AVALIAÇÃO DA EFICIÊNCIA TÉCNICA DE PRODUTORES DE LEITE
Paulo Cesar Tavares de Souza Universidade Federal do Paraná – UFPR
Programa de Pós-Graduação em Métodos Numéricos em Engenharia Caixa Postal 19081 – CEP 81531-990 Curitiba/PR
Professor do Colégio Militar de Curitiba e-mail: pctavares@uol.com.br
Volmir Eugênio Wilhelm Universidade Federal do Paraná – UFPR
Programa de Pós-Graduação em Métodos Numéricos em Engenharia Departamento de Matemática da UFPR
Caixa Postal 19081 – CEP 81531-990 Curitiba/PR e-mail: volmir@ufpr.br
RESUMO
Este trabalho propõe uma metodologia para avaliar a eficiência técnica de produtores de leite. A metodologia será baseada em DEA-Data Envelopment Analysis, consiste basicamente na obtenção dos produtores benchmarks, e do cálculo de índices de eficiência cruzados. A metodologia proposta foi aplicada na avaliação de 25 produtores de leite que participam do Programa de Leite da Região de Guarapuava – PROLEG. O PROLEG é desenvolvido pela Emater-Pr e objetiva gerar subsídios para aumentar a produtividade da atividade leiteira na região.
PALAVRAS CHAVE: Data Envelopment Analysis, Eficiência Técnica, Avaliação Cruzada.
ABSTRACT
This work suggests a methodology to evaluate milk producers’ technical efficiency. The methodology is based on Data Envelopment Analysis (DEA) and it is basically made up of benchmark producers and the crossed efficiency index calculation. This methodology was applied to evaluate 25 milk producers that take part in Guarapuava’s Region Milk Program (PROLEG). This program is developed by Emater-PR and aims at generating subsidies to increase milk productivity in the region.
KEY WORDS: Data Envelopment Analysis, Technical Efficiency, Cross Evaluation
1. Introdução
No mundo globalizado verifica-se um aumento de competitividade nos mais variados setores produtivos. Para manterem-se ativas neste contexto, tanto as organizações públicas quanto privadas, buscam melhorar seus índices de produtividade e eficiência técnica. Para tanto buscam a melhoria de seus modelos produtivos, com a implementação de novas tecnologias ou adaptando seu sistema produtivo a condições que possam melhorar seu desempenho produtivo, otimizando o uso de seus recursos.
No setor leiteiro a situação não é diferente. Alem dos problemas locais, os produtores enfrentam uma concorrência externa, com as medidas protecionistas dos paises desenvolvidos.
O objetivo deste trabalho é desenvolver uma metodologia baseada em DEA – Data Envelopment Analysis para a avaliação da eficiência técnica relativa de produtores de leite. Serão determinados os benchmarks dos produtores, a partir de um único índice de eficiência técnica, que serão os referenciais para os produtores não benchmarks alcançarem a eficiência.
2. Descrição do Problema
Presente em todos os estados do país, com maior ou menor grau de importância na economia local, com maior ou menor grau de desenvolvimento tecnológico, a produção de leite garante um adicional de renda a uma parcela significativa da população, empregando mão de obra e gerando excedentes que são comercializados.
A Emater-Pr, durante os anos de 1999 e 2000 fez um acompanhamento e monitoramento em 25 propriedades de pecuária leiteira do programa de leite da região de Guarapuava, PROLEG.
Os resultados deste programa compreendem: a análise da produção de leite no período de 1999 e 2000; a produtividade mensal do leite (litros total por vaca por mês); produtividade do leite (litros por hectare por ano); tamanho do rebanho – número total de vacas (cabeças); custos variáveis;
margem bruta por hectare (R$ / ha / ano) e margem bruta por vaca total (R$ / vaca total mês). O acompanhamento proporcionou informações mensais aos produtores, assistência técnica e extensão rural, na identificação dos gargalos da produção e de indicadores técnicos, econômicos e financeiros, subsidiando-os na tomada de melhores decisões pelos produtores, em função de seus objetivos (SEPULCRI, 2001).
Os índices gerados, apesar de fornecerem aos produtores importantes informações para seus processos de gerenciamento, são parciais, pois envolvem apenas duas variáveis, obrigando o gerente do processo conviver com índices antagônicos relativos a um mesmo produtor (pode ter um alto índice quando se considera a produtividade litros por vaca, e apresentar baixo índice quando relaciona a produtividade litros por área útil).
3. Mensuração de índices de eficiência técnica
Segundo Sturion, os métodos de programação linear têm conseguido sanar a fragilidade apresentada pelos métodos de análise por meio de índices parciais. Dentre os métodos de programação linear destaca-se a Analise por Envoltório de Dados – DEA, desenvolvida por Charnes, Cooper e Rhodes (modelo CCR) em 1978, e por Banker, Charnes e Cooper (modelo BCC) em 1984 (STURION, 1996).
O termo produtividade refere-se à relação produto-insumo de um sistema produtivo considerado, enquanto que uma medida de produtividade deve incorporar os efeitos da tecnologia e da produtividade. Os diferenciais do processo de produtividade derivam das diferenças nas tecnologias de produção, das diferenças de eficiência técnica do processo produtivo e das diferenças de ambiente onde ocorrem os sistemas produtivos (TORESAN, 1998).
Niederauer destaca que em DEA, um desempenho eficiente é desenvolvido no sentido
Pareto-Koopmans, onde uma unidade organizacional é completamente eficiente se, e somente se,
não é possível aumentar o nível de nenhum produto sem diminuir algum outro ou aumentar pelo
menos um insumo (NIEDERAUER, 2002). Sendo assim, uma unidade será considerada ineficiente tecnicamente se for possível produzir os mesmos produtos, reduzindo ao menos um dos insumos, ou se for possível, usando os mesmos insumos, aumentar a produção de pelo menos um produto.
3.1 Aspectos gerais de DEA
Desenvolvida para avaliar o desempenho de unidades de produção, que são genericamente chamadas de Unidades de Tomada de Decisão (Decision Making Units – DMUs), em que não estão disponíveis informações de preços de mercado de insumos e produtos, a metodologia DEA calcula uma medida máxima de performance para cada DMU relativa a todas as demais, com a restrição de que todas as DMUs se encontram na fronteira externa ou abaixo dela. Toda DMU que se encontra abaixo da fronteira de produção terá seu grau de ineficiência medido em relação a uma combinação de DMUs com melhores práticas e que compõem a faceta da fronteira mais próxima (AMARAL, 1999).
Uma análise DEA gera como resultado:
• Uma superfície envoltória que identifica as DMUs eficientes e ineficientes;
• Uma medida de eficiência métrica para cada DMU (a distância da fronteira, a fonte e o grau de ineficiência);
• Uma projeção da DMU sobre a fronteira;
• Um conjunto-referência – os benchmarks (unidades específicas contra as quais uma DMU particular está sendo comparada).
Devido à flexibilidade e a aplicabilidade na analise de eficiência de organizações não voltadas ao mercado, um grande número de aplicações de DEA em instituições públicas e privadas se seguiu à divulgação do modelo inicial de Charnes, Cooper e Rhodes, em1978.
Amaral descreve que o grande interesse pelo método deve-se a suas três características:
• Caracterização de cada DMU por um escore único que resume a eficiência relativa;
• Para cada DMU são feitas projeções de melhorias sobre referências observadas, revelando aquelas que possuem as melhores práticas;
• DEA se coloca como alternativa para abordagens indiretas de especificação de modelos estatísticos abstratos que fazem inferência baseadas na análise de resíduos e de coeficientes-parâmetros, tal como na abordagem econométrica (AMARAL, 1999).
Em sua versão original, o modelo DEA-CCR (Charnes, Cooper e Rhodes, 1978), orientação consumo, considerando J DMUs, n insumos e m produtos, é apresentado como um problema de programação fracionária. Após algumas alterações, o modelo DEA considerando retornos constantes de escala, orientação produção - DEA-CCR – para calcular o índice de eficiência técnica ( θ
o) da o-ésima DMU é
m r
n i
J j
u v
J j
y u x
v y u sa
x v E
jr ji
m
r
jr jr n
i
ji ji m
r
or or n
i
oi oi oo
,...,
; ,...,
; ,..., ,
,
,..., ,
min
1 1
1
1 0 1
1 1
1 1
=
=
=
≥
=
≥
−
=
=
∑
∑
∑
∑
=
=
=
=
ε
(Modelo A)
onde: X
j= ( x
j1, x
j2, L , x
jn) é o vetor das quantidades consumidas pela DMU j;
(
j j jn)
j
y y y
Y =
1,
2, L , é o vetor dos níveis de produção; v
j= ( v
1, v
2, L , v
n) o vetor dos pesos relacionados aos insumos; u
j= ( u
1, u
2, L , u
n) o vetor dos pesos relacionados aos insumos; e ε
é uma quantidade infinitesimal.
Esta formulação matemática implica em:
• E
oo> 1 , se a expansão radial dos produtos for possível (ou seja, a DMU é ineficiente);
• E
oo= 1 é a condição necessária, mas não suficiente para que a DMU seja considerada eficiente tecnicamente no sentido de Pareto-Koopmans, ou seja, o produtor não consegue diminuir o nível de pelo menos um insumo, sem que ocorra a diminuição de produção.
Para a DMU avaliada, E
ooé o indicador de eficiência, baseado na possibilidade de expansão dos produtos para obter-se a eficiência máxima. Dentro desta ótica de orientação à produção, têm-se retornos constantes de escala, descarte forte de insumos e produtos, bem como se supõe a convexidade no conjunto de combinações viáveis de insumos e produtos.
3.2 Avaliação cruzada
O conjunto de pesos ótimos obtidos com a resolução do modelo de programação linear para cada DMU, resulta no melhor escore de eficiência técnica possível para cada DMU. As únicas limitações impostas no processo de obtenção destes pesos é que sejam positivos, e que os escores de eficiência de cada DMU seja menor ou igual a unidade.
A flexibilidade nos pesos tem sido referenciada na bibliografia como sendo uma das grandes vantagens da Análise por Envoltória de Dados - DEA, pois é um fator significante para a identificação das DMUs ineficientes, que possuem uma performance baixa com seu próprio conjunto de pesos ótimos. Deste modo, analisando a magnitude dos pesos atribuídos a cada um dos insumos e dos produtos, a gerência de uma DMU ineficiente conhece a importância de certos insumos e produtos no seu processo produtivo. Quanto maior o valor do peso de um insumo ou de um produto, maior é a importância deste insumo ou deste produto no processo produtivo.
Segundo Lins e Meza (LINS, 2000), este procedimento tem sido criticado por muitos pesquisadores pelas seguintes razões:
1. Fatores de menor importância podem dominar o estabelecimento da eficiência de uma DMU, isto é, podem ter um alto peso;
2. Fatores importantes podem ser ignorados da análise, o que acontece quando o ppl outorga um peso zero na respectiva variável;
3. Ao se ter flexibilidade nos pesos permite-se que as DMUs possam ter objetivos individuais e circunstanciais particulares, o qual não é compatível com o fato delas serem homogêneas no sentido que produzem os mesmos produtos;
4. Em alguns casos, dispõe-se de certa quantidade de informação com respeito à importância dos insumos e produtos, e sobre as relações entre as variáveis;
5. Os gerentes com freqüência tem percepção, a priori sobre as DMUs eficientes e ineficientes;
6. A existência de várias DMUs caracterizadas como eficientes, pois a abordagem DEA explora as características positivas da performance de cada DMU, não podendo ser discriminado de forma direta as unidades produtivas verdadeiramente eficientes.
Desenvolvida por Sexton et all (SEXTON, 1986), a avaliação cruzada é uma maneira de evitar diferenças nos pesos determinados para cada DMU, sem a arbitrariedade das restrições e sem o conhecimento prévio da importância relativa de cada variável. A avaliação cruzada tem como finalidade principal utilizar DEA em uma avaliação do conjunto, ao invés de uma auto- avaliação a qual é calculada por um modelo DEA padrão.
Uma avaliação do conjunto significa que cada DMU é avaliada segundo o esquema de pesos ótimo das outras DMUs, sendo a média de todas essas eficiências a eficiência cruzada.
Logo a avaliação feita será uma média das eficiências de uma DMU calculada a partir das outras DMUs.
Segundo Niederauer (NIEDERAUER, 2002), os modelos DEA básicos nem sempre
fornecem boas características discriminatórias, especialmente quando é necessário apontar o
melhor dentre aqueles com 100% de desempenho. Nem mesmo o número de vezes que essas
unidades são referência para as demais é suficiente para determinar qual é a melhor. A avaliação cruzada é uma maneira de aumentar o poder discriminatório do DEA.
Na avaliação cruzada utiliza-se as eficiências calculadas segundo um modelo DEA padrão e o esquema de pesos ótimo utilizado para atingirem tal eficiência. Nos modelos DEA podem existir muitas soluções ótimas, podendo implicar em obtenção de eficiências cruzadas altas ou baixas, isto ocorre porque um conjunto de pesos ótimo pode ser favorável para uma DMU, mas desfavorável para outra. Para contornar este problema utiliza-se então uma função objetivo secundária. O modelo, considerado neste trabalho está descrito na seqüência:
( )
( )
( )
m r
n i
J j
o j y
x
y E
x
o j y
sa
o j x
jr ji
m
r
jr jr n
i
ji ji
m
r
or or oo n
i
oi oi m
r
J
j jr or n
i
J
j ji oi
,...,
; ,...,
; ,..., ,
, min
1 1
1
0 0 1
1 1
1 1
1 1
1 1
=
=
=
≥
≠
∀
≥
−
=
−
≠
=
≠
∑
∑
∑
∑
∑ ∑
∑ ∑
=
=
=
=
= =
= =
ε ν µ
µ ν
µ ν
µ ν
(Modelo B)
onde E
ooé obtido do Modelo A. Uma vez determinado o esquema de pesos e as eficiências cruzadas, estas compõem uma matriz da seguinte forma:
1 2 3 4 5 ... n 1 E
11E
12E
13E
14E
15... E
1n2 E
21E
22E
23E
24E
25... E
2n... ... ... ... ... ... ... ...
n E
n1E
n2E
n3E
n4E
n5... E
nne
1e
2e
3e
4e
5... e
nTabela 1: Eficiências Cruzadas
onde E
kké a eficiência calculada pelo Modelo A (DEA-CCR) e E
ksé a eficiência da DMU s calculada utilizando os pesos obtidos para a DMU k, e
ké a eficiência cruzada média da DMU k.
Os índices E
kke e
ksão calculados por
∑
∑
=
=
m= rkr ks n
i
ki ks ks
y x E
1 1
µ ν
∑
−
==
J
j jk
k
E
e J
1
11
4. A metodologia
Para avaliar a eficiência técnica dos produtores de leite será necessário seguir os seguintes passos.
• Passo 1: Definir quais produtores de leite farão parte da análise.
• Passo 2: Escolher os insumos e os produtos. Determinar as quantidades dos insumos transformados e das quantidades dos produtos gerados pelos produtores de leite.
• Passo 3: Determinar os produtores benchmarks (através do Modelo A).
• Passo 4: Calcular os índices de eficiência técnica cruzada dos produtores (Modelo B).
• Passo 5: Analisar e implementar os resultados.
A seleção dos produtores poderá ser feita segundo os interesses dos administradores e
técnicos da área da produção leiteira. Podem-se empregar ferramentas estatísticas para verificar
quais produtores farão parte da análise. Os fatores de produção devem ser os que influenciam de modo significativo a produção leiteira e podem ser definidos a partir de consultas a especialistas na produção leiteira, bem como proceder consultas a literatura especializada. Os índices de eficiência técnica serão calculados a partir do modelo DEA-CCR e a avaliação cruzada.
O cálculo dos índices da eficiência técnica e a obtenção dos produtores benchmarks (passo 3) pode ser feito considerando: (i) orientação consumo, situação em que se mantém fixo o nível de produção e busca-se uma diminuição dos níveis dos insumos atualmente consumidos;
(ii) orientação produção, mantendo fixos os níveis de todos os insumos e buscando uma expansão eqüiproporcional da quantidade de todos os produtos. A opção pela orientação produção é a mais apropriada neste caso, pois alguns dos insumos disponíveis aos produtores, tais como a área produtiva e o número de animais já são de domínio do produtor e geralmente não é interessante ao produtor desfazer-se destes bens; uma segunda justificativa é em relação à necessidade de expansão de mercado, visto que parte do leite consumido no Brasil é importada.
Depois de obtidos os índices de eficiência nos Passos 3 e 4, os resultados deverão ser analisados e discutidos pelos produtores juntamente com os extensionistas da Emater para uma possível implementação posterior. Os índices de eficiência podem ser subsídios aos técnicos envolvidos no sistema produtivo na tomada de decisões rápidas, seguras e eficazes, como forma de melhorar a produtividade dos produtores envolvidos.
No Passo 3, será avaliada a performance dos produtores para determinar a fronteira de produção, que contem os produtores eficientes (os benchmarks). O grau de ineficiência dos demais é dado pela distância até a fronteira de produção.
A avaliação cruzada (Passo 4) será executada considerando retornos constantes de escala.
Este modelo é perfeitamente aplicável, pois, segundo Mori (MORI, 1997), não se pode afirmar que a agricultura e a pecuária apresentam retornos variáveis de escala. Na avaliação cruzada, as unidades de produção são avaliadas segundo o esquema de pesos de todas as demais unidades.
Deste modo, além da auto-avaliaçao, cada unidade é avaliada pelos seus pares, e o escore é dado pela média das avaliações cruzadas. O modelo DEA cruzado será utilizado para identificar o desempenho global e efetuar uma classificação geral de todas as unidades.
Segundo Lins e Meza (LINS, 2000), este método permite a identificação dos índices maverick. Os mavericks determinam os falsos-positivos, que são unidades com altos índices na avaliação segundo o modelo DEA padrão por super valorizarem seus insumos, porém atingem índices bem menores quando utilizam os pesos ótimos das outras unidades, e deste modo não tem um bom desempenho global. Por exemplo, o índice maverick do k-ésimo produtor é dado por:
k k kk
k