UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE DIREITO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
DANIEL OITAVEN PAMPONET MIGUEL
A HERMENÊUTICA DA ESGRIMA E OS DIREITOS
HUMANOS:
AS APORIAS VINCULAÇÃO/DISCRICIONARIEDADE, CONTEXTO
DE DESCOBERTA/CONTEXTO DE JUSTIFICAÇÃO DAS DECISÕES
JUDICIAIS E UNIVERSALISMO/MULTICULTURALISMO À LUZ DA
PARANÓIA MÚTUA ENTRE AUTOPOIESE E DESCONSTRUÇÃO
Vol. I
Salvador
2015
DANIEL OITAVEN PAMPONET MIGUEL
A HERMENÊUTICA DA ESGRIMA E OS DIREITOS
HUMANOS:
AS APORIAS VINCULAÇÃO/DISCRICIONARIEDADE, CONTEXTO
DE DESCOBERTA/CONTEXTO DE JUSTIFICAÇÃO DAS DECISÕES
JUDICIAIS E UNIVERSALISMO/MULTICULTURALISMO À LUZ DA
PARANÓIA MÚTUA ENTRE AUTOPOIESE E DESCONSTRUÇÃO
Vol. I
Tese exigida como requisito de conclusão do curso de Pós-Graduação stricto sensu de Doutorado em Direito Público da Universidade Federal da Bahia.
MIGUEL, Daniel Oitaven Pamponet.
A hermenêutica da esgrima e os direitos humanos: as aporias vinculação/discricionariedade, contexto de descoberta/contexto de justificação das decisões judiciais e universalismo/multiculturalismo à luz da paranóia mútua entre autopoiese e desconstrução/ Daniel Oitaven Pamponet Miguel; orientador, Wálber Araújo Carneiro; co-orientador, Márcio Flávio Mafra Leal — Salvador, 2015, 681 p.
Tese (Doutorado) – Universidade Federal da Bahia, Programa de Pós-graduação em Direito, Faculdade de Direito, Salvador, 2015.
1. Hermenêutica Jurídica 2. Vinculação e discricionariedade 3. Contexto de descoberta e contexto de justificação. 4. Universalismo, multiculturalismo e direitos humanos. 5. I. Carneiro, Wálber Araújo; Leal, Márcio Flávio Mafra (co-orient.). II. Universidade Federal da Bahia. Programa de Pós-graduação em Direito. III. Título.
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo geral propor, à luz da paranóia mútua descrita por Teubner entre a autopoiese luhmanniana e a desconstrução derridariana, um modelo hermenêutico adequado ao enfrentamento dos intervalos vinculatividade/discricionariedade, contexto de descoberta/contexto de justificação das decisões judiciais e universalismo/multiculturalismo no discurso dos direitos humanos em uma sociedade policontextural que apresenta crescentemente conflitos entre ordens jurídicas estatais e ordens jurídicas locais extraestatais. O escrito justifica-se e caracteriza-se como inovador ao pretender preencher a lacuna científica quanto ao seguinte problema de pesquisa: como pode ser estruturado um modelo hermenêutico descritivo-enquanto-normativo que, embora não sendo restrito à aporia pluralista, ofereça uma abordagem integrada sobre as mencionadas aporias idônea a catalisar uma construtiva desconstrução dos típicos moldes mutuamente paranoicos das relações entre ordens jurídicas estatais e ordens jurídicas locais extraestatais? Assumiremos, como matriz
“epistemológica”, a desconstrução derridariana, entendida esta de modo
desconstrutivo-construtivo (Miriam Bankovsky), de maneira a viabilizar diálogos e entrecruzamentos que desvelem tanto as deficiências quanto as potencialidades das vertentes de pensamento presentes em nosso referencial teórico, o qual congregará: tradições do pensamento jurídico que destacaram a dimensão empírica/sociológica do direito; e teses que podem ser lidas como tentativas de revitalização de tais modelos, os quais, por sua vez, podem ser compreendidos como seus “ancestrais”. Nesse sentido, estabeleceremos elos entre: o realismo estadunidense e Esser, de modo a caracterizar o eixo compreensivo do modelo ora proposto; o realismo de Alf Ross e a teoria da argumentação de Peczenik – eixo analítico; o realismo axiológico tridimensionalista de Miguel Reale e a hermenêutica diatópica de Panikkar e Boaventura Santos – eixo cultural; e entre, de um lado, a Jurisprudência Pragmática de Jhering e a Jurisprudência dos Interesses, e, de outro, o derridariano Douzinas – eixo político. Nosso referencial teórico também envolverá um metaeixo de análise, qual seja, a paranóia mútua enxergada por Teubner entre a desconstrução derridariana e a autopoiese luhmanniana, vertentes que consideramos ter como ancestrais, respectivamente, o Direito Livre de Kantorowicz e a Livre Investigação Científica de Gény. Concluímos, em uma iterativa confirmação da nossa hipótese de trabalho, que um entrelaçamento hierárquico das quatro dimensões axiais e da dimensão meta-axial mencionadas é idôneo a caracterizar a demarcação dos intervalos vinculatividade/discricionariedade, contexto de descoberta/contexto de justificação das decisões judiciais e universalismo/multiculturalismo como tarefas aporéticas por-vir envoltas, à luz de uma noção de justiça jurídica comprometida com um contínuo aperfeiçoamento, em um incessante jogo concertado (“thrust-and-parry” – estocadas-e-bloqueios) de deslocamentos entre um esforço construtivo de fundamentação retrospectiva
ABSTRACT
This work aims to create, based on the mutual paranoia between Luhmann’s autopoiesis and Derrida’s desconstruction described by Teubner, a hermeneutic model which can assess the gaps bindness/discretion, context of discovery/context of justification of judicial decisions and universalism/multiculturalism in what concerns the human rights discourse in a polycontextural society where conflicts between state legal orders and local non-state legal orders. This writing is justified and innovates primarily for it tries to work out the following unsolved research problem: how can it be formulated a descriptive-cum-normative hermeneutic model simultaneously not restricted to the pluralist aporia and able to, by an integrated approach to the three aforementioned undecidabilities, deconstruct constructively the mutual paranoia between those two kinds of legal orders? We chose a constructive reading of desconstruction, as offered by Miriam Bankovsky, as an “epistemological” basis, what builds bridges among the traditions of legal thinking which compose our theoretical framework and reveal its flaws and flairs. That theoretical framework gathers: traditions which highlight the empirical/sociological dimension of law; and and theses that can be read as attempts to revitalize such models, which, in turn, can be understood as their "ancestors". In this sense, we will establish links between: American Legal Realism and Esser, in order to characterize the hermeneutical (in a strict sense) axis of the model we offer; Alf Ross’ realism and Peczenik’s theory of legal argumentation - analytical axis; Miguel Reale’s tridimensionalist value realism, and Panikkar’s and Boaventura Santos’ Diatopic Hermeneutics – cultural axis; and, on the one hand, Jhering’s Pragmatic Jurisprudence and Heck’s Jurisprudence of Interests, and on the other, Douzinas’ derridian approach – political axis. Our theoretical framework will also involve a meta-axis: the mutual paranoia Teubner sees between Luhmann’s autopoiesis and Derrida’s deconstruction, lines of thought we consider to have as ancestors, respectively, Kantorowicz’ Free Law and Gény’s Free Scientific Research. We concluded our hypothesis was iteratively confirmed in such a way that a hierarchical entanglement among the four axial and the meta-axial dimensions is able to qualify the boundaries of the gaps bindness/discretion, context of discovery/context of justification of judicial decisions and universalism/multiculturalism as aporetic tasks to-come. In the light of a conception of juridical/legal justice bound to perfect itself continuously, those tasks are wrapped between a constructive effort to, à la re-entry and its systemic constraints, conceive justification retrospectively – what in the context of conflicts between state legal orders and non-state legal orders requires translating (creative misunderstanding) local custom into state normative programmes and demands the state order to, in diatopic fashion, take the initiative, independently of reciprocity, to establish an intercultural approach – and an inexorable deconstruction of the determinations in what it results.
Keywords: “Thrust-and-parry”. “Re-entry” as creative misunderstanding. Juridical (legal)
justice to-come. Jumps of meaning of the empty signifier “human rights” as personalist formulations of truth. Conflicts between state legal orders and local non-state legal orders.
RÉSUMÉ
Ce travail a pour objectif général de proposer, à la lumière de la paranoïa réciproque décrite par Teubner entre l’autopoièse de Luhmann et la déconstruction de Derrida, un modèle herméneutique approprié pour faire face à les intervalles « caractère contraignant/ caractère discrétionnaire », « contexte de découverte/contexte de justification des décisions judiciaires » et « universalisme/multiculturalisme » dans le discours des droits de l'homme, dans une société polycontextuel qui a de plus en plus des conflits entre les ordres juridiques de l'État et les ordres juridiques locaux non étatiques. L'étude est justifiée et est caractérisé comme
innovante de vouloir combler la lacune scientifique sur le problème de recherche suivant:
comment peut-il être structuré un modèle herméneutique descriptive-comme-normative qui, sans être limité à l’aporie pluraliste, offre une approche intégrée sur les apories mentionnés capable de catalyser une déconstruction constructive des moules typiques mutuellement paranoïaques des relations entre les ordres juridiques de l'État et les ordres juridiques locaux non étatiques? On assumera, comme matrice "épistémologique", la déconstruction de Derrida, compris de façon déconstructive-constructive (Miriam Bankovsky), afin de permettre le dialogue et les intersections qui révèlent à la fois les déficiences que le potentiel des lignes de pensée présents dans notre cadre théorique, qui regroupe: les traditions de la pensée juridique qui a souligné la dimension empirique/sociologique du droit; et thèses qui peuvent être lues comme des tentatives de revitaliser ces modèles, lesquels, à son tour, peuvent être comprises comme leurs «ancêtres». En ce sens, nous allons établir des liaisons entre: le réalisme américain et Esser, afin de caractériser l’axe comprehénsive du modèle proposé; le réalisme de Alf Ross et la théorie de l'argumentation de Peczenik – l’axe analytique; le réalisme axiologique tridimensionnel de Miguel Reale et l'herméneutique diatopique de Panikkar et Boaventura Santos – l’axe culturel; et entre, d'une part, la Jurisprudence Pragmatique de Jhering et la Jurisprudence des Intérêts, et, de l'autre, le derridien Douzinas –
l’axe politique. Notre cadre théorique également comprendra un méta-axe d'analyse, à savoir,
la paranoïa réciproque perçue par Teubner entre l’autopoièse de Luhmann et la déconstruction de Derrida, thèses que nous considérons avoir comme ancêtres, respectivement, le Droit Libre de Kantorowicz et de la Libre Recherche Scientifique de Gény. On conclut, dans une validation itérative de notre hypothèse, qu’une imbrication hiérarchique des quatre dimensions axiales et de la dimension méta-axiale mentionnée est appropriée pour caractériser la démarcation des intervalles « caractère contraignant/ caractère discrétionnaire », « contexte de découverte/contexte de justification des décisions judiciaires » et « universalisme/multiculturalisme » comme des tâches aporétiques à-venir enveloppés, à la lumière d'un sens de la justice juridique engagée à l'amélioration continue, dans un jeu concertée continue (« thrust-and-parry » - attaque-et-parade) de déplacements entre un effort
