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Percepção dos profissionais das equipes de saúde da família acerca dos elementos de seu processo de trabalho

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DO TRAIRI PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA

MARLLON SOUSA LINHARES

PERCEPÇÃO DOS PROFISSIONAIS DAS EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA ACERCA DOS ELEMENTOS DE SEU PROCESSO DE

TRABALHO

SANTA CRUZ 2019

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MARLLON SOUSA LINHARES

PERCEPÇÃO DOS PROFISSIONAIS DAS EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA ACERCA DOS ELEMENTOS DE SEU PROCESSO DE TRABALHO

Dissertação apresentada ao curso de Pós-graduação em Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva

Área de concentração: Saúde Coletiva.

Orientadora: Profa. Dra. Rafaela Carolini de Oliveira Távora

Coorientadora: Profa. Dra. Cecília Nogueira Valença

SANTA CRUZ 2019

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MARLLON SOUSA LINHARES

PERCEPÇÃO DOS PROFISSIONAIS DAS EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA ACERCA DOS ELEMENTOS DE SEU PROCESSO DE TRABALHO

Dissertação apresentada ao curso de Pós-graduação em Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva

Aprovada em: ______/______/______

BANCA EXAMINADORA:

________________________________________ Profa. Dra. Rafaela Carolini de Oliveira Távora

Orientadora

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

_________________________________________ Profa. Dra. Camilla Araújo Lopes Vieira

Membro externo

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

________________________________________ Prof. Dr. Dimitri Taurino Guedes

Membro interno

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial da Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi - FACISA

Linhares, Marllon Sousa.

Percepção dos profissionais das equipes de saúde da família acerca dos elementos de seu processo de trabalho / Marllon Sousa Linhares. -

2019. 35f.: il.

Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi, Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Santa Cruz, RN, 2019.

Orientador: Rafaela Carolini de Oliveira Távora. Coorientador: Cecília Nogueira Valença.

1. Estratégia Saúde da Família - Dissertação. 2. Trabalho - Dissertação. 3. Pessoal de saúde - Dissertação. I. Távora, Rafaela

Carolini de Oliveira. II. Valença, Cecília Nogueira. III. Título.

RN/UF/FACISA CDU 614.39

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O preço do silêncio é pago na dura moeda corrente do sofrimento humano. Fazer as perguntas certas constitui, afinal, toda a diferença entre sina e destino, entre andar à deriva e viajar. Questionar as premissas supostamente inquestionáveis do nosso modo de vida é provavelmente o serviço mais urgente que devemos prestar aos nossos companheiros humanos e a nós mesmos.

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RESUMO

Partindo do pressuposto que o processo de trabalho é formado por objetivos ou finalidades, objeto, meios e condições, agente ou sujeito, o presente projeto tem como objetivo analisar a percepção dos profissionais das equipes de Saúde da Família do município de Santa Cruz-RN acerca dos elementos do seu processo de trabalho. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória, com 12 sujeitos participantes, metade da zona urbana e o restante da zona rural. Diante dos elementos apresentados e das discussões realizadas com vistas à elucidação dos objetivos propostos, percebeu-se que ano de formação dos profissionais abrangeu a década de 2000 e de 2010, a maioria dos profissionais realiza suas atividades de trabalho somente na ABS, com o regime de 40 horas semanais, vinculados por concurso público. A partir das transcrições e análises das entrevistas emergiram quatro categorias: incompreensão entre objetos, instrumentos e finalidades; objetivos diversos; tensões n o cotidiano; qualidade do processo de trabalho. Tais falas foram analisadas seguindo as orientações da Análise de Discurso Crítica. Observou-se que muitos profissionais não souberam diferenciar objetos, instrumentos e objetivos no seu processo de trabalho, bem como apresentaram finalidades diversas, como a restauração da saúde bucal, até as que abrangiam prevenir doenças e promover saúde. A falta de instrumentos, a estrutura inadequada, a comunicação deficitária e o vínculo, ou a falta dele, com os usuários foram apresentados como tensões no cotidiano das práticas de saúde. Podendo esses serem elementos que comprometem o processo de trabalho das equipes. Esta pesquisa construiu espaços de falas nos quais os integrantes das eSF puderam refletir sobre seu processo de trabalho a partir das suas próprias percepções, o que pode ter gerado incômodos aos sujeitos, e também contribuiu na desconstrução de formas de trabalho encontradas.

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ABSTRACT

Assuming that the work process is formed by objectives or purposes, object, means and conditions, agent or subject, this project aims to analyze the perception of professionals of the Family Health teams of Santa Cruz-RN about of the elements of your work process. This is a qualitative, descriptive and exploratory research, with 12 participants, half of the urban area and the others of the rural area. Given the elements presented and the discussions conducted with a view to elucidating the proposed objectives, it was noticed that the year of training of professionals covered the 2000 and 2010, most of professionals perform their work activities only in ABS, with the regime 40 hours per week, bound by public tender. From the transcriptions and analysis from the interviews four categories emerged: misunderstanding between objects, instruments and purposes; miscellaneous goals; everyday tensions; quality of the work process. These statements were analyzed following the guidelines of Critical Discourse Analysis. It was observed that many professionals did not know how to differentiate objects, instruments and objectives in their work process, as well as having different purposes, such as the restoration of oral health, including those that prevent disease and promote health. The lack of instruments, inadequate structure, poor communication and the link, or lack thereof, with users were presented as tensions in the daily practice of health practices. These may be elements that compromise the work process of teams. This research built spaces of speech in which the members of the health teams could reflect on their work process from their own perceptions, which may have caused discomfort to the subjects, and also contributed to the deconstruction of forms of work found.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 08

2 MÉTODOS ... 13

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 16

3.1 Incompreensão entre Objetos, Instrumentos e Finalidades ... 19

3.2 Objetivos Diversos ... 21

3.3 Tensões no Cotidiano ... 22

3.4 Qualidade do Processo de Trabalho ... 24

4 CONSIDERAÇÕES ... 30

REFERÊNCIAS ... 31

APÊNDICE A - INFORMAÇÕES PROFISSIONAIS ... 34

APÊNDICE B - INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS ... 35

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1 INTRODUÇÃO

A Atenção Básica à Saúde (ABS) é caracterizada por um “conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, a redução de danos e a manutenção da saúde” (BRASIL, 2012, p. 19), objetivando o desenvolvimento da atenção integral que “impacte na situação de saúde e autonomia das pessoas e nos determinantes e condicionantes de saúde das coletividades”.

A Saúde da Família é a estratégia prioritária da Política Nacional de Atenção Básica para expansão e consolidação da Atenção Básica (BRASIL, 2012). Uma equipe de Saúde da Família (eSF) é composta por médico generalista ou especialista em Saúde da Família ou médico de família e comunidade, enfermeiro generalista ou especialista em Saúde da Família, auxiliar ou técnico de enfermagem e Agentes Comunitários de Saúde (ACS), bem como pode ser complementada por profissionais de Saúde Bucal.

O processo de trabalho é um elemento de suma importância na ABS, pois constitui-se como fator que influencia na qualidade das relações entre profissionais-usuários-gestores e na formação/atuação das equipes. Há estudos que mostram como os processos de trabalho estão dispostos em suas diversas dimensões (ABRAHÃO, 2007; SANTANA et al., 2013; CORDEIRO; SOARES, 2015).

O trabalho “é o conjunto de procedimentos pelos quais os homens atuam, por intermédio dos meios de produção, sobre algum objeto para, transformando-o, obterem deter-minado produto que, pretensamente, tenha alguma utilidade”. O modo como são desenvolvidas as atividades profissionais, ou o próprio trabalho, é classificado como “processo de trabalho” (FARIA et al., 2009, p. 21).

No processo de trabalho, há a composição técnica do trabalho, formada pela razão entre o “trabalho vivo” e o “trabalho morto”. O “trabalho vivo” é o trabalho humano no momento em que é executado, determinando a produção do cuidado; enquanto o “trabalho morto” é formado pelos procedimentos e instrumentos (MERHY; FRANCO, 2003). Dessa forma, questiona-se: como definir a composição técnica do trabalho dos profissionais de Saúde da Família apreendendo os elementos que compõem os processos de trabalho?

Vários elementos integram o processo de trabalho, dentre eles: objetivos ou finalidades, objeto, meios e condições, agente ou sujeito (FARIA et al., 2009). A produção de saúde é considerada função e finalidade essencial quando se fala de trabalho em saúde (CAMPOS, 2000). Faria et al. (2009, p. 22) afirmam que “a finalidade rege todo o processo

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de trabalho, e é em função dessa finalidade que se estabelecem os critérios ou parâmetros de realização do processo de trabalho”.

Qualquer processo de trabalho realiza-se em algum objeto sobre o qual se exerce ação transformadora, com o uso de meios e em condições determinadas. Subjetividades, complexos sociais ou mesmo elementos simbólicos, físicos e biológicos, podem ser objetos nos diversos processos de trabalho em saúde (FARIA et al., 2009).

A produção da saúde dos usuários é o ponto primordial para a constituição do processo de trabalho dos profissionais. Essa se executa entre o trabalhador e o usuário, implicando que a matéria prima do trabalho em saúde é o encontro, nesse momento, ambos atuarão para possibilitar respostas positivas frente aos problemas de saúde (FARIA; ARAUJO, 2010).

Nesse aspecto, qual o objeto das equipes de Saúde da Família: a doença, a subjetividade, os comportamentos de risco ou os próprios usuários? Campos (2003) afirma que o objeto de intervenção e de estudo das práticas em Saúde Coletiva ou da Clínica é o adoecer, uma vez que ambas as áreas agem sobre a doença ou sobre a possibilida de de que ela aconteça.

Há a possibilidade da formação dos profissionais em equipes de referência, que Campos (2007, p. 400) descreve como sendo:

Composta por distintos especialistas e profissionais encarregados de intervir sobre um mesmo objeto – problema de saúde –, buscando atingir objetivos comuns e sendo responsáveis pela realização de um conjunto de tarefas, ainda que operando com diversos modos de intervenção.

Partindo desse rearranjo organizacional que objetiva o deslocamento do poder das profissões e corporações de especialistas e que reforça o poder da gestão da equipe interdisciplinar (CAMPOS, 2007), é questionável se todos os profissionais envolvidos atuam sobre o mesmo objeto e tem objetivos comuns.

Exemplificando os expostos anteriores, pode-se questionar se o dentista componente de uma eSF tem como objeto de trabalho o sujeito que possui uma demanda bucal ou apenas a boca dele? O objetivo do médico dessa mesma equipe é apenas a cura das patologias ou ele segue um modelo de prevenção de doenças e promoção da saúde? Todos os ACS’s atuam sobre as famílias e a comunidade?

Em trabalho realizado por Santos, Mishima e Merhy (2018), descrevendo a organização do processo de trabalho que atenda constantemente ao princípio da integralidade, a questão das necessidades de saúde é sempre posicionada como objeto do trabalho. A

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compreensão disso pelos profissionais de saúde colabora para o desenvolvimento de práticas que vão além da intervenção nos corpos biológicos.

O modelo de Clínica Ampliada, Campos (2003, p. 64), discutindo sobre o objeto da “Clínica do Sujeito” afirma que esse “inclui a doença, o contexto e o próprio sujeito”. Questiona-se que Clínica é essa que se configura dentro dos dispositivos de ABS, seria a Clínica Oficial (a Clínica clínica), a Clínica Degradada ou a Clínica Ampliada?

A Clínica Oficial funciona como um sistema de referência, podendo exercer bastante influência sobre a materialidade das coisas e dos fenômenos. O degradado da Clínica Degradada abrange os limites externos impostos à potência da Clínica. Essa busca reconhecer que contextos socioeconômicos particulares podem desempenhar alguma determinação tão absoluta sobre a prática clínica, diminuindo sua potencialidade para resolver problemas de saúde (CAMPOS, 2003).

Inserido no campo da Clínica Ampliada há o Projeto Terapêutico Singular (PTS), que é “um conjunto de propostas de condutas terapêuticas articuladas, para um sujeito individual ou coletivo, resultado da discussão coletiva de uma equipe interdisciplinar, com apoio matricial se necessário” (BRASIL, 2007, p. 40). Ele funciona como um modelo de gestão da atenção e como um recurso utilizado para atuação das equipes de referência.

Suplementos técnicos e equipamentos, edificações das unidades de saúde e outros equipamentos sociais são considerados os meios e as condições para que os objetivos na ABS sejam atingidos (FARIA et al., 2009). Os referidos meios são os mesmos para todos os profissionais independentemente de sua formação? Existe um campo comum de atuação desses profissionais?

Pressupõe-se que os agentes do processo de trabalho em saúde são os profissionais que compõem a equipe multiprofissional e atuam de forma interdisciplinar. Campos (2003, p. 70) destaca que “o papel do profissional de saúde é agir sobre o outro que se põe sob nosso cuidado, mas é também ajudar os outros a se ajudarem”, com isso “o outro” representa o usuário e ele estaria atuando também como agente do processo.

Porém, se as equipes de referências utilizam a retaguarda especializada e o suporte técnico-pedagógico denominado de apoio matricial (CAMPOS, 2007), elas também podem ser consideradas agentes na arte de produzir saúde? Os sujeitos que representam a gestão dos serviços e das redes, são visualizados pelos integrantes das eSF como agentes? E no caso dos usuários, em que posição estão?

O trabalho, na saúde pública, além de poder evidenciar o confronto das diferentes lógicas de produção de serviços, bens, modos de subjetivação e de organização social; surge como uma zona estratégica para mudanças (MORSCHEL; BARROS, 2014).

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Observa-se que para esses arranjos organizacionais como Clínica Ampliada, equipes de referência, projeto terapêutico singular e apoio matricial fluírem, é necessário que os profissionais envolvidos possuam objetos e objetivos comuns e que trilhem caminhos semelhantes levando à mesma chegada, à produção de saúde e o fortalecimento da autonomia dos usuários através de um trabalho integrado.

As problematizações desse projeto emergiram com base nas vivências na ABS, durante o período de atuação na Residência Multiprofissional em Assistência Materno-infantil, na qual foi perceptível que os papeis dos profissionais não apresentavam uniformidade e que algumas formas de atuar tinham sentidos opostos, ou seja, os elementos do processo de trabalho das equipes divergiam.

As indagações emergidas levaram a uma busca nas principais plataformas de pesquisa de artigos científicos: SciELO, plataforma CAFe e Google Acadêmico. Nessa procura por estudos semelhantes com o referencial teórico proposto, apenas a pesquisa de Jacondino et al. (2019) foi encontrada, esta objetivou conhecer o entendimento dos enfermeiros de um hospital sobre os elementos do seu processo de trabalho.

Acerca dos resultados da pesquisa citada anteriormente, foi possível observar que o objeto de trabalho foi composto pelo sujeito em adoecimento e sua família, demonstrando uma perspectiva ampliada. Houve dificuldades dos enfermeiros em determinar a finalidade do trabalho. Acerca dos instrumentos do processo de trabalho, foi detectada uma variedade que abrange ferramentas gerenciais, educacionais e metodológicas, assim como o corpo do trabalhador (JACONDINO et al., 2019).

Observou-se, ainda, a pouca quantidade de trabalhos que propiciassem a escuta dos profissionais das eSF’s abrangendo todas as categorias dispostas nos serviços e o compartilhamento de percepções acerca de como é construído e como está disposto o seu trabalho.

Considerando a formação dos componentes dos processos de trabalho, o presente estudo poderá resultar em atividades de educação permanente, na emergência de uma leitura crítica da realidade por parte dos profissionais, no desenvolvimento de novas [inter]ações entre os atores envolvidos no ato de produzir saúde e na descoberta de como estão organizadas as práticas das equipes eSF’s.

Com um olhar sensível é possível que se observe como os processos de trabalho estão constituídos nas eSF’s, porém, isso não é suficiente, é necessário acrescentar uma escuta que envolve a compreensão dos profissionais sobre os métodos que são inerentes de sua atuação.

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Somando escutas e olhares como pesquisador, pode-se conhecer quais elementos estão sendo utilizados por cada profissional, pelas equipes e, possivelmente, enxergar a cronicidade dos serviços e das atitudes profissionais, sendo necessário também materializar outros modos de construir saúde, metodologias novas para o seu funcionamento (MORSCHEL; BARROS, 2014).

Parte-se do conceito de percepção como uma interpretação, apreensão da realidade a partir da linguagem dos sujeitos, tendo em vista que toda percepção é um movimento de criação (EL-HANI; PEREIRA, 2001).

Este trabalho tem como questão norteadora: qual a percepção dos profissionais das equipes de Saúde da Família do município de Santa Cruz-RN acerca dos elementos do seu processo de trabalho?

Portanto, tendo em vista que o processo de trabalho é formado por agentes, meios e instrumentos, objeto e finalidade, objetiva-se analisar a percepção dos profissionais das equipes de Saúde da Família do município de Santa Cruz-RN acerca dos elementos do seu processo de trabalho.

Como objetivos específicos, o estudo visa: identificar como as eSF’s estão organizadas no seu processo de trabalho; e descrever os elementos do processo de trabalho na rotina do seu local de atuação conforme os profissionais das eSF’s.

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2 MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória. Acerca da pesquisa qualitativa, Flick (2009, p. 20) afirma que ela “é de particular relevância ao estudo das relações sociais devido à pluralização das esferas da vida”. Marconi e Lakatos (2010, p. 272) ressaltam que, nesse método, “o pesquisador entra em contato direto com o indivíduo ou grupos humanos, com o ambiente e a situação que está sendo investigada, permitindo contato direto com os informantes”.

A ABS do município de Santa Cruz é composta 12 equipes de Saúde da Família cadastradas, dez atuando na zona urbana e duas na zona rural, sendo complementada pelo Núcleo de Apoio à Saúde da Família Tipo 1. Há ainda equipes de Saúde Bucal Modalidade I (DEPARTAMENTO DE ATENÇÃO BÁSICA, 2017).

A coleta de dados ocorreu por meio de entrevistas semiestruturadas, as quais foram gravadas e, posteriormente, transcritas para análise. Elas foram realizadas no próprio local de atuação dos profissionais, em horários que não comprometeram a rotina das equipes e em salas que privilegiavam a acústica silenciosa e sem interrupções. Caso o participante não concordasse com a gravação, o pesquisador realizaria anotações durante a entrevista, com vistas a registrar as respostas e observações necessárias, o que não ocorreu.

Foram incluídas na pesquisa duas eSF’s que possuíam equipe de Saúde Bucal, uma disposta na zona rural e uma na zona urbana do município de Santa Cruz. A seleção das equipes da zona urbana e rural foi realizada de forma aleatória, por sorteio da equipe, após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa, com parecer nº 3.265.073 e CAAE: 10646319.2.0000.5568.

Destaca-se o interesse em abranger profissionais que atuem em cenários diversos, tendo em vista a possível existência de realidades socioeconômicas distintas, diferentes desafios vivenciados pelos profissionais e práticas assistenciais diversas.

Diante do quadro exposto, o quantitativo amostral foi de 12 participantes, de cada equipe foi selecionado um profissional de cada categoria: enfermeiro, técnico de enfermagem, agente de saúde, médico, cirurgião dentista, auxiliar de saúde bucal. Para as categorias profissionais que contaram com mais de um profissional na mesma equipe, foi selecionado apenas um, por sorteio. Sendo a amostragem do tipo não probabilística e intencional.

Justifica-se esse quantitativo de sujeitos participantes a partir de pesquisa de Jacondino et al. (2019), que identificou o entendimento de 14 enfermeiros sobre os elementos do seu processo, trabalho esse que mais se aproximou com o referencial teórico proposto.

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Os profissionais que compõem as equipes e que eventualmente no período da coleta estivessem de licença, afastamento ou férias com duração superior a 30 dias seriam automaticamente excluídos da pesquisa. Nesse caso, em sendo esse profissional o único de sua categoria na equipe, seria sorteada uma nova equipe de ESF para a aplicação das entrevistas. Contudo, não houve profissionais nessa situação.

Para a organização do discurso foram formadas categorias a partir das narrativas coletadas durante as entrevistas, estas foram construídas pelas características significativas identificadas pelo pesquisador (MARCONI; LAKATOS, 2011). As categorias que emergiram foram: incompreensão entre objetos, instrumentos e finalidades; objetivos diversos; tensões no cotidiano; qualidade do processo de trabalho.

Para análise dos dados utilizou-se a Análise de Discurso Crítica (ADC) como forma de análise dos dados empíricos. Resende e Ramalho (2006, p. 14) descrevem que a ADC “[...] é, por princípio, uma abordagem transdisciplinar. Isso significa que não somente aplica outras teorias como também, por meio do rompimento de fronteiras epistemológicas, operacionaliza e transforma as teorias em favor da abordagem sócio-discursiva”.

A ADC abrange estudos de textos e eventos em diversas práticas sociais, elaborando um método e uma teoria para descrever, interpretar e explicar a linguagem na conjuntura sociohistórica, enxergando-a como uma prática social (MAGALHÃES, 2005).

Fairclough (2012, p. 311-312), descrevendo a estrutura analítica da ADC, mostra que ela foi “modelada com base no conceito de apreciação crítica exploratória do teórico crítico de Roy Bhaskar” e abrange as seguintes etapas, “1. Dar ênfase em um problema social que tenha aspecto semiótico; 2. Identificar os obstáculos para que esse problema seja resolvido; 3. Considerar se a ordem social (a rede de práticas) em algum sentido é problema ou não; 4. Identificar maneiras possíveis para superar os obstáculos; 5. Refletir criticamente sobre a análise”.

Todo material organizado foi discutido conforme as referências pertinentes na área, com vias a alcançar os objetivos propostos, a exemplo Shimizu e Cavalcante Junior (2012) e Feuerweker (2014). Ressalta-se que para a análise da categoria “qualidade do processo de trabalho”, as narrativas foram divididas por equipe, tendo em vista dos conteúdos serem referentes às especificidades existentes dos profissionais de cada equipe.

Os aspectos éticos foram preservados em cumprimento à RESOLUÇÃO Nº 466, de 12 de dezembro de 2012, bem como a RESOLUÇÃO Nº510/2016, assim, como a coleta de dados só teve início quando o presente projeto foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/ Faculdade de Ciências da Saúde do TrairI (FACISA).

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Os participantes da pesquisa foram esclarecidos da participação por meio da leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A coleta de informações só foi iniciada após a assinatura desse termo em duas vias.

A previsão de riscos durante a aplicação do instrumento incluiu a possibilidade de constrangimento, estresse ou desconforto físico ou emocional, que seriam minimizados pela interrupção da coleta de informações, sendo agendado outro momento para continuidade, ou mesmo esclarecendo novamente que o participante poderia desistir a qualquer momento de participar da pesquisa, como também o participante se recusaria a responder alguma pergunta, sendo respeitada a sua vontade e sem trazer nenhum prejuízo ao participante da pesquisa.

Acrescentou-se o risco de quebra de sigilo e anonimato, que foram minimizados pela manipulação das informações colhidas em ambiente reservado, comprometimento de toda a equipe em não divulgar quaisquer informações sobre os envolvidos e a aplicação da entrevista em local privativo.

Os benefícios da pesquisa abrangeram a possibilidade de discorrer sobre o seu processo de trabalho, a apresentação dos resultados às equipes de saúde envolvidas na coleta e, a partir desses a possibilidade de educação permanente e probabilidade de repensar o processo de trabalho para melhorá-lo.

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3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados aqui apresentados servirão como subsídios para discutirmos o processo de trabalho, seus elementos, as tensões existentes e a qualidade desse, tendo em vista que os padrões assistenciais se desenham, são manifestados e tomam formas nos microespaços e no dia-a-dia do trabalho. Eles se expressam por um conjugado de processos de trabalho, de serviços de saúde e posicionam-se numa conjuntura social-econômica-cultural-histórica (REIS et al., 2007).

O início das entrevistas com os doze profissionais membros das eSF deu-se com o questionário (APÊNDICE A) acerca das informações profissionais, posteriormente eram realizadas as perguntas sobre o processo de trabalho (APÊNDICE B). Os questionamentos iniciais envolviam o ano/instituição de formação, os cursos após a formação, o tempo e as experiências na área da saúde, o vínculo empregatício atual e se há mais de um, a participação em palestras ou congressos, o acompanhamento das conferências de saúde e se consideravam suficiente ou insuficiente a quantidade de profissionais da equipe para atender a demanda.

O ano de formação dos profissionais abrangeu a década de 2000 e de 2010, apenas um profissional teve formação na década de 90. Quatro integrantes da pesquisa afirmaram não possuir cursos ou especialização, os demais relataram a participação e foi observado que abrangiam áreas específicas, como ortodontia, autoria em sistema de saúde, urgência e emergência, dependência química.

Referente ao tempo de trabalho em saúde, observou-se panoramas diversos. Cinco profissionais estão atuam no período de 0 a 5 anos, três profissionais encontram-se atuando entre 5 a 10 anos e os outros quatro atuam a mais de dez anos nesse cenário, inclusive, dois participantes informaram que estão há vinte e dois anos prestando serviço na saúde.

As experiências citadas por todos os integrantes da pesquisa foram relacionadas à ABS, eles demonstraram que suas maiores vivências são nessa área. Alguns acrescentaram experiências na atenção secundária e terciária, atuando em “Unidades de Pronto-atendimento; pronto-socorro; hospitais”. Ressalta-se que dois profissionais citaram que além de já atuarem na ABS, trabalharam em clínicas particulares.

Com relação ao vínculo empregatício (concursado ou contratado) e a quantidade de horas de trabalho semanal, com exceção de um profissional que relatou ter contrato de 24 horas/semana, todos estão com 40 horas semanais. Observou-se que a maioria (nove) estão vinculados mediante concurso público, apenas três estão ligados ao município através de contrato.

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Acerca de mais de um vínculo empregatício, quatro profissionais atuam também em outro local, três realizam atividades laborais ainda na área da saúde e um complementa sua renda em um trabalho particular. O restante afirmou não ter outro vínculo.

Ao serem questionados sobre a sua participação em congressos ou palestras as respostas variaram entre “sim”, “raramente” e “não”. Um participante afirmou que suas participações nesses eventos ocorrem mediante disponibilização da FACISA, campus da Universidade Federal do Rio Grande que está localizada no interior do estado, mostrando a importância desta instituição diante da oferta de momentos de produção de conhecimentos.

Feuerwerker (2014) mostra que universidade é um espaço mais legítimo de produção da Ciência Oficial, influenciando nas formas de produzir conhecimento, na legitimação e deslegitmação de outros saberes, na ambição da verdade, na rendição e dependência como tônica na produção da relação com o outro, na afinidade com o sistema médico-industrial.

Um profissional afirmou que o município e a gestão não proporcionam momentos de capacitação ou que abranjam a educação permanente. Contudo, a portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017 mostra que é responsabilidade comum a todas as esferas de governo “desenvolver mecanismos técnicos e estratégias organizacionais de qualificação da força de trabalho para gestão e atenção à saúde, estimular e viabilizar a formação, educação permanente e continuada dos profissionais”.

Desta forma, o governo federal, estadual e municipal deveriam ofertar educação permanente, qualificando a assistência prestada pelos profissionais e construindo espaços nos quais as temáticas que envolvessem a ABS pudessem ser trabalhadas, como por exemplo o processo de trabalho em saúde.

O acompanhamento das conferências foi abordado, diante dessa temática oito profissionais informaram não acompanharem, três mostraram que coletam informações sobre seu andamento e um afirmou que participa ativamente de todos os momentos que envolvem as conferências. Questiona-se que formações são essas que não estão ou são atravessadas pelo controle social? Princípio organizativo do SUS. Acerca disso, Ceccim e Feuerwerker (2004, p. 42) mostram que:

A formação dos profissionais de saúde tem permanecido alheia à organização da gestão setorial e ao debate crítico sobre os sistemas de estruturação do cuidado, mostrando-se absolutamente impermeável ao controle social sobre o setor, fundante do modelo oficial de saúde brasileiro.

Quando perguntados sobre a quantidade de profissionais de sua equipe e se esse número é suficiente ou não par atender a demanda, é necessário mostrar as respostas divididas por equipes, tendo em vista de se tratar de uma pergunta direcionada ao seu grupo de trabalho.

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Todos os integrantes da equipe da zona urbana selecionada (mediante sorteio) responderam que o quantitativo de profissionais é insuficiente, alguns sugeriram a construção de outra unidade de saúde, pois a UBS na qual eles atuavam já dispunham de duas equipes de Saúde da Família, outros informaram que o grupo necessitava de mais ACS. Com relação a essa possibilidade de aumento das equipes, observa-se que é recomendado na Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017:

População adscrita por equipe de Atenção Básica (eAB) e de Saúde da Família (eSF) de 2.000 a 3.500 pessoas, localizada dentro do seu território, garantindo os princípios e diretrizes da Atenção Básica.

Além dessa faixa populacional, podem existir outros arranjos de adscrição, conforme vulnerabilidades, riscos e dinâmica comunitária, facultando aos gestores locais, conjuntamente com as equipes que atuam na Atenção Básica e Conselho Municipal ou Local de Saúde, a possibilidade de definir outro parâmetro populacional de responsabilidade da equipe, podendo ser maior ou menor do que o parâmetro recomendado, de acordo com as especificidades do território, assegurando-se a qualidade do cuidado (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017).

Observa-se que é possível a criação de novas eSF, desde que atendam ao quantitativo de população adscrita, como também é possível que esses arranjos sejam modificados, como por exemplo, a diminuição do quantitativo populacional de responsabilidade da equipe devido à grande extensão territorial.

Dos profissionais da equipe da zona rural, quatro demonstraram que o quantitativo existente é suficiente para suprir as demandas de saúde, os outros dois afirmara que o quadro é insuficiente, sendo necessário, inclusive, a criação de uma terceira equipe para dar um suporte maior à população.

Na mesma Portaria citada, recomenda-se “ii) - 4 (quatro) equipes por UBS (Atenção Básica ou Saúde da Família), para que possam atingir seu potencial resolutivo”, ou seja, é possível a criação de outra eSF ou eAB, aumentando a qualidade do cuidado.

Optou-se por não descrever a categoria profissional ou o nome dos profissionais neste material, tendo em vista da pesquisa ter sido realizada em um município de pequeno porte e existir a possibilidade dos participantes serem identificados facilmente. Dessa forma, colocou-se abreviaturas de profissionais (p) que vai do 1 ao 12, sendo os seis primeiros de uma equipe e os seis últimos da outra, em uma sequência aleatória.

Reitera-se que a construção das categorias foi realizada adotando das etapas da ADC, citadas anteriormente, enfatizando os problemas sociais, identificando obstáculos para resolução dos problemas, considerando a ordem social como empecilho ou não, identificando formas de superação dos obstáculos e tecendo reflexões críticas sobre a análise.

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Assim, a partir das transcrições e análises das entrevistas emergiram quatro categorias: incompreensão entre objetos, instrumentos e finalidades; objetivos diversos; tensões no cotidiano; qualidade do processo de trabalho.

3.1 Incompreensão entre Objetos, Instrumentos e Finalidades

Observou-se que um grande quantitativo de profissionais não soube distinguir diferenças entre os objetos, os instrumentos e os objetivos do seu processo de trabalho, alguns, inclusive, afirmaram não saber responder pois não tinham conhecimento do que se tratava.

Quando questionado sobre o objeto de trabalho, o p1 respondeu que “utilizo a sala, papeis para encaminhamento, mesa, instrumentos para avaliar, estetoscópio”. O p9 também respondeu de forma semelhante, “tensiômetro, termômetro, balança, fichas de procedimento, cartão SUS [....]”, confundindo objetos com instrumentos.

Essas seriam as tecnologias, Merhy e Franco ([2--?]) mostram que todo trabalho é mediado por elas e estar sujeito a maneira como elas se manifestam no processo de trabalho, podendo ter processos mais criativos, focados nas relações, ou processos onde prevalece a valorização dos instrumentos duros, como as máquinas. Porém, elas foram descritas como objetos.

Dentro de uma mesma resposta acerca do objeto de trabalho, além do tablet, o p9 citou “o pouco conhecimento que a gente leva [...] E a principal forma de trabalhar da gente é levando informação para a comunidade, levando informação em saúde, levando informação de como funciona o processo de trabalho da unidade, trazendo informações da comunidade para a unidade para a gente intervir em algumas questões”.

Mesmo ele não classificando como ferramentas, pode-se dizer que esse trabalhador estaria carregando consigo três caixas de ferramentas, demonstrando suas “ferramentas-máquinas”, seus “conhecimentos e saberes tecnológicos” e suas “relações com todos os outros”, conforme mostram Merhy e Franco ([2--?], p. 280).

Outra entrevistada, afirmou que seus objetos de trabalho eram “prontuários, muitas fichas, receituário, solicitação de exames, estetoscópio” (p9). Isso vai de encontro com o que afirma Faria et al. (2009), pois eles mostram que os objetos do processo de trabalho seriam os elementos biológicos, físicos ou simbólicos, assim como subjetividades ou complexos sociais. Algumas respostas falavam mais de uma possível finalidade de atuações do que propriamente do objeto, como “facilitar o acesso da comunidade na ABS, incluindo as demandas de acordo com o perfil de cada pessoa, fazendo pré-natal, encaminhamento

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[...]levar informação” (p9), outra fala também abrangeu isso, “promover saúde, fazer o trabalho de prevenção [...]” (p8). Acerca das finalidades do processo de trabalho, discutirá posteriormente, na categoria “objetivos diversos”.

Ressalta-se que após as quatro primeiras perguntas sobre o processo de trabalho que abrangiam objetos, instrumentos, agentes e objetivos, foi realizada uma explicação sobre esses componentes e alguns participantes retomaram e refletiram sobre as respostas já dadas. Uma delas foi acerca do objeto de trabalho, antes respondido a partir dos seus instrumentos físicos, após a explicação a entrevistada afirmou que seus objetos de trabalho seriam “meus pacientes” (p10).

Faria et al. (2009) afirmam que os usuários, nesse caso seriam os pacientes citados acima, podem ser considerados objetos do processo de trabalho, mas também seriam agentes, ou seja, o objeto da ação também age. Sobre os agentes, a maioria das respostas abrangiam os profissionais da equipe mínima, as gerentes das unidades, os auxiliares de serviços gerais, apenas uma entrevistada considerou a comunidade como agente do seu processo.

Feuerweker (2014, p. 38) descreve que um encontro no processo de trabalho em saúde, um encontro entre o “agente produtor (com suas ferramentas - conhecimentos, equipamentos - e concepções) e do agente consumidor (com suas intencionalidades, conhecimentos e concepções)”. A autora coloca o agente consumidor como objeto daquele ato produtivo e também agente ativo, interferindo no processo.

Partindo do pensamento de que “o ‘trabalho em saúde’ deve pautar-se pelo ‘referente simbólico’: ato de cuidar da vida, em geral, e do outro, como se isso fosse de fato a alma da produção da saúde”, Merhy e Franco ([2--?], p. 281, 282) mostram que se deve “tomar como seu objeto central o mundo das necessidades de saúde dos usuários individuais e coletivos, expressos como demandas pelas ações de cuidado”.

Reis et al. (2007) afirmam que como objeto de trabalho é possível adotar a família, o corpo biológico, o sujeito em sua condição de existência, etc. Os autores complementam que é a partir do que se toma como objeto que as práticas são desenvolvidas. Já Feuerweker (2014, p. 41) coloca que:

No campo da saúde o objeto é a produção do cuidado, por meio da qual se espera atingir a cura e a saúde, que são, de fato, os objetivos esperados. Entretanto, a vida real dos serviços de saúde tem mostrado que, conforme os modelos de atenção adotados, nem sempre a produção do cuidado está efetivamente comprometida com a cura e a promoção.

Então, que práticas estão sendo alimentadas pela não adoção dos sujeitos como objetos e agentes do processo de trabalho dos profissionais das equipes? Essas atuações, estão tendo como elemento central o sujeito e sua possibilidade de adoecer ou as tecnologias?

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3.2 Objetivos Diversos

Questionados sobre quais eram os objetivos ou as finalidades do seu trabalho, muitas respostas surgiram, desde as voltadas mais para o seu campo específico de atuação, como a restauração da saúde bucal, até as que abrangiam prevenir doenças e promover saúde. Ressalta-se que essa questão também gerou dúvidas, demonstrando a possibilidade de que as finalidades não são um elemento claro no processo de trabalho das equipes.

Uma das atribuições comuns a todos os profissionais da ABS, segundo a Portaria nº 2.436 (BRASIL, 2017), é “Garantir a atenção à saúde da população adscrita, buscando a integralidade por meio da realização de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, prevenção de doenças e agravos”, isso foi observado em alguns objetivos dos integrantes da equipe, p4 respondendo que a finalidade do seu trabalho era “promover saúde, não só prevenir [...]”, já p8 referiu “promover a qualidade de vida”, “promover saúde e prevenir doenças”.

Outra finalidade do trabalho surgida foi a citada por p9, de “Intervir junto à determinados grupos, grupo materno-infantil, pacientes com “tb” [lê-se tuberculose], pacientes diabéticos, portadores de câncer”. Isso vai ao encontro com outra atribuição comum a todos os profissionais, que mostra a necessidade de “responsabilizar-se pelo acompanhamento da população adscrita ao longo do tempo no que se refere às múltiplas situações de doenças e agravos, e às necessidades de cuidados preventivos, permitindo a longitudinalidade do cuidado” (BRASIL, 2017).

Dessa forma, também está presente a intervenção com grupos específicos, caberia em outro momento o aprofundamento dessa forma de atuar, buscando saber se é algo direcionado apenas à recuperação da saúde dos sujeitos ou ao cuidado longitudinal, tendo em vista que também foi citado o grupo “materno-infantil”.

Um dos objetivos emergidos na pesquisa envolveu suporte, tratamento de doença e acolhimento: “levar saúde para as pessoas, as vezes levar suporte, apoio, não é nem tanto de tratar a doença, às vezes a gente dá até uma de psicólogo com as pessoas, acho que seria isso, dar suporte e também tratar doença que faz parte da minha profissão” (p10).

Nessa fala está presente o acolher e o construir vínculo com o usuário, que seria uma das atribuições comuns a todos os profissionais, “participar do acolhimento dos usuários, proporcionando atendimento humanizado, realizando classificação de risco, identificando as necessidades de intervenções de cuidado, responsabilizando- se pela continuidade da atenção e viabilizando o estabelecimento do vínculo” (BRASIL, 2017).

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Observou-se que uma resposta sobre os objetivos esteve direcionada às finalidades específicas da categoria profissional, falando em “ajudar as pessoas na orientação de saúde bucal” (p11). Isso diz da atribuição específica, descrita por “realizar a atenção em saúde bucal (promoção e proteção da saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, acompanhamento, reabilitação e manutenção da saúde) [...]” (BRASIL, 2017).

Outras envolviam tanto finalidades próprias da profissão como as da equipe “Cuidar da saúde bucal das pessoas no primeiro momento, atender as necessidades bucal desses indivíduos, tanto no ponto de vista curativo como preventivo. Não apenas olhar para a boca, mas para o indivíduo como um todo” (p3), “restaurar a saúde bucal e incentivar a promoção de saúde, promover a saúde e restaurar aquilo que já foi prejudicado” (p12).

Pavoni e Medeiros (2009, p. 270) mostram a necessidade de “construir consensos quanto aos objetivos e resultados a serem alcançados pelo conjunto de profissionais, bem como quanto à maneira mais adequada de atingi-los”, visando a integração do trabalho em equipe, na qual significa conectar diferentes processos de trabalho, valorizando a produção do cuidado e conhecendo o trabalho do outro.

“O enfermeiro executa a atividade, o médico faz outro totalmente diferente, podem até estar todos certos, mas tomam um caminho diferente que não trabalham em equipe. Os técnicos também vão para o outro lado, então hoje em dia não existe um efetivo trabalho em equipe, não existe um processo de trabalho, uma rotina. A única rotina é a de cronograma, mas trabalhar em parceria, unido, desenvolvendo um objetivo comum não existe (p5).

Com essa fala, observou-se que há uma oposição entre o que é o necessário aos objetivos dos profissionais para a estruturação do processo de trabalho com a forma na qual está disposta essa equipe, não havendo um objetivo comum, de acordo com a percepção mencionada.

Merhy e Franco ([2--?], p. 282) advogam que a finalidade “para as práticas de saúde é a de visar à produção social da vida e defendê-la”, questiona-se que vida[s] está sendo produzida com os objetivos descritos nessa pesquisa e o que os profissionais de saúde estão defendendo? Estão cumprindo adequadamente as finalidades obrigatórias dispostas nas legislações oficiais da ASB?

3.3 Tensões no Cotidiano

Duas perguntas abordadas nas entrevistas abrangiam a percepção dos profissionais acerca dos elementos do processo de trabalho e da qualidade deste. As respostas

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demonstraram que existem tensões no cotidiano das práticas de saúde, que envolvem a falta de instrumentos, a comunicação deficitária e o vínculo, ou a falta dele, com os usuários.

Alguns entrevistados demostraram a escassez de materiais que deveriam estar presentes na sua atuação, como p1, relatando que “tem um equipamento auricular que eu preciso para fazer avaliação dos pacientes, mas eu não tenho porque não achei interessante fazer este investimento e a prefeitura não disponibiliza”. Ele finaliza essa fala afirmando que “essas coisas que podem melhorar, o município dar os recursos que a gente precisa”.

A estrutura da unidade de saúde também foi uma dificuldade apresentada por um profissional, demonstrou que “se a gente tivesse uma estrutura, uma unidade de saúde, ainda seria melhor o atendimento” (p7). Segundo ele, alguns procedimentos ficam impedidos de serem executados devido essa limitação na estruturada, como o exame preventivo.

Outros instrumentos trazidos pelos profissionais como gerador de tensão no processo de trabalho devido sua falta foram os insumos básicos, como medicamentos e materiais de curativo. Uma entrevistada afirmou que “nós temos certas dificuldades em relação a esses elementos, tipo chega um medicamento e acaba muito rápido, a gente tem material de curativo e é insuficiente” (p9).

Em outra fala essa tensão gerada pela escassez de materiais também esteve presente, “O que a gente sofre um pouco é com relação a material, que nem sempre a gente tem material suficiente para realizar nosso trabalho, o que dificulta nossa atuação. Seria justamente em relação à aquisição de tensiômetro, faz semanas que a gente solicitou e é b em complicado ficar sem, às vezes falta vacina. Minha sala não tem nenhum banquinho para a pessoa subir na maca, gestante com barrigão[...] às vezes faltam muitos medicamentos, tem vezes que está cheio, mas também falta bastante” (p10).

Observou-se que as dificuldades e as limitações no trabalho dos profissionais foram questões que surgiram espontaneamente, sem serem abordadas diretamente. Tentando contornar essa situação, surge a necessidade da criação de espaço de qualificação profissional, partindo das problematizações do próprio processo de trabalho, tendo como objetivo a transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho (CECCIM; FEUERWERKER, 2004).

A comunicação e a interação entre os profissionais foram comumente citadas como algo que é deficitário. O p5 demonstrou que “não existe aquela interprofissionalidade”, já p2 informou que “às vezes falta interação entre um e outro que compromete o resultado final do nosso trabalho”, os dois são integrantes da mesma eSF.

Essa tensão foi colocada como algo que “compromete um pouco o processo de trabalho”, de acordo com p2, ele complementa sua percepção afirmando que “às vezes a

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gente recebe a informação em tempo que não é mais hábil, a gente depende da informação para levar para os usuários, ela já chega de forma tardia, compromete a qualidade do serviço”.

O diálogo entre a equipe foi algo visto como um elemento primordial para satisfazer as necessidades dos usuários, como afirmou p3 “eu acho que o que falta entre a equipe de saúde bucal, a equipe médica e os agentes é a comunicação, em relação a como proceder a determinadas demandas, suprir as dúvidas das pessoas”.

Em trabalho realizado por Shimizu e Cavalcante Junior (2012, p. 2412), constatou-se semelhanças com os achados desta pesquisa citados nessa categoria:

As relações socioprofissionais nas equipes da ESF apresentam-se como a situação mais grave no contexto do trabalho. Há dificuldades na comunicação entre chefia e subordinados, falta integração no ambiente de trabalho, a comunicação entre os funcionários é frequentemente insatisfatória, bem como ocorre falta de apoio das chefias para o desenvolvimento profissional.

Uma possibilidade para transformar esse nó em laço foi citada por p3, abrangeria a criação de “reuniões, através de debates, rodas de conversas [...], um encontro vai ser só de planejamento, vou sentar com os agentes e ver qual a micro área que tem a maior demanda, quais são os principais problemas desta micro área”.

O vínculo entre usuários e profissionais, foi colocado algumas vezes como algo que precisaria ser melhorado, apesar da realidade, como expôs p8, “a zona rural tem suas particularidades, a gente não tem aquele vínculo direto, todos os dias, todos os dias no mesmo lugar, então pode haver uma quebra nesse processo”. Acerca desse vínculo, Feuerweker (2014, p.50) compreende como uma relação de confiança, na qual

há uma expectativa de ser cuidado, de poder contar com trabalhador/equipe que o conheça ou venha a conhecer, que o escute, que se interesse, que o informe, que ajude a diminuir seu sofrimento, que tenha disposição e ferramentas para vincular-se e responsabilizar-se, juntamente com ele (usuário), pela construção de um plano de cuidados.

Dessa forma, é necessária a construção de vínculos mais fortes, produzindo uma dimensão cuidadora no trabalho por parte dos profissionais e também dos usuários, na qual as relações de confiança entre os agentes do processo de trabalho seriam alicerces para a existência deste.

3.4 Qualidade do Processo de Trabalho

Após as perguntas envolvendo as percepções dos elementos do processo de trabalho, a qualidade desse e a possibilidade de melhorá-lo, emergiu a categoria que será discutida

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adiante. Optou-se por dividir as falas dos profissionais por equipes, tendo em vista de tratar-se de respostas que dizem respeito às particularidades dos grupos.

Ressalta-se que o questionamento “Qual sua percepção acerca da qualidade do seu processo de trabalho e como melhorá-lo?” foi o único que não gerou dúvidas nos entrevistados. Com isso, interpreta-se que eles conseguem perceber o processo de trabalho de forma macro, descrevendo sua qualidade a partir da ligação ou não dos elementos, como a falta dos instrumentos, a necessidade de educação em saúde, ou mesmo a ausência da interprofissionalidade.

Observou-se que na equipe da zona urbana todos os profissionais percebiam o seu processo de trabalho como bom ou razoável, porém, com uma enorme necessidade de melhorá-lo, como citou p2 “Razoável, poderia ser melhor, mas depende de instrumentos, depende de uma conjuntura”.

Outro entrevistado descreveu que supera as faltas do cotidiano e faz o que pode, descrevendo a qualidade do seu processo de trabalho como “boa, dá pra gente trabalhar, mesmo sabendo que às vezes falta algumas coisas. Eu tento fazer o que posso com o que tenho” (p1).

Entre essas carências um profissional descreveu a interação entre os membros da equipe como um elemento a ser melhorado no seu processo de trabalho, afirma ele que “às vezes falta interação entre um e outro que compromete o resultado final do nosso trabalho” (p2).

Semelhante a isso, a intercomunicação foi citada como algo a ser melhorado, com isso atividades como as de educação em saúde seriam realizadas, como afirmou p3 “a gente peca um pouco em não fazer educação em saúde e pra fazer educação em saúde é necessário eu intercomunicar com as pessoas que eu trabalho”.

Pode-se interpretar essa interação e intercomunicação dos profissionais da equipe como alicerces para a integralidade do trabalho, sobre esse Ceccim e Feuerwerker (2004) mostram que “a integralidade da atenção envolve a compreensão da noção de ampliação da clínica, o conhecimento sobre a realidade, o trabalho em equipe multiprofissional e transdisciplinar e a ação intersetorial”.

Dessa forma, questiona-se: como construir um trabalho integrado, ampliando o conhecimento sobre a realidade se não há comunicação entre a equipe ou se não existem momentos em que os profissionais interagem e discutem seus objetos e objetivos do trabalho? É possível que a valorização da integralidade na prática profissional origine vivências que tragam satisfação ou angústia, dependendo das dificuldades ou facilidades descobertas no dia-a-dia das diversas experiências (LIMA et al., 2012). Esse princípio foi

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abordado como falta, que precisaria ser preenchida para produzir a melhoria da qualidade assistencial.

Infere-se que se a comunicação entre a equipe está comprometida, como estaria a comunicação intersetorial? Ou mesmo da eSF com os outros níveis de atenção à saúde. Corroborando Lima et al. (2012, p.950) mostram que:

A falta de comunicação entre os serviços de saúde é posta como um dos entraves para a realização do cuidado integral, uma vez que, apesar dos encaminhamentos se realizarem, principalmente quando se trata da referência, a contra referência parece não acontecer. O usuário, que é atendido por diversos serviços, recebe um cuidado fragmentado, da mesma forma como se encontram as informações a respeito do seu estado de saúde/doença. O profissional que o atende no nível primário encontra dificuldades para acessar informações do que vem sendo realizado nos níveis secundário e/ou terciário e vice-versa.

Nesta pesquisa a comunicação entre os dispositivos de saúde não foi um ponto diretamente abordado, porém, o mesmo profissional que afirmou“eu tento fazer o que posso com o que tenho”, discorrendo sobre a qualidade do seu processo de trabalho, citou o caso de um idoso que ela está acompanhando na ABS e necessita de uma cirurgia, ainda não realizada devido à alta demanda da atenção terciária e que “os serviços deveriam estar integrados para suprir essas necessidades dele” (p1).

Nomeando-se como crítico ao seu processo de trabalho, um profissional afirmou que esse “está correto [...] porém, poderia ser muito melhor quando é um trabalho em conjunto, quando é um trabalho que envolve outros profissionais de saúde, aí acredito que teria muito mais efetividade” (p5). Ele considera que o primeiro passo para essa melhoria seria gerencial, “tem que vir uma orientação gerencial”.

Uma profissional demonstrou que precisava de qualidade melhor, surgindo a necessidade de uma hora a menos todos os dias dentro das 40 horas semanais. Essa “hora a menos” é justificada como uma forma de “um dia para a gente, somos seres humanos, a gente adoece, precisamos nos cuidar” (p4). Como cuidar dos outros se isso impossibilita o cuidar de si? “Cuidar de si é pressuposto para cuidar dos outros, dá potência ao trabalhador da saúde para a sua produção cotidiana” (FEUERWERKER, 2014, p. 103).

Com as percepções expostas pelos profissionais membros dessa equipe, podemos pensá-la como uma equipe agrupamento, onde há a justaposição das ações e mero agrupamento dos profissionais (PEDUZZI, [2--?]). Ressalta-se que a qualidade da comunicação, autonomia profissional de caráter interdependente e a construção de um projeto assistencial comum foram critérios que levaram a essa associação.

Na equipe da zona rural, algumas respostas foram semelhantes às encontradas na outra equipe, principalmente referente às condições de trabalho e necessidade de melhorá-las.

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Ressalta-se que os profissionais demonstraram conseguir contornar algumas faltas como o reabastecimento de materiais com a dedicação no dia-a-dia.

Observando a qualidade do seu processo de trabalho como “boa”, p9 se refere à “criação de uma outra equipe” para possibilitar a melhoria da assistência às demandas não atendidas. Esse profissional também condiciona a qualificação do seu processo de trabalho com “não faltar material, que às vezes falta muito”.

Em pesquisa realizada por Lima et al. (2014), investigando a satisfação e a insatisfação no trabalho dos profissionais de dois modelos assistenciais, ABS e ESF, constatou-se que o déficit nos instrumentos foi o motivo mais citado como de insatisfação no trabalho, assim como o da área física/ambiente da unidade, em ambos.

Falas associando a escassez de materiais e a qualidade do trabalho foram constantes, p10 cita que “que nem sempre a gente tem material suficiente para realizar nosso trabalho, o que dificulta nosso trabalho”. A narrativa de p12 também representou isso, “tem coisas que não estão ao nosso alcance, falta material, como por exemplo, essa semana voltei de férias e tinha sumido as canetas que eu uso (o motorzinho), foi levado, sumiu da unidade e estamos ainda querendo saber como foi isso”.

De acordo com a Portaria nº 2.436, compete às Secretarias Municipais de Saúde “garantir recursos materiais, equipamentos e insumos suficientes para o funcionamento das UBS e equipes, para execução do conjunto de ações propostas” (BRASI, 2017). Dessa forma, demonstrou-se necessário que a secretaria de saúde do município revisite suas competências objetivando a garantia da assistência de qualidade.

Observou-se que o andamento do processo de trabalho nessa equipe pode estar comprometido pelo não fornecimento de materiais necessários para a realização de atendimentos, ações de promoção à saúde e atividades de educação em saúde. Resultados semelhantes foram encontrados na pesquisa de Shimizu e Cavalcante Junior (2012), na qual eles relacionam a falta de reconhecimento e valorização profissional por parte da instituição que os sujeita às problemáticas condições de trabalho.

Como citou p12, quando esses instrumentos são fornecidos de maneira suficiente “os usuários recebem um serviço de melhor qualidade, porque você vai trabalhar mais satisfeito, você tem esse retorno da comunidade, eles às vezes fazem elogio para a coordenadora da unidade, isso é importante”. Não havendo isso, os usuários receberão um serviço um serviço fragmentado, o que pode não gerar soluções no processo saúde/doença.

Com os resultados obtidos através das falas, constatou-se diante dos tipos de Clínicas apresentadas na introdução que a Clínica Degrada (CAMPOS, 2003) foi a mais presente na

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forma de atuação das equipes, tendo em vista que a prática clínica tinha sua potencialidade diminuída em resolver os problemas de saúde, devido à escassez de matérias básicos.

Partiu-se do pressuposto que a percepção dos profissionais da eSF acerca do seu processo de trabalho pode contribuir para o conhecimento das formas como os trabalhos vem sendo dispostos, bem como indicar novas possibilidades de atuação e contribuir para a construção de ações de educação permanente. É necessário que discussões acerca do processo de trabalho se tornem constantes, seja para organizar a atuação em equipe, seja para [re]pensar as práticas assistenciais, seja para construir novas relações com os usuários.

Dificilmente o profissional de saúde, trabalhador do SUS e integrante da eSF tem a possibilidade de manifestar suas percepções sobre o seu trabalho, mesmo sabendo que elas são atravessadas por conflitos, desejos e questões, permanecem guardadas sem terem momentos para serem escutadas. Em pesquisa realizada por Reis et al. (2007, p. 569), eles afirmaram que:

O trabalhador da saúde tem sempre muito a dizer: tome isso, não tome isso, faça assim, não faça assim; bom seria se tivessem mais a ouvir do a que dizer, pois assim abririam possibilidades de descobrir novas necessidades e a interação com os usuários poderia pautar-se na escuta, e não apenas em prescrições que, a priori, desconsideram as condições de existência das pessoas.

Assim, quem escuta os profissionais? Quais são os espaços que eles têm para expor suas angústias diante do processo de trabalho que estão construindo? Como questionar as práticas de saúde se não são dadas aberturas para seus praticantes colocarem suas reflexões e sugestões?

Levar aos profissionais das eSF’s momentos de escutas também pareceu ter gerado incômodos, considerando as dificuldades encontradas em responder à entrevista realizada no presente estudo. Esse fato foi observado pelos questionamentos direcionados a eles e pela possibilidade de repensar os modos de fazer e saber até então vigentes. Sobre esse incômodo, Feuerwerker (2014, p. 90), afirma que ele é:

[...] a condição indispensável para que um trabalhador ou organização decida sobre mudanças ou incorporar novos elementos na sua prática e a seus conceitos [...] a percepção de que a maneira vigente de fazer ou pensar é insuficiente ou insatisfatória para dar conta dos desafios do seu trabalho. Esse incômodo ou percepção de insuficiência tem que ser intenso, vivido e percebido. Não se produz a partir do discurso ou de análises externas. A vivência e a reflexão sobre as práticas são as que podem produzir incômodos e a disposição para se produzir alternativas de práticas e conceitos, para enfrentar os desafios das transformações

Portanto, esta pesquisa construiu espaços de falas nos quais os integrantes das eSF pudessem refletir sobre seu processo de trabalho a partir das suas próprias percepções, e quem

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sabe ela também contribuiu na desconstrução de formas de trabalho em que o sujeito não seja considerado objeto de trabalho, em que os usuários não fossem agentes, em que os instrumentos não sejam confundidos com as finalidades e em que o processo de trabalho não for integrado.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante dos elementos apresentados e das discussões realizadas com vistas à elucidação dos objetivos propostos, percebeu-se que ano de formação dos profissionais abrangeu a década de 2000 e de 2010, a maioria dos profissionais realiza suas atividades de trabalho somente na ABS, com o regime de 40 horas semanais, vinculados por concurso público.

A partir das transcrições e análises das entrevistas emergiram quatro categorias: incompreensão entre objetos, instrumentos e finalidades; objetivos diversos; tensões no cotidiano; qualidade do processo de trabalho. Tais falas foram analisadas seguindo as orientações da Análise de Discurso Crítica. Observou-se que muitos profissionais não souberam diferenciar objetos, instrumentos e objetivos no seu processo de trabalho, bem como apresentaram finalidades diversas, como a restauração da saúde bucal, até as que abrangiam prevenir doenças e promover saúde.

A falta de instrumentos, a estrutura inadequada, a comunicação deficitária e o vínculo, ou a falta dele, com os usuários foram apresentados como tensões no cotidiano das práticas de saúde. Podendo esses serem elementos que comprometem o processo de trabalho das equipes.

O compartilhamento de percepções abre espaço para que os profissionais da saúde tenham seus saberes valorizados e para que possam receber atividades de educação permanente. Como a análise foi feita em apenas duas equipes, há a possibilidade de existirem outras ideias sobre o processo de trabalho, sugerindo a necessidade de outras pesquisas acerca do tema.

Esta pesquisa construiu momentos de falas nos quais os integrantes das eSF puderam refletir sobre seu processo de trabalho a partir das suas próprias percepções, o que pode ter gerado incômodos aos sujeitos, e também contribuiu na desconstrução de formas de trabalho encontradas.

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Referências

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