crime, e Dia. Para tal, fez o levantamento das Metáforas (estruturais e ontológicas) e dos Protótipos maioritariamente presentes nos jornais em estudo, chegando à conclusão de que do total de artigos analisados 131 (40,8%) recorrem a metáforas para falar do Suicídio, assim como 282 (88%) e 233 (73%) desses artigos recorrem a uma descrição sociográfica ou a avaliação dos traços e atributos do suicida, respectivamente. Os resultados obtidos demonstraram que o recurso à objectivação por metáforas é uma estratégia da quase totalidade dos jornais, oferecendo uma riqueza imagética suficientemente diversificada para que seja possível promover diferentes formas de compreensão e de explicitação do acto suicida. Do conjunto dos resultados obtidos também sobressaiu um protótipo de suicida – ser Homem, ter uma actividade e residência especificada e não estar integrado socialmente devido ao comportamento desviante; a este perfil sociográfico surgem associados como traços/atributos mais salientes a Loucura e o Desvio.

Em 2000, Sampaio, Oliveira, Vinagre, Gouveia-Pereira, Santos e Ordaz estudaram as Representações Sociais do Suicídio em Estudantes do Secundário. Para isso, recolheram uma amostra de 822 adolescentes de idades compreendidas entre os 15 e os 23 anos de idade, das regiões de Santarém, Guimarães, Évora e Lisboa, dos 10º, 11º e 12º anos de escolaridade. Pelos resultados obtidos pode-se verificar que os adolescentes recorrem a uma multiplicidade de razões para explicar o fenómeno do Suicídio, remetendo essencialmente para dimensões de natureza IntraIndividual (sentimentos de perda, baixa auto-estima, desilusão e insegurança), Inter-activa (injustiça relacionada com os amigos, injustiça relacional e distributiva), Psicossocial (influência social e isolamento) e Biológica (factores biológicos). Os adolescentes apontam como possíveis indicadores do Suicídio a Ausência de amigos e família, o Abuso de Substâncias e a Fuga aos problemas. Também se constatou que são os

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adolescentes que apresentam ideação suicida que escolhem maioritariamente razões de natureza IntraIndividual e Biológica, enquanto que os que nunca tiveram ideação suicida atribuem uma maior importância a Causas Externas, como por exemplo o Álcool e a Droga. A variável “Regiões” considerada neste estudo, é modeladora de diferenças nos conteúdos representacionais, já que é nas regiões de Évora e Guimarães, onde se verificam as taxas de suicídio mais elevadas, que as explicações remetem quer para a natureza Psicossocial do acto quer para os Factores Biológicos que lhe podem estar associados.

Em 2003, Ordaz, Vinagre, Santos, Gouveia-Pereira, Oliveira e Sampaio apresentaram um estudo sobre as Representações Sociais do Suicídio em jovens com Comportamentos Auto-destrutivos. Esse estudo debruçou-se sobre as respostas de 56 adolescentes que tentaram o suicídio retirados da amostra de uma outra investigação (principal) de 822 estudantes dos 10º, 11º e 12º anos de escolaridade de escolas secundárias de Guimarães, Santarém, Lisboa e Évora, com idades compreendidas entre os 15 e os 23 anos de idade. Os resultados demonstraram que esses jovens recorrem a várias ideias e imagens quando pensam e sentem o suicídio. Essas ideias e imagens remetem, por um lado, para uma Dimensão InterIndividual (referem a família, os amigos e a escola, os seus problemas e desencontros), e, por outro, para uma Dimensão IntraIndividual (suicídio enquanto caminho para a libertação, numa procura incessante de paz, enquanto encontro final com o abismo, limite, vazio, etc, e como saída, solução, escape); também remetem para os comportamentos desviantes e para os métodos usados para levar a cabo o acto. Os sentimentos desses jovens face ao Suicídio revelam essencialmente o conflito IntraIndividual do desamor consigo próprio e da zanga com o mundo, que conduz a um estado de espírito no qual parece não haver saída. Quanto às características do jovem que se tenta suicidar, estes jovens dão conta de uma clara vertente interactiva, centrada nas dificuldades relacionais (com os pais, com os outros, consigo próprio), numa imagem de fragilidade e perturbação psicológica, numa situação de desespero, na incapacidade para resolver os problemas e na ausência de razões para viver. Quanto aos conceitos metafóricos seleccionados, a maioria destes jovens compara o acto suicida a uma Fuga, uma Desistência, uma Solução para os problemas, uma Saída, um Pedido de ajuda, um Mistério, uma Loucura e uma Mensagem.

Em 2004, Correia apresentou um novo estudo sobre as Representações Sociais do Suicídio com adolescentes com e sem tentativas de suicídio, um estudo comparativo com uma amostra de 30 adolescentes – 15 com tentativas de suicídio de pequena ou média gravidade em início de acompanhamento psicológico no NES no Hospital de Santa Maria e 15 sem

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Gráfico  1:  Distribuição  das  Percentagens  relativas  à  existência  de  Ideias  e  de  Tentativas  de  Suicídio,  ao  Contacto com o fenómeno do Suicídio e à Importância da Religião na ausência de Ideação Suicida  nos Católicos e nos Muçulmanos (n=74)
Tabela  1:  Distribuição  das  Percentagens  relativas  à  existência  de  Ideias  de  Suicídio  nos  Homens  e  nas  Mulheres, tanto Católicos como Muçulmanos (n=74)
Gráfico 4: Percentagens referentes ao Contacto dos Católicos e dos Muçulmanos com o fenómeno do Suicídio  (N=74) 19% 17% 40% 31% 7% 20% 14% 3% 5% 28% 0%10%20%30%40%50%
Tabela  2:  Resultados  relativos  às  razões  pelas  quais  os  Católicos  e  os  Muçulmanos  consideram  que  a  sua  Religião os ajuda a não ter Ideias de Suicídio (n=74)
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Referências

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