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Armistício na Revolução Constitucionalista de 1932. Resultado de uma traição?

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

Artigo Científico apresentado ao Curso de

Especializa-ção em História Militar como requisito para a conclusão

de Curso, sob orientação do Professor Luiz Augusto Ro-cha do Nascimento.

ARMISTÍCIO NA REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA DE 1932. RESULTADO DE UMA TRAIÇÃO?

MÁRCIO SANTIAGO HIGASHI COUTO1

Resumo

A Revolução Constitucionalista de 1932 marcou o Brasil do século XX. Dentro deste contexto, serão explorados os motivos que levaram à sua eclosão, a forma como transcorreram os com-bates, além dos bastidores políticos deste episodio histórico, que para alguns historiadores, teve um desfecho inevitável. Entretanto, o problema desta pesquisa é analisar a forma como se deu o fim da Revolução de 1932, abordando as controvérsias sobre o fato. O objetivo da pesquisa é analisar principalmente os fatos que levaram os revolucionários constitucionalistas à derrota pelas armas e o ao armistício com o governo de Getúlio Vargas e as suas consequências.

Palavras-chave. Revolução Constitucionalista de 1932. Armistício. Bertoldo Klinger. Hercu-lano de Carvalho e Silva.

Introdução

Conhecida também como Guerra Paulista ou Revolução de 1932, foi um dos maiores conflitos militares na América do Sul, no século XX. As raízes de suas causas remontam ao chamado Movimento Tenentista de 1922, movimento que foi encabeçado por oficiais de baixa patente do Exército Brasileiro (os tenentes) que se revoltaram contra as precárias condições sociais do Brasil à época, e com a política feita pelas oligarquias, principlamente os grandes produtores de café, que na República Velha instituíram a política do “Café com Leite”, repartindo o poder entre os Estados de São Paulo e Minas Gerais.

1 O autor é Tenente Coronel da Polícia Militar do Estado de São Paulo, com especialização em Política e Estratégia pela USP e MBA Executivo pelo INSPER. Atualmente é o Comandante do 2ºBatalhão de Polícia Militar Me-tropolitano “Coronel Herculano de Carvalho e Silva”.

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Este movimento teve como resultados a Revolta Paulista de 1924, que teve como um dos seus principais episódios, a Coluna Prestes e abriu caminho para a Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder, derrubando o então presidente da republica, Washington Luis e impedindo a posse de seu sucessor, Júlio Prestes.

A Revolução de 1932 é uma sequência, ou melhor, uma consequência de outras Revoluções, em 1922, 1924 e 1930 e foi causada por vários motivos, mas destacamos a forma como Getúlio Vargas influenciava e controlava a adminstiração do Estado de São Paulo como um dos fatores preponderantes para a revolta. A exigência de uma Constituição que limitasse os poderes do presidente ditator e marcassem uma eleição livre eram exigências dos paulistas. Quando da eclosão do conflito, os paulistas esperaram em vão o apoio de outros estados, obtendo apenas o apoio do Mato Grosso. Enquanto esperavam esse apoio militar, as tropas constitucionalistas não se dirigiram para o Rio de Janeiro, para tomar a cidade e depor Getúlio. Este, por sua vez, mobilizou contra os revoltosos todo o Exército e a Marinha do Brasil, além das Forças Públicas de outros Estados (Donato, 1982).

Tudo isso foi agravado pelos aliados de Getúlio, que no comando do Estado de São Paulo, enfraqueceram a Força Pública e as unidades militares do Exército Brasileiro e da Marinha, que se sediavam em São Paulo. Quase não havia armamento pesado e navios de guerra e o efetivo era mínimo.

A idéia geral era de que o Brasil inteiro estava insatisfeito com Getúlio Vargas. Os acenos e acordos secretos com vários políticos de outros estados, levaram os líderes da Revolução Constitucionalista a acreditarem que teriam não só o apoio político, mas o apoio militar para derrubar Getúlio Vargas. Imaginaram que ocorreira como em 1930, e que após pouca resistência poderiam marchar para a capital federal no Rio de Janeiro e facilmente derrubar Vargas.

Este pensamento e a urgência e o sigilo que cercaram o início do movimento, impediram que São Paulo se preparasse militarmente para um longo conflito. Não foram estocadas armas, munições e equipamentos para um conflito prolongado, e não havia um planejamento para o caso do Estado de São Paulo fosse sitiado e atacado por forças federais, que já no começo do mês de setembro, romperam as defesas dos constitucionalistas e ampliavam o cerco aos revoltosos, se aproximando perigosamente da cidade de São Paulo.

Diante deste cenário, o Coronel Herculano de Carvalho e Silva (figura 1), comandante da Força Pública Paulista, sabedor do que ocorria de fato, tanto por ter estado em combate, como pelo contato diário com os relatórios alarmantes que recebia, juntamente com o coman-dante supremo do Exército Constitucionalista, General Bertoldo Klinger, entraram em negoci-ações com o General Góis Monteiro, representante de Getulio Vargas, para uma armistício,

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afim de evitar mais derramamento de sangue e uma possível invasão e destruição sem prece-dentes do Estado e da Cidade de São Paulo.

Figura 1. Coronel Herculano de Carvalho e Silva, Comandante da Força Pública do Estado de São Paulo durante a Revolução Constitucionalista de 1932.

Fonte: acervo histórico do 2º Batalhão da Policia Militar Metropolitano da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

O Armistício foi assinado em 2 de outubro de 1932, na cidade de Cruzeiro e entre suas condições, havia a total cessação das hostilidades e a Força Pública de São Paulo poderia retor-nar com seus homens e suas armas para seus locais de origem, afim de manter a segurança pública, contra saque e depredações. O Coronel Herculano foi designado interventor militar no Estado de São Paulo, assumindo o Governo do Estado, até o dia 06 de Outubro, quando o Ge-neral Valdomiro Castilho de Lima, comandante das tropas do Sul do Brasil, assumiu o governo paulista. A maior parte dos líderes da Revolução Constitucionalista foi exilada para Portugal.

Teria havido uma “traição” da Força Pública Paulista ou do seu comandante, Coronel Herculano, aos ideais da Revolução de 1932? Quais teriam sido as consequências de se conti-nuarem os combates? Havia possibilidade de vitória das forças constitucionalistas? O General Klinger já não havia falado em armistício?

No escopo do estudo do problema apresentado neste artigo, podemos trabalhar com três hipóteses, com relação a pergunta principal, de que o armistício seria o resultado de uma traição?

Na primeira hipótese houve realmente uma traição aos ideiais revolucionários, por parte tanto do General Bertoldo Klinger quanto pelo Coronel Herculano, por terem iniciado as negociações para o armistício, pois haveria condições para continuar a luta, até, pelo menos, uma situação mais vantajosa para se fazer um acordo com o governo federal.

Na segunda hipótese, ocorreu uma traição por parte do Coronel Herculano, que intermediou as negociações com o governo federal, passando por cima da autoridade do General Klinger.

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E na terceira hipótese, o armistício não foi uma “traição” por qualquer das partes, mas uma necessidade para se poupar vidas e bens materiais e o Coronel Herculano agiu devidamente autorizado pelo General Klinger.

Para a verificação destas hipóteses, é necessário uma análise das motivações políticas e da situação militar dos revolucionários durante o conflito, em termos de homens e armas, além de um estudo em ordem cronológica das ações durante as negociações para o armistício.

Isso será feito através de pesquisa bibliográfica e documental, além de entrevista com renomado autor sobre o assunto para podermos apresentar conclusões sobre as hipóteses.

Antecedentes

Em meio a uma grave crise econômica causada pela quebra da bolsa de Nova Iorque, nos EUA, e conhecida como “Grande Depressão”, que causou a queda dos preços do café, principal produto de exportação do Brasil, particularmente em São Paulo, Julio Prestes foi eleito presidente da república em 1930, apoiado por Washington Luis, vencendo no Distrito Federal e em dezessete estados, tendo em São Paulo 91% dos votos, mas não tomou posse.

Getúlio Vargas, da Aliança Liberal, seu adversário, apesar da larga votação nos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba, foi derrotado.

João Pessoa, o candidato à vice-presidente de Getúlio Vargas foi assassinado em julho de 1930, na Paraíba, por motivos passionais, mas sua morte foi utilizada pela ala radical da Aliança Liberal como estopim para a revolução de 1930, iniciada em 3 de outubro e espalhando-se pelo Rio Grande do Sul e Minas Gerais, rapidamente rumando para o Rio de Janeiro, a capital federal.

No dia 24 de outubro de 1930, os comandantes militares no Rio de Janeiro, através de um golpe militar, depuseram o presidente Washington Luis e entregaram em 3 de novembro de 1930 o governo provisório a Getúlio Vargas, pondo fim a chamada política do “Café com Leite”, onde São Paulo e Rio de Janeiro se alternavam no poder da presidência da república.

Quando assumiu o poder, Getulio Vargas destituiu a maioria dos presidentes estaduais (cargo equivalente, á época, a governador do estado), colocando interventores federais, homens de sua confiança, muitos ex-tenentes, colegas das revoluções de 1922 e 1924. Fechou também o Congresso Nacional e as Assembleias Legislativas.

Posteriormente, cassou a Constituição de 1891. Getúlio Vargas assumiu amplos pode-res, com a promessa de convocar novas eleições e formar uma Assembleia Nacional Consti-tuinte, para promulgar uma nova Constituição.

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Para o Estado de São Paulo foi nomeado como interventor federal o tenente, promo-vido a coronel, por Getúlio Vargas, João Alberto Lins de Barros ex-revolucionário de 1922 que rapidamente obteve antipatia do povo paulista, que o tratava como forasteiro, pois ele era per-nambucano, e que conduziu o estado com mão de ferro.

Como comandante da 2º Região Militar, foi nomeado o General Isidoro Dias Lopes, um dos líderes da Revolta de 1924 e o Major Miguel Costa foi nomeado Comandante da Força Pública (atual Polícia Militar do Estado de São Paulo), de onde havia sido expulso por haver também sido um dos líderes da Revolução de 1924.

Várias intervenções diretas do governo federal na vida política do Estado de São Paulo, aliadas ao descontentamento geral por Getúlio Vargas continuar governando por decretos, de forma ditatorial, e não convocar eleições, fez com que os políticos paulistas se voltassem aber-tamente contra o governo federal, mobilizando a população paulista para pressionar Getúlio Vargas a convocar uma constituinte e elaborar uma nova Constituição.

Figura 2. Manifestação em São Paulo, por uma nova Constituição.

Fonte: 1932: Imagens de uma Revolução do Historiador Marco Antonio Villa.

Em meio ao descontentamento e a denuncias de incompetência, o interventor João Al-berto foi substituído, e em 1932 o paulista Pedro de Toledo foi nomeado interventor federal em São Paulo. Em 25 de janeiro de 1932, dia do aniversário da cidade de São Paulo, um grande comício com mais de 200.000 pessoas na Praça da Sé, transformou-se em uma manifestação do descontentamento paulista, conforme figura 2.

Embora Pedro de Toledo fosse visto com bons olhos pelo povo de São Paulo, o mesmo queixava-se de que não possuía autonomia para governar, pois era constantemente pressionado

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pelo ex-interventor João Alberto, que comunicava cada movimento de Pedro de Toledo a Ge-tulio Vargas.

A Luta

Em 9 de julho eclodiu o movimento revolucionário, com a movimentação de tropas da Força Pública do Estado de São Paulo e de algumas unidades do Exército Brasileiro, sediadas em São Paulo e simpáticas ao movimento. Os paulistas acreditavam que outros estados do Bra-sil iriam apoiar militarmente São Paulo contra o governo federal, principalmente Mato Grosso, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.

Pedro de Toledo, o interventor federal, foi proclamado governador de São Paulo, tor-nando-se o líder civil da revolução constitucionalista. Os líderes militares foram os Generais Bertoldo Klinger, Isidoro Dias Lopes e o Coronel Euclides Figueiredo.

Na verdade, grande parte do movimento baseava-se na esperança do apoio político de outros estados da federação contrários a Getúlio Vargas. Esperava-se que, tal como havia ocor-rido na Revolução de 1930, que levou Vargas ao poder, os chefes militares no Rio de Janeiro depusessem o ditador ou pelos menos o forçassem a aceitar os termos dos paulistas, sem a necessidade do uso das armas.

Esta esperança de um apoio político e militar, que não ocorreu, fez com que os revo-lucionários não marchassem diretamente para o Rio de Janeiro para depor Vargas e nem orga-nizassem uma defesa das divisas do Estado de São Paulo para conter um possível ataque das forças federais, proporcionando tempo para que Vargas e seus aliados se mobilizassem e cer-cassem São Paulo, preparando um ataque aos revoltosos.

O único estado a apoiar São Paulo foi o Mato Grosso. O General Bertoldo Klinger, comandante da circunscrição militar de Mato Grosso prometeu apoiar o movimento com 5 mil homens e muita munição. Entretanto, em uma hábil manobra do governo federal, Klinger foi exonerado e quando eclodiu a revolução, Mato Grosso só pôde contribuir com alguns poucos voluntários, embora fosse criado um novo estado na região, chamado de Maracaju, que apoiou abertamente a revolução constitucionalista.

Embora naquela época o Estado de São Paulo já fosse um dos mais ricos e desenvol-vidos da federação, com uma população aproximada de 7 milhões de habitantes e tivesse uma Força Pública com cerca de 10.000 homens, e contando com o apoio da população, que mobi-lizou 200.000 voluntários, havia uma tremenda escassez de armamento o que permitiu que fos-sem criados apenas alguns batalhões, chegando assim a 40.000 combatentes lutando pelos

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Constitucionalistas, como pode ser observado na figura 3. Muitos voluntários foram para o combate portando somente suas armas particulares, pois não havia fuzis para todos.

Figura3. Voluntários Paulistas, partindo para frente de combate.

Fonte: livro A Revolução de 1932 de Hernani Donato (1982).

Praticamente desde 1930, após tomarem o poder, os partidários de Getúlio Vargas se mobilizaram em desestruturar a Força Pública de São Paulo, enfraquecendo-a. Parte de sua aviação e de sua artilharia foram tomadas pelo Exército Brasileiro, e seu efetivo foi reduzido. O armamento era velho e obsoleto, sendo a maioria dos fuzis de modelos Mauser de 1893 e 1894, como podemos ver na figura 4.

Figura 4. Fuzis Mauser, utilizados durante a Revolução de 1932.

Fonte: foto tirada pelo autor, acervo histórico do Centro de Estudos José Celestino Bourroul.

Logo no início do conflito, as forças federais trataram de isolar o Estado de São Paulo, principalmente o porto de Santos, impedindo que novos armamentos, munição ou suprimentos

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pudessem chegar do exterior para suprir as forças paulistas. Apesar do apoio irrestrito da im-prensa e da população que se mobilizou com campanhas como o “Ouro para o bem de São Paulo”, para prover recursos para a compra de armas, não foi possível abastecer as tropas.

Diante deste problema de abastecimento logístico, os paulistas apelaram para a inicia-tiva e a criatividade. Professores e engenheiros da Escola Politécnica do Estado e do Instituto de Pesquisas Tecnológicas desenvolveram e produziram munições, granadas e armamentos, como morteiros, blindaram caminhões, trens e lanchas e produziram capacetes de aço (figuras 5 e 6). Indústrias se mobilizaram para produzir materiais a serem usados pelos combatentes e milhares de voluntárias se apresentaram para costurar uniformes. A carência de armas era tão grande que criou-se um equipamento, apelidado de ¨matraca¨, que imitava o som de metralha-doras, afim de enganar as tropas inimigas (figura 7).

Figuras 5 e 6. Um dos trens e um dos caminhões blindados construídos pelos paulistas.

Fonte: http://darozhistoriamilitar.blogspot.com

Figura 7. A famosa “matraca”.Ao se girar a manivela, produzia sons parecidos com tiros de metralhadora.

Fonte: foto tirada pelo autor, acervo histórico do Centro de Estudos José Celestino Bourroul.

Durante os testes de um morteiro produzido por engenheiros da Escola Politécnica de São Paulo, em 23 de julho de 1932, uma explosão acidental matou o comandante da Força

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Pública de São Paulo, o General Júlio Marcondes Salgado e o Major José Marcelino da Fonseca. No mesmo dia, o Coronel Herculano de Carvalho e Silva assumiu o comando da Força Pública.

Em seu livro,“A Revolução Constitucionalista”, escrito em 1932, em que reuniu farta documentação sobre o conflito, o Coronel Herculano dá a real dimensão das dificuldades pelas quais passavam os combatentes constitucionalistas: “Um dos fatores primordiais do fracasso da campanha constitucionalista, senão o primordial de todos estes fatores, foi a nossa esmagadora inferioridade em armas e munições” (Silva, 1932, p.44).

Houve uma intensa campanha de mobilização da população e de encorajamento as tropas, através do rádio, de jornais escritos e de peças publicitárias, cartazes colados em postes e muros (figura 8), para elevar o moral da população e das tropas. No entanto, este efeito, em-bora positivo para encorajar os paulistas, teve um resultado nefasto ao esconder a realidade da situação e a gravidade da falta de armas e munições.

Figura 8. Cartazes da Revolução Constitucionalista, exortando a população a se alistar.

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Figura 9. Mapa com os principais combates da revolução de 1932.

Fonte: Acervo histórico do Centro de Estudos José Celestino Bourroul. Mapa “São Paulo Con-flagrada” de José Washt Rodrigues.

Os revolucionários viram-se então lutando em três frentes. A chamada frente norte, no vale do Paraíba, divisa com os estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, a frente sul, na divisa com o Paraná e a frente leste como pode ser visto no mapa da figura 9.

No setor note, no Vale do Paraíba, na divisa com os estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro, e então a principal via de acesso à capital federal, e de onde devia se esperar o ataque das forças de Vargas, o comandante era o Coronel Euclides Figueiredo. Grande parte das tropas constitucionalistas foi posicionada nessa região, no início do conflito, para marchar em direção à cidade do Rio de Janeiro. Como nunca chegou esta ordem, as tropas foram empregadas para defender a região.

Um dos pontos de combates mais intensos foi nas cercanias de um estratégico túnel ferroviário, na Serra da Mantiqueira, que ligava a cidade de Passa Quatro, em Minas Gerais e de Cruzeiro em São Paulo. O 2º Batalhão de Caçadores da Força Pública de São Paulo, conhe-cido como o “Dois de Ouro”, e comandado pelo Tenente Coronel Herculano de Carvalho e Silva se deslocou para o túnel e guarneceu aquela posição estratégica, montando várias trin-cheiras em seus arredores.

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Os intensos combates causaram a morte de 18 homens desse batalhão e custaram aos atacantes, da Força Pública de Minas Gerais, dezenas de mortos e feridos, inclusive o Tenente Coronel Fulgêncio de Souza Santos, comandante do 7º Batalhão da Força Pública Mineira, morto em combate.

O avanço das forças federais contra o Estado de São Paulo trouxe os combates para as cidades de Queluz, Cachoeira Paulista, Piquete e Lorena, com intensos bombardeios de artilha-ria e da ação da aviação federal, onde as forças constitucionalistas, sem armas e munição, ten-tavam retardar o avanço das tropas de Vargas. Uma última linha defensiva na cidade de Guara-tinguetá segurou o avanço das forças federais até o armistício em 02 de Outubro.

No setor leste, na divisa com Minas Gerais, as tropas constitucionalistas, no início do conflito, chegaram a tomar algumas cidades mineiras, como Jacutinga e Ouro Fino. No mês de setembro, um contra-ataque das forças federais tomou várias cidade paulistas da região, for-çando a retirada dos constitucionalistas para uma linha defensiva na região de Campinas.

O setor sul, na divisa com o estado do Paraná, a estratégica cidade de Itararé, princi-palmente a localidade conhecida como “Passo do Cypriano”, viu grandes combates. Os consti-tucionalistas, apoiados por um trem blindado, e cerca de 5.000 combatentes enfrentaram as forças federais com cerca de 15.000 homens, do exército brasileiro e das Forças Públicas dos Estados da região sul. Mas graças ao empenho e a coragem dos paulistas, as forças federais pouco avançaram na região, até o armistício de 2 de outubro.

O Armistício

A primeira tentativa de pôr fim ao conflito, ocorreu no dia 14 de setembro, por parte dos revolucionários paulistas com o envio de uma carta de Bertoldo Klinger a Getúlio Vargas, na qual o Governo Provisório era consultado acerca da possibilidade de um armistício para que se estabelecessem as negociações visando o fim do conflito.

Como resposta, transmitida pelo almirante Protógenes Guimarães, referia-se à possibi-lidade de se encontrar uma solução, desde que se fossem seguidas as condições ditadas pelo Governo Provisório, como a deposição das armas pelos revolucionários, a reorganização do governo de São Paulo pelo chefe do Governo Provisório, a nomeação de interventor “civil e paulista”, o afastamento dos líderes do movimento, a anistia para todos os efeitos criminais, sem prejuízo das sanções administrativas que o governo aplicaria aos “principais responsáveis” e a reintegração dos tribunais, juízes federais e estaduais na plenitude das garantias e atribuições que lhes conferia a Constituição de fevereiro de 1891.

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No dia 29 de setembro o general Klinger propôs ao governo a suspensão das hostilida-des para que se tratasse da cessação do conflito. Getúlio Vargas respondeu solicitando o envio de um emissário para entrar em negociações com o general Góis Monteiro, que, juntamente com o general Valdomiro de Lima, comandava as forças legalistas. Foi incumbido da missão o tenente-coronel Vilabela.

As negociações, entretanto, não puderam prosseguir, pois o emissário das forças cons-titucionalistas não levara autorização para assinar a convenção sobre as garantias militares exi-gidas pelos legalistas para a cessação de hostilidades.

Contudo, o coronel Herculano de Carvalho e Silva que, após a morte do coronel Júlio Marcondes Salgado, no dia 23 de julho, passou a ocupar o comando da Força Pública, desde o dia 27 de setembro resolvou abandonar a luta, entrando em contato com as forças federais para firmar a suspensão do conflito. Assim, no dia 1º de outubro, em Cruzeiro, a Força Pública es-tabeleceu a paz em separado, atitude que se fixou no ideário sobre a Revolução Constituciona-lista como “a traição da Força Pública” segundo Villa (2010).

Pela convenção militar então assinada, a Força Pública comprometia-se a recuar para a capital de São Paulo, assumir a manutenção da ordem entre a população civil do estado e reco-nhecer apenas a autoridade do Governo Provisório. Em troca, os oficiais da milícia estadual tinham garantidas as regalias e vantagens de seus postos, e as forças federais comprometiam-se, cumpridos os itens da convenção, a pôr em liberdade os oficiais e praças presos durante a guerra.

No dia 2 de outubro a Força Pública depôs o governo revolucionário paulista, que lan-çou seu manifesto de despedida reafirmando a esperança de chegar-se à reorganização político-administrativa do país em bases liberais, conforme noticiaram jornais da época (figura 10). O governo de São Paulo ficou nas mãos do coronel Herculano Silva até o dia 6 de outubro, quando o general Valdomiro Castilho de Lima foi nomeado interventor militar no estado. Os membros do governo revolucionário foram levados para o Rio de Janeiro, junto com os principais líderes constitucionalistas e posteriormente deportados para Portugal.

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Figura 10. Reprodução do jornal “Correio de São Paulo”, de 07 de Outubro de 1932.

Fonte: Acervo histórico do Centro de Estudos José Celestino Bourroul.

Embora grande parte da população de São Paulo ainda estivesse animada e acreditasse em uma chance de vitória, os que estavam envolvidos nos combates sabiam da situação deses-peradora. Apesar de em algumas frentes as forças constitucionalistas conseguissem deter o avanço das forças federais, a falta de munição e de reposição de armas e homens, cobrava um tributo altíssimo. O poeta Guilherme de Almeida, combatente na frente leste, descreveu a pe-núria das tropas em seu poema “Oração a Ultima Trincheira”, falando sobre a escassez de armas e de suprimentos.

No início do conflito, as forças revolucionárias contavam com cerca de 10.000 homens da Força Pública, muito mal armados e efetivos revoltosos do Exército e da Marinha, que aderiram as causas da revolução, mas que não passavam de 5.000. No decorrer do conflito foram mobilizados batalhões de voluntários, que chegaram a mais 40.000 homens, com quase nenhum armamento e treinamento. As forças federais de Vargas chegaram a quase 100.000 do Exercito e Forças Públicas Estaduais, conforme dados extraídos de relatórios oficiais, constantes da obra do Coronel Herculano sobre a Revolução de 1932.

Um dos primeiros movimentos de Vargas foi sitiar o Estado de São Paulo, impedindo o abastecimento de armas e munições. Embora São Paulo já fosse um grande centro econômico e industrial e houvesse uma grande mobilização, para a construção local de armas e munições, não havia possibilidade de conseguir a quantidade necessária que uma guerra do tipo exigia.

Desde o começo, a liderança militar dos Revolucionários Constitucionalistas encontrava-se dividida. Embora o General Isidoro Dias Lopes fosse um dos idealizadores do

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movimento, já encontrava-se na reserva ha alguns anos. O General Bertoldo Klinger portanto foi aclamado como chefe militar. Mas o Coronel Euclydes Figueiredo, também do exército, se destacava nas linhas de combate.

Embora a Força Pública contribuisse com um maior efetivo de combatentes revolucionários, do que os rebelados do Exército, por uma questão de hierarquia foram subordinados às ordens dos oficiais do exército, como o General Klinger e o Coronel Figueiredo. Isso acirrou muito os ânimos.

O Tenente Coronel Herculano, da Força Pública, não participou da articulação do movimento, mas no início dos combates, comandando o 2º Batalhão de Caçadores da Força Pública, se deslocou para o município de Cruzeiro, divisa com Minas Gerais, para defender o túnel ferroviário existente no local, importante objetivo estratégico.

Após dias de intensos combates, foi chamado a São Paulo, onde, promovido a Coronel, assumiu o Comando da Força Pública, após a trágica morte do General Júlio Marcondes Salgado, em um acidente durante o teste de um morteiro.

Desde o momento em que assumiu o Comando da Força Pública, o Coronel Herculano, destaca em seu livro, que recebia constantemente terríveis relatórios de falta de armas e munições em todas as frentes de combate.

O própiro General Klinger, tomando conhecimento destes relatórios, não acreditava mais que haveria condições de continuar a luta, iniciando assim, em 26 de setembro, entendimentos com o Geneal Goes Monteiro, comandante das forças federais (Villa,2010).

A vitória das forças de Getúlio Vargas foi-se evidenciando a partir do mês de agosto, com o recuo progressivo das tropas paulistas em todas as frentes. No dia 16 de setembro, em meio a uma situação militar crítica, o coronel Herculano assumiu o comando do destacamento de Campinas, responsável por uma das principais linhas de defesa das forças constitucionalis-tas.

Logo, porém, convenceu-se de que era vã a intenção de continuar o combate, dado o avanço constante das forças legais e “o esgotamento e a indisposição para prosseguir-se a luta” que constatava entre seus comandados.

Em 28 de setembro de 1932, o comandante-em-chefe das forças constitucionalistas, general Bertoldo Klinger, comunicou aos comandantes das tropas paulistas estar na iminência de pedir um armistício. Entretanto, o coronel Euclides procurou Klinger, solicitando que não prosseguisse na negociação do armistício e que impedisse o coronel Herculano de enviar repre-sentantes para negociar com o adversário.

Klinger concordou em sustar a divulgação de sua proposta de armistício, mas só au-torizou Euclides a dirigir-se a Herculano em seu próprio nome. Em resposta a esse apelo, porém,

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o comandante da Força Pública respondeu a Euclides que não havia possibilidade de suspender os entendimentos com as forças governistas.

O historiador Marco Antônio Villa, em seu livro A Revolução de 1932-Constituição e Cidadania (2010), afirma que o General Bertoldo Klinger enviou por rádio uma mensagem para Vargas, na madrugada do dia 29 de setembro, propondo o fim do conflito para que não fossem causados maiores sacrifícios de vidas e danos materiais.

Entretanto, a proposta levada ainda no mesmo dia 29 pelo emissário de Klinger para a primeira rodada das negociações com o general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, represen-tante do governo federal, não foi aceita. No dia seguinte, o emissário de Klinger retornou com uma contraproposta de convenção militar, à qual Klinger respondeu preparando outra proposta, a ser discutida em nova reunião com o general Góis Monteiro, no dia 1º de outubro.

Na noite de 30 de setembro, porém, sabendo das negociações que se tratavam, o co-ronel Herculano solicitou a Klinger, pelo telefone, que fosse permitido à Força Pública partici-par dos entendimentos partici-para o armistício, o que foi concedido (Villa,2010).

De todo modo, realizou-se em Cruzeiro (SP), quartel-general das forças legalistas, no dia 1º de outubro, novo encontro com o general Góis Monteiro. Além dos dois emissários de Klinger, compareceram dois enviados da Força Pública, os tenentes-coronéis Otaviano Gonçal-ves da Silva e Euclides Machado.

Entretanto, Góis Monteiro agiu de modo a tratar em separado com os representantes das duas forças e, reunindo-se inicialmente com os oficiais da Força Pública, obteve destes a acei-tação de seus termos ao cabo de alguma discussão, assinando-se em seguida uma convenção de compromisso. “ O general Klinger, comandante do exército constitucionalista que, desde o final de setembro, negociava os termos da rendição com o general Góis Monteiro, criticou duramente as circunstâncias da desastrosa assinatura de acordo de paz em separado pela FP.” (Villa, 2010) Nos termos do acordo, a Força Pública comprometia-se a recuar para a capital do es-tado com a missão de manter a ordem, passando a reconhecer unicamente a autoridade do go-verno federal. Em contrapartida, este gogo-verno garantia aos oficiais da força a manutenção de todas as vantagens e regalias correspondentes aos postos que ocupavam antes do início dos combates, prometendo ainda libertar todos os oficiais e soldados da corporação aprisionados ao longo da campanha.

No dia seguinte, 2 de outubro de 1932, o alto comando da Força Pública reuniu-se, em São Paulo, no gabinete do coronel Herculano, para apreciar o comportamento dos emissá-rios e os termos do acordo, que foram aprovados por unanimidade.

Entretanto, a iniciativa da Força Pública foi condenada tanto pelo grupo de líderes do movimento ainda dispostos à luta quanto pelo próprio general Klinger. Este, em suas narrativas

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autobiográficas, qualificou o acordo de “atentado à lealdade para com o governo paulista e o supremo comando das forças constitucionalistas” (Klinger,1933).

O Professor Marco Antonio Villa, na obra já citada, afirma que a rendição dos consti-tucionalistas foi considerada uma traição, e o governo civil acusou a Força Pública de ter acei-tado termos humilhantes para o acordo.

O Coronel Herculano de Carvalho e Silva, em sua obra A Revolução Constituciona-lista (1932), afirma que, embora fosse o General Bertoldo Klinger, comandante das forças re-volucionárias, que primeiramente tivesse proposto o armistício, coube a ele, Coronel Hercu-lano, a pecha de traidor, por ter assinado o acordo, desviando assim a responsabilidade sobre a rendição.

Entretanto, as exigências que foram feitas por Getúlio Vargas, para cessar as hostilidades, não agradaram aos oficiais do exército que eram os líderes militares da Revolução Constitucionalista. Estes oficiais eram vistos por Getúlio Vargas como pouco confiáveis, traidores, que deveriam ser presos. Portanto os termos não eram favoráveis a eles e não foram aceitos.

Ciente deste dilema, o Coronel Herculano solicitou autorização do General Klinger para iniciar negociações com o governo de Vargas, solicitando um armistício geral.

Herculano, por sua postura política neutra, era visto com mais confiança pelo governo federal. As propostas acertadas estipulavam a imediata cessação das hostilidades, mas as tropas da Força Pública poderiam manter suas armas e retornarem a cidade de São Paulo, para manterem a ordem pública.

O Coronel Herculano deu ciência dos termos ao General Klinger, que não gostou do acordo, tendo em vista que não benficiava os revoltosos do exército, e abria caminho para sua própria prisão. O Coronel Figueiredo também não gostou dos termos e insistiu em continuar a luta, organizando tropas para ir para o Mato Grosso e lá continuar a combater (Figueiredo, 1933).

Outros fatores importantes que devem ter levado o Coronel Herculano a tomar a difícil decisão pelo armistício foram, possivelmente, as lembranças da terrível destruição ocorrida na cidade de São Paulo, durante os combates da Revolução de 1924, da qual ele foi testemunha ocular.

No período de 23 dias, entre 05 de julho e 28 de julho de 1924, os combates entre revoltosos liderados pelo General Isidoro Dias Lopes e pelo Major Miguel Costa, da Força Pública de São Paulo, e as forças legais, do Governo Federal, resultaram entre 500 e 800 mortos e mais de 5000 feridos, que lotaram os hospitais da cidade de São Paulo.

Cerca de 1500 construções, principalmente em bairros como a Mooca e o Brás, foram destruídas pelo bombardeio indicriminado feito com canhões e aviões pelas forças legais, para

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desalojar os rebeldes, segundo a escritora Ilka Stern Cohen, em seu livro “Bombas sobre São Paulo- A Revolução de 1924” (UNESP,2007). Dos quase 700 mil habitantes da cidade, cerca de um terço fugiram para o interior do estado, para se refugiarem.

Como não havia mais condições de combater, o Coronel Herculano assinou o armistício, em 02 de outubro de 1932, com a autorização do Governador Pedro de Toledo, que posteriormente afirmou que foi pressionado pelas circunstãncias.

O Coronel Herculando foi declarado pelo governo federal como intervento federal, até que Getúlio Vargas enviasse um General para assumir o governo, o que aconteceu no dia 9 de Outubro. Descontente com a pecha de traidor que lhe foi imposta, o Coronel Herculano escreveu um artigo no jornal “O Estado de São Paulo”, expondo seus motivos (figura11).

Ainda no dia 2, o comando das forças paulistas manifestou sua disposição de cessar incondicionalmente a resistência armada, que se tornara impossível. O governo paulista delegou ao coronel Herculano o encargo de consultar o general Góis Monteiro sobre a situação em que ficaria a administração estadual.

Em resposta, o general Góis ordenou a deposição de Pedro de Toledo, instruindo o coronel Herculano para que assumisse imediatamente o governo militar do estado de São Paulo de acordo com Luiz Octavio de lima em seu livro 1932- São Paulo em Chamas.

Figura 11. Reprodução do Jornal “O Estado de São Paulo” de 09 de Outubro de 1932, onde o Coronel Herculano de Carvalho e Silva explica as razões que o levaram a assinar o

ar-mistício.

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No brevíssimo período de seu governo, Herculano de Carvalho e Silva precisou en-frentar não só o repúdio de boa parte da opinião paulista, que lhe lançava acusações de traição e de ter aceito uma rendição vergonhosa, humilhante, como também a resistência de alguns comandantes militares. O coronel Euclides de Figueiredo chegou mesmo a organizar uma co-luna com a qual tentou atingir Mato Grosso e prosseguir na resistência.

Houve uma insatisfação muito grande por parte da população, com o Armistício, pois ainda acreditavam na possibilidade de luta, insuflados por alguns políticos paulistas. Por este motivo, o Coronel Herculano foi acusado, por muitos anos de traidor, sendo sua honra restau-rada apenas próximo à sua morte, na década de 1960, quando um movimento de alguns jornais resgatou sua história e demonstrou que sua difícil decisão salvou milhares de vidas e livrou São Paulo da destruição.

Estimativas oficiais dão conta de cerca de 900 mortos entre os combatentes constitu-cionalistas. Não oficialmente, seriam cerca de 2000 mortos. As tropas federais teriam 1050 mortos e mais de 3000 feridos.

Conclusão

Em entrevista pessoal realizada no dia 25 de julho de 2019 com o historiador Marco Antônio Villa (figura 12), foram abordados dois pontos sobre o armistício. No primeiro, de acordo com suas pesquisas, não havia condições militares para se os combates fossem mantidos pelos revolucionários por muito mais tempo, e prolongar a resistência só traria a perda inútil de mais vidas e propriedades.

No segundo ponto, o Professor Villa acredita que o Coronel Herculano teve autoriza-ção do General Klinger para fazer as negociações, não havendo então o que se falar em traiautoriza-ção de fato, tanto é que o próprio Klinger já havia iniciado as negociações, ainda no final de setem-bro.

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Figura 12. O autor em entrevista com o Professor Marco Antonio Villa.

Fonte: foto tirada pelo autor.

Ao analisarmos as hipóteses, já apresentadas, podemos verificar que, quanto à primeira, não houve traição por parte do General Klinger ou do Coronel Herculano em iniciarem as ne-gociações, pois não havia mais condições de se sustentar os combates, tendo em vista a escassez de homens, armas e munições, e ao cerco das forças legais ao Estado de São Paulo.

Tampouco pode prosperar a segunda hipótese, de que houve uma traição da Força Pú-blica e do seu Comandante, o Coronel Herculano, ao Comandante da Revolução Constitucio-nalista, General Klinger. As negociações com o governo Vargas já estavam sendo feitas pelo General Klinger desde 27 de setembro. Após três infrutíferas tentativas, o Coronel Herculano solicitou autorização para participar das negociações, no que foi autorizado por Klinger.

O General Góis Monteiro, comandante das forças legais, promoveu um encontro em separado com emissários da Força Pública. O motivo do General Klinger ter feito comentários desonrosos contra a Força Pública e contra Herculano é de que os termos do armistício benefi-ciavam a Força Pública e seus Oficiais, que não seriam presos e punidos, enquanto os Oficiais revoltosos do Exército Brasileiro, entre eles o próprio Klinger, seriam presos e posteriormente exilados.

Na terceira hipótese, afastamos a ideia de traição relacionada ao armistício. Após análise dos fatos, podemos chegar a esta conclusão devido à necessidade urgente e imperiosa de colocar fim à matança e à destruição que ceifavam as vidas de paulistas e dos seus irmãos de outros estados.

“ A verdade é que a ação da FP foi preventiva. A resistência militar seria inútil, aumentaria o custo humano da guerra, especialmente da população civil elevaria à destruição da infraestrutura e da base econômica de áreas ode estavam ocorrendo os

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combates e criaria uma ruptura social e política de proporções inimagináveis entre os derrotados e os vitoriosos” (Villa, 2010).

O Coronel Herculano foi obrigado a aceitar os termos da rendição, pois só assim o go-verno federal aceitaria firmar um armistício. Esta decisão, embora difícil, era a melhor a ser tomada, tendo em vista o cenário de momento.

Durante muitos anos, o Coronel Herculano foi acusado de traidor por antigos compa-nheiros revolucionários. Somente na década de 1960, através de uma campanha em vários jor-nais paulistas, para esclarecer como se deu o armistício, é que foi possível reabilitar sua ima-gem, um pouco antes de seu falecimento em 11 de março de 1963. Em 1982, seu nome foi dado ao 2º Batalhão da Policia Militar do Estado de São Paulo, uma das suas mais antigas Unidades, que passou a se chamar 2ºBatalhão de Polícia Militar Metropolitanos “Coronel Herculano de Carvalho e Silva”.

Apesar da derrota militar, o espírito da Revolução de 1932 jamais foi subjugado. Em 1933 realizaram-se eleições para a Constituinte, que em 1934 entregou ao Brasil uma nova Constituição, satisfazendo assim uma das exigências dos constitucionalistas.

Esse espírito de luta pela legalidade existe até hoje, seja no Obelisco do Ibirapuera (figura 13), monumento aos heróis mortos de 1932, e inaugurado em 9 de julho de 1955, seja na Sociedade dos Veteranos de 1932, encarregada de preservar esses ideais e que realiza um desfile cívico-militar em São Paulo, todos os dias 9 de Julho.

Figura 13. Obelisco do Parque do Ibirapuera em homenagem aos heróis de 1932.

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ARMISTICE IN THE CONSTITUTIONALIST REVOLUTION OF 1932. Result of a betrayal?

MÁRCIO SANTIAGO HIGASHI COUTO

Summary

The 1932 Constitutionalist Revolution marked twentieth-century Brazil. Within this context, we will explore the reasons that led to its outbreak, the way the fighting took place, and the political backstage of this historical episode, which for some historians had an inevitable out-come. However, the problem with this research is to analyze the way in which the 1932 Revo-lution ended, addressing the controversies about the fact. The aim of the research is mainly to analyze the facts that led the constitutionalist revolutionaries to defeat by arms and to the armi-stice with the government of Getúlio Vargas and its consequences.

Key words. Constitutionalist Revolution of 1932. Armistice. Bertoldo Klinger. Herculano de Carvalho e Silva

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REFERÊNCIAS

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CAPELATO, Maria Helena. O movimento de 1932: a causa paulista. São Paulo.Brasiliense, 1981.

COHEN, Ilka Stern. Bombas sobre São Paulo: A Revolução de 1924. São Paulo. Editora UNESP, 2007.

DAROZ, Carlos. O Fantasma da morte. Disponível em: http://darozhistoriamilitar.blogs-pot.com/2010/05/o-fantasma-da-morte-o-trem-blindado.html. Acessado em 02 de fevereiro de 2019.

DONATO, Hernani. A Revolução de 32. São Paulo. Editora Abril, 1982.

FIGUEIREDO, Euclydes. Contribuição para a história da Revolução Constitucionalista de 1932. São Paulo. Martins, 1981.

KLINGER, Bertholdo et alli. Nós e a Ditadura. A Jornada Revolucionária de 1932. Rio de Janeiro. Sem editora. 1933.

LIMA, Luiz Octavio de. 1932- São Paulo em Chamas. São Paulo. Editora Planeta do Brasil, 2018.

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VILLA, Marco Antonio. 1932: Imagens de Uma Revolução. São Paulo, Imprensa Oficial do Estado, 2008.

______A Revolução de 1932: Constituição e Cidadania. São Paulo, Imprensa Oficial do Es-tado, 2010.

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Entrevista realizada com o Professor e Historiador Marco Antonio Villa em 25 de julho de 2019, nas dependências do quartel do 2ºBatalhão de Polícia Militar Metropolitano “Coronel Herculano de Carvalho e Silva”.

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