Diário
[GRÁFICO]
Diário
[GRÁFICO]
A experiência de Deus na vida diária
Capa
Nuno Branco, SJ
Paginação
Editorial Frente e Verso
Impressão e Acabamentos
Empresa Diário do Minho, Lda.
Depósito Legal
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ISBN
978-989-98322-9-9 Novembro de 2019
Com todas as licenças necessárias
©
Editorial Frente e Verso Rua S. Barnabé, nº 32
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7 PREÂMBULO
A palavra «diário» pode despertar em nós um desejo acrescido e proibido de espreitar uma escrita que se apresenta diante nós, assim, de forma desinibida e, tremendamente, honesta. Sem a pretensão de uma exposição pública, porque não é esta a razão que preside à escrita de um diário, até porque quem o faz fá-lo seguramente com uma intenção livre e desempoeirada, onde anota com considerável periodicidade o cenário dos seus dias, o autor de um diário parece trazer, ainda assim, sob a forma de publicação, a sua vida a palco. Acredito que não seja para ser exibida, desfilada ou desfiada, mas revelada numa beleza me-nos epidérmica.
Sobem ao palco, portanto, as gargalhadas dos nossos camarins, a apreensão dos artistas e as perguntas dos atores:
Acham que estou bem assim?
E ali duas cortinas se abrem uma diante da outra.
A de cá, a cortina preta que cobre os bastidores, os ensaios e as repre-sentações, as repetições e as reproduções, os figurantes e os figurinos, os corredores e as dores, as maquilhagens e as maquinarias.
Do lado de lá, ao fundo, a cortina vermelha. O público e a bilhe-teira. Os bilhetes e as entradas. A expectativa e as aspirações. O desejo maior, grande e grandioso, de apreciar a vida, por vezes impondo à vida um preço que vale pelo apreço da vida enquanto dom.
Com tudo isto, imagino que, para quem escreva, talvez só haja cor-tina preta. Só haja então o lado de cá, o lado da vida ainda por ensaiar, por colher e declamar. Onde se recolhem notas e anotações de umas moções que habitam e cavalgam no coração humano. Estes movimen-tos de consolação ou de desolação que se produzem num dos principais palcos da vida humana: a alma, o espírito, o coração. Não que a vida
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seja assim só para dentro, uterina, mas sem esta fecundidade, ela tornar--se-ia incapaz de gerar e contagiar vida.
Imagem 1 – Exemplo de um diário feito numa agenda
Muitos homens e mulheres encontraram nas entrelinhas da vida diá-ria a suspeita de uma presença maior. Como se fossem habitados, assal-tados ou visiassal-tados por Deus, por esta vitalidade e força que os anima, mesmo que, por vezes, sem mimo.
E, assim, com paciência e insistência, anotaram e anotavam aquilo que lhes sucedia por meio das suas ocupações temporais e fugazes. Imagino que o drama destes homens fosse a própria escrita.
Pela linguagem, não conseguiam estender os braços, dilatar o cora-ção, libertar os movimentos justos que revelassem tudo aquilo que lhes era dado a viver enquanto experiência religiosa, estética ou ética. Como se esta vida fosse demasiado pequena para acolher em si uma aspiração
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eterna. Como se nas palavras tropeçasse a graça e no texto se desfizesse o mistério.
São João da Cruz interrogou-se sobre a autoridade e a autorização para escrever. Será possível, pergunta ele no Prólogo do Cântico
Espiri-tual, escrever sobre aquilo que decorre nas almas amorosas e
manifes-tar por palavras aquilo que nelas se fez sentir? Ou reconhecido como criança que não sabe exprimir-se nem falar, mas apenas balbuciar, Santo Inácio de Loyola encontra-se sem palavras para narrar ou evocar a força da sua vida. A sua escrita, nalgum momento, encontrou uma palavra límpida, cristalina e manifestamente verdadeira: o dom das lágrimas. Tantos homens e mulheres de fé e do mundo da cultura (mesmo não sendo crentes) encontravam, na desesperante cortina preta, este desejo de falar (sob diferentes géneros: o diário, a biografia ou as memórias) de uma outra cortina bem maior: aquela que abre para o estremecimento e o espanto diante da vida.
Inúmeros exemplos. Inácio de Loyola, Pedro Fabro, Francisco de Borja, Jerónimo Nadal, Charles de Foulcaud, Thomas Merton, Franz Kafka, Miguel de Unamuno, Santo Agostinho, João XXIII, Teresa de Lisieux, Padre Hurtado, Anne Frank, Etty Hillesum, Michael Paul Gallagher, Eugène Delacroix, Le Corbusier, Stefano Faravelli, Flannery O’Connor.
Aprender a fazer bom uso do diário, enquanto meio inigualável de tomada de consciência espiritual da vida humana, ajuda-nos a procurar e a reconhecer esta presença inaugural e misteriosa de Deus na vida diária. Que o bom uso dele, do diário de cada um dos leitores, possa ser uma experiência de verdadeiro encontro.
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ÍNDICE
Preâmbulo ... 7
Introdução: Composição do lugar ... 11
Primeira Parte A MONTANHA O Tempo Comum ... 19
Olhai os lírios do campo ... 20
Onde está Deus? ... 22
O desenho e a oração ... 28
O desenho na oração ... 37
A fé a cultura ... 42
Imitação pelo desenho ... 51
Segunda Parte A CIDADE DA JUDEIA Percorrer cidades e aldeias ... 59
O artista é paciente? ... 65
Pela cidade de Lisboa ... 66
Jardim zoológico de Lisboa ... 73
Viagem de comboio ... 75
Viagem de avião ... 81
Viagem a São Tomé e Príncipe ... 84
Viagem a Roma ... 101
Na barbearia ... 114
Terceira Parte A CASA DE ZACARIAS Em casa ... 121
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Trissomia 21 ... 127
Retiro de Diários Gráficos ... 129
IPO Coimbra ... 139
Páscoa Universitária Inaciana ... 141
Rabo de Peixe ... 153
Exercícios Espirituais ... 164
A Morte ... 166
Quarta Parte O VENTRE DE MARIA Oração contrária e contraditória ... 171
O drama da folha em branco ... 176
A fecundidade da folha em branco ... 179
Exercícios Espirituais em Diários Gráficos (primeira parte) ... 186
Exercícios Espirituais em Diários Gráficos (segunda parte) ... 190
Leituras ... 213
Isaías cinquenta e oito (primeira parte) ... 214
Isaías cinquenta e oito (segunda parte) ... 218
Conclusão: Refletir para tirar proveito ... 225