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PROJETOS DE ESTÁGIO: RELATOS SOBRE A FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA

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Academic year: 2021

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PROJETOS DE ESTÁGIO: RELATOS SOBRE A FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA

David P. DIAS, IME-USP Formação inicial de professores de educação básica dpdias@ime.usp.br 1. Introdução

O objetivo deste trabalho é relatar experiências vivenciadas pelo autor como docente da disciplina Projetos de Estágio, mais conhecida pelo código MAT1500, e do curso de extensão universitária Projetos de Estágio: Aprendendo Matemática com Projetos. Mostrar como uma disciplina obrigatória para alunos da licenciatura em Matemática, em conjunto com um curso de extensão voltado para professores da rede pública de Ensino, pode unir o conhecimento acadêmico específico da área, o conhecimento pedagógico, a prática profissional vivenciada pelo estágio supervisionado e também o conhecimento especializado necessário à formação de um professor.

2. Histórico

Nas últimas duas décadas os conselhos estadual e nacional de Educação (CEE-SP e CNE, respectivamente), seguindo as tendências desencadeadas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) promulgada em 1996, passaram a indicar, quando não exigir, mudanças nas estruturas curriculares e projetos político-pedagógicos das licenciaturas, por meio da edição e publicação de portarias, resoluções e pareceres específicos. Tais alterações explicitaram a necessidade de uma mudança na formação inicial e continuada de professores da Educação Básica e portanto nas licenciaturas.

Para entender e discutir tais exigências a Universidade de São Paulo (USP) criou em 2001 a Comissão Permanente das Licenciaturas, formada por especialistas da área de Educação e também especialistas específicos das licenciaturas existentes na universidade. Após alguns anos de discussões, foi elaborado e publicado em 2004, por essa comissão, o Programa de Formação de Professores da USP (PFPUSP). Desde então o PFPUSP serve para nortear as Comissões Coordenadoras de Curso (CoCs) na elaboração do projeto político-pedagógico de cada licenciatura da universidade. Além disso, o PFPUSP estabeleceu a criação da Comissão Interunidades das Licenciaturas (CIL), que agrega representantes da Faculdade de Educação (FE) e de todas CoCs de

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desses cursos, além de ser responsável pela “implantação, avaliação e constante reformulação de programas de formação de professores.” (SÃO PAULO, 2004, p.9).

Em 2004 a Comissão Coordenadora do Curso de Licenciatura em Matemática do Instituto de Matemática e Estatística (IME) iniciou a ampla discussão sobre uma mudança na estrutura da licenciatura, envolvendo o instituto e membros de outras unidades como a Faculdade de Educação e o Instituto de Física, visando aprimorar o curso já existente, atender as diretrizes estabelecidas pelo PFPUSP e consequentemente as legislações pertinentes. A partir de 2006, passou então a vigorar uma nova estrutura para a Licenciatura em Matemática do IME fruto das discussões e a luz das diretrizes estabelecidas pelo PFPUSP. Numa síntese abrangente, pode-se afirmar que o PFPUSP tem como um de seus principais objetivos promover uma formação inicial de modo articulado com as necessidades da escola pública, no sentido de que as atividades de estágio contemplem uma articulação com a formação continuada de professores, e para atender a esse objetivo foi criada, nas mudanças estabelecidas pela nova estrutura, a disciplina MAT1500-Projetos de Estágio, anual e obrigatória a todos os licenciandos do IME.

3. Desenvolvimento da Disciplina

A disciplina Projetos de Estágio atende a exigência do PFPUSP de que 100 horas do estágio curricular obrigatório sejam supervisionadas pela unidade de origem do estudante, enquanto as horas restantes são supervisionadas pela Faculdade de Educação da Universidade, e, além disso, promove uma formação inicial de modo articulado com as necessidades da escola pública, almejando que as atividades de estágio estabeleçam uma forte interação com a formação continuada de professores. Tal concepção de disciplina concomitantemente com um curso de extensão universitária voltado a professores da rede pública de ensino teve por fundamentos não apenas a ideia de que é necessária uma proposta que integre teoria e prática como também a de que é essencial, como propõe Guzmán et alli (1998, p.758), a existência de um diálogo maior entre a Universidade e a Educação Básica.

Nesse sentido o IME criou em seu Programa de Estágios Supervisionados a disciplina Projetos de Estágio, que está sob a responsabilidade do Departamento de Matemática e possui uma carga horária anual de 120 horas, cujo oferecimento de cada turma está atrelado ao oferecimento de uma turma do curso de extensão denominado Projetos de Estágio: Aprendendo Matemática com Projetos, destinado a professores da Educação Básica pública do Estado.

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Desde 2009, ano do primeiro oferecimento da disciplina e também do curso de extensão, todo início de ano são estabelecidas parcerias entre o instituto e escolas públicas visando a realização dos estágios curriculares obrigatórios dos licenciandos e também a contínua formação dos professores das escolas envolvidas. Educadores e Monitores-Bolsistas, alunos de Pós-Graduação da Universidade, visitam ou recebem visitas das escolas interessadas para explicar o funcionamento e as intenções do Projeto e verificar a possibilidade de se firmar uma parceria que, ao se concretizar, estabelece a necessidade do(s) professor(es) da escola se matricular(em) e frequentar(em) o curso de extensão e consequentemente orientar(em) o estágio curricular obrigatório de licenciandos em Matemática matriculados na disciplina.

A cada duas semanas, a partir de março, acontecem os encontros da equipe de trabalho que é composta pelo docente da disciplina que conta com o apoio do Educador ou Monitor-Bolsista, os alunos matriculados na disciplina e os professores matriculados no curso de extensão. Cada encontro tem duração de uma hora e quarenta minutos e dia e horário fixo na semana para acontecer. Nessas reuniões são formados grupos de trabalho cujo objetivo é a elaboração de um projeto ou sequência didática, a ser aplicado pelo grupo nas turmas em que o estágio ocorrerá, o desenvolvimento do projeto ocorre tanto nos encontros como nas visitas alternadas feitas às salas de aula envolvidas.

Nas duas reuniões iniciais da disciplina o docente reforça o intuito da disciplina/curso e os professores da rede pública se apresentam, assim como, seus horários, turmas e intenções (assunto, conteúdo, competência, etc) em relação ao projeto de estágio que será desenvolvido. Ainda nesses dois primeiros encontros os estudantes (estagiários) dividem-se em grupos escolhendo o professor com quem irão estagiar durante o ano. Esse processo de escolha é bem amplo e pode se dar pela disponibilidade de horário do professor, pelo tema que o professor pretende abordar, dentre outras.

A partir do terceiro encontro os grupos de trabalho já estão constituídos, contudo alguns pequenos ajustes ainda podem ocorrer. Os estudantes passam a visitar as escolas em que vão estagiar, algumas vezes acompanhados do Educador, com a finalidade de observar o ambiente escolar, a prática da professora, a dinâmica em sala de aula, o comportamento dos alunos, etc. Ao mesmo tempo, nos encontros quinzenais do primeiro semestre, a equipe discute em sala textos sobre metodologia do ensino de Matemática, projetos de ensino, didática, avaliação, dentre outros. Além disso, os grupos apresentam para toda a equipe atividades elaboradas para os projetos e preparam e aplicam atividades diagnósticas nas turmas da educação básica em que estão estagiando. Nesses encontros fica evidente não apenas a necessidade do conhecimento especializado, definido pelo modelo multidimensional apresentado em Ball et alli (2008),

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licenciados, já que a participação de toda a equipe na discussão sobre as atividades elaboradas e sobre os resultados obtidos na atividade diagnóstico, levam os grupos a refletir e muitas vezes a aprimorar o projeto, quando não os levam a uma mudança global do projeto envolvendo inclusive a alteração dos objetivos previamente definidos.

Entre alguns dos exemplos da dinâmica de trabalho nas aulas da disciplina, vivenciados pelo autor durante quatro anos, destaca-se o ocorrido em 2014 na apresentação de uma atividade proposta em um projeto de estágio voltado a turmas do sétimo ano do Ensino Fundamental. Nessa atividade o grupo propunha o jogo da batalha naval circular cujo objetivo era o de trabalhar o conceito de ângulo, o jogo é como o de batalha naval clássico, porém o tabuleiro é dividido em setores circulares e não em retângulos, e as coordenadas são fornecidas pela distância do setor ao centro do círculo e pelo ângulo em relação a um semieixo horizontal. Já durante a explicação das regras as intervenções começaram, pois ao explicar como o jogador deveria escolher um setor circular um dos membros do grupo salientou que só poderiam ser escolhidos ângulos múltiplos de 30º adicionados a 15º, o que gerou confusão entre aqueles que estavam presentes, primeiro porque todos julgaram ser inconveniente introduzir medidas de ângulos com uma regra que envolve múltiplos e somas e também porque julgaram ser prejudicial ao aprendizado inicial do assunto a escolha de um setor se dar apenas por um ângulo específico e não pelos vários ângulos distintos que também contemplariam esse mesmo setor circular. Após algumas reflexões a equipe (alunos, professores, educador e docente) sugeriu que a atividade fosse reavaliada em vários aspectos, como a de deixá-la para um segundo momento do projeto, assim como alterar as regras de modo a propiciar de fato um entendimento do setor circular e não somente de um ângulo que o representasse, dentre outros. Como resultado dessas reflexões o grupo alterou a atividade e sua ordem cronológica de aplicação no projeto e conseguiu produzir uma sequência didática mais adequada, segundo a opinião de toda a equipe, a aprendizagem dos conceitos de ângulo e de setor circular.

Ao final do primeiro semestre, após leituras, apresentações, discussões e ajustes os grupos entregam um pré-projeto que é avaliado e comentado pelo docente e pelo educador para que com alguns últimos e pequenos aprimoramentos se transforme no projeto que será aplicado no segundo semestre. No segundo semestre, via de regra, os projetos já estão planejados e confeccionados, restando portanto aplicar as atividades sob a supervisão do professor regente. Nos últimos encontros do ano com o projeto pronto, isto é, não só elaborado como também aplicado, os grupos preparam um relatório final e o apresentam para a toda a equipe, nesse relatório, além de uma autoavaliação individual e do grupo, externam reflexões sobre objetivos alcançados e não alcançados,

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sobre experiências vivenciadas no estágio e no trabalho em grupo. E novamente nessa etapa da disciplina os alunos demonstram, oralmente nas apresentações ou nas autoavaliações, o quanto a interação entre conhecimento teórico específico de matemática, teórico pedagógico, conhecimento especializado, prática profissional e estágio supervisionado estiveram presentes na disciplina e o quanto foram importantes em sua formação docente, assim como sugerido pelo modelo de Ball et alli (2008, p.403). No último encontro, após as apresentações, a equipe promove uma roda de discussão e avaliação da disciplina e de sua importância na formação dos licenciandos e dos professores, assim como sugestões de aprimoramento para as turmas vindouras.

4. Relatos

As experiências vivenciadas nessa disciplina permeiam diversos pontos importantes para a formação inicial do professor de matemática. O primeiro, que foi o ponto de partida para a criação da disciplina, é o de facilitar e estreitar o contato do licenciando com escola pública e portanto da Universidade com a educação Básica, assim como sugerido em Guzmán et alli (1998) e que pode ser exemplificado pela frase de um estudante de uma das turmas de 2014 que ao ser questionado sobre um ponto importante a destacar na disciplina respondeu - “O fato dos professores frequentarem a aula, pois colabora para o desenvolvimento do projeto e também com questões burocráticas. Muitas escolas colocam empecilhos para a realização do estágio.”.

Tal aproximação entre Universidade e Educação Básica possibilitam a realização de um estágio contínuo e que aproxima, de fato, o estudante da prática profissional, contemplando as ideias de Zeichner (2010), como mostram as frases de um licenciando que cursou a disciplina em 2014 - “Experiência real com alunos em um projeto que transcorre durante o período de vários meses consecutivos.” e a de outro que cursou em 2013 - “Diferente das disciplinas que contém estágios, MAT1500 fez com vivenciássemos a escola de fato. Nos trouxe a ideia de projeto, discussões pertinentes sobre a escola e pôde nos dar a sensação de como é ser professor.” Esta última frase, retrata ainda outras vertentes que a disciplina utiliza como a da prática como componente curricular e a de trabalho com projetos.

Outro destaque da disciplina fica por conta das reflexões decorrentes desse maior e mais efetivo contato com e escola, como podemos observar nas frases de dois estudantes - “A disciplina nos favorece um contato maior e melhor com os alunos, permite-nos perceber a realidade do trabalho do professor com o preparo das aulas e nos faz ver a real situação da educação pública.” - e - “O momento de discussão sobre

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por coisas parecidas e sabe bem da nossa realidade.” - em que percebe-se a preocupação com a atual realidade da escola pública, sobre o papel do professor, suas experiências e sua realidade.

Por fim e talvez o mais importante o projeto como um todo proporciona ao licenciando aquilo que Shulman (1987) denomina de conhecimento didático do conteúdo, assim como o conhecimento especializado descrito pelo modelo multidimensional de Ball et alli (2008), pois além do conhecimento específico da matemática e o do pedagógico, o estudante utiliza a interação entre esses e a realidade prática da sala de aula, como nas frases de dois deles - “A disciplina força uma imersão do estudante no ambiente escolar de forma organizada em duas fases, observação e aplicação. Isso possibilita que o aluno veja a escola de uma forma totalmente diferente que ele está acostumado enquanto aluno, menos passiva. Outro ponto importante é que mostra a responsabilidade do professor em elaborar as aulas e a dificuldade de aplicá-las.” - e - “A ida a prática com um projeto elaborado por nós alunos é algo positivo, tendo em vista que nós próprios pudemos verificar se nosso projeto seria um sucesso ou se seria preciso reformulá-lo.” Cabe ressaltar que a última frase exemplifica também as ideias de Schön (2000) de que o profissional aprende a fazer fazendo, tornando o professor reflexivo de sua prática, que compreende sua profissão, planeja, percebe dificuldades e é capaz de replanejar suas ações.

5. Conclusões

A necessidade de atender as exigências do PFPUSP de que o IME se tornasse responsável por 100 horas de estágio curricular obrigatório de seus alunos do curso de Licenciatura em Matemática, fez com que em 2006 fosse criada a disciplina Projetos de Estágio, que em sua concepção foi muito bem discutida, elaborada e implementada e não meramente burocrática, como fazem referências alguns licenciandos a respeito do estágio supervisionado.

Tal concepção de disciplina possibilitou, não só o cumprimento das 100 horas de estágio por parte dos estudantes, como também um espaço em que todos aprendem, o licenciando em sua formação inicial, o professor em sua formação continuada, o Monitor-Bolsista (aluno de pós-graduação) e o docente. Um ambiente em que todos discutem e refletem sobre a prática profissional, conhecimentos específicos, pedagógicos, especializados para o professor e sobre a interação entre estes. E que proporciona uma aproximação com a escola pública e seus membros (dirigentes, professores, alunos e comunidade) comprovados não só pela percepção de um docente, mas também pelos relatos dos professores em formação.

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Referências Bibliográficas

BALL, D. L.; THAMES, M. H.; PHELPS, G.. Content Knowledge for Teaching: What Makes it Special?. Journal of Teacher Education, Washington D.C., v.59, p. 389-407, 2008.

GUZMÁN, M; HODGSON, B R; ROBERT, A; VILLANI, V. Difficulties in the Passage from Secondary to Tertiary Education. Documenta Mathematica, v. Extra ICM 1998, III, p.747-762, 1998.

SÃO PAULO, Universidade de São Paulo. Programa de Formação de Professores da USP. Pró Reitoria da USP, São Paulo, 2004.

SCHÖN, D. A. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2000.

SHULMAN, L. S. Knowledge and Teaching: Foundations of the New Reform. Harvard Educational Review, 57, p.1-22, 1987.

ZEICHNER, K. Repensando as conexões entre a formação na universidade e as experiências de campo na formação de professores em faculdades e universidades, Educação, Santa Maria, v.35, n.3, p.479-504. 2010.

Referências

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