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O AMOR PODE SER MÁGICO [The Silence of Angels]

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Academic year: 2022

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O AMOR PODE SER MÁGICO

[The Silence of Angels]

[The Silence of Angels]

Karen Keast Karen Keast

COM SUAS CARÍCIAS, ELE A FAZ ESQUECER SEU TRISTE PASSADO...

Na penumbra do quarto, Connor insinua os dedos sob o elástico da calcinha de Katy... Procurando palavras ternas, ele remove a minúscula peça de renda e começa a acariciar o centro da feminilidade com infinita volúpia...

Katy não consegue mais conter a onda de excitação que ameaça sufocá- la. Sentindo o mundo girar a sua volta, abraça Connor e o beija com ardor. Nessa noite, Katy não quer lembrar que ele é o homem que traiu seu amor e sua confiança, abandonando-a no momento mais trágico de sua vida; nessa noite, ela quer apenas que Connor a faça experimentar mais uma vez o prazer de ser mulher!

Digitalização e revisão: Tinna

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Copyright © 1992 by Sandra Canfield

Originalmente publicado em 1992 pela Silhouette Books, Divisão da Harlequin Enterprises Limited.

Título original: The Silence of Angels Tradução: Débora da Silva Guimarães Copyright para a língua portuguesa: 1993

EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.

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CAPÍTULO I CAPÍTULO I

Katy McKellen detestou as luzes coloridas árvore de Natal e a música que ecoava na sala. Sentiu-se mal ouvindo as risadas e conversas alegres à sua volta.

Odiava o Natal.

Ou melhor, estava odiando esse Natal em particular, o primeiro desde sua separação e da morte de seu filho. Seria o primeiro Natal que passaria sozinha.

Tomou um gole de vinho e viu que uma mulher a observava do outro lado da sala.

A mulher sorriu, e Katy retribuiu o sorriso por cortesia, imaginando se aquela estranha estava a par de seu passado. A mulher saberia, por exemplo, que ela perdera as coisas mais importantes de sua vida? Saberia que, dentro de duas semanas, quando todos estivessem abrindo presentes, comendo nozes e visitando amigos e parentes, ela estaria rezando para que o dia acabasse logo?

Numa tentativa dramática de esquecer o passado, Katy prestou atenção na roupa da mulher e de repente sentiu-se fora de moda. Usava um vestido de veludo verde, e só agora percebia o quanto ele era antiquado... E não era para menos: os últimos anos de sua vida não haviam sido preenchidos exatamente por festas e eventos sociais. Passara quase todos os momentos daqueles anos ao lado do filho doente. Nos últimos meses, chegara inclusive a tirar uma licença do trabalho. Afinal, o lugar de uma mãe certamente era ao lado do filho, especialmente se esse filho estava prestes a morrer.

Com um suspiro, Katy disse a si mesma que devia deixar o passado para trás.

Tomou mais um gole de vinho e tentou convencer-se de que seu velho vestido verde estava ótimo. A festa estava ótima. O mundo inteiro estava ótimo!

— Ei, qual é o problema?

Katy ouviu a voz conhecida e virou-se para fitar Janna Siegel. Além de ser a dona da casa, Janna era sua melhor amiga. Haviam estudado juntas na Universidade da Carolina do Norte. Janna formara-se em psicologia clínica, e Katy cursara serviço social.

Pouco depois da formatura, Katy fora dama de honra no casamento de Janna, que retribuíra a delicadeza no casamento da melhor amiga. Anos depois, ambas haviam tido seus filhos com alguns meses de diferença. Mas as semelhanças terminavam aí. O filho de Janna nascera forte e saudável, e não morrera poucos dias antes de completar cinco anos.

— Problema nenhum — respondeu Katy, tentando afastar o sarcasmo da voz. — Está tudo perfeito. Maravilhoso!

— Está mentindo — disse Janna, depois de observar a amiga por alguns segundos. — O Natal é sempre deprimente.

— Bem... Sim, é verdade.

Katy perdera o filho numa segunda-feira fria e triste, e na terça-feira seguinte entrara com o pedido de divórcio.

— Vai melhorar — disse Janna, afagando com carinho a mão da amiga. — Prometo. O tempo cura todas as dores.

Seria verdade? Era estranho, mas Katy começava a conformar-se com a morte do filho. Afinal, fora inevitável. Só não conseguia conformar-se com a atitude do marido, que quebrara a promessa de estar a seu lado quando o momento final e doloroso chegasse.

Isso não fora inevitável, e ainda a feria corno uma lâmina incandescente.

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De repente alguns convidados explodiram em gargalhadas, e Katy aproveitou para mudar de assunto:

— Como Rick consegue dormir com todo esse barulho?

Janna sorriu.

— Ele não está dormindo. Está assistindo ao vídeo que ganhou de presente de Natal. Rick disse que Papai Noel queria que ele abrisse o presente antes do dia, ou não o teria deixado ao pé árvore antes da hora.

— Pensei que Rick não acreditasse mais em Papai Noel.

— Oh, isso foi na semana passada. Agora ele acredita novamente em Papai Noel e trenós voadores. Nenhuma criança quer correr riscos nesta época do ano.

— É, tem razão — sorriu Katy.

— Além do mais, Rick está com outras coisas na cabeça. Nossa gata vai dar cria, e ele insiste em saber como os filhotes foram parar na barriga dela. É claro que eu passei a tarefa de responder para John.

— Pensei que psicólogos soubessem lidar com perguntas infantis embaraçosas.

— É claro que sabemos! — riu Janna. — Mas John também tem de participar da vida do filho. Duvido que Rick tenha acreditado naquela história toda. Sexo e bebês são coisas ainda mais inacreditáveis que Papai Noel e renas voadoras. As crianças não costumam aceitar conceitos abstratos e...

— Ei!

As duas amigas viraram-se ao ouvir a voz masculina.

John Siegel estava parado à porta da cozinha e, mais uma vez, Katy pensou que Janna e ele haviam sido feitos um para o outro. Os dois eram morenos e muito bonitos, e pareciam sempre prontos a posar para uma revista de moda. Em determinada época Katy acreditara que ela e Connor também passavam a mesma impressão. Em determinada época, tivera certeza de que nada poderia separá-la do marido. No final, por mais irônico e trágico que pudesse parecer, o filho que ambos haviam desejado e gerado conseguira o que parecia impossível.

— Telefone para você, Katy — disse John, ainda à porta da cozinha. — Parece que é assunto profissional.

Durante os últimos dez anos, Katy atuara como assistente social junto ao Departamento de Polícia de Charlotte, no Estado da Carolina do Norte. Começara trabalhando com os detentos e suas famílias, e depois passara a atuar junto a vítimas de criminosos. Agora trabalhava com crianças.

Sem hesitar, Katy foi atender a chamada na cozinha.

— Alô, Katy McKellen falando — disse, feliz por poder afastar-se do barulho da festa.

— É sua primeira festa em um ano, e eu tenho de atrapalhar sua diversão. Sinto muito.

Katy reconheceu de imediato a voz de uma das funcionária do Departamento de Polícia, uma mulher forte e sorridente que representara sua maior fonte de consolo no período mais difícil de sua vida.

— Não precisa se desculpar. Você não sabe o favor que está me fazendo, Hannah.

— É exatamente por isso que estou tão aborrecida.

— A boa e velha Hannah! Diga, qual é o problema?

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— Uma criança abandonada. Um menino de aproximadamente seis anos de idade.

O fato de haver uma criança envolvida despertou o interesse da Katy. Trabalhar com crianças era sua verdadeira vocação, o maior prazer proporcionado por sua carreira.

— Estou indo para o Departamento agora mesmo.

— Não, Katy. O garotinho não está no Departamento. Está no posto de gasolina da rua...

Hannah forneceu o endereço completo, e Katy logo compreendeu que teria de dirigir durante quase trinta minutos para chegar ao local. Enquanto traçava o caminho mentalmente, tentava imaginar porque a criança não fora levada para o Departamento.

Hannah pareceu ler seus pensamentos e forneceu a resposta em seguida:

— O garoto não deixa ninguém chegar perto, e os policiais esperam que você tenha mais sorte.

— Estou indo para lá.

— Katy?

— Sim?

— E melhor ir preparada para o que vai encontrar.

Cinco minutos depois Katy enfrentava o trânsito pesado e pensava no último comentário de Hannah. Já vira muitas coisas horríveis em seus anos de trabalho. Se Hannah sentira necessidade de preveni-la sobre aquela criança em especial, o caso devia ser realmente sério.

Katy levou trinta e cinco minutos para chegar ao local indicado, repleto de viaturas policiais. Estacionou ao lado de uma delas e, enfrentando o frio cortante, saiu do carro. O sargento Sam Abrams veio em sua direção.

— Finalmente! — exclamou o sargento, sem esconder a aflição.

— Eu estava do outro lado da cidade, Sam, por isso demorei. E o garoto?

— Não sabemos há quanto tempo ele está aqui. O gerente do posto encontrou o menino no banheiro e ligou para nós.

— Ninguém viu nada? Quem o deixou aqui, quando...?

— Nada.

— E ninguém conseguiu aproximar-se do menino?

— Não. Já tentamos, mas ele grita como um louco. Dá para ver que o pobrezinho tem hematomas horríveis! Acha que pode conseguir alguma coisa?

— Vamos ver — disse Katy, preparando-se para enfrentar a difícil missão.

— Ele vai partir seu coração — disse o sargento, como se quisesse prepará-la para algo terrível.

Partir seu coração? Era difícil acreditar. Ela já enfrentara coisas horríveis, e ainda podia lembrar-se das palavras do médico que os chamara para uma conversa cerca de cinco anos antes:

— Sinto muito, sr. e sra. McKellen, mas o seu filho é portador de uma desordem genética que deixa o paciente propenso ao desenvolvimento de tumores e resulta num certo grau de retardo. Existe uma relação entre a idade em que os sintomas da doença aparecem e a gravidade da doença, em si. Seu filho começou a apresentar os sintomas com apenas três semanas de vida, e... Isso significa que ele sofrerá um retardo severo e irreversível. Jamais irá andar ou falar. Em termos estatísticos, as chances de ele alcançar a idade adulta são praticamente nulas.

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Katy suspirou. Se ouvira tudo isso sem desfalecer, se tivera coragem para enfrentar tudo que vivera depois desse dia, o que seria terrível o bastante para abalá-la?

— Meu coração já foi partido há anos, sargento —respondeu ela, por fim, dirigindo-se ao banheiro público do posto.

— Katy?

— Mais alguma informação?

— A imprensa está aqui.

Não era uma notícia inesperada. Repórteres sempre cobriam esse tipo de história. Mas o fato do sargento tê-la prevenido sobre a presença dos repórteres era estranho, e a maneira como ele a fitava era ainda pior.

Notando que ela o encarava com olhos ansiosos e confusos, Sam Abrams explicou:

— Connor está aqui.

Apavorada, Katy virou-se para a pequena multidão na porta do banheiro, esperando estar enganada. Talvez houvesse entendido mal, ou... E então encontrou um par de olhos azuis que pareciam procurar algo, ou alguém.

Ver Katy foi como receber um murro no estômago. Quando Connor soubera que uma assistente social estava a caminho, pensara na possibilidade de reencontrá-la.

Julgara-se preparado para vê-la novamente, mas agora descobria que estava enganado.

Não conseguia deixar de pensar em como era bom acariciar-lhe os cabelos dourados e a pele macia e rosada, no prazer que experimentara sempre que a havia tocado. Lembrou-se do sabor de seus lábios, ternos e doces, e da capacidade que tinham de torturar um homem até o limite do suportável. Acima de tudo, lembrou-se de seus olhos, do tom verde intenso e profundo que jamais vira em outra pessoa. Seria imaginação sua ou aqueles olhos o devoravam agora, com a mesma intensidade de antes?

Nesse instante, sentiu que seriai capaz para retroceder no tempo. Teria vendido sua alma para tocá-la, beijá-la e acariciá-la como no passado. E assim que percebeu as emoções que o invadia, uma onda de dor varreu todo seu ser, trazendo consigo a raiva que julgava adormecida para sempre. Katy o expulsara de sua vida. Ela construíra um muro em volta do filho, de forma que ele não pudesse aproximar-se. Fora ela quem, sem uma única explicação, entrara com o pedido de divórcio.

Afinal, o que havia acontecido? Era uma questão para a qual Connor não conseguia encontrar resposta. Por que haviam se afastado no momento em que mais precisavam um do outro?

Ao ver Connor, Katy sentiu-se como se um ônibus desgovernado viesse em sua direção para atropelá-la, mas em seguida foi invadida por uma raiva profunda e irracional.

A vida tivera a audácia de continuar, apesar da morte de Patrick e da separação conjugal, e Connor também seguira em frente. Não só seguira em frente, como permanecera bonito e atraente como sempre.

Mesmo sabendo que não devia punir-se daquela maneira, ela observou cada traço do rosto de Connor. Notou os cabelos escuros e espessos que seriam encaracolados se não fossem tão curtos, os olhos azuis como o mar e o queixo quadrado.

Ele continuava vestindo-se da mesma maneira: calça jeans surrada, a velha jaqueta de couro, botas de sola grossa.

Naquele momento, Katy teria feito qualquer coisa para atirar-se naqueles braços e esconder-se do mundo. O que teria estragado um casamento tão perfeito?

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Não saberia dizer. Sabia apenas que Connor afastara-se dela quando a saúde de Patrick começara a piorar. Não havia esperado que ele se ausentasse do emprego no jornal, pois a situação financeira da família não o permitiria. Mesmo com o auxílio do seguro-saúde, as despesas médicas de Patrick eram muito mais altas do que o orçamento podia suportar. Só esperara que Connor não passasse tanto tempo longe de casa. Mais tarde descobrira que a maior parte dos trabalhos de Connor naqueles dias haviam sido feitos em esquema free-lance, em adição aos trabalhos regulares. O pior de tudo, porém, era que ele jurara presenciar os últimos momentos de Patrick, mas quebrara, sua promessa. Em vez de estar em casa, amparando o filho morto e confortando a esposa desesperada, Connor havia permanecido no aeroporto de Atlanta.

Vários repórteres correram na direção de Katy, bloqueando a visão de Connor e impedindo sua aproximação do banheiro.

— Sra. McKellen, pode nos dizer algo a respeito da criança?

— É verdade que o menino foi abandonado?

— Sabe algo sobre os pais dele?

— Ela não sabe nada além do que nós já dissemos — interferiu o sargento Sam Abrams, empurrando Katy ao longo do corredor humano formado por policiais.

A porta do banheiro estava fechada, numa tentativa de bloquear o ar frio do exterior. Sam apressou-se a abri-la e Katy preparou-se para o que estava prestes a ver.

Segundos depois compreendia que nada poderia tê-la preparado para aquela cena.

Como um animal apavorado, o menino encolhia-se em um dos cantos, próximo às pias. Vestia roupas velhas e um sobretudo rasgado, sujo e fétido. Havia urinado na roupa.

Os tênis, molhados e sujos de barro, mal cobriam-lhe os pés: estavam rasgados, expondo a pele clara e delicada ao frio da noite. Não usava um casaco, uma jaqueta, nada que pudesse protegê-lo dos rigores do inverno.

— Oh, meu Deus!

Ao ouvir a voz de Katy o garoto ergueu a cabeça, como se só então percebesse que já não estava sozinho. A primeira coisa que Katy notou foi um de seus olhos, quase fechado e cercado por uma enorme mancha vermelha que já começava a adquirir tons arroxeados. Era óbvio que o ferimento era recente, e que fora provocado no momento em que a criança fora abandonada. Havia outras manchas, uma na face e outra no pescoço, mas estas possuíam um tom esverdeado, o que indicava que haviam sido adquiridas há alguns dias, talvez uma semana. A segunda coisa que Katy notou foi o quanto o menino era bonitinho, apesar do olho inchado e das manchas roxas. Mas ele a fitava com expressão vazia, como se olhasse para o nada, e apesar da ausência de lágrimas, as marcas em seu rosto indicavam que já havia chorado antes.

De maneira intuitiva, Katy compreendeu que ele chorara até esgotar as lágrimas.

Agora devia estar em um estágio além do pranto, um estágio que ela conhecia muito bem.

Ficava um pouco além da exaustão emocional, da tristeza, do medo, e um pouco antes do estupor absoluto.

Ao olhar para aquele rosto pequeno e pálido, Katy sentiu uma. raiva intensa e dolorosa. Teria feito qualquer coisa para salvar seu filho doente e imperfeito, e ali estava uma criança bonita e saudável que havia sido abandonada num posto de gasolina, como se fosse um saco de lixo. Que tipo de pessoa seria capaz de ter feito algo tão cruel e terrível?

Hesitante, Katy tirou seu casaco e aproximou-se lentamente do garoto. Ele gemeu e encolheu-se. Desesperado, tentou retroceder ainda mais, tarefa impossibilitada pela

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parede existente às suas costas. Katy deu mais um passo... Outro... A criança gemeu novamente, o medo estampado no rostinho pálido e cheio de hematomas.

Katy abaixou-se lentamente e disse com voz suave:

— Está tudo bem, amorzinho. Não vou machucar você. Prometo. Sei que está ferido, mas ninguém aqui vai machucar você novamente. Nunca mais.

O menino permaneceu encolhido, os olhos assustados fixos no rosto de Katy.

Num tom gentil, ela prosseguiu:

— Eu gosto de garotinhos. Sabe que eu também tinha um garotinho em casa? Ele tinha a sua idade. Tinha cabelos da cor dos seus e lindos olhos azuis. O nome dele era Patrick. Por que não me diz o seu nome?

A resposta foi o silêncio.

— Pode me dizer seu nome quando quiser. O que acha de colocarmos este casaco sobre os seus ombros?

Katy mantinha um dos joelhos no chão e sentia o frio do piso através da meia de seda. Podia imaginar o que sentia a pobre criança, encolhida no chão há horas! Mesmo assim, o menino não estava tremendo. Talvez estivesse além das sensações físicas.

O garoto não ofereceu resposta e Katy compreendeu que teria de tomar uma atitude decisiva.

— Vamos, querido — murmurou, colocando as duas mãos sobre os braços frágeis e pequenos.

A criança encolheu-se, gritou e tentou empurrá-la.

Surpresa com a força daquelas mãos tão pequenas, Katy resistiu aos empurrões e aos gritos, que tornavam-se mais fortes e assustadores a cada instante. Fechando o coração contra o pavor daquela criança, puxou-a para mais perto e descobriu, imediatamente, que ela pesava menos do que o esperado para sua idade.

— Shhh — murmurou, apertando o menino de encontro ao peito. — Agora está tudo bem. Só quero pôr esse casaco em você.

Apesar dos braços que o consolavam e acariciavam, o garoto continuava lutando, chutando e esperneando. Katy segurou-o com mais força e suportou os golpes no queixo, no rosto e no peito.

Enquanto ele a agredia com os punhos fechados, ela o embalava e repetia:

— Shhhh... Shhhh...

Apesar do cheiro forte exalado pelas roupas do menino, Katy o mantinha bem perto do peito. Começou a embalá-lo como se fosse um bebê, cantarolando canções de ninar.

Um minuto, dois, cinco... Katy não saberia dizer quanto tempo havia passado.

Sabia apenas que a força da criança ia diminuindo aos poucos, junto com sua resistência.

Os golpes foram tornando-se menos freqüentes, até limitarem-se a algumas tentativas frustradas. Finalmente as pequenas mãos seguraram seu vestido e, exausto, o garoto enterrou o rostinho sujo em seu peito, como se quisesse esconder-se do mundo.

Contato humano. Havia um momento em que a necessidade de contato era maior que o medo. Katy sabia que esse momento havia chegado para o menino, e sentia-se feliz por ele ter confiado nela, especialmente depois de tudo o que devia ter passado.

Segurando o pequeno corpo entre os braços, foi incapaz de conter as lágrimas. Sabia que esta não era uma reação profissional. Sabia que não podia envolver-se emocionalmente,

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mas foi incapaz de evitar o choro. Na verdade, não quis nem tentar. Simplesmente ajeitou o casaco sobre o corpo pequeno e ferido, e continuou a embalá-lo.

Mais uma vez, não saberia dizer quanto tempo havia passado. Devagar, começou a notar que apertava o garoto contra o peito com a mesma força com a qual ele agarrava- se a seu vestido. Há quanto tempo não segurava uma criança no colo... Seu filho também fora indefeso e fraco, e também precisara de sua proteção. Deus, como sentia a falta de Patrick! E como a criança abandonada provocava-lhe lembranças doces e dolorosas ao mesmo tempo!

Connor, que conseguira vencer a barreira formada pelos policiais, assistia à cena da porta, ao lado de Sam. A visão de Katy com o menino nos braços provocou-lhe um aperto no peito. Lembrou-se de como ela costumava segurar Patrick e embalá-lo lentamente, como se fosse uma peça de porcelana delicada e frágil. Lembrou-se de como ela conversava com o filho, falando a respeito do outono, das cores e do perfume da primavera, dos animais e das plantas, como se, sabendo que seu tempo era limitado, quisesse passar todo o conhecimento que tinha sobre as coisas mais belas do mundo.

Connor sentira necessidade de acreditar que o filho compreendera cada palavra da mãe.

Também sentira necessidade de fazer parte daquele cenário de amor e, por causa dessa necessidade tão antiga, aproximou-se de Katy e da criança que ela segurava.

Ouvindo o som de passos, Katy ergueu a cabeça. O menino acompanhou a direção de seu olhar e agitou-se, gritando e escondendo o rosto.

Connor parou.

Mais uma vez, sua presença era indesejada. Desta vez, no entanto, forçou-se a conter a onda de raiva, uma raiva intensa e profunda dirigida a pessoas que sequer conhecia: os adultos que haviam abandonado aquela criança.

— Vocês dois vão congelar, se não levantarem do chão — disse ele em voz baixa.

Invadida por uma infinidade de lembranças, Katy começou a levantar-se e oscilou sob o peso do garoto, mas Connor segurou-a pelo braço e ajudou-a a erguer-se.

— Vamos, evacuem a área — gritou Sam Abrams, dirigindo-se aos curiosos que permaneciam amontoados diante da porta do escritório.

Katy saiu do escritório com o garoto nos braços, e seguiu pelo corredor humano formado por policiais. O vento a envolveu com braços frios, mas ela limitou-se a ajeitar o casaco que protegia o corpo da criança, tentando controlar o tremor que ameaçava dominá-la. Sem dizer nada, Connor tirou a jaqueta de couro e colocou-a sobre os ombros de Katy.

— Não precisa...

— Fique com ela.

Alguma coisa no tom de voz de Connor a fez desistir dos protestos. De qualquer forma, Katy já não tinha certeza de poder devolver o agasalho. Era tão quente e reconfortante...

Por uma fração de segundo, Katy e Connor encararam-se.

— Leve a jaqueta — disse ele, sentindo o vento frio e cortante.

Como a criança era a única coisa realmente importante naquele momento, Katy virou-se e caminhou para uma das viaturas policiais, tentando esquecer o passado que vivera com aquele homem e toda a dor que sentira no último ano.

Em silêncio, Connor a viu afastar-se. Exatamente como fizera antes.

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CAPÍTULO II CAPÍTULO II

Na manhã seguinte o telefone sobre a mesa de Katy tocou.

— Alô! Katy McKellen falando.

Fez-se um instante de silêncio, durante o qual Connor imaginou se ela iria continuar usando seu sobrenome após o divórcio, como algumas mulheres costumavam fazer.

— Estou atrapalhando? — perguntou ele, por fim.

Ouvir a voz de Connor a assustou, principalmente porque estava pensando nele.

Na verdade, não havia deixado de pensar nele desde a noite anterior. Tentava convencer- se de que as lembranças haviam sido provocadas pelo encontro inesperado, pelo artigo que ele escrevera no jornal local a respeito da criança abandonada e pela jaqueta de couro que passara a noite sobre sua cama.

— Não — respondeu, envergonhada, como se Connor soubesse onde a jaqueta passara a noite.

— Eu... estava imaginando se a polícia não tem mais informações a respeito daquele menino.

— Ainda não.

— O que será feito, então?

— A polícia vai continuar com os interrogatórios. Estou preparando alguns depoimentos para as emissoras de TV, e vou completá-los com uma foto do garoto.

Talvez alguém veja o retrato e o reconheça.

— Pode me dar uma cópia desse retrato?

Katy podia sentir a preocupação de Connor e, por um momento, isso a aborreceu.

Por que ele não demonstrara a mesma preocupação com o filho? No mesmo instante, compreendeu que estava sendo injusta.

— Sim, posso enviar-lhe uma cópia da fotografia — disse ela.

— Ótimo. O jornal publicou um artigo na página...

— Eu vi o seu artigo. Estava muito bom.

Katy fora a melhor crítica do marido. Ele confiava em sua opinião, e sentia falta de seus comentários inteligentes. Pensando bem, sentia falta de tudo que relacionava-se a ela. Apesar da raiva, não fora capaz de tirá-la da cabeça. Talvez o divórcio pudesse mudar essa situação.

— Obrigado. Como está o menino?

Durante anos Katy ouvira a mesma pergunta centenas de vezes, sempre relacionada ao filho, e a resposta fora tornando-se menos otimistas com o correr do tempo. Mas agora Connor estava perguntando sobre outra criança. Infelizmente, a resposta também não era muito animadora.

— O garoto está sob a custódia das autoridades competentes. Passou a noite em um hospital e, fisicamente, não está tão mal quanto temíamos. Além dos hematomas no rosto e no olho, tem outros por todo o corpo, uma evidência de que foi surrado várias vezes. A clavícula esquerda foi fraturada há algum tempo, e parece ter se curado sozinha.

E provável que o menino jamais tenha recebido atendimento médico.

— Meu Deus! Como alguém pode ser tão cruel com uma criança?

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