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Comparação de traços psicopáticos entre jovens infratores e não-infratores

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G

USTAVO

B

ONINI

C

ASTELLANA

Comparação de traços psicopáticos entre jovens

infratores e não-infratores

Dissertação apresentada à Faculdade de

Medicina da Universidade de São Paulo para

obtenção do título de mestre em Ciências

Programa de Psiquiatria

Orientador: Prof. Dr. Geraldo Busatto Filho

São Paulo

(2)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Preparada pela Biblioteca da

Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

©reprodução autorizada pelo autor

Castellana, Gustavo Bonini

Comparação de traços psicopáticos entre jovens infratores e não-infratores / Gustavo Bonini Castellana. -- São Paulo, 2014.

Dissertação(mestrado)--Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Programa de Psiquiatria.

Orientador: Geraldo Busatto Filho.

Descritores: 1.Delinquencia juvenil/psicologia 2.Transtorno da personalidade antissocial 3.Eletrofisiologia 4.Transtorno da personalidade/diagnóstico 5.Transtorno da conduta/psicologia 6.Adolescente

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Dedicatória

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Agradecimentos

A Geraldo Busatto Filho, orientador com quem tive o privilégio de aprender a importância do rigor e do espírito científico, e a quem devo a motivação para a pesquisa em Psiquiatria.

A Daniel Martins de Barros, não só pela coautoria deste projeto, mas também pelo aprendizado contínuo e pela parceria profícua no trabalho e nas reflexões acerca da Psiquiatria Forense.

A Antonio de Padua Serafim, que desvendou os caminhos para a pesquisa científica nesta área, e participou ativamente na supervisão deste trabalho com contribuições imprescindíveis.

A July Silveira Gomes, Rosana Cavalcante Fonseca e Maria Fernanda Faria Acha, às quais devo tudo que aprendi sobre psicofisiologia e neuropsicologia, e cujos trabalhos árduos na coleta dos dados tornaram possível a execução deste projeto.

A Rosana Cristina Squitino Aun, diretora da UAISAS - Raposo Tavares da Fundação Casa, e a toda sua equipe, que encara desafios intransponíveis diariamente, e ainda assim disponibilizaram tudo que estava ao alcance para tornar este projeto possível. Aos coordenadores do “Intel Clubhouse”, que nos abriram as portas generosamente e nos gratificou compartilhando seus sucessos e fracassos na partilha diária com os jovens da comunidade.

A todos os jovens que participaram da amostra deste estudo, permitindo que pudéssemos conhecer sua história intimamente, com a esperança de que possamos, um dia, retribuí-los com o nosso conhecimento.

A meus saudosos avós Cesare, Mirian e Nãna (in memorian), que dedicaram suas vidas a seus filhos e netos, bravamente superando as dificuldades sendo impossível retribuir-lhes toda a gratidão.

A meu pai, cujo comprometimento e integridade me inspiram no exercício da profissão. À minha mãe, cuja sensibilidade e determinação nutrem diariamente o prazer de viver. À minha esposa Luciana, cujo carinho infinito e sensatez admirável tornam mais leves os momentos difíceis e mais ricos os desafios. À minha filha Helena, pela alegria e por cada sorriso, essência da vida.

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Normas adotadas

Esta dissertação está de acordo com as seguintes normas, em vigor no momento desta publicação:

Referências: adaptado de International Committee of Medical Journals Editors (Vancouver).

Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina. Divisão de Biblioteca e Documentação. Guia de apresentação de dissertações, teses e monografias. Elaborado por Anneliese Carneiro da Cunha, Maria Julia de A. L. Freddi, Maria F. Crestana, Marinalva de Souza Aragão, Suely Campos Cardoso, Valéria Vilhena. 3a ed. São Paulo: Divisão de Biblioteca e Documentação; 2011.

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Sumário

Lista de abreviaturas ... Lista de ilustrações ... Lista de tabelas ... RESUMO ... ABSTRACT ...

1. INTRODUÇÃO ... 1

1.1. Delinquência juvenil ... 2

1.2. Fatores associados à delinquência juvenil ... 4

1.3. Traços psicopáticos em jovens infratores ... 8

1.4. Comportamento antissocial e atividade elétrica da pele (AEP) ... 14

1.5. Resposta autonômica em jovens infratores ... 19

1.6. Estudos anteriores com jovens infratores em nosso meio ... 20

2. OBJETIVOS ... 23

2.1. Objetivo principal ... 23

2.2. Objetivo secundário ... 24

3. MÉTODOS ... 25

3.1. População e local de estudo ... 25

3.2. Instrumentos ... 27

3.2.1. Avaliação de psicopatia ... 27

3.2.2. Diagnóstico de transtornos mentais ... 28

3.2.3. Uso de álcool e outras drogas ... 29

3.2.4. Estimativa de nível intelectual ... 29

3.2.5. Critério de Classificação Econômica Brasil ... 30

3.3. Medidas psicofisiológicas (AEP) ... 31

3.3.1. Coleta de dados de AEP ... 31

3.3.2. Parâmetros de AEP avaliados ... 33

3.4. Análise estatística dos dados ... 37

3.5. Aspectos éticos ... 38

4. RESULTADOS ... 40

4.1. Características gerais da amostra ... 40

4.2. Avaliação de traços psicopáticos pela PCL-R ... 42

4.3. Avaliação de resposta psicofisiológica ... 43

5. DISCUSSÃO ... 46

5.1. Comparação de traços psicopáticos entre jovens infratores e grupo controle ... 46

5.2. Comparação da resposta psicofisiológica entre jovens infratores e grupo controle ... 52

5.3. Considerações metodológicas... 57

5.4. Considerações éticas acerca das implicações deste estudo ... 60

6. CONCLUSÕES ... 63

7. ANEXOS ... 65

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Lista de abreviaturas

AEP - Atividade elétrica da pele EDA- Electrodermal activity

GSR- Galvanic Skin response

SR- skin resistance

SC- skin conductance

ed. - edição et al. - e outros

IAPS - International Affective Pictures System p.- página

PCL-R - Psychopathy Checklist Revised rev.- revista

v. - volume

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Lista de ilustrações

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Lista de tabelas

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RESUMO

Castellana GB. Comparação de traços psicopáticos entre jovens infratores e não-infratores [dissertação]. São Paulo: Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo; 2014.

Introdução: A prática de atos infracionais e comportamento antissocial entre jovens podem estar associados a traços psicopáticos constitucionais (primários) ou ambientais (secundários) presentes no desenvolvimento desses indivíduos. O comportamento antissocial também está associado com a resposta autonômica diminuída diante de estímulos com saliência emocional. O objetivo deste trabalho foi analisar as diferenças de traços psicopáticos primários e secundários entre jovens infratores e jovens da comunidade com nível socioeconômico semelhante. Foi também objetivo a comparação dos padrões de resposta autonômica frente a estímulos visuais agradáveis, neutros e desagradáveis entre os grupos. Métodos: A escala Psychopathy Checklist-Revised (PCL-R) foi utilizada para identificar se jovens infratores do sexo masculino, que cumpriam medida socioeducativa de internação nas unidades da Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA) em São Paulo, apresentavam diferenças na sua pontuação total, e especificamente no fator 1 ou fator 2 da escala, quando comparados com outros jovens da comunidade, em condições socioeconômicas semelhantes. Para isso foram excluídos da amostra os jovens que apresentavam critérios para Transtornos mentais ou Retardo mental de acordo com a Mini-International Neuropsychiatric Interview(MINI) e escala Wechsler de inteligência para adultos (WAIS- III), respectivamente. Foram também excluídos da comparação aqueles que apresentaram pontuação condizente com o critério de psicopatia no Brasil (igual ou maior que 23 pontos na escala PCL-R). A resposta autonômica foi avaliada por meio das medidas de latência, amplitude e labilidade da atividade elétrica da pele (AEP) diante de imagens agradáveis, neutras e desagradáveis do International Affective Picture System (IAPS). Resultados: 39 infratores e 31 jovens do grupo controle foram comparados em relação aos traços psicopáticos. Os grupos apresentaram diferenças estatisticamente significativas (p<0,01) na pontuação média do PCL-R, sendo 13.4 a pontuação média entre infratores e 2.1 entre não-infratores. Foram encontradas também diferenças estatisticamente significativas entre os grupos quando analisadas separadamente as médias de pontuação no fator 1 (p<0,01) e fator 2 (p<0,01) da PCL-R. Apesar dos grupos terem apresentado diferença estatisticamente significativa (p<0,01) nos níveis educacionais, a ANCOVA realizada para comparar os resultados da média de pontuação na PCL-R entre os grupos, controlando para nível educacional, mostrou que a diferença nos resultados da PCL-R permaneceu estatisticamente significativa (p<0,01). Na comparação da resposta autonômica foi possível a inclusão de 33 infratores com os mesmos 31 do grupo controle. Foram também encontradas diferenças estatisticamente significativas (p<0,01) na amplitude da AEP, sendo que o grupo de infratores apresentou maior ativação autonômica para estímulos agradáveis, porém menor ativação autonômica para estímulos desagradáveis. Conclusões: nesta amostra, tanto a presença de traços psicopáticos primários - associados a características constitucionais - quanto de traços psicopáticos secundários - associados a características ambientais, foram maiores entre infratores. No entanto a proporção de cada um destes fatores foi a mesma entre os grupos, com predominância dos traços secundários em ambos os grupos. Portanto não se pode atribuir a delinquência juvenil nesta amostra a nenhum fator especificamente - constitucional ou ambiental-, ainda que os fatores ambientais tenham contribuído de forma mais significativa para os traços psicopáticos na amostra como um todo. Os padrões de ativação autonômica entre infratores indicam que as respostas emocionais destes jovens diante dos estímulos agradáveis e desagradáveis do ambiente são diferentes dos outros jovens da comunidade, apontando características singulares da reação emocional de jovens infratores. Os resultados sugerem a necessidade de intervenções amplas, não restritas a aspectos socioeconômicos, na abordagem da delinquência juvenil.

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ABSTRACT

Castellana GB. Comparison of psychopathic traits between young offenders and non-offenders [dissertation]. São Paulo: Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo; 2014.

Introduction: The perpetration of infractional acts and display of antisocial behavior among young people may be associated with constitutional (primary) or environmental psychopathic traits (secondary) present in their development. Antisocial behavior is also associated with impaired autonomic response to emotionally charged stimuli. The aim of this study was to analyze the differences in primary and secondary psychopathic traits among young offenders and youngsters with similar socioeconomic status in a community. Another objective was to compare the patterns of autonomic response to pleasant, unpleasant and neutral visual stimuli between groups. Method: The Psychopathy Checklist Revised (PCL-R) scale was used to identify whether male young offenders, who were detained at the units of Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA) at São Paulo, exhibited total score differences, and specifically for factor 1 or factor 2 of this scale, when compared with other young people in similar socioeconomic conditions from the community. To this end, young people who met the criteria for mental disorders or mental retardation were excluded, ased on the Mini-International Neuropsychiatric Interview (MINI) and Wechsler adult intelligence scale (WAIS- III), respectively. The comparison also excluded those who presented scores consistent with the criteria for psychopathy in Brazil (equal to or greater than 23 points on the PCL-R). The autonomic response was evaluated by means of latency, amplitude and lability of electrodermal activity (EDA) when presented with pleasant, unpleasant and neutral images from the International Affective Picture System (IAPS). Results: 39 offenders and 31 non-offenders were compared in relation to psychopathic traits. The groups presented statistically significant differences (p<0.01) in PCL-R score averages, being 13.4 the average score in the group of offenders and 2.1 in the non-offender group. Significant differences between the groups were also detected when factor 1 (p<0.01) and factor 2 (p<0.01) PCL-R score averages were analyzed separately. Although the groups presented statistically significant difference in educational level, the ANCOVA used to compare the PCL-R scores averages between the groups, controlling for educational level, showed that the difference in PCL-R scores remained statistically significant (p<0,01). In the comparison of autonomic response, it was possible to include 33 offenders with the same 31 from the control group. Statistically significant differences (p <0.01) in EDA amplitudes were also found, and the group of offenders showed greater autonomic activation to pleasant stimuli, but less autonomic activation to unpleasant stimuli. Conclusions: in this sample, both the presence of primary psychopathic traits (due to inherited characteristics) and secondary psychopathic traits (due to environmental factors) was greater among young offenders. However, the proportion of each of these factors was the same between groups, with predominance of secondary traits in both groups. Therefore, one cannot specifically attribute juvenile delinquency in this sample to any factor - constitutional or environmental - although the environmental factors contributed more significantly to psychopathic traits in the sample as a whole. Patterns of autonomic activation among offenders indicate that the emotional responses of these young people when presented with pleasant and unpleasant stimuli in the environment are different from the other youngsters of the community, indicating particular features in the emotional response of young offenders. These results suggest that addressing juvenile delinquency requires far-reaching interventions, not solely restricted to socioeconomic factors.

Descriptors: Juvenile delinquency/psychology; Antisocial personality disorder; Electrophysiology; Personality disorders/diagnosis; Conduct disorder/psychology; Adolescent

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1. INTRODUÇÃO

A psicopatia tem sido descrita com boa confiabilidade em todo o mundo como um preditor de reincidência criminal em adultos. Já a associação entre traços psicopáticos e o envolvimento com atos infracionais entre jovens têm sido menos estudada, e a investigação das causas da delinquência juvenil é muitas vezes limitada aos estudos que enfatizam os aspectos socioeconômicos associados à inserção dos jovens na criminalidade.

Atualmente, a avaliação de traços psicopáticos por meio de instrumentos validados inclui tanto características de personalidade determinados eminentemente pela constituição da personalidade do indivíduo quanto características associadas às variáveis psicossociais do ambiente onde se desenvolveu.

Por outro lado, muitos autores, ao avaliarem os aspectos biológicos da psicopatia em adultos e do comportamento antissocial em adolescentes, têm encontrado na hiporesponsividade do Sistema Nervoso Autônomo (SNA) a explicação para estes fenômenos. No entanto, tais estudos não têm levado em consideração as condições socioeconômicas onde os indivíduos se desenvolveram. A inclusão desta variável poderia ajudar a entender a relevância de cada um dos componentes- biológicos e socioambientais- que influenciam no comportamento antissocial dos infratores.

(13)

A motivação para a pesquisa foi a importância da compreensão dos fenômenos associados aos traços psicopáticos e ao comportamento antissocial entre jovens infratores, que podem ser decisivas para que ações e intervenções sejam tomadas de forma racional e assertiva frente às demandas específicas desta população.

1.1. Delinquência juvenil

O fenômeno da delinquência juvenil é um dos grandes problemas das sociedades contemporâneas, e de comum interesse às áreas de estudo em ciências naturais e humanas, envolvendo o interesse de médicos, antropólogos, educadores, psicólogos, juízes, políticos, enfim, de toda a sociedade. Por isso, a delinquência juvenil é uma definição legal, e não clínica1-2.

Em 1909, o Juiz de Direito Julian Mack já ressaltava a importância de se entender melhor os jovens envolvidos com o crime: “O problema para a decisão do Juiz não é o que este jovem fez de errado, mas quem é ele, como ele se tronou o que é, e o que poderia ser feito em seu interesse e no interesse do Estado para salvá-lo de um modo de vida decadente” (Juiz Julian Mack, 1909, tradução nossa)3.

O período pós-segunda guerra, caracterizado pelo caos econômico e social do mundo ocidental, é considerado um marco no aumento da delinquência juvenil. Desde então, diversos autores têm estudado as causas biológicas, psicológicas e sociais do problema4.

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No Brasil, menores de idade que praticam atos infracionais correspondentes a qualquer crime em adultos são chamados de menores ou jovens infratores. São considerados inimputáveis de acordo com o Código Penal6, isto é, não podem ser penalmente responsabilizados por seus atos, e estão sujeitos, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ao cumprimento de medida socioeducativa7. Esta será determinada a critério do Juiz da Vara da Infância e Juventude, que pode aplicar, a depender da gravidade e da repercussão social do ato, as seguintes medidas ao adolescente:

I- advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semi-liberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

Portanto, com o objetivo de garantir a segurança pessoal do adolescente e manter a ordem pública, o adolescente poderá ser privado de sua liberdade em caso de flagrante ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada do Juiz da Infância e da Juventude. Nesses casos, o menor poderá ficar internado por no máximo 3 anos ou até completar 21 anos7.

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Direitos Humanos, há 60 mil adolescentes cumprindo medidas socioeducativas no Brasil, sendo 14 mil em regime de internação e os demais em regime aberto8. O número de jovens infratores aumentou de 4245 em 1996 para 17703 em 2010 (equivalente a 88 por 100000 habitantes em 2010)9.

Nos últimos dez anos, o número de jovens infratores aumentou 138% 10. Os atos infracionais praticados por adolescentes também aumentaram aproximadamente 80% em 12 anos, ao subir de 8 mil, em 2000, para 14,4 mil, em 2012 - diferentemente do que ocorre em relação aos crimes praticados por maiores de 18 anos, que vêm diminuindo na última década na cidade de São Paulo11.

De acordo com dados da Fundação CASA12 (Centro de atendimento socioeducativo ao adolescente), autarquia responsável pelo programa socioeducativo para adolescentes privados de liberdade no Estado de São Paulo, cerca de 90% dos internos é composta por jovens do sexo masculino, que possuem entre 12 e 21 anos.

Dentre os atos infracionais cometidos, cerca de 44,1% estão detidos por roubo, 41,8% por tráfico de drogas e 1,5% por homicídio ou latrocínio. Do total geral de infrações violentas, tais como homicídio e latrocínio, tais jovens foram responsáveis por 4% no ano de 201213. Tais dados têm levado psiquiatras, psicólogos, sociólogos e educadores a tentar entender as causas da delinquência juvenil.

1.2. Fatores associados à delinquência juvenil

(16)

maus-tratos na infância; uso e abuso de drogas, violência familiar e baixa escolaridade, correlacionam-se com fatores de risco para a origem e manutenção do comportamento violento na infância e adolescência14-17.

A relevância de precárias condições socioeconômicas também tem sido proposta por vários autores que estudaram crianças e adolescentes com comportamentos antissociais18,19.

Curto et al.20 estudaram adolescentes de uma comunidade pobre na periferia de São Paulo e também encontrou a associação de fatores psicossociais, tais como a presença de punição física severa e a falta de pai (ou outro tutor masculino), com comportamento antissocial.

Kiriakidis, no entanto, defende que focando apenas em fatores sociais que facilitam a delinquência, com a exclusão de características individuais, fornece-se apenas uma visão parcial do quebra-cabeça do infrator. O autor cita o estudo de Short & Meier em 1981, no qual argumentam que a delinqüência em geral pode ser conceitualizada e testada em diferentes níveis de explicação. Eles identificaram o nível individual, onde o foco é sobre as características individuais, o nível macrosociológico,

com foco no papel dos sistemas sociais e variação cultural para explicar a delinqüência e o nívelmicrossociológico, que incide sobre determinantes situacionais da delinqüência em termos de papel e referência de grupos e os processos de interação contínua. Sugerem que “um maior entendimento da delinquência deve considerar a pesquisa interdisciplinar em todos os níveis de análise com o objetivo de reconhecer diferente níveis de explicação e de buscar pontes entre eles”21.

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prevalência de depressão e transtornos do desenvolvimento em jovens infratores suecos de 15 a 21 anos quando comparados a criminosos mais velhos. Transtorno de Déficit de Atenção (TDAH), Abuso de substâncias e Transtornos de conduta também são mais prevalentes na população de jovens infratores em relação à população geral.15,23-26.

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Tabela 1- Fatores sociológicos e biológicos associados à delinquência juvenil

Fatores socioambientais25-29 Fatores biológico30-32

-Sexo: homens 6x mais que mulheres -Raça: negros 5x mais que brancos -Idade: aumento progressivo de crimes entre 13 e 18 anos

-Baixo status socioeconômico

-História pessoal e familiar de violência -Uso de armas e participação em gangues

-Baixa escolaridade e evasão escolar

-Transtornos de conduta: 30-90% -TDAH: 1-34%

-Depressão: 2-36% -TEPT: 30-40%

-Abuso de substâncias: 40-69% -Retardo mental: 5-27%

TEPT: Transtorno de estresse pós-traumático; TDAH: Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade

Existem diferentes formas de associação entre os transtornos mentais e o comportamento antissocial de jovens infratores, podendo os transtornos serem desde a causa até a consequência do seu comportamento antissocial34. Em especial, destaca-se a confluência de aspectos ditos biológicos ou constitucionais, por um lado, e psicossociais ou socioambientais, por outro, que moldam o desenvolvimento da personalidade, influenciando o padrão de comportamento e tomada de decisões ao longo da vida21. Em alguns casos, o comportamento poderá ser condizente com a psicopatia, que está associada à persistência e reincidência no crime. Estudos apontam para prevalência de psicopatia 9,4% e 37% entre os jovens infratores internados15,34-37..

(19)

ajudar a compreender a relevância dos aspectos constitucionais e ambientais no fenômeno da delinquência juvenil.

1.3. Traços psicopáticos em jovens infratores

As primeiras descrições que remetem à psicopatia são descrições de comportamentos que eram vistos como moralmente repugnantes. Assim, Pinel cunhou o termo “manie sens delire” em 1801 para descrever pacientes envolvidos em atos impulsivos e auto-destrutivos, que tinham sua habilidade de raciocínio intacta e tinham

consciência da irracionalidade do que estavam fazendo38.

Posteriormente, tais fenômenos foram estudados por Prichard, que os intitulou

moral insanity” em 1835. Em 1888 Koch usa pela primeira vez o termo “inferioridade psicopática”, sendo posteriormente chamada de “personalidade psicopática” por Kraepelin em 190439.

Desde então, diversos autores tem buscado entender as causas e características destes indivíduos. Schneider, em 1923, agrupa nas “Personalidades psicopáticas” os “desalmados” ou “frios de alma”, apontando a frieza emocional como a principal característica desta população40.

(20)

reforço e punição, levando ao diagnóstico de perturbação sociopática da personalidade

ou sociopatia.

Cleckley descreveu o psicopata prototípico como um indivíduo que superficialmente charmoso e inteligente, mas também pouco sincero, mentiroso, egocêntrico, que não sentia remorso ou vergonha. Psicopatas foram caracterizados como engajados em comportamentos aversivos, com uma vida sexual impessoal, que não seguem nenhum plano de vida, e estão sujeitas a “comportamento antissocial inadequadamente motivado”. No entanto, eles geralmente eram considerados sem outros sinais de outros transtornos mentais, como a ansiedade neurótica, delírios ou outros pensamentos irracionais35.

Assim, a definição da personalidade antissocial no DSM-II, influenciada pelo estudo de Cleckley, apontava para características consideradas inatas do sujeito. O Transtorno de personalidade antissocial (TPAS) passava a ser caracterizado pelos seguintes sintomas: indivíduos não socializados; impulsivos; sem culpa ou remorso; egoístas; indivíduos insensíveis que racionalizavam seu comportamento e que não aprendiam com a experiência41.

Nos DSM III de 1980 e no DSM-IV de 1994, um agrupamento de características ambientais e constitucionais passou a caracterizar o TPAS.

Ainda que tentassem descrever fenômenos parecidos que buscavam compreender o comportamento antissocial, é provável que as diversas definições incluíssem um construto mais heterogêneo, que incluiria sob o mesmo diagnóstico sujeitos com comportamentos semelhantes, mas com características de personalidades diferentes. A psicopatia se refere, portanto, a um grupo bastante heterogêneo42-43.

(21)

De acordo com este autor, enquanto psicopatas secundários resultam de conflitos emocionais não resolvidos produzidos pela exposição a fatores psicossociais e ambientais, psicopatas primários resultariam de um déficit “constitucional”.

Desde então, esta hipótese tem sido sustentada por vários estudos avaliando amostras de psicopatas com diferentes abordagens teóricas42,45-47. Atualmente há consenso em relação à validade de diferenciar características interpessoais/afetivos (que correspondem aos psicopatas primários e são mais constitucionalmente adquiridos), daqueles fatores associados ao estilo de vida e comportamento antissocial (que correspondem às variantes secundárias e são mais influenciados pelo ambiente)35,48-52.

Paralelamente, apsicopatia foi reformulada por Hare que, em 1991, estabeleceu novos critérios para a identificação da síndrome e desenvolveu um instrumento que, ao longo dos últimos anos, se tornou o padrão-ouro para avaliação desta síndrome em contextos forenses e correcionais: a Psychopathy Checklist-Revised (PCL-R). A PCL-R é composta por 20 itens (ver Tabela 1) que se destinam a corresponder à conceituação original de Cleckley desta síndrome 53-55. No entanto, como inicialmente foi desenvolvida e validada em amostras forenses e correcionais, a formulação de psicopatia da PCL-R (e seu antecessor, a PCL) é mais fortemente tendenciosa para os itens relacionados com a criminalidade e um estilo de vida socialmente desviantes (por exemplo, delinquência juvenil, revogação da liberdade condicional, versatilidade criminal) do que foi criado originalmente por Cleckley35.

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duvidosa) e 2 pontos (presença evidente), com base em entrevista pessoal e informações colaterais, totalizando 0 a 40 pontos.

A partir de então, os estudos começaram a se multiplicar levando em conta a definição de Hare. Foram sendo então identificadas diversas características dos criminosos psicopatas, como a total incapacidade de modificar o comportamento por meio da punição ou de exibir alterações fisiológicas em situações emocionalmente estressantes55.

Hart and Hare (1996)56 argumentam que o critério de corte para diagnóstico de psicopatia da PCL-R ideal estaria entre 28 e 32 do total de 40 pontos. No entanto alguns autores têm usado pontuações de corte mais baixa57. Estudos com adolescentes tem usado critério de corte entre 22 e 3015.

No Brasil, a validação da escala para uso em adultos encontrou a pontuação de corte em 23 pontos. A partir deste estudo, Morana propõe ainda a estratificação ainda de traços psicopáticos para aqueles que pontuaram entre 12 e 23 pontos, argumentando que tais indivíduos apresentariam traços estáveis de personalidade que predisporiam ao crime e comportamentos antissociais56.

O estudo com jovens infratores também passou a se proliferar com a escala

PCL-R youth version, que apresenta também 20 critérios adaptados para a aplicação em adolescentes até 18 anos, trazendo contribuições relevantes para a compreensão dos traços psicopáticos nesta população em especial.

(23)

Domes avaliou a capacidade de empatia- e de seus componentes cognitivo e emocional- entre 90 jovens infratores na Alemanha, e não encontrou correlação com o nível de psicopatia. No entanto, os infratores apresentaram menores escores para ambos os componentes da empatia, e tais associações estavam associadas ao nível educacional e disposição social, mostrando a influência do desenvolvimento social e da escolaridade na delinquência juvenil nesta amostra. De forma semelhante, Hanoch, na Inglaterra, comparando a personalidade de 44 infratores com 46 não infratores concluiu que não havia relações de impulsividade com a criminalidade, porém encontrou relações significativas entre impulsividade e o nível de escolaridade60-61.

Assim, na última década, as pesquisas sobre o comportamento antissocial (agressividade, psicopatia e problemas de conduta), foram capazes de identificar vários percursos biológicos, psicológicos e sociais que, potencialmente, levam a esses comportamentos62. Apesar da reconhecida influência das condições socioeconômicas, esta variável isoladamente não explica a delinquência juvenil, e abre a questão sobre quais fatores seriam predominantes na determinação da delinquência entre os jovens: traços constitucionais herdados geneticamente, ou traços adquiridos associados ao ambiente psicossocial?63-64.

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Quadro 1: Critérios da PCL-R de acordo com os fatores 1 e 2

Fator 1 – Insensibilidade Afetiva Fator 2 – Comportamento

Antissocial Loquacidade / Charme superficial

Superestima Mentira patológica Vigarice / manipulação

Ausência de remorso ou culpa Insensibilidade afetivo-emocional Indiferença / Falta de empatia

Incapacidade de aceitar responsabilidade pelos próprios atos

Necessidade de estimulação/ tendência ao tédio

Estilo de vida parasitário Descontroles comportamentais Transtornos de conduta na infância Ausência de metas realistas e de longo prazo

Impulsividade Irresponsabilidade Delinqüência juvenil

Revogação da liberdade condicional

Outros critérios Promiscuidade sexual

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1.4. Comportamento antissocial e atividade elétrica da pele (AEP)

De acordo com Crider66, atividade eletrodérmica (electrodermal activity; EDA) ou atividade elétrica da pele (AEP) é um termo utilizado para definir mudanças autonômicas nas propriedades elétricas da pele. A propriedade mais estudada é a condutância da pele, que pode ser quantificada aplicando potenciais elétricos entre dois pontos de contato da pele e medindo a corrente resultante entre eles. A atividade eletrodérmica inclui tanto o nível tônico da condutividade da pele quanto o componente fásico decorrente da variação ou pico de resposta simpática em decorrência da apresentação de um estímulo. Ao conjunto de alterações que ocorrem na resposta eletrodermal dá-se o nome de resposta galvânica da pele (galvanic skin response; GSR)67-69.

A condutividade elétrica da pele se faz por meio da passagem de uma microcorrente elétrica insensível pela superfície da pele, medindo-se a resistência a essa passagem. Quando as glândulas sudoríparas estão ativas a resistência da passagem da corrente diminui. Em caso contrário a resistência aumenta. A medida da resistência elétrica traduz a atividade ou inatividade das glândulas sudoríparas as quais, por sua vez, são um reflexo da atividade do SNA simpático56.

(26)

Filogeneticamente, o SNA é um componente importante e antigo do sistema nervoso que controla funcionamentos viscerais como tecidos cardiovasculares (coração, vasos sanguíneos), músculos lisos (órgãos mais visceral), glândulas (endócrinas e sistemas exócrina) e sensoriais (olhos, pele), com funções específicas na adaptação fisiológica e comportamental71. Assim, a análise do padrão de resposta elétrica da pele - a atividade eletrodérmica - permite estabelecer a relação entre estado emocional e a atividade do SNA.

Em 1957, Lykken demonstrou que indivíduos antissociais diagnosticados como psicopatas apresentavam condicionamento prejudicado, ou extinção mais rápida da atividade eletrodérmica, num experimento paradigmático de condicionamento aversivo por meio de choques72.

A partir dos estudos de Lykken, diversas investigações passaram a ser realizados nesta área, e o fenômeno da hiporreatividade eletrodérmica na psicopatia é considerado hoje um dos mais confiáveis correlatos psicofisiológicos da psicopatologia. Estudos da condutância da pele e sua correlação com agressividade impulsiva têm consistentemente apontado baixa excitação autonômica em ofensores criminais psicopatas e agressivos73.

Evidências mostram que anormalidades estruturais em indivíduos antissociais, em especial déficits no córtex pré-frontal e sistema límbico (córtex temporal, ínsula, amígdala, hipocampo e giro do cíngulo anterior e posterior) 74-75, poderiam explicar a resposta autonômica encontrada no comportamento antissocial.

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foram relacionados aos déficits de atividade eletrodérmica (mas não cardiovascular) dentro do grupo de TAPS76. Encontrou também que pessoas com TAPS em que a matéria cinzenta pré-frontal apresentou reduções de volume tiveram menor atividade da condutância da pele durante o estressor do que aqueles sem volume cinzento pré-frontal diminuído.

O córtex pré-frontal tem sido reconhecido como a estrutura cerebral mais frequentemente comprometida em populações de violentos e antissociais77-80. Yang e Raine, em meta-análise envolvendo 43 estudos com neuroimagem funcional e estrutural, encontraram reduções no volume de substância cinzenta no córtex orbitofrontal, dorsolateral frontal e córtex cingulado anterior do cíngulo pré-frontal em indivíduos com comportamento antissocial81. Além destes, a amígdala tem sido a estrutura do sistema límbico mais frequentemente associada a este fenômeno82-83.

Consistente com esses achados, as populações com danos no lobo frontal mostram aumento da extroversão, impulsividade, irritabilidade, agressividade e outros comportamentos antissociais84. Além disso, apresentam deficiências na capacidade de tomar decisões racionais e dificuldades no processamento das emoções85. Assim, uma desconexão funcional entre o córtex pré-frontal e regiões límbicas podem ser responsáveis pelo comportamento desinibido e por tomada de decisões com processamento emocional precário86.

De acordo com Critchley, as lesões do córtex pré-frontal e as estruturas do sistema límbico que constituem parte do circuito neural para processos cognitivo-emocionais podem cada um prejudicar tanto a resposta cognitiva quanto a resposta de atividade elétrica da pele87.

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após a apresentação de estímulos novos ou significativos, o que é considerado um componente da resposta orientada pelo estímulo89. No entanto, indivíduos com deficiência pré-frontal hipoteticamente sofrem déficit que interferem com o processamento normal de estímulos em seu ambiente, em última análise predispondo-os a um comportamento antissocial90-91. A correlação entre hiporreatividade autonômica e a psicopatia favorece a tese de que a frieza emocional é a característica central e essencial da psicopatia, mas os mecanismos e processos pelos quais os déficits pré-frontais e autonômico poderiam predispor ao comportamento antissocial são vários, de acordo com Raine et al: primeiro, o córtex pré-frontal é parte de uma rede de circuito neural que desempenha um papel central no condicionamento do medo e resposta ao estresse. O padrão de condicionamento estaria, então, associado com o desenvolvimento da consciência, e pessoas que são menos sensíveis autonomicamente a estímulos aversivos -como crítica social durante infância- seriam menos suscetível às punições sociais, e, portanto, tornam-se predispostos a comportamento antissocial. Experimentos têm repetidamente confirmado que grupos antissociais revelam condicionamento de medo precário. A hiporreatividade para estímulos aversivos seria interpretada, então, como o reflexo da insensibilidade emocional em indivíduos psicopatas92 . Essa perspectiva considera a hiporreatividade como um resultado de um sistema de inibição comportamental subativado93.

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uma baixa excitação que predispõe os indivíduos para os problemas desinibitórios e comportamento antissocial95.

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1.5. Resposta autonômica em jovens infratores

Os padrões de AEP associados a comportamento antissocial ou agressivo tem sido estudados em crianças com transtornos de conduta e jovens em conflito com as Leis. Redução da resposta eliciada pelo estímulo foi encontrada em jovens com transtorno de conduta e foram prospectivamente associados com comportamento criminoso em uma amostra da comunidade de adolescentes do sexo masculino 97, 98.

Há evidências de que mesmo crianças propensas a comportamento antissocial ou psicopatia tem amplitude de AEP menor para estímulos desagradáveis ou não. Herpertz, por exemplo, encontrou hiporresponsividade autonômica já em crianças de 8 a 13 com diagnóstico de Transtorno de conduta em comparação com crianças com TDAH ou sem diagnóstico psiquiátrico99-101.

Como são muitas as possíveis fontes de danos ao córtex pré-frontal que podem comprometer a capacidade de avaliar as consequências e de regular os impulsos, não fica claro se o padrão de resposta autonômica em jovens agressivos em condições sociais desfavoráveis está associado aos traços psicopáticos, a alterações da estrutura cerebral ou ao meio e condições onde se desenvolveram estes jovens.

Há evidências, em particular, que funções cognitivas frontais podem ser afetadas por fatores psicossociais, tais como privação e estímulos ambientais estressantes, sugerindo que os déficits nas funções cognitivas executivas podem ser mais prevalentes em bairros caracterizados como de baixa renda, de criminalidade e uso frequente de drogas, assim como nas famílias disfuncionais86,102.

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psicopatia. Yang aponta para a possibilidade de que os achados de alterações no córtex pré-frontal podem ser moderados por subfatores de PCL-R, em especial o subfator estilo de vida antissocial, que está mais associada com déficits frontais, tais como impulsividade e controle comportamental prejudicado103.

Assim, o estudo das respostas autonômicas em jovens infratores, correlacionando com os subfatores da PCL-R, poderia ajudar a entender se os padrões encontrados estão associadas aos fatores primários ou secundários da psicopatia.

1.6. Estudos anteriores com jovens infratores em nosso meio

Num estudo recente realizado no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), Barros avaliou a relação entre a pontuação na escala PCL-R e os resultados de medidas psicofisiológicas de 30 jovens infratores submetidos a medida de internação na Fundação Casa, nas unidades do Complexo Raposo Tavares. O objetivo deste trabalho era avaliar a relação entre a resposta psicofisiológica, o nível de julgamento moral e o grau de psicopatia51.

O autor não encontrou correlação entre o escore total de psicopatia e a AEP. No entanto, quando analisados de forma independente o fator 1 e 2 da PCL-R foram identificadas correlações significativas.

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Já em relação ao fator 2, a pesquisa demonstrou correlação inversa com a instabilidade da resposta diante dos estímulos neutros e desagradáveis, indicando maior controle vagal.

Este estudo foi o primeiro em nosso país a analisar a atividade elétrica da pele em jovens infratores, e indicou tendência parecida com as encontradas na literatura internacional. No entanto, o estudo ficou limitado à análise de infratores não psicopatas, pois todos os adolescentes avaliados pontuaram menos que 30 na escala PCL-R. Assim sendo, não foram incluídos indivíduos psicopatas de acordo com os critérios atuais propostos por Morana na validação da escala PCL-R para uso no Brasil104. Também não foi incluído naquele estudo um grupo controle com características sociodemográficas semelhantes às dos jovens internados, que permitisse uma comparação das respostas psicofisiológicas entre os jovens infratores e o grupo controle.

O estudo deixou em aberto, portanto, se os mesmos parâmetros psicofisiológicos são encontrados em jovens não-infratores de condições socioeconômicas semelhantes. O próprio autor ressalta a dificuldade desta avaliação, destacando que “se pretendêssemos comparar a resposta psicofisiológica de jovens infratores com não infratores, as variáveis de confusão tornariam a eleição de um grupo controle logisticamente inviável, não sendo possível encontrar número suficiente de indivíduos que, não sendo infratores, tenham traços semelhantes de psicopatia, origem social e nível intelectual ao dos delinquentes.”

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2. OBJETIVOS

Neste estudo objetivou-se avaliar a presença e as características específicas de traços psicopáticos entre jovens infratores sob medida socioeducativa de internação, em comparação com jovens não-infratores oriundos de extrato socioeconômico semelhante. Para tal, avaliou-se a presença de traços psicopáticos com entrevista semi-estruturada, além dos padrões de resposta emocional através da resposta psicofisiológica frente a estímulos.

2.1. Objetivo principal

O principal objetivo deste estudo foi a comparação da pontuação na escala de psicopatia PCL-R entre os jovens infratores e os jovens não-infratores.

Com este objetivo pretendia-se avaliar se existem diferenças entre infratores e não-infratores com relação aos traços psicopáticos- tanto na pontuação total quanto nos fatores 1 e 2 da escala, refletindo a predominância de características interpessoais e afetivas essencialmente constitucionais (associadas ao fator 1), ou do estilo de vida e comportamento antissocial influenciados pelo ambiente (associados ao fator 2).

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2.2. Objetivo secundário

Foi também objetivo deste estudo avaliar os parâmetros de resposta psicofisiológica de jovens infratores sem psicopatia em comparação a jovens não-infratores submetidos a condições socioeconômicas semelhantes.

Com este objetivo pretendia-se avaliar se jovens infratores apresentam padrões de resposta autonômica diferentes de outros jovens da comunidade, quando oriundos de condições socioeconômicas semelhantes.

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3. MÉTODOS

3.1. População e local de estudo

O estudo foi desenvolvido em dois locais diferentes: o grupo de infratores foi constituído pela avaliação de jovens infratores da unidade Raposo Tavares da Fundação CASA, enquanto o grupo controle foi constituído por moradores de uma comunidade de baixo perfil socioeconômico vizinha da unidade Raposo Tavares da Fundação CASA.

A Fundação CASA é uma autarquia do governo do Estado de São Paulo, vinculada à Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania, que presta assistência aos adolescentes do Estado de São Paulo. Tem como missão primordial aplicar em todo o Estado as diretrizes e as normas dispostas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), promovendo estudos e planejando soluções direcionadas ao atendimento de adolescentes autores de atos infracionais, na faixa de 12 a 18 anos12.

Os adolescentes encaminhados à Fundação CASA estão inseridos nas medidas socioeducativas de privação de liberdade (internação), semiliberdade e meio aberto (Liberdade Assistida e Prestação de Serviços à Comunidade). As medidas são aplicadas de acordo com o ato infracional e a idade dos adolescentes. Os jovens ficam internados por um período máximo de 3 anos ou até completarem 21 anos.

A Divisão Técnica da Unidade Raposo Tavares da Fundação Casa foi escolhida por ser composta por 5 unidades de internação, incluindo unidades específicas para infratores internados pela primeira vez (primários) e para os que já têm internações prévias (reincidentes), somando cerca de 200 internos.

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Os jovens foram convidados a participar por meio do contato dos coordenadores da ONG “Intel Computer Clubhouse Network”, localizada dentro da comunidade, onde tais jovens já haviam participado de cursos de aprimoramento gratuitos. Todos os jovens do sexo masculino maiores de 18 anos que já haviam participado destes cursos foram convidados. Após a chegada dos adolescentes à ONG- local onde foram desenvolvidas as entrevistas e avaliações psicofisiológicas- a seleção dos jovens era feita pelos pesquisadores seguindo os mesmos critérios do grupo de infratores.

Assim, foram convidados a participar estudo jovens infratores internos na Fundação Casa e jovens da comunidade de sexo masculino, maiores de 18 anos, com ensino médio completo ou em curso, que não estivessem em uso de medicamentos psicotrópicos.

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3.2. Instrumentos

A seguir descrevemos os instrumentos utilizados para avaliação de psicopatia, presença de transtornos mentais e transtornos associados ao uso de drogas, quociente de inteligência estimado e avaliação socioeconômica.

3.2.1. Avaliação de psicopatia

Para a avaliação de psicopatia será utilizada a PCL-R de Hare (1991), traduzida para uso no Brasil por Morana (anexo 1)34.

A PCL-R é o instrumento que dita os paradigmas da psicopatia atualmente. Foi criado em 1980 e traduzido e validado no Brasil em 2004. Trata-se de uma entrevista semi-estruturada composta por 20 itens que avaliam o grau de psicopatia. Cada um dos 20 itens pode ser pontuado através de uma escala numérica ordinal, sendo: 0 (Não), 1 (Talvez/em alguns aspectos) e 2 (Sim), totalizando 40 pontos.

Segundo Hare, podem-se conceituar traços de psicopatia quando o entrevistado pontua de 15 a 29 pontos, e a psicopatia deve ser considerada a partir de 30 pontos58. A validação da escala para uso no Brasil, no entanto, redefiniu os critérios para psicopatia estabelecendo em 23 pontos ou mais o critério para psicopatia, e entre 15 e 23 pontos os traços de psicopatia. Utilizaremos, portanto, os parâmetros estabelecidos por Morana para uso da escala no Brasil.

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fatores 1 e 2 completam a escala: promiscuidade sexual, muitas relações conjugais de curta duração e versatilidade criminal.

Seguindo orientação do manual, dada baixa média de idade da população estudada, estes últimos três fatores foram excluídos da pontuação final, e por isso o escore final foi corrigido levando em conta tais exclusões conforme orientações do manual.

Todas as entrevistas para aplicação da PCL-R foram realizadas pelo mesmo profissional, que recebera treinamento para a aplicação do instrumento e não conhecia os resultados das outras escalas ou testes, evitando assim o viés em sua avaliação.

3.2.2. Diagnóstico de transtornos mentais

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3.2.3. Uso de álcool e outras drogas

O “Clinician Drug Use Scale (DUS)”106 (Anexo 3) foi utilizado para avaliação específica do uso de álcool e outras drogas. Este instrumento permite uma avaliação objetiva do uso de diversas substâncias nos últimos 12 meses, podendo ser utilizado com e relatos espontâneos, entrevistas, observações do comportamento ou relatos de outros.

Neste estudo utilizamos o relato espontâneo, a entrevista clínica e informações de prontuário para ter acesso a esta informação. A escala pontua como 1 (abstinência), 2 (uso sem prejuízo), 3 (abuso), 4 (dependência) ou 5 (dependência grave).

A avaliação foi feita pelo próprio pesquisador responsável, que também foi responsável pela aplicação da PCL-R nos grupos de infratores e grupo controle e pela MINI no grupo controle.

3.2.4. Estimativa de nível intelectual

Os subtestes Cubos e Vocabulário da Wechsler Adult Intelligence Scale-III

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3.2.5. Critério de Classificação Econômica Brasil

O Critério de Classificação Econômica Brasil (CCEB) da Associação Brasileira de Empresas de pesquisa (ABEP), foi o instrumento utilizado para avaliação de perfil socioeconômico. O “Critério Brasil” é composto por um sistema de 46 pontos que visa estimar as classes econômicas a que pertencem os entrevistados.

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3.3. Medidas psicofisiológicas (AEP)

3.3.1. Coleta de dados de AEP

Para a coleta de dados psicofisiológicos por meio da AEP utilizamos o mesmo procedimento utilizado por Barros51, conforme descrito a seguir.

O hardware utilizado foi o aparelho I-330 C (J&J Engineering) com 2 canais. Os eletrodos foram colocados no segundo e terceiro dedos da mão esquerda, por meio de cabos “MC-6SY”. A programação permitiu a captação de AEP entre quase zero e 10Ω, por meio do software BioExplorer 1.5 (CyberEvolution) instalado num notebook Vaio, 2 GHZ, 3 Gigas, com tela de 15.4 polegadas. Um monitor de LCD extra de 19 polegadas foi utilizado para apresentação das imagens aos sujeitos.

Para capturar e sincronizar os dados fisiológicos com a percepção dos estímulos visuais foi criada uma interface multimídia associada a um processador de sinais digital, aliado a um mecanismo de exportação seletiva dos dados de interesse. Por meio do software de processamento de sinais digital Bioexplorer 1.5 foi possível delinear a sincronização dos inputs (estímulos fisiológicos) com imagens em Flash (SWF). A criação dos arquivos SWF, expostos na interface do usuário utilizou o módulo IMPRESS do software Open Office.

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afetivos, permitindo sua verificação dada a possibilidade de exposição controlada110-112, e já foi validado para a população adulta brasileira113. Este instrumento foi efetivo num estudo de respostas psicofisiológicas realizado com populações de adultos encarcerados no Brasil114.

Com o objetivo de evitar qualquer viés em função da ordem de apresentação, optamos por apresentar três blocos com sequencias diferentes. Assim, as imagens foram apresentadas da seguinte forma: o primeiro bloco foi formado por 3 figuras agradáveis, cada uma durante 6 segundos, seguidas de uma tela cinza por 6 segundos; 3 figuras neutras, também seguidas de uma tela cinza e 3 figuras desagradáveis, com os mesmos intervalos. Ao final do bloco, uma tela cinza aparecia por 16 segundos, para retornar a resposta aos níveis basais e dar início a um novo bloco. No segundo bloco a seqüência se iniciava por figuras desagradáveis, seguidas de neutras e terminava com imagens agradáveis, mantidos os mesmo intervalos temporais. Finalmente, o último bloco começava com as imagens neutras, seguidas das agradáveis e finalizado pelas desagradáveis (Figura 1).

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3.3.2. Parâmetros de AEP avaliados

Seguindo o procedimento adotado por Barros51, a AEP foi inicialmente medida em três parâmetros de interesse: o tempo de demora para alterações no sinal (medido em milisegundos), chamada aqui de latência; o máximo da resposta em relação à linha de base (medida em μΩ), chamada aqui de resposta máxima; e a variabilidade da resposta (quantificando o número de μΩ/s), chamada aqui de labilidade (Figura 2). Estes dados numéricos foram automaticamente exportados para um arquivo de dados elementares (.txt), o qual serviu de base para a criação de um Template (.xlx).

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Figura 2: Curva de resposta fásica ao estímulo

Devido à “Lei dos valores iniciais”- a proposição descrita já em 1931 de que, devido a restrições biológicas, a linha de base de um indivíduo estará associada com a mudança em resposta a uma tarefa - o valor da resposta fásica será determinado pela linha de base deste indivíduo115.

Por isso, além da avaliação das variáveis latência, labilidade e respostamáxima, utilizadas no estudo de Barros, os grupos foram também avaliados em relação à média da resposta fásica considerando a linha de base.

Dessa forma, decidimos ampliar a avaliação dos dados por meio de uma nova análise metodológica que considerasse a média da amplitude da resposta fásica em cada estímulo, incluindo a normalização das variáveis por meio da resposta fásica geral, com o objetivo de diminuir as diferenças individuais.

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- Amplitude da primeira condição de cada bloco: reduzimos o valor da média de resposta fásica da primeira condição (imagem) do primeiro estímulo de cada bloco da linha de base imediatamente anterior. A fórmula matemática utilizada para o cálculo foi: Abl1AgrCond1= bl1st1cond1Med-bl1st1basemed, onde A= amplitude; bl1 = bloco 1; Agr= agradável; Cond1 = condição 1; st=estimulo; lbasemed=linha de base média. Com isto objetivamos avaliar a possibilidade de um viés de estímulo da primeira imagem apresentada, independente da valência (agradável, neutra ou desagradável)

- Amplitude da emoção, por bloco: fizemos a média da resposta fásica das três condições (imagens) de cada emoção (agradável, neutra e desagradável). Calculamos a amplitude com o valor da média da emoção, reduzindo do valor da linha de base imediatamente anterior. Assim, a fórmula matemática utilizada para o cálculo da emoção “agradável” no primeiro bloco foi: Abl1AgrMed= [(bl1st1cond1Med+ bl1st1cond2Med+ bl1st1cond3Med)/3]- bl1st1basemed

- Amplitude da emoção, geral: fizemos a média da resposta fásica das 3 condições (imagens) nos 3 blocos. Calculamos também uma linha de base geral, considerando a média das três linhas de base. Assim, a fórmula matemática utilizada para a emoção “agradável” geral foi: AagrGeral= (Abl1AgrMed + Abl2AgrMed + Abl3AgrMed) / 3

A orientação aos sujeitos do experimento psicofisiológico foi padronizada, minimizando a presença de vieses gerados por estas orientações.

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Em seguida, eram orientados quanto ao procedimento em si: “Nessa parte da pesquisa que estamos fazendo você vai olhar para o computador. Nessa tela na sua frente vão aparecer várias fotos de pessoas e situações, algumas são agradáveis, outras são desagradáveis e outras não são nem um nem outro. A ideia aqui é você tentar se colocar no lugar das pessoas que estão aparecendo, tentando imaginar se elas estão felizes ou tristes, como estão se sentindo, tudo bem?”

Após o assentimento, a explicação seguia: “Eu vou colocar esses dois sensores aqui nos seus dedos, para a gente medir a emoção que as imagens produzem; não se preocupe com os fios e pode deixar a mão bem relaxada”.

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3.4. Análise estatística dos dados

A análise estatística foi realizada por meio do programa STATA Data Analysis and Statistical Software versão 11, com a ajuda de um profissional especialista no assunto.

Para avaliação de traços psicopáticos nós consideramos como variáveis de desfecho as médias da pontuação total, fator 1 e fator 2 da escala PCL-R. As variáveis potencialmente confundidoras eram a média de Quociente de inteligência (QI estimado), média de idade e média de anos de estudo em cada grupo.

Utilizamos o teste t para comparar as pontuações médias na PCL-R (total, Fator 1 e Fator 2) entre os grupos. Como no grupo controle a PCL-R falhou no teste de normalidade Shapiro-Wilk nós padronizamos os dados para correr o teste t para variâncias desiguais. Nós também utilizamos o teste t para comparar as médias de QI estimado, idade e nível de escolaridade entre os grupos. Em todas estas comparações, o teste não-paramétrico Mann Whitney também foi realizado com o objetivo de confirmar os dados encontrados.

No caso de alguma das variáveis confundidoras apresentar diferenças entre os grupos (between-group differences by Student´s t test), avaliamos as diferenças na PCL-R na presença destas covariáveis utilizando ANCOVA.

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(ampagrbl1, ampagrbl2, ampagrbl3, ampdesagbl1, ampdesagbl2, ampdesagbl3, ampneutbl1, ampneutbl2, ampneutbl3) e Amplitude da emoção geral (Ampagradgeral, ampdesaggeral, ampneutgeral).

Para todas estas comparações dos índices de atividade da pele entre o grupo de infratores e grupo controle optamos por utilizar o teste não paramétrico Mann Whitney, pois os grupos falharam no teste de normalidadeShapiro-Wilk.

Em todas as análises, foram usados níveis de significância estatística de p<0,05 e intervalo de confiança de 95%.

3.5. Aspectos éticos

O projeto foi autorizado pela Comissão de Ética do Departamento de Psiquiatria da FMUSP, assim como pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. O projeto foi cadastrado na Plataforma Brasil sob o número CAAE: 13509713.8.0000.0065.

O Departamento de Execuções da Infância e Juventude (DEIJ), órgão responsável pelas internações em seu caráter judicial, bem como a Superintendência de Saúde da Fundação Casa e a diretoria da Divisão Técnica Raposo Tavares, onde a pesquisa junto ao grupo caso foi realizada, também autorizaram a pesquisa.

A Coordenaria do “Intel Computer Clubhouse Network”, onde os dados do grupo controle foram coletados, concordou com a realização da pesquisa em sua sede.

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4. RESULTADOS

4.1. Características gerais da amostra

Entre 2009 e 2012, foram convidados a participar do estudo um total de 84 jovens, sendo 52 infratores e 32 não-infratores.

Como os jovens que já faziam tratamento não foram convidados a participar do estudo, foram excluídos do grupo de infratores apenas 3 jovens que apresentaram critérios para transtorno mental, sendo dois com episódio depressivo e um com síndrome do pânico. Assim, preencheram os critérios de inclusão 49 infratores, no entanto 2 tiveram os dados de AEP corrompidos na análise e 5 deles tiveram a avaliação de AEP incompleta. Além destes, 5 deles tiveram a avaliação da PCL-R incompletas, em ambos os casos em virtude dos jovens terem sido submetidos a medida de desinternação por medida judicial antes de completarem todas as avaliações propostas. Assim, o grupo de infratores totalizou 44 sujeitos com avaliação de PCL-R completa e 37 sujeitos com avaliação de PCL-R e psicofisiológica completas.

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O uso de drogas estava presente entre 15 jovens do grupo de infratores, sendo que 11 preencheram critérios para dependência de maconha e 4 preencheram critérios para dependência de cocaína. Todos estes sujeitos estavam abstêmios do uso há pelo menos 5 meses. Já no grupo controle um sujeito apresentou critérios para abuso de drogas (cocaína), mas também estava abstinente há pelo menos 5 meses.

Para a comparação das características gerais dos grupos foram incluídos os jovens que concluíram a avaliação da PCL-R independente da perda dos dados de AEP, ou seja, 44 jovens infratores e 31 não infratores.

Os infratores haviam sido admitidos em média 7 meses antes da entrevista (média de 3-17 meses), e a maioria dos atos infracionais correspondia a roubo à mão armada. No grupo controle, a maioria estava empregada com salários que variavam de 1 a 2 salários mínimos.

A média de idade do grupo de infratores era de 18 anos (variação de 18-19 anos), enquanto que a média de idade no grupo controle foi de 20 anos (variação de 18-24 anos), sem diferença estatisticamente significativas entre os grupos. Também não houve diferenças estatisticamente significativas quanto à media de QI estimado entre o grupo de infratores (QI=96 IC95%: [90-102]) e o grupo controle (QI= 102 IC95%: [96-108]).

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4.2. Avaliação de traços psicopáticos pela PCL-R

Entre os 44 jovens infratores, apenas 5 pontuaram 23 pontos ou mais na PCL-R, configurando desta forma o critério de psicopatia de acordo com as instruções do PCL-R validado para uso no Brasil. Como nosso objetivo era a composição de um grupo de jovens infratores sem psicopatia, tais indivíduos foram excluídos da análise. Entre os jovens do grupo controle, nenhum apresentava critério para psicopatia de acordo com a PCL-R.

A média de pontuação na PCL-R para os grupos estão apresentadas na Tabela 2. Foi observada diferença estatisticamente significativa entre estes grupos em termos das médias de PCL-R total (p<0,01), e também entre os fatores 1 e 2 isoladamente (p<0,01 em ambos os casos).

A ANCOVA utilizada para comparar as médias de pontuação na PCL-R entre os grupos, controlando para as variáveis que apresentaram diferença significativa entre os grupos - neste caso apenas o grau de escolaridade - mostrou que a diferença na pontuação da PCL-R se manteve estatisticamente significativa (p<0,01) na presença desta covariável.

Tabela 2 - Comparação de médias de escore total, fator 1 e fator 2 da escala PCL-R de infratores e não-infratores excluindo psicopatia por meio do teste t

Grupo n

Média PCL-R (IC95%)*

Média Fator 1 (IC95%)

Média Fator 2 (IC95%) Infratores 39 13,4 (11,6-15,1) 2,5 (1,8-3,1) 8,9 (7,7-10) Não-infratores 31 2,1 (0,85-3,3) 0,4 (0,1-0,6) 1,4 (0,5-2,3)

Diferença 11,3 (9,2-13,4) 2,1 (1,4-2,8) 7,5 (6,0-8,9)

P <0,01 <0,01 <0,01

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4.3. Avaliação de resposta psicofisiológica

Para esta comparação, dos 37 que haviam completado todas as fases, foram excluídos 4 com critérios para psicopatia (PCL-R>23), totalizando assim 33 jovens infratores com dados psicofisiológicos. Para o grupo controle foram incluídos os 31 sujeitos também avaliados em relação à PCL-R.

Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos de infratores e não infratores em relação a latência de resposta fásica e a labilidade (variabilidade) da resposta fásica, seja em relação aos estímulos agradáveis, neutros ou desagradáveis.

No entanto, a amplitude máxima da resposta fásica foi diferente entre infratores e grupo controle para os estímulos agradáveis e desagradáveis - em ambos os casos foi maior entre infratores, conforme apresentado na tabela 3.

Tabela 3 - Comparação entre infratores e não-infratores de acordo com parâmetro de AEP e estímulo (agradável, neutro ou desagradável) por meio do teste

Mann-Whitney

AEP  INFRATORES (IC95%)  CONTROLE (IC95%)   Prob>z 

LAT a  0,03  0,01  0,91 

LAT n  0  0  0,41 

LAT d  0,01  0  0,41 

LAB a   0,04  ‐0,03  0,37 

LAB n   0,03  0  0,72 

LAB d   0,02  0,04  0,18 

 FAS a   0,1  ‐0,04  0,02 

FAS n  ‐0,08  0,02  0,12 

FAS d  0,02  ‐0,01  <0,01 

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Foi avaliada também a média da amplitude de resposta fásica no primeiro estímulo de cada um dos três blocos (estímulos agradável, desagradável e neutro respectivamente), e não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre estas (Tabela 4).

Tabela 4 - Comparação das médias de amplitude de resposta fásica entre infratores e não-infratores na primeira condição de cada bloco de imagens por meio do teste Mann-Whitney

AMPLITUDE DA RESPOSTA FÁSICA* Controles Infratores Prob>z (p)

Bloco 1 Condição 1 (agradável) <0,01 0,01 0,4 Bloco 2 Condição 1 (desagradável) <0,01 <0,01 0,86 Bloco 3 Condição 1 (neutro) <0,01 <0,01 0,17

*Normalizada pela resposta fásica geral

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Tabela 5 - Comparação das médias de amplitude de resposta fásica entre infratores e não-infratores, de acordo com a emoção da imagem por meio do teste

Mann-Whitney

AMPLITUDE DA RESPOSTA FÁSICA*

Controles (Mdn)

Infratore s (Mdn)

Prob>z (p)

Bloco 1 agradável -0,01 0,00 0,15

Bloco 1 neutro -0,00 -0,01 0,28

Bloco 1 desagradável -0,00 -0,00 0,31

Bloco 2 agradável -0,01 -0,00 0,92

Bloco 2 neutro -0,02 -0,01 0,7

Bloco 2 desagradável -0,01 -0,00 0,57

Bloco 3 agradável -0,02 -0,01 0,08

Bloco 3 neutro -0,00 -0,00 0,41

Bloco 3 desagradável -0,02 -0,00 <0,01

Geral agradável 1,03 1,00 <0,01

Geral neutro 0,98 0,99 0,07

Geral desagradável 0,98 1,00 0,01

(57)

5. DISCUSSÃO

5.1. Comparação de traços psicopáticos entre jovens infratores e grupo

controle

Este estudo avaliou jovens que cumprem medida socioeducativa de internação por atos infracionais correspondentes aos crimes de roubo, furto, tráfico de drogas e homicídio, que não apresentaram pontuação condizente com o diagnóstico de psicopatia de acordo com a escala PCL-R, já que nosso objetivo era avaliar a presença de traços psicopáticos em jovens infratores sem diagnóstico de psicopatia, comparando-os com não-infratores em condições socioeconômicas semelhantes.

A semelhança de origem socioeconômica teve como objetivo controlar este aspecto pertencente às variáveis ambientais, que estão habitualmente associadas ao comportamento antissocial. Como esse desenho nos permitiu bom controle dessa variável, pode-se inferir com boa segurança que os resultados encontrados não estão associadas às condições socioeconômicas onde estes jovens se desenvolveram.

(58)

A pontuação média na PCL-R entre os infratores foi de 13,4 (11,6 - 15,1), pontuação consistente com a presença de traços psicopáticas de acordo com Morana, Camara e Arboleda-Florez, que encontraram a correlação entre traços psicopáticos e pontuações entre 12 e 23 no Brasil111. Assim, a pontuação do grupo de infratores esteve no limite inferior para caracterização de traços psicopáticos, e a diferença com o PCL-R total do grupo controle foi significativa, reforçando que a presença substancial de traços psicopáticos no grupo de infratores.

Tal achado era esperado pois é consistente com a proposta da escala PCL-R, que inclui em parte de seus critérios o comportamento antissocial que caracteriza os jovens infratores, mesmo entre aqueles sem psicopatia como diagnóstico categorial. A pontuação dos infratores, no limite inferior para caracterização de traços psicopáticos, indica ainda que o grupo estava dimensionalmente distante do critério para psicopatia (pontuação maior que 23 na PCL-R), o que reafirma a utilização deste grupo como representativo de infratores sem psicopatia stricto sensu, o que era um dos objetivos desta análise.

Diante desta diferença, foi possível realizar a comparação das características ambientais e constitucionais entre o grupo de infratores sem critérios para psicopatia e grupo controle. Para isso, comparamos isoladamente as médias dos fatores 1 e 2 da escala PCL-R, e encontramos diferença estatisticamente significativa entre os grupos em relação a ambos os fatores.

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Com o objetivo de avaliar a relevância de cada um dos fatores- ambientais e constitucionais- associados à delinquência juvenil, comparamos também as proporções dos fatores 1 e 2 na escala PCL-R dentro de cada grupo. A razão encontrada foi similar entre os grupos, apresentando infratores e controles uma pontuação média no fator 2 aproximadamente 3,5 vezes maior que a pontuação média no fator 1.

Estes achados apontam para duas conclusões diferentes: por um lado, a diferença significativa encontrada entre os grupos em relação à média do fator 2 permite inferir que os traços associados ao ambiente psicossocial onde se desenvolveram apresentaram correlação com a delinquência juvenil. Por outro lado, o grupo controle também apresentou maior pontuação no fator 2 em relação ao fator 1 numa proporção semelhante aos infratores. Tal achado sugere que os jovens infratores estiveram susceptíveis a um padrão equivalente de influências ambientais e constitucionais, porém com influências quantitativamente maiores.

Esta conclusão é bastante relevante porque a maioria dos autores nesta área concorda que o fator 1 revela características estruturais da personalidade do indivíduo, pouco sujeita a intervenções psicoterapêuticas e psicofarmacológicas, enquanto que o fator 2, por refletir um estilo de vida e de comportamento, estaria mais permeável às influências do meio e às possibilidades de intervenção psicossocial 118. O próprio Hare, criador da escala PCL-R, aponta que os fatores 1 e 2 são similares para predição de violência, mas aponta o fator 1 como melhor preditor de psicopatia, ressaltando que, “além disso, o fator 1 está associado a pior resposta ao tratamento e até piora com o tratamento”117-119.

Imagem

Tabela 1- Fatores sociológicos e biológicos associados à delinquência juvenil  Fatores socioambientais 25-29  Fatores biológico 30-32    -Sexo: homens 6x mais que mulheres
Figura 1: Exemplo de 1 bloco, com 3 imagens agradáveis, 3 neutras e 3 desagradáveis
Figura 2: Curva de resposta fásica ao estímulo
Tabela 3 - Comparação entre infratores e não-infratores de acordo com parâmetro de  AEP e estímulo (agradável, neutro ou desagradável) por meio do teste  Mann-Whitney
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Referências

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