XXVI CONGRESSO NACIONAL DO
CONPEDI SÃO LUÍS – MA
EFICÁCIA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS
RELAÇÕES DO TRABALHO, SOCIAIS E
EMPRESARIAIS
LUCIANA ABOIM MACHADO GONÇALVES DA SILVA
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E27
Eficácia de direitos fundamentais nas relações do trabalho, sociais e empresariais [Recurso eletrônico on-line] organização CONPEDI
Coordenadores: Luciana Aboim Machado Gonçalves da Silva , Rodrigo Goldschmidt, Viviane Coêlho de
Séllos Knoerr– Florianópolis: CONPEDI, 2017. Inclui bibliografia
ISBN:978-85-5505-572-0
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1.Direito – Estudo e ensino (Pós-graduação) – Encontros Nacionais. 2. Direitos sociais. 3. Contrato. 4. Educação. XXVI Congresso Nacional do CONPEDI (27. : 2017 : Maranhão, Brasil).
Universidade Federal do Maranhão - UFMA
XXVI CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI SÃO LUÍS – MA
EFICÁCIA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES DO TRABALHO, SOCIAIS E EMPRESARIAIS
Apresentação
As relações sociais cotidianas, nomeadamente as de trabalho e empresa, vem desafiando
novos estudos sobre a eficácia dos direitos fundamentais.
Várias pesquisas, válidas e atuais, lançam luzes sobre os limites da atuação do Estado por
sobre o particular, fenômeno que se convencionou chamar de “eficácia vertical” dos direitos
fundamentais.
Atualmente, com a gradativa suplantação e instrumentalização do Estado pelo poder
econômico empresarial, a temática alçou novos contornos, na medida em que, de forma cada
vez mais frequente, constata-se que dito poder vem exorbitando os seus limites no âmbito das
relações individuais e coletivas de trabalho, afetando, com isso, a dignidade e a esfera de
personalidade do trabalhador.
Os artigos científicos que compõem esta obra coletiva constituem uma possível resposta a
essa problemática, procurando oferecer elementos teóricos para compreender as implicações
do uso abusivo do poder econômico, bem como elementos práticos para opor limites a este
poder nas relações privadas, com o mote de alcançar, na maior medida possível, um salutar
equilíbrio entre a empresa e o trabalho humano, a partir de um olhar conforme a
Constituição, a qual preconiza a valorização do trabalho, a livre iniciativa e a justiça social.
Nesse diapasão, preconizam a adoção de políticas públicas para promoção do trabalho
decente e da máxima efetividade dos direitos humanos dos trabalhadores, inclusive com
vistas ao disposto na Declaração da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre
Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho e seu seguimento, enaltecendo a
imprescindibilidade de abolir o trabalho infantil, erradicar o trabalho forçado, eliminar a
discriminação e valorizar a negociação coletiva ao lado da liberdade sindical.
Para tanto, os artigos em questão exploram vários marcos regulatórios internacionais,
constitucionais e infraconstitucionais, assim como abarcam vários marcos teóricos, v.g., a
eficácia horizontal dos direitos fundamentais, a função social da empresa e a função social do
Agora todo esse material científico, elaborado com esmero e dedicação, depurado pelo
debate científico no Grupo de Trabalho constituído para esse fim no âmbito do XXVI
Congresso Nacional do CONPEDI realizado em São Luis/MA, de 15 a 17 de novembro de
2017, está à disposição de você.
Boa leitura, boas práticas!
Prof. Dr. Rodrigo Goldschmidt - Unesc
Profa. Dra. Luciana Aboim Machado Gonçalves da Silva - UFS
Profa. Dra. Viviane Coêlho de Séllos Knoerr - UNICURITIBA
Nota Técnica: Os artigos que não constam nestes Anais foram selecionados para publicação
na Plataforma Index Law Journals, conforme previsto no artigo 7.3 do edital do evento.
EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: ABORDAGEM DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE NA RELAÇÃO DE EMPREGO
HORIZONTAL EFFECTIVENESS OF FUNDAMENTAL RIGHTS: APPROACH TO PERSONALITY RIGHTS IN EMPLOYMENT RELATIONS
Andrea Silvana Fernandes de Oliveira
Resumo
O presente trabalho tem por objetivo analisar a aplicabilidade da eficácia horizontal dos
direitos fundamentais com abordagem nos direitos da personalidade nas relações de emprego,
marcada pela desigualdade entre particulares, tendo de um lado o empregador, detentor do
poder diretivo e do outro o empregado, hipossuficiente e vulnerável. O sistema brasileiro
infraconstitucional de proteção ao trabalhador incorporou os direitos fundamentais
trabalhistas de maneira superficial, tendo a Consolidação das Leis Trabalhistas, com raras
exceções, se limitado ao plano patrimonial. Essa visão reducionista do legislador
infraconstitucional de 1943 foi abandonada pela eficácia dos direitos fundamentais na
Constituição Federal do Brasil de 1988.
Palavras-chave: Constitucionalização, Eficácia horizontal, Direitos fundamentais, Direitos da personalidade, Relação de emprego
Abstract/Resumen/Résumé
The objective of this study is to analyze the applicability of the horizontal effectiveness
fundamental rights with approach to the rights personality in the employment relations,
marked by the inequality between individuals, having on one hand the employer, holder of
the directive power and other the employee, hyposufficient and vulnerable. The Brazilian
infraconstitutional system of worker protection incorporated labor fundamental rights
superficial way, with the Consolidation of Labor Laws, rare exceptions, limited to the equity
plan. This reductionist vision of the infraconstitutional legislator of 1943 was abandoned by
the effectiveness of fundamental rights in the Federal Constitution of Brazil 1988.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por escopo embasar a eficácia horizontal dos direitos
fundamentais realizando uma abordagem acerca dos direitos da personalidade nas relações de
emprego. Assim, quando se trata da incidência horizontal das normas constitucionais,
pretende-se demonstrar que a vinculação de tais garantias não se dá apenas nas relações de
poder que se estabelecem entre o Estado e o cidadão, o que constitui relação do tipo vertical,
mas também naquelas estabelecidas entre pessoas e entidades que se encontram em posições,
pelo menos em teoria, de igualdade, ou seja, entre particulares.
Nessa perspectiva, a existência de forças sociais, como os conglomerados
econômicos, sindicatos, grandes empresas multinacionais, associações patronais, entre outras,
exige que se reconheça a aplicação dos direitos fundamentais, também, em face de pessoas e
entes privados, tendo em vista o poder que concentram em suas mãos, os quais, incontáveis
vezes, oprimem e abusam do cidadão, parte mais frágil, desvirtuando o interesse social na
consecução de interesses particulares.
Os direitos fundamentais, compreendendo não apenas os direitos trabalhistas
específicos, mas também os direitos dos trabalhadores, relacionados à sua cidadania, como os
direitos de personalidade, de informação, de participação na vida da empresa, expressados
constitucionalmente como princípios normativos, vivenciados no contexto da empresa,
colidem muitas vezes, na sua aplicação, com o chamado “interesse da empresa”, representado
pelo “jus variandi” do empregador, expressando também os valores constitucionais da livre
iniciativa e da livre concorrência, será o método da ponderação que resolverá o conflito dos
princípios normativos em cada caso concreto, quando então valer-se-á do princípio da
proporcionalidade.
Os direitos da personalidade concebidos como instrumento de tutela da pessoa,
impedem o ataque à esfera privada do indivíduo, não se restringindo somente a isso, mas
alcançam novas projeções, regulando casos em que a pessoa relaciona-se com terceiros, como
é o caso da relação entre empregado e empregador. O Direito do Trabalho passa a ter uma
nova preocupação, na medida em que, além de tutelar os interesse do empregado frente ao
empregador, passa a tutelar igualmente a personalidade do empregado em relação a novas
práticas adotadas no mercado de trabalho.
Faz-se necessária a análise do dos direitos da personalidade nas relações de trabalho,
quais sejam, o direito à vida, à integridade física, à honra, à imagem e à privacidade do
Como elementos metodológicos, foi utilizado o método de abordagem indutivo, haja
vista a importância da observação de tudo que envolve o problema, de forma geral, como os
mecanismos assecuratórios dos direitos fundamentais atribuídos ao trabalhador, como são
instrumentalizados esses direitos, para assim, chegar a determinada conclusão mais específica
a respeito desse quadro. O método de procedimento implementado foi o histórico e a técnica
empregada foi a documental indireta e bibliográfica, concretizado por meio de pesquisas
legais, jurisprudenciais e doutrinárias acerca da temática.
1 EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Os direitos fundamentais, consagrados pela Constituição Federal de 1988, são
direitos assegurados ao cidadão, tanto em sociedade quanto isoladamente, e que objetivam
protegê-los da discricionariedade estatal ou outros atos temerários praticados por terceiros.
Verifica-se, portanto, que enquanto as garantias são instrumentos da efetivação dos
direitos fundamentais e sendo assim, eminentemente assecuratórios, não estando
necessariamente expressos no Texto Constitucional, os direitos fundamentais, propriamente
ditos, constam expressamente da Constituição Federal, o que confere aos mesmos, caráter
declaratório.
Os direitos fundamentais possuem caráter de norma constitucional, haja vista a sua
positivação na Lei Maior. São direitos fundamentais na medida em que estão insertos no
Texto Constitucional, tendo passado por declaração do Poder Constituinte Originário para
tanto, com fundamento no Princípio da Soberania Popular. A priori, tais direitos possuem
eficácia e aplicabilidade imediata, situação que pode ser mitigada conforme os critérios de
razoabilidade e proporcionalidade previstos na lei ou a serem arbitrados em determinados
casos concretos.
No ordenamento jurídico brasileiro anterior à Constituição Federal de 1988, a
distinção entre direito público e direito privado tinha um caráter absoluto, o primeiro dispunha
sobre normas de ordem pública, regulando interesses gerais, e o segundo, regulamentava as
relações privadas, principalmente no que concerne as questões patrimoniais, representado
pelo Direito Civil, Empresarial e Trabalho.
Posteriormente, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, modificou os
paradigmas estruturais do direito privado, especificamente no que diz ao direito civil e direito
constitucionais tendo em vista, a irradiação de vetores constitucionais aplicados a todos os
ramos do direito. Assim, preceitua Dirley da Cunha Júnior:
[...] a partir da segunda metade do Século XX, e no Brasil particularmente com o advento da Constituição de 1988, surge o fenômeno da constitucionalização do Direito Civil, com a sujeição de suas normas e institutos aos princípios e regras constitucionais. De fato, valores constitucionais como dignidade da pessoa humana, solidariedade social e igualdade substancial marcam decisivamente a mudança do Direito Civil contemporâneo. (CUNHA JÚNIOR, 2016, p. 56)
Entende-se que houve uma reformulação de valores pela sociedade, ou seja, os
preceitos que antes estavam apenas no Direito Civil e Trabalhista estão agora inseridos na
Constituição. É ela quem positiva os direitos concernentes à justiça, segurança, liberdade,
igualdade, propriedade, herança, que antes estavam apenas no Código Civil. Um dos pontos
que marcam a constitucionalização é que sendo a noção de patrimônio é excluída e
substituída, sobretudo, pelo Princípio da Dignidade Humana.
Mas há dois desenvolvimentos que merecem destaque, pela dimensão das transformações que acarretam. O primeiro deles diz respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana na nova dogmática jurídica. Ao término da 2a. Guerra Mundial, tem início a reconstrução dos direitos humanos, que se irradiam a partir da dignidade da pessoa humana, referência que passou a constar dos documentos internacionais e das Constituições democráticas, tendo figurado na Carta brasileira de 1988 como um dos fundamentos da República (art. 1º, III). A dignidade humana impõe limites e atuações positivas ao Estado, no atendimento das necessidades vitais básicas, expressando-se em diferentes dimensões. No tema específico aqui versado, o princípio promove uma despatrimonialização e uma repersonalização do direito civil, com ênfase em valores existenciais e do espírito, bem como no reconhecimento e desenvolvimento dos direitos da personalidade, tanto em sua dimensão física quanto psíquica. (BARROSO, 2005, p. 44)
A segunda questão que marca a constitucionalização do direito civil e trabalhista é a
eficácia horizontal nas relações privadas, que surge com intuito de proteger direitos dos
indivíduos, uma vez que os direitos fundamentais são oponíveis não só em relação ao Estado,
mas também no âmbito das relações privadas, o Supremo Tribunal Federal, demonstrou em
suas decisões, dentre elas o RE 201.819/ RJ, 2ª Turma, o entendimento da proteção dos
direitos fundamentais nas relações privadas, estando em situação fática de igualdade, assim
expõe Virgílio Afonso da Silva:
Consagra-se que os direitos fundamentais foram construídos originariamente, como
direitos do indivíduo frente ao Estado, aonde, inicialmente, esses direitos fundamentais eram
exercidos verticalmente, de forma hierarquizada e com caráter de subordinação diante da
supremacia do Estado perante o particular. Com o Estado Democrático de Direito, os direitos
fundamentais foram estendidos sua atuação nas relações jurídicas entre particulares, para que
não ocorra nenhuma desestabilização jurídica.
A aplicação de direitos fundamentais nas relações privadas é conformada pela
autonomia da vontade, considerada princípio vetor de todo o direito privado. Assim, os
direitos fundamentais não são, para a pessoa do direito privado, comandos como o são para o
Estado; são antes condições para que a autonomia da vontade se realize plenamente,
garantindo o livre desenvolvimento da personalidade.
O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, precursor da instituição de todos os
direitos fundamentais, nos quais se incluem os direitos da personalidade, mantem ligação
imediata, aonde consideram direitos fundamentais gênero, do qual direitos da personalidade
são espécies. Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald (2015, p. 139), consideram que “os
direitos da personalidade estão, inexoravelmente, unidos ao desenvolvimento da pessoa
humana, caracterizando-se como garantia para a preservação de sua dignidade.”
1.1 Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais na Relação de Emprego
Tratando-se dos direitos fundamentais nas relações de emprego, em razão do poder
de direção exercido pelo empregador que coloca em risco a eficácia dos direitos fundamentais
dos trabalhadores, razão pela qual há uma dimensão negativa, isto é, limitadora do poder de
direção do empregador para respeitar o exercício dos direitos fundamentais dos trabalhadores.
Dispõe Barroso, a necessidade de aplicação horizontal dos direitos fundamentais é
diretamente proporcional à desigualdade das partes envolvidas no conflito. Quanto maior a
disparidade entre os sujeitos, maior deve ser a intervenção estatal em favor da parte
considerada hipossuficiente.
Em um contrato de trabalho é evidente a desigualdade das partes: o trabalhador
necessita vender sua força de trabalho ao empregador, que dirige a prestação pessoal dos
Não apenas dos direitos trabalhistas específicos, seja dos direitos individuais, seja
dos direitos coletivos, mas também os direitos de cidadania dos trabalhadores, como os
direitos de personalidade.
Os direitos de personalidade estão relacionados à inviolabilidade da vida privada dos
trabalhadores, hoje traduzida pela liberdade de expressão e opinião, da integridade física e
moral, reserva da intimidade da vida privada (a questão da revista), proteção de dados
pessoais, controle do uso pelo empregador dos meios de vigilância à distância, com finalidade
de controlar o desempenho profissional do trabalhador, direito à confidencialidade de
mensagens e de acesso à informação, com a garantia da utilização do correio eletrônico
(Internet), embora possa o empregado estabelecer regras de utilização desses meios.
A título de jurisprudências prolatados pelo STF no que se refere ao tema discute sobre
à expulsão de associado de cooperativa por deliberação da Assembleia Geral, sem que fossem
observadas as regras estatutárias relacionadas à ampla defesa.
A controvérsia se estabeleceu em torno do fato de que os próprios associados lançaram
desafio público manifestando o desejo de serem julgados pela Assembleia Geral. Apesar de
no aludido caso ter sido feita referência ao direito à ampla defesa como derivativo do devido
processo legal, o fato é que o próprio estatuto da entidade já fazia referências ao direito de
defesa, o que acabou por prejudicar, pelo menos no referido acórdão, a análise acerca de qual
corrente tem a preferência da Suprema Corte. Segue o julgado acima referido:
Cooperativa – Exclusão de associado – Caráter punitivo – devido processo legal. Na hipótese de exclusão de associado decorrente de conduta contrária aos estatutos, impõe-se a observância do devido processo legal, viabilizando o exercício amplo da defesa. Simples desafio do associado à assembléia geral, no que toca à exclusão, não é de molde a atrair a adoção do processo sumário. Observância obrigatória do próprio estatuto da cooperativa. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 158. 215-4. Publicado no DJ em 7 jun 1996).
Em relação à despedida individual, a proteção da relação de emprego contra a
despedida arbitrária ou sem justa causa (artigo 7º, inciso I, da CF/88) não poderia ser
assegurada pelo controle prévio da despedida sob alegação de justa causa, com sindicância
interna na empresa, implicando a procedimentalização do poder disciplinar do empregador,
em razão do princípio constitucional da presunção da inocência, previsto pelo artigo 5º, inciso
LVII, da CF/88, extensivo ao trabalhador, com direito ao contraditório e ampla defesa, sob
pena de a empresa ser condenada no pagamento de indenização a ser arbitrada por abuso de
direito e por dano moral.
Na despedida em massa ou coletiva, assegurando-se o direito prévio à informação e à
princípios não catalogados, mas assegurados pela ratificação pelo Brasil de convenções
pertinentes da OIT, conforme prevê o artigo 5º, § 2º, CF/ 88. A despedida em massa sem a
prévia informação e negociação implicaria ilicitude por abuso de direito e por violação da
boa-fé objetiva e seus deveres anexos, previstos pelos artigos 187 e 422 do Código Civil,
resultando a obrigação de pagar indenização complementar à indenização compensatória já
prevista no ordenamento jurídico.
Assim decidiu o Tribunal da 15ª Região, em decisão paradigmática no caso Embraer
(processo de dissídio coletivo jurídico nº 00309200900015004-DC), o que levou o TST
(processo de dissídio coletivo jurídico nº. TST-ES-207660/2009-000-00- 7) a decidir que as
despedidas coletivas doravante devem ser precedidas de negociação entre a empresa e os
trabalhadores e seus representantes.
Outro direito fundamental, cuja eficácia é reclamada, é a participação dos
trabalhadores na gestão da empresa, conforme previsão do artigo 7º, XI, da CF/88. Em que
medida a teoria da empresa, consagrada pelo artigo 966 do Código Civil poderia assegurar a
participação dos trabalhadores na gestão da empresa, por meio da via judicial trabalhista,
quando o exercício profissional da atividade econômica organizada implica a articulação dos
fatores de produção, entre eles a mão-de-obra a exigir a participação dos trabalhadores na sua
gestão.
A Segunda Turma da Suprema Corte, um tempo depois, apreciou um outro caso, esta
agora envolvendo a aplicação dos direitos fundamentais em relação jurídica travada entre
particulares e consistia em uma reclamação trabalhista movida por empregado brasileiro de
uma companhia aérea francesa e tinha por objetivo estender as prerrogativas do Estatuto
Pessoal da empresa, o qual era aplicado somente aos empregados franceses. O STF,
entendendo ter havido uma violação ao princípio isonômico, decidiu da seguinte forma:
Constitucional. Trabalho. Princípio da igualdade. Trabalhador brasileiro empregado de empresa estrangeira: estatutos de pessoal desta: aplicabilidade ao trabalhador estrangeiro e ao trabalhador brasileiro. C.F., 1967. art. 153,§1º, C.F., 1998, art. 5º, caput.
I – Ao recorrente, por não ser francês, não obstante trabalhar para empresa francesa, no Brasil, não foi aplicado o Estatuto Pessoal da Empresa, que concede vantagens aos empregados, cuja aplicabilidade seria restrita aos empregados de nacionalidade francesa. Ofensa ao princípio da igualdade (C.F., 1967. art.153,§ 1º, C.F., 1998, art.5º, caput).
II - A discriminação que se baseia em atributo, qualidade, nota intrínseca ou extrínseca do indivíduo, como o sexo, a raça, a nacionalidade, o credo religioso etc., é inconstitucional. Precedentes do STF: Ag. 110.846 (Ag. Rg) – PR, Célio Borja, RTJ 119-465).
Vislumbra-se, portanto, que Supremo Tribunal Federal, embora não tenha se
manifestado expressamente, vem se alinhando em favor da aplicabilidade direta dos direitos
fundamentais nas relações entre particulares.
2 DIREITOS DA PERSONALIDADE
Pode-se dizer que, os direitos da personalidade originam-se da própria dignidade
reconhecida à pessoa humana para tutelar os valores do indivíduo, seja perante outras pessoas,
seja em relação ao Poder Público. O Código Civil enumera alguns direitos da personalidade
como a integridade física, a honra, a imagem, a intimidade e o nome, sendo essa enumeração
não exaustiva, comportando, portanto, o reconhecimento de outros direitos da personalidade
nele não expressamente tipificados. Nesse sentido, o editado Enunciado 274, do CJF,
aprovado na IV Jornada de Direito Civil:
Os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, III, da Constituição (princípio da dignidade da pessoa humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação.
Os direitos da personalidade, assim como a liberdade pública (direitos fundamentais
de primeira dimensão), possuem um caráter absoluto, geram um dever de abstenção (eficácia
erga omnes), no sentido de não violar direitos da personalidade alheios.
Assim sendo, dentre os direitos considerados como pertencentes à personalidade do
indivíduo, destacam-se o direito à vida, à liberdade, ao nome, à imagem, à honra, às
integridades física, moral e psíquica, à vida privada e à proteção da intimidade. Os direitos
fundamentais e o direito à personalidade têm como principal objetivo a proteção da dignidade
da pessoa humana. Ingo Wolfgang Sarlet define a dignidade da pessoa humana da seguinte
forma:
Os direitos da personalidade alcançaram status de direito fundamental antes do final
do Século XX. Inicialmente, foram tratados no inciso X do art. 5º da Constituição, e, no
Direito civil, o Código Civil de 2002 introduziu, nos arts. 11 a 21, uma tratativa dessa matéria.
No Direito do Trabalho, não há previsão expressa acerca dos direitos da personalidade do
empregado, com exceção da matéria das revistas íntimas. Assim, convém traçar o
desenvolvimento dos direitos da personalidade de uma maneira geral e, depois, situá-los no
campo laboral.
O Código Civil de 1916 não fazia qualquer referência acerca dos direitos da
personalidade, o que acabou sendo uma das inovações trazidas pelo atual Código. Assim,
pode-se dizer que o Código Civil de 2002 abandonou a antiga concepção patrimonialista e
adotou a característica da socialidade. Ou seja, o homem e seus valores passam a ser o
enfoque central do direito civil.
Assim conceitua os direitos da personalidade:
Sob a denominação de direitos da personalidade, compreendem-se os direitos personalíssimos e os direitos essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana que a doutrina moderna preconiza e disciplina no corpo do Código Civil como direitos absolutos desprovidos, porém, da faculdade de disposição. Destinam- -se a resguardar a eminente dignidade da pessoa humana, preservando-a dos atentados que pode sofrer por parte dos outros indivíduos. (GOMES, 1996, p. 130).
Em face de seu caráter essencial, a maior parte dos direitos da personalidade são
direitos inatos, como direitos originários que nascem com a própria pessoa, sendo também
imprescritíveis, onde a omissão no seu exercício não provoca a extinção do direito.
Para que ocorra o exercício dos direitos da personalidade, faz-se necessário garantir ao
particular a autonomia privada, a liberdade para exercer sua vontade, faculdade de
autodeterminação, sob o respaldo da dignidade da pessoa humana, tem especial função para
que essa dignidade seja respeitada e alcançada.
Cada pessoa é um fim em si mesmo, e em cada homem ou mulher, pulsa toda a Humanidade! Por isso, as pessoas são titulares de direitos inalienáveis, que podem ser exercidos inclusive contra os interesses da sociedade. Num sistema constitucional antropocêntrico, fundado na dignidade da pessoa humana, não parece legítimo resolver possíveis tensões entre a liberdade existencial da pessoa e os interesses da coletividade sempre em favor dos segundos (SARMENTO, 2010, p. 65).
Segundo Alvarenga (2015), a dignidade humana é o núcleo essencial que compõe os
direitos humanos, é a fonte ética que confere unidade, sustentáculo e sentido a todo o sistema
constitucional brasileiro.
No direito do trabalho, a proteção ao hipossuficiente liga-se com a dignidade
humana. Acreditamos que o conteúdo básico do direito do trabalho seja a proteção e a
preservação da dignidade do ser humano. Visto que a justiça especializada trabalhista regula o
direito social do trabalho, base de qualquer sociedade.
2.1 Direitos da Personalidade na Relação de Emprego
No plano laboral, esta matéria justifica uma reflexão a três níveis: em primeiro lugar,
deve ser realçada a importância dos direitos de personalidade do trabalhador no domínio do
contrato de trabalho; em segundo lugar, importa atentar nas ideias-força do regime do Código
do Trabalho nesta matéria, conjugando-o ainda com as normas do Código Civil em matéria de
tutela dos direitos de personalidade e com o regime da Constituição em matéria de direitos
fundamentais.
Com efeito, ao lado da dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho
também constitui pilar fundamental do Estado Democrático de Direito, conforme disposto no
art. 1º, IV, da CF/ 88. O trabalho é direito social, conforme o art. 6º da CF, que deve ser
assegurado pelo Estado e dotado de maior eficácia possível. O art. 170 da Carta Magna
estabelece que a ordem econômica funda-se na valorização do trabalho humano e, por fim, o
art. 193 prevê que a ordem social tem como base o primado pelo trabalho e pela justiça social.
Portanto, como o direito deve nortear-se pelas normas constitucionais, o trabalho humano e o
Quanto a classificação dos direitos da personalidade, a doutrina brasileira segue
determinada divisão, segundo BARROS (2010, p. 25):
Filiamo-nos à doutrina nacional que classifica “os direitos da personalidade”
como direito à integridade física (direito à vida, a higidez corpórea, às partes do
corpo, ao cadáver, etc); direito à integridade intelectual (direito à liberdade de
pensamento, autoria artística e científica e invenção) e direito à integridade moral,
incluído neste último o direito à intimidade, à imagem, à privacidade, à honra, à
boa fama, à liberdade civil, política e religiosa.
Em relação à vida e à integridade física do trabalhador, há uma obrigação do
empregador em manter serviços especializados em segurança e higiene do obreiro. A
Constituição Federal, no art. 7º, inciso XXVIII, dispõe que o trabalhador tem direito a um
seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, além de uma indenização quando
incorrer em dolo ou culpa.
Quanto ao direito ao direito a honra, no direito do trabalho, sempre que o
empregador age de forma a atentar contra a reputação, credibilidade ou valor do empregado, o
bom nome de que o trabalhador desfruta no meio social, atinge sua honra. Em face da
inexistência de norma específica na legislação trabalhista que tutele os direitos de
personalidade do empregado, faz-se necessária a aplicação subsidiária do direito comum,
autorizada pela norma contida no parágrafo único do art. 8º da CLT.
Ementa: PROIBIÇÃO AO USO DE BARBA NO TRABALHO. INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL COLETIVO. Não se pode negar ao empregador, em razão do seu poder diretivo, o direito de impor determinados padrões, de exigir dos seus empregados certa forma de se conduzir e de se apresentar no ambiente de trabalho, inclusive no que diz respeito à proibição do uso de barba, bigode, cavanhaque ou costeleta, quando em serviço, o que não se revela como exigência abusiva ou desarrazoada. (BAHIA. Tribunal Regional do Trabalho. Recurso Ordinário n. 0073200-78.2008.5.05.0007, da 4ª Turma. Relatora: Desembargadora Graça Boness. Salvador, 07 de julho de 2011. Acesso em: 19 jul. 2017).
De acordo com o art. 20 do Código Civil, a imagem de uma pessoa somente pode ser
utilizada se houver consentimento da pessoa interessada ou dos legitimados para o ato e se a
exibição for necessária para a administração da justiça ou a manutenção da ordem pública.
No texto constitucional, a proteção da imagem está estampada no art. 5º, inciso V. O
STJ entende que somente em situações muito claras deve ser aceito como válido o
consentimento tácito em relação à cessão do direito de imagem, devendo ser feita uma
interpretação restritiva ao art. 111 do Código Civil. No campo laboral, essa restrição faz-se
caráter de adesão dos contratos de trabalho. Portanto, há a necessidade do consentimento
expresso do trabalhador para uso da imagem, sob pena de configurar violado esse direito com
a consequente necessidade de reparação.
No direito do trabalho, tem-se como violada a imagem-retrato quando o empregador
divulga à sua empresa nos meios de comunicação, utilizando a imagem do empregado sem
prévia autorização, pouco importando se a campanha publicitária enalteça o produto da
empresa, a higiene do ambiente de trabalho ou a excelência dos serviços prestados pelos
empregados, sendo, portanto, a mera propagação da imagem do empregado suficiente para
gerar a reparação por danos morais ao empregado. O Enunciado 14 da Jornada de direito
material e processual da Justiça do Trabalho de 2007, regulamentou que:
O empregador não pode, sem autorização judicial, conservar gravação, exibir e divulgar, para seu uso privado, imagens dos trabalhadores antes, no curso ou logo após a sua jornada de trabalho, por violação ao direito de imagem e à preservação das expressões da personalidade, garantidos pelo art. 5º, V, da Constituição.
Portanto, o empregador que expor o trabalhador indevidamente na mídia viola a
honra, a intimidade e a privacidade. Em ocorrendo agressões a esses bens de caráter
personalíssimo do indivíduo, nascerá a obrigação de indenizar o trabalhador pelos danos
morais sofridos.
No inciso X do art. 5ª da Constituição, o texto resguardou de forma expressa tanto a
intimidade quanto a privacidade das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano
material ou moral decorrente de sua violação. O art. 21 do Código Civil garante a
inviolabilidade da vida privada da pessoa natural, afirmando que o juiz, a requerimento do
interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário ao
preceito.
A Corte Europeia de Direitos Humanos instituiu, no art. 8º da sua Convenção, o que
a doutrina denominou de “vida privada social”, ou seja, que o conceito de vida privada
abrange o ambiente de trabalho. O Código de Trabalho de Portugal prevê expressamente a
proteção da intimidade e da vida privada do trabalhador no art. 16. Senão, veja-se:
Art. 16 - Reserva da intimidade da vida privada. Empregador e trabalhador devem respeitar os direitos de personalidade da contraparte, cabendo-lhes, designadamente, guardar reserva quanto à intimidade da vida privada.
No campo laboral, no que se refere à privacidade do trabalhador no ambiente de
trabalho, tem-se, no direito brasileiro, a questão das revistas íntimas e da revista pessoal de
empregados.
O art. 373-A da CLT autoriza a realização da revista pessoal, resguardada a
intimidade do empregado. Embora esse preceito esteja previsto no capítulo da mulher,
aplica-se a todos os empregados em geral. Portanto, é viável a revista pessoal dos empregados,
porém é necessário atender certos requisitos, tais como o resguardo dos atributos da dignidade
da pessoa, a divulgação prévia e adequada e a adoção de meios razoáveis durante a realização
do procedimento. Nesse sentido, é o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho:
Sob o fundamento de que a revista pessoal, por si só, não enseja condenação por danos morais, a Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou pedido de indenização formulado em reclamação trabalhista por um empregado que alegava constrangimento em face da revista a que era submetido na empresa Itabuna Têxtil S.A. A Turma, ao decidir, considerou as razões expressas no acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA) que, de igual modo, não reconheceu a existência de dano moral no procedimento da empresa, pois a revista, embora diária, era realizada de forma aleatória (por sorteio eletrônico), em local reservado, por funcionário do mesmo sexo.
Na Segunda Turma, o ministro-relator, José Roberto Freire Pimenta, salientou que o Regional não mencionou nenhuma conduta da empresa que tenha extrapolado os limites do seu poder diretivo e fiscalizatório. Desta forma, o procedimento do empregador não configura prática de ilícito que enseje dano passível de reparação. (DISTRITO FEDERAL. Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista n. 96400- 38.2007.5.05.0464, 2ª Turma. Relator: Ministro José Roberto Freire Pimenta. Brasília, 23 de março de 2012. Acesso em: 2 de jul 2017).
Ainda, na esteira da reserva da intimidade e da vida privada no ambiente de trabalho,
surge, no campo laboral, uma outra questão que consiste no controle sobre o conteúdo do
correio eletrônico recebido e enviado pelo empregado, bem como o monitoramento dos sites
da internet visitados pelos empregados.
Assim, conclui-se que por meio do critério de ponderação de valores e da utilização
do princípio instrumental da proporcionalidade, no caso concreto, é possível solucionar
conflitos oriundos do direito à intimidade do empregado e do poder diretivo do empregador,
avaliando-se a possibilidade de monitoramento do correio eletrônico frente à expectativa de
resguardo da intimidade do trabalhador.
2.1.1 Entrevistas vexatórias
privada do candidato ao emprego, pois certos questionamentos podem ferir os direitos
humanos fundamentais de personalidade do trabalhador.
Desse modo, as entrevistas devem se ater somente aos fatos profissionais decorrentes
das exigências técnicas para o preenchimento do cargo, sendo proibida qualquer diferenciação
e discriminação quanto à raça, sexo, cor, crença religiosa e idade. É vedado expor o candidato
ao ridículo, protegendo a sua intimidade, dignidade e moral.
2.1.2 Revistas pessoais
No que se refere à revista dos funcionários na entrada e na saída do local de trabalho,
vale esclarecer que essa revista representa um procedimento empresarial decorrente do poder
diretivo do empregador, tendo por objetivo salvaguardar o patrimônio da empresa e a
segurança dos empregados.
No entanto, vale frisar que esse poder não é absoluto, pois a revista deve ser
efetivada de forma adequada, razoável e harmônica, em consonância com a preservação à
intimidade do empregado. Se a revista não for realizada de forma adequada, ocorrerá abuso de
direito e constrangimento irregular por parte do empregador, mais precisamente excesso do
poder diretivo.
Nesse quadro, a revista íntima é simplesmente proibida. É o que determina o artigo
5°, inciso X, da Constituição Federal de 1988: são invioláveis a intimidade, a vida privada, a
honra e a imagem das pessoas. É assegurado o direito à indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação. Também é o que deriva de todos os demais preceitos da
Constituição que resguardam a dignidade da pessoa humana, já bastante citados.
Ainda, a própria CLT regulamenta essa questão em norma inserida pela Lei 9.799/99
(artigo 373-A, VI), que proíbe que o empregador execute a revista íntima nas empregadas ou
funcionárias. Em face do critério isonômico do artigo 5°, inciso I, da Constituição, não há
porque recusar-se a incidência da regra também em benefício dos homens.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A eficácia horizontal, voltada às relações particulares, inibe os detentores de poder
social e econômico de mutilarem o garantias e direitos fundamentais mínimos ofertados pela
Constituição Federal de 1988. As diferenças gritantes que vem se delineando nas relações
dignidade da pessoa humana, e para tal, necessário se faz a aplicação direta dos direitos
fundamentais existentes em nossa Constituição Federal.
Algumas determinadas organizações privadas, dada a grande diversidade econômica
existente, ostentam um poder de mando e sujeição que reclamam as necessárias restrições,
que não só podem como devem se consubstanciar na aplicabilidade direta dos direitos
fundamentais como opção hermenêutica de proteção à pessoa.
Nesse cenário, há de ser considerada ainda a realidade da sociedade, em especial a
brasileira, na qual as diferenças sociais entre os indivíduos são imensas, de modo que a
aplicabilidade direta dos direitos fundamentais nas relações privadas pode se qualificar como
valioso instrumento de proteção jurídica.
Quantos aos direitos da personalidade a proteção destes não está prevista, de forma
expressa, na legislação trabalhista, com exceção da matéria de revistas íntimas, o que diminui
o nível de proteção dos direitos da personalidade do trabalhador. Assim, o Código Civil
cumpre papel de norma subsidiária. No campo laboral, com o advento das novas tecnologias,
inseriu-se, no ambiente de trabalho, novas ferramentas para a prestação dos serviços. O uso do
e-mail na atividade empresarial propiciou grandes vantagens, sendo necessária à sua
utilização. Porém, evidencia-se um conflito de direitos fundamentais, em razão do poder
diretivo do empregador e do direito à intimidade do empregado, no que tange à possibilidade
de controle do correio eletrônico utilizado pelo trabalhador. Quanto este aspecto, a
jurisprudência admite a possibilidade de monitoramento do correio eletrônico corporativo, ao
passo que, quanto ao e-mail pessoal, deve ser resguardada a intimidade do empregado.
Por fim, os direitos da personalidade nas relações laborais têm sido aplicados de
maneira incólume, tendo em vista a proteção obreira que orienta as interpretações nas relações
de emprego, ao passo que, também há uma orientação jurisprudencial no sentido de mitigar a
interpretação da aplicação dos direitos da personalidade nas relações de trabalho, face à
subordinação característica da relação laboral.
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