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Processo

10106/16.9T8PRT.P1

Data do documento

22 de março de 2021

Relator

Pedro Damião E Cunha

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Extinção da execução > Funcionário de justiça > Processo especial de revitalização > Penhora

SUMÁRIO

I – No âmbito da acção executiva, incumbe aos Srs. Funcionários Judiciais intervir na tramitação processual apenas na fase liminar do processo executivo e nos procedimentos ou incidentes de natureza declarativa, salvo no que respeita à citação – que já incumbe ao Sr. Solicitador de execução.

II - Por assim ser é que, na fase de extinção da instância executiva, o acto processual de notificação de decisão judicial praticado pelo Sr. Solicitador de execução integra-se no âmbito da sua competência funcional, tal como a mesma se encontra definida no art. 719º do CPC.

III - De qualquer forma, não se pode deixar de referir que, até certo ponto, se admite a estranheza da solução legal empreendida pelo legislador, uma vez que não se pode deixar de reconhecer que, em princípio, na tradição processual portuguesa quem tem a incumbência de cumprir os despachos do juiz são “os seus Funcionários” (da sua secção), não fazendo muito sentido que, para esse efeito, se remetam os autos para que uma entidade externa ao tribunal cumpra o despacho proferido pelo Juiz.

IV - Tendo sido aprovado e homologado plano de revitalização e não estando

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previsto nesse plano a continuação da acção executiva, por força do disposto no nº 1 do artigo 17º-E do CIRE, deve ser julgada extinta a instância executiva (por impossibilidade legal de prosseguir), com o inerente levantamento das penhoras que tenham sido concretizadas, pois estas destinavam-se apenas à realização dos fins da execução.

V – Não é aplicável à extinção da acção executiva, decorrente da homologação do plano de recuperação, o regime previsto no artigo 807º do CPC para os casos de acordo de pagamento em prestações da dívida exequenda e, por isso, as aludidas penhoras não se podem converter em hipotecas ou penhores.

TEXTO INTEGRAL

APELAÇÃO Nº 10.106/16.9T8PRT.P1

Comarca do Porto - Juízo de execução – J2

*

Sumário (elaborado pelo Relator- art. 663º, nº 7 do CPC):

...

...

...

*

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto.

I. RELATÓRIO.

Recorrente: - B…, Lda.;

Recorrida: C…, Lda.;

*

(3)

A Executada/recorrida foi condenada no âmbito do processo n.º 45584/15.4YPRT, que correu termos no J1 da Instância Local de V.N. Gaia – Secção Cível, da Comarca do Porto, a liquidar o quantitativo de €16.247,41 a título de capital, tendo ainda sido condenada a pagar os competentes juros de mora, vencidos e vincendos à taxa comercial.

Em 11 de Maio de 2016 a Exequente/recorrente executou a sentença em questão, dando assim origem aos presentes autos executivos.

Após terem sido efectivadas penhoras de créditos de que era detentora a executada, foi a mesma citada em 22 de Junho de 2016.

Em 29 de Junho de 2016, a executada deu entrada do Processo Especial de Revitalização, o qual veio a culminar na aprovação de um plano de recuperação da executada, homologado por douta sentença datada de 19 de Dezembro de 2016, transitada em julgado.

Em 16 de Maio de 2018 (Ref.ª 29152304), a executada requereu a extinção dos presentes autos executivos e consequente levantamento das penhoras, nos termos do art. 17.º-E do CIRE.

Por requerimento de 1 de Junho de 2018 (Ref.ª 29308668) a Exequente opôs-se à extinção dos presentes autos executivos e ao levantamento das penhoras que se encontram à ordem dos presentes autos.

*

Em 4 de Junho de 2018, o Sr. Agente de Execução proferiu a seguinte decisão:

“Extingue-se a presente execução tendo em consideração que, nos termos do artigo 17- E do CIRE, sendo aprovado o plano especial de revitalização.

[FUNDAMENTOS]

1 - A decisão a que se refere o n.º 4 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra a empresa e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto à empresa, as

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acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação”.

*

Em 18 de Junho de 2018, a exequente reclamou para o Exmo. Juiz titular do processo daquela decisão de extinção da execução, tendo invocado diversas questões de direito, entre as quais a nulidade prevista no art. 615.º n.º 1 al. d) (pelo facto do Sr. A.E. não se ter pronunciado sobre questões levantadas pela Exequente), abuso de direito por parte da Executada, bem como a eventual conversão das penhoras concretizadas no âmbito dos autos em penhor nos termos do art. 807º, nº 1 do CPC.

A 2 de Julho de 2018 a executada pronunciou-se quanto ao requerimento da Exequente, requerendo o indeferimento das questões levantadas pela exequente.

Em 27 de Fevereiro de 2020, a Executada apresentou novo requerimento a pugnar pelo encerramento do processo executivo, e pelo levantamento das penhoras.

*

Por despacho proferido em 8 de Setembro de 2020 (Ref.ª 416895100), o tribunal recorrido proferiu a seguinte decisão:

“Atento o alegado e comprovado, deverá a AE proceder ao arquivamento dos autos e ao cancelamento da penhora”.

*

Em face dessa decisão, veio ainda o Sr. Solicitador de execução remeter o processo ao Juiz ((dúvidas):

“… notificado do despacho de arquivamento e cancelamento das penhoras vem

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junto do tribunal requerer o seguinte esclarecimento.

Da decisão de extinção dos presentes autos, foi a mesma objecto de reclamação por parte da exequente e objecto de resposta por parte da executada, requerimentos com data de 18/06/2018.

A questão e dúvida levantada é se o despacho de arquivamento e cancelamento das penhoras datado de 8/9/2020 teve em conta essas reclamações de acto do agente de execução?

Pede deferimento”

*

Em face deste pedido de esclarecimento, o tribunal recorrido, proferiu o seguinte despacho:

“Informe positivamente”.

*

É justamente da referida decisão de 8 de Setembro de 2020 que a Exequente/Recorrente veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:

………..

………..

………..

Termos em que, e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá a presente Apelação ser julgada procedente, por provada, e nessa sequência revogado o douto despacho (final) recorrido, substituindo-se por um outro que mantenha a execução suspensa, ou assim não se entendendo que se mantenha as penhoras, com a conversão das mesmas em penhor nos termos do disposto no art. 807.º n.º 1 do C.P.C (…) “.

*

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A executada apresentou contra-alegações, onde pugna pela improcedência do Recurso, apresentando as seguintes conclusões:

“CONCLUSÕES:

I a III (efeitos do recurso)

(…)

IV - A decisão de extinção foi notificada pelo AE à recorrente, pelo que, ainda que ocorresse qualquer nulidade ou irregularidade na notificação, sempre já estaria a mesma sanada, até porque a recorrente reagiu à mesma, interpondo o presente recurso, não restando quaisquer dúvidas que nenhum direito seu foi precludido.

V - A decisão de extinção do Agente de Execução, datada de 4 de Junho de 2018, está devidamente fundamentada, de facto e de direito, sendo a decisão do Juiz a quo apenas a confirmação daquela, não existindo, pois, qualquer omissão na douta decisão ou nulidade da mesma.

VI - Com a aprovação e homologação do Plano de Recuperação, a forma de pagamento aos credores passou a ter de ser realizada nos termos previstos nesse plano, razão pela qual o prosseguimento das acções executivas – que visavam obter o pagamento imediato – se tornou inútil, fazendo sentido, nesta medida, que as execuções se extingam.

VII - A aprovação e homologação do Plano de Recuperação no processo especial de revitalização vincula todos os credores, mesmo aqueles que não tenham participado nas negociações ou discordem desse plano, e determina a extinção da execução já instaurada, a menos que o próprio plano preveja o seu prosseguimento.

VIII - Não prevendo o Plano de Recuperação a continuação de determinada execução, e sendo esta extinta, deixam de subsistir as penhoras efectivadas no respectivo processo, uma vez que estas se destinavam necessariamente à realização dos fins da execução.

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IX - A penhora, o arresto de bens e a hipoteca judicial são garantias reais de natureza processual e, por isso, acarretam desvantagens face às outras garantias reais. Assim, a preferência ou prioridade de pagamento destas garantias são, por força da lei, totalmente desconsideradas em caso de insolvência do devedor, não sendo nunca atendidas em sede de processo de insolvência.

X - Nos termos do art. 17º-E do CIRE, a aprovação e homologação do plano de recuperação no âmbito do Processo Especial de Revitalização obsta a instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação.

XI - Não prevendo o plano o prosseguimento da presente execução, a execução tem de ser extinta e, como consequência da extinção, levantadas as penhoras.

XII - O facto de constar do plano aprovado a expressão “manutenção das garantias existentes” nas condições particulares quanto aos credores comuns deve ser interpretado em conjugação ponto iv) das condições genéricas do plano (aplicáveis a todos os credores) sendo aplicável apenas “se já existirem garantias prestadas no âmbito dos financiamentos, mútuos, empréstimos, as mesmas serão mantidas”, o que não é o caso das penhoras à ordem dos presentes autos.

XIII - O levantamento das penhoras é consequência da extinção das execuções, e essa extinção opera ope leges por força do disposto no artigo art. 17º-E do CIRE.

XIV - Extinta a acção executiva, deixam de subsistir as penhoras, uma vez que estas se destinavam necessariamente apenas à realização dos fins da execução.

XV - A penhora de créditos jamais pode ser enquadrada no artigo 17º H, desde

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logo, porque não foi convencionada pelas partes, nem tem a finalidade de proporcionar à devedora os meios financeiros para o desenvolvimento da sua actividade.

XVI - Decorre do artigo 17º F, nº 10 (anterior nº 6) que a sentença vincula todos os credores (independentemente do seu sentido de voto), pelo que é eficaz em relação à recorrida.

XVII - A penhora da maioria dos créditos que, entretanto, foram penhorados à ordem dos presentes autos é posterior à nomeação do Sr. Administrador provisório, momento no qual deveriam ter sido suspensas todas as diligências da presente execução, conforme dispõe o artigo 17º C do CIRE.

XVIII - Tais penhoras, concretizadas já durante o período de negociações do PER, para além de ilegais, excederam em cerca 50% a quantia exequenda e as despesas prováveis, pelo que a haver abuso de direito, o mesmo deve ser atribuído à exequente/recorrente.

XIX - Há muito que já deveria ter sido autorizada a restituição de todas penhoras concretizadas após a nomeação do Sr. Administrador Judicial Provisório, a qual ocorreu em 5 de Julho 2016 e desde o trânsito em julgado da sentença homologatória do PER, que ocorreu em Janeiro de 2017, deveria ter sido determinada a extinção da instância e o consequente levantamento das penhoras.

XX - Nenhuma censura merece a decisão do Agente de Execução, que veio a ser confirmada pelo Douto Despacho recorrido, sendo que a questão em causa reveste tamanha simplicidade e está de tal forma assente na jurisprudência que deverá ser decidida por simples despacho.

Termos em que, deverá ser atribuído efeito meramente devolutivo e negado provimento ao recurso, mantendo-se na íntegra a Douta Decisão recorrida (…)”.

*

Como se pode ver do relatório que antecede, foi requerida a nulidade da

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decisão recorrida, por falta de fundamentação e omissão de pronúncia, mas o Tribunal Recorrido não se pronunciou sobre as mesmas no despacho que admitiu o recurso – cfr. art. 617º, nº 1 do CPC.

Considera-se, no entanto, que não se torna indispensável para apreciação Recurso fazer baixar o presente processo à Primeira instância para esse efeito (cfr. art. 617º, nº 6 do CPC), tanto mais que vigora nesta sede o princípio da substituição do tribunal recorrido pelo presente Tribunal- como iremos ver.

*

II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.

*

No seguimento desta orientação, a Recorrente coloca as seguintes questões que importa apreciar:

1 - saber se a decisão de encerramento do processo, ordenada pelo tribunal recorrido, foi notificada às partes por quem não tinha competência para o efeito, pelo que essa notificação deve ser considerada irregular, e, portanto, nula e de nenhum efeito (ut art. 195.º n.º 1 e 2 do CPC).

*

2 - Saber se se verifica a nulidade da decisão recorrida, por falta de fundamentação e omissão de pronúncia (não se pronunciou sobre a reclamação deduzida pela Recorrente contra a decisão de extinção de instância proferida pelo Sr. Solicitador de execução) – als. b) e d) do nº 1 do art. 615º do CPC.

*

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3 - saber se a recorrida agiu em abuso de direito (ut art. 334.º do Cód. Civil), quando requereu a extinção dos presentes autos executivos (pois que bem sabia que a presente acção executiva deveria prosseguir, pois tal não estava excluído no P.E.R. aprovado, tendo a própria Executada previsto no seu plano de recuperação a manutenção das garantias existentes para os credores comuns, que no caso da Apelante só se poderia estar a referir-se às penhoras existentes, pelo que sempre se acautelou, ainda que indirectamente, naquele plano de recuperação, o prosseguimento da presente acção executiva).

*

4 - Saber se o PER aprovado é ineficaz em relação ao recorrente;

*

5 - Saber se, tendo-se previsto no plano de recuperação, a manutenção das garantias existentes (mesmo no caso dos credores comuns, como é o caso da Recorrente), as penhoras concretizadas no âmbito dos presentes autos deveriam ter sido convertidas em penhor nos termos do disposto no art. 807º, nº 1 do CPC.

*

Na sequência, pede que:

- o despacho onde se ordena a extinção, e por consequência o encerramento dos presentes autos e o cancelamento das penhoras, seja revogado e substituído por outro que mantenha a execução suspensa e mantenha as penhoras realizadas,

- ou caso se venha entender que os efeitos da aprovação e homologação do plano vertidos no n.º 1 do artigo 17-E do CIRE, no que concerne com a extinção das acções é igualmente aplicável à presente execução, sempre se deverão

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manter as penhoras nos termos já explanados com a respectiva conversão em penhor.

*

A) - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

*

Como factualidade relevante interessa aqui ponderar:

- os trâmites processuais dos presentes autos, nomeadamente, os consignados no relatório do presente Acórdão e o teor da decisão proferida - trâmites e decisão que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.

- Além disso, considera-se provado o teor do “Plano de recuperação conducente à revitalização da devedora C…, Lda. “, que aqui se dá também por integralmente reproduzido, nomeadamente, nos seguintes excertos que têm pertinência com as questões atrás enunciadas:

(…)

DAS CONDIÇÕES GENÉRICAS (SALVO EXCEPÇÕES INDICADAS)

i) Início da contagem de prazos

Para efeitos de início de contagem de prazos fixa-se a data de trânsito em julgado da sentença de homologação do plano de recuperação.

ii) Consolidação de dívidas

Consolidação da dívida, incluindo o capital e juros, vencidos à data, ocorrerá na data do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação.

iii) A periocidade dos planos prestacionais será mensal;

iv) Nos casos de se prefigurar um período de carência, este será apenas de capital, e será pelo prazo de doze meses

v) Considerando o prazo de carência do regime prestacional, a primeira prestação vence-se no décimo terceiro mês após o trânsito em julgado da

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sentença homologatória do plano de recuperação.

vi) Se já existirem garantias prestadas no âmbito dos financiamentos, mútuos, empréstimos, as mesmas serão mantidas.

vii) Fica expressamente consignado que o incumprimento do plano de recuperação terá os efeitos previstos no artigo 218 do CIRE.

viii) Salvo regresso de melhor fortuna.

*

CONDIÇÕES PARTICULARES

(…)

Instituições Financeiras (…)

Estas entidades ficam sujeitas às condições genéricas já apresentadas.

Assim:

i) Início da contagem de prazo: trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação;

ii) Consolidação da dívida na data do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação;

iii) Pagamento do capital em dívida (total) em 120 prestações iguais e sucessivas;

iv) Período de carência (apenas de capital): 12 meses;

v) Vencimento da 1ª prestação no décimo terceiro mês após o trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação;

vi) Manutenção das garantias, se já existirem;

vii) Taxa de juro indexada à Euribor a 12 meses, acrescida de spread de 4%

(quatro);

viii) Aplicação do artigo 218 do CIRE;

ix) Salvo regime de melhor fortuna;

*

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O caso particular da credora 321 (…):

Condições Propostas:

i) Início da contagem de prazo: no mês seguinte à data da apresentação do plano de revitalização (encerramento das negociações);

ii) Consolidação da dívida: no mês seguinte à data da apresentação do plano de revitalização (encerramento das negociações);

iii) Pagamento de todo o capital em dívida (capital e juros e quaisquer valores) em 132 (cento e trinta e duas prestações mensais, iguais e sucessivas);

iv) Inexistência de qualquer período de carência;

v) Vencimento da primeira prestação: no mês seguinte à data da apresentação do plano de revitalização (encerramento das negociações);

vi) Manutenção das garantias existentes;

vii) Taxa de juros indexada à Euribor a 3 meses, acrescida de 2,5% (dois e meio);

viii) Aplicação do artigo 218 do CIRE;

ix) Salvo regresso de melhor fortuna.

(…)

CREDORES COMUNS / OUTROS CREDORES COMUNS i) B…, Unipessoal, Lda. (credor 02);

ii) (…)

Quanto a estes credores será de considerar o seguinte:

iii) Início e contagem dos prazos consolidação da dívida na data do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação;

iv) Perdão da totalidade dos juros vencidos e demais encargos financeiros (comissões, impostos de selo, etc.), também vencidos;

v) Periodicidade mensal do plano prestacional;

vi) Pagamento do valor consolidado em 120 prestações iguais e sucessivas;

vii) Período de carência de dezoito meses;

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viii) Pagamento da primeira prestação no décimo nono mês após o trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação;

ix) Perdão da totalidade dos juros vincendos;

x) Salvo regresso de melhor fortuna;

xi) Manutenção das garantias existentes;

xii) Aplicação do artigo 218 do CIRE;

(…)”

*

Mais consta dos autos o documento nº 2 (junto com a comunicação de 16.5.2018) de onde decorre que a exequente declarou que “… rejeita o plano de recuperação proposto pela empresa e que nos foi dado a conhecer”.

*

Este plano, como já decorre do relatório, veio a ser homologado pela sentença proferida em 19.12.2016, já transitada em julgado, de onde se destaca o seguinte excerto:

“VI. Do Direito

Nos termos do disposto no art. 17-F nº 3 do CIRE, considera-se aprovado o plano de recuperação que reúna a maioria dos votos prevista no nº 1 do art.

212, sendo o quórum deliberativo calculado com base nos créditos relacionados contidos na lista de créditos a que se referem os nºs 3 e 4 do art. 17-D.

A maioria dos votos prevista no art. 212, nº 1, é de 2/3, incluindo-se metade dos votos dos credores subordinados e descontando-se as abstenções.

No presente processo, atendendo aos credores que votaram favoravelmente, e descontando-se as abstenções, o plano mostra-se aprovado (mais de 2/3 dos votos, descontando-se as abstenções), pois votaram favoravelmente 84,90%.

Inexistindo razões que nos levem a não homologar o plano, o Tribunal decide

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homologá-lo.

*

VII. Dispositivo

Atento o exposto e ao abrigo do disposto nos nºs. 2, 3, 4 e 5 do artigo 17.º-F, da Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, homologa-se, pela presente sentença, o plano de recuperação (cfr. fls. 76 e ss.) (…)”.

*

B) - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Comecemos por apreciar a primeira questão que é colocada pela Recorrente que contende a alegada irregularidade da notificação da decisão recorrida por ter sido efectuada pelo Sr. Solicitador de execução (e não pelos Srs.

Funcionários judiciais da respectiva secção).

Invoca a recorrente, em abono da sua arguição de nulidade (cfr. art. 195º do CPC) do acto de notificação que lhe foi efectuado, os arts. 253º, 157º, nº 1 e 2, 220º, nº 2, 247º, nº 1 e 720º, nº 7, todos do CPC, defendendo que decorre destes preceitos legais que as notificações das decisões judiciais são da incumbência da secretaria do Tribunal e não do Agente de Execução – contrariamente ao que sucedeu no caso concreto.

Como decorre expressamente das considerações que expende, a recorrente pretende arguir a nulidade (processual) da notificação da decisão recorrida efectivada pelo Sr. Solicitador de execução, alegando que, não fazendo parte da sua competência funcional, este ao praticar tal acto de notificação praticou um

“acto que a lei não admitia” - art. 195º, nº 1 do CPC.

Ora, antes mesmo de entrar nessa questão da competência funcional do Sr.

Solicitador de execução, importa chamar a atenção para uma questão prévia que contende com a admissibilidade de invocação dessa nulidade processual em sede do presente recurso.

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Conforme resulta do relatório elaborado, constata-se, efectivamente, que foi o sr. Solicitador de execução que procedeu à notificação da decisão recorrida (proferida pelo Juiz).

Acontece que se a recorrente pretendia arguir essa eventual irregularidade não o podia ter efectuado, de uma forma directa, em sede do presente recurso, pois que tal acto processual, tendo sido praticado depois da decisão recorrida, não se mostra “coberto” por qualquer decisão judicial que sobre ela se tenha pronunciado[1].

É que, como é sabido, “… os Recursos destinam-se à apreciação de questões já antes levantadas e decididas no processo e não a provocar decisões sobre questões que não foram ainda submetidas ao contraditório e decididas pelo Tribunal Recorrido, a menos que se trate de questões de conhecimento oficioso…”[2] -o que não sucede, no caso concreto (arts. 195º; cfr. art. 196º do CPC).

Nessa medida, uma das limitações que decorre desta natureza do Recurso, enquanto meio de impugnação de uma anterior decisão, é justamente a de que o objecto do Recurso, regra geral, não pode incidir sobre questões que ainda não tenham sido apreciadas anteriormente pelo Tribunal Recorrido (“questões novas”).

Sucede que no caso concreto, esta regra geral decorre directamente do disposto nos arts. 196º, 2ª parte, e 200º, nº 3 do CPC onde se impõe que a nulidade, como aquela que aqui foi arguida (falta ou irregularidade da notificação da decisão judicial), devia ter requerida junto do tribunal onde foi alegadamente cometida a nulidade (1ª instância), cabendo então recurso da decisão que a conhecesse[3].

Como é sabido, as nulidades processuais traduzem-se em desvios ao formalismo processual prescrito na lei, quer por se praticar acto proibido, quer por se omitir um acto prescrito na lei, quer por se realizar um acto imposto ou permitido por lei, mas sem o formalismo requerido.

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Tais nulidades, conforme já se referiu, constituindo anomalia do processo, devem ser suscitadas e conhecidas no Tribunal onde ocorreram e, discordando- se do despacho que as conhecer, poderá ele ser impugnado através de recurso.

Destas considerações, resultaria, então, que não poderia o presente Tribunal da Relação conhecer de uma nulidade processual alegadamente cometida na 1ª Instância, que foi suscitada pela parte interessada, sem que tenha merecido da parte do Tribunal de Primeira Instância decisão expressa sobre a questão.

É que, como se pode ler no Ac. RC de 27.05.2015[4]:“ (…) o regime consagrado entre nós para os recursos ordinários é de “(…) reponderação e não de reexame, visto que o tribunal superior não é chamado a apreciar de novo a acção e a julgá-la como se fosse pela primeira vez, indo antes controlar a correcção da decisão proferida pelo tribunal recorrido, face aos elementos averiguados por este último.”. Daqui decorre — e em consonância com a máxima tradicional “dos despachos recorre-se, das nulidades reclama-se” —, que as nulidades decorrentes da preterição de uma formalidade legal terão de ser sempre suscitadas perante o Tribunal de 1ª instância, competindo a este decidir se a nulidade se verifica (art. 200º, nº 3 do CPC).

A não ser assim, o Tribunal de recurso ver-se-ia na contingência de decidir a questão pela primeira vez, ao arrepio do nosso sistema de recursos.

Em sede de recurso, o Tribunal da Relação só pode pronunciar-se sobre a decisão que recaiu sobre a nulidade reclamada e nunca sobre a arguição da nulidade “em si mesma” pois tal integraria uma decisão em 1ª instância.

Concluímos, portanto, que não poderia este Tribunal da Relação conhecer da nulidade em apreço.

De qualquer forma, mesmo que assim não se entendesse, sempre cumpriria referir que nunca tal nulidade poderia aqui ser reconhecida, pois que, conforme resulta do facto de a exequente ter podido interpor recurso, tratar-se-ia de uma irregularidade que não teve qualquer influência no exame da causa por parte da recorrente.

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Com efeito, como refere o Prof. Lebre de Freitas, “salvo se a lei dispuser diversamente, o vício (“ irregularidade “) não gera nulidade se a prática do acto inadmissível ou a omissão do acto ou da formalidade prescrita não influir no exame ou decisão da causa, isto é, na sua instrução, discussão ou julgamento (…) ou, no processo executivo, na realização da penhora, na venda ou pagamento”[5].

Ora, no caso concreto, o facto de a notificação ter sido efectivada através de solicitador de execução – e não por Funcionário Judicial – não só permitiu à exequente ter conhecimento pleno da decisão proferida, como, além do mais, não impediu que a mesma apresentasse o presente recurso, sem diminuição objectiva dos seus direitos de defesa.

Nesta conformidade, também por esta via não poderia ser reconhecida a nulidade processual arguida.

Finalmente, independentemente destas regras processuais, sempre incumbiria referir que, salvo o devido respeito pela opinião contrária, cabe dentro da competência funcional do solicitador de execução a notificação da decisão judicial aqui posta em causa.

Com efeito, tal decorre, de uma forma expressa, da norma especial – em relação à invocada pela recorrente (art. 157º do CPC) - estabelecida no art.

719º do CPC, onde se preceitua que:

(Repartição de competências)

“1 - Cabe ao agente de execução efectuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do j u i z , incluindo, nomeadamente, citações, notificações, publicações, consultas de bases de dados, penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos.

2 - Mesmo após a extinção da instância, o agente de execução deve assegurar a realização dos actos emergentes do processo que careçam da sua intervenção.

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3 - Incumbe à secretaria, para além das competências que lhe são especificamente atribuídas no presente título, exercer as funções que lhe são cometidas pelo artigo 157.º na fase liminar e nos procedimentos ou incidentes de natureza declarativa, salvo no que respeita à citação.

4 - Incumbe igualmente à secretaria notificar, oficiosamente, o agente de execução da pendência de procedimentos ou incidentes de natureza declarativa deduzidos na execução e dos actos aí praticados que possam ter influência na instância executiva.

*

Com efeito, como decorre deste preceito legal especial, a generalidade das diligências executivas passou a ficar a cargo do solicitador de execução.

Assim, o solicitador de execução só não terá competência funcional para praticar os actos cuja competência tenha sido expressamente atribuída à secretaria ou ao juiz[6].

Nessa medida, o solicitador de execução não terá competência para praticar os actos processuais da secretaria correspondentes às funções que são cometidas aos Srs. Funcionários Judiciais na fase liminar e nos procedimentos ou incidentes de natureza declarativa, mas mesmo aí o acto de citação é da competência do agente de execução[7].

Da mesma forma, e como é óbvio, também não terá competência para a apreciação das questões de natureza jurisdicional, incumbindo ao Juiz as competências que decorrem do disposto no art. 723º do CPC – o que não significa, por exemplo, que não incumba ao solicitador proferir a decisão de extinção de instância nos casos do art. 849º do CPC.

Nesta conformidade, “de acordo com a repartição de competências previstas (no art. 719º do CPC), cabe ao agente de execução efectuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz.

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No nº 1, ao estabelecer a repartição de competências entre o juiz, o agente de execução e a secretaria, o legislador pretendeu afirmar, de forma inequívoca, que o principal órgão de execução é o agente de execução e que todos os outros intervenientes apenas dispõem das competências expressamente previstas na lei”[8].

Assim, “em geral, o agente de execução fica incumbido de todas as diligências de pendor propriamente executivo, com destaque para a penhora, venda e pagamento e todos os que desempenham uma função instrumental, tal como a citação, as notificações ou as publicações. Ao agente de execução é cometido um poder geral de direcção do processo de execução, tendo uma competência ampla e não tipificada, embora com natural exclusão dos actos que apresentem natureza jurisdicional nos termos definidos no art. 723º e noutras normas avulsas. Ou seja, compete ao agente de execução a prática da quase totalidade dos actos de execução, com excepção dos materialmente jurisdicionais e especificamente daqueles cuja competência é legalmente deferida ao juiz”[9].

“Em suma, pode-se afirmar que a intervenção da secretaria para assegurar a regular tramitação do processo executivo se limita à fase liminar, sendo pontual e perfeitamente definida na lei essa intervenção nas fases posteriores da execução (cfr. arts. 157º, nº 1 e nº 3 do art. 719º do CPC”[10].

Por assim ser é que se pode concluir que, independentemente da já afirmada falta de influência processual da realização do acto de notificação pelo sr.

Solicitador de execução, a lei não comina tal actuação processual com a afirmação de qualquer irregularidade processual, antes permite que tal acto seja efectivado pelo Sr. Solicitador de execução.

Como decorre do exposto, no âmbito da acção executiva, incumbe apenas aos Srs. Funcionários Judiciais intervir na fase liminar do processo executivo e nos procedimentos ou incidentes de natureza declarativa, salvo no que respeita à citação - que já incumbe ao Sr. Solicitador de execução[11].

Assim, na fase em que o presente se encontrava (fase da extinção da instância

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executiva), o acto processual de notificação da decisão recorrida praticado pelo Sr. Solicitador de execução integrava-se no âmbito da sua competência funcional, tal como a mesma se encontra definida no art. 719º do CPC.

De qualquer forma, não se pode deixar de referir que, até certo ponto, se compreende a estranheza da recorrente quanto à solução legal empreendida pelo legislador, uma vez que não se pode deixar de reconhecer que, em princípio, na tradição processual portuguesa quem tem a incumbência de cumprir os despachos do juiz são “os seus Funcionários” (da sua secção), não fazendo muito sentido que, para esse efeito, se remetam os autos para que uma entidade externa cumpra o despacho proferido pelo Juiz.

Mas a verdade é que foi essa a solução expressa do legislador que apenas atribuiu essa competência aos Srs. Funcionários Judiciais na fase liminar da acção executiva e nos procedimentos ou incidentes de natureza declarativa.

Nesta conformidade, e por todo o exposto, julga-se improcedente esta argumentação da recorrente.

*

Entremos agora na análise da questão das nulidades da decisão arguidas pela recorrente (falta de fundamentação (al. b)) e omissão de pronúncia (al. d)) imputada ao Tribunal Recorrido.

A questão é relativamente simples, pois que, em face do teor das decisões atrás transcritas, não nos resta outra alternativa que dar razão à recorrente.

Com efeito, tendo o Sr. Solicitador de execução, na sequencia da informação junta aos autos de que foi aprovado um plano de revitalização da executada, proferido uma decisão no sentido de extinguir a execução com fundamento artigo 17- E do CIRE, a recorrente veio apresentar reclamação para o Juiz titular do processo, invocando um conjunto de fundamentos, como se pode verificar do respectivo requerimento (e que, no fundo, constituem as questões que volta a levantar no presente recurso).

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Ora, a verdade é que, perante essa reclamação formulada no âmbito do disposto no art. 723º do CPC, o tribunal recorrido, na decisão que constitui o objecto do presente recurso, se limitou a referir o seguinte: “Atento o alegado e comprovado, deverá a AE proceder ao arquivamento dos autos e ao cancelamento da penhora”.

E na sequência de pedido de esclarecimento do Sr. Solicitador de execução (que expressou dúvidas sobre “se o despacho de arquivamento e cancelamento das penhoras datado de 8/9/2020 teve em conta essas reclamações de acto do agente de execução?”), acrescentou apenas: “Informe positivamente”.

Ora, como é bom de ver, tendo a recorrente/exequente levantado um conjunto de questões na reclamação que apresentou contra a decisão proferida pelo Sr.

Solicitador de execução, a verdade é que o tribunal recorrido na decisão recorrida não se pronunciou sobre qualquer uma delas (art. 615º, nº 1, al. d) do CPC) e, nessa sequência, também não apresentou qualquer fundamentação (de direito) (art. 615º, nº 1, al. b) do CPC) que justificasse a decisão proferida e donde se pudessem retirar as razões pelas quais a reclamação apresentada pela exequente não merecia acolhimento.

Segundo o disposto no art. 615º, nº 1 al. d), do CPC é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

Ora, conforme decorre do exposto, constata-se que, tendo sido invocada expressamente um conjunto de questões (no fundo, aquelas que a recorrente renovou no seu recurso), o tribunal recorrido omitiu completamente a pronúncia sobre as mesmas, limitando-se a proferir decisão no sentido de confirmar a decisão do Sr. Solicitador de execução.

Por outro lado, ao ter confirmado a decisão do Sr. Solicitador de execução, o tribunal recorrido também não especificou qualquer fundamento de facto ou de direito que pudesse justificar a decisão (art. 615º, nº 1, al. b) do CPC) – não sendo suficiente, para esse efeito, a referência implícita à decisão que aprovou

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o plano de revitalização.

Na verdade, o tribunal recorrido limitou-se a confirmar a decisão de extinção da instância sem se pronunciar nem fundamentar a sua decisão, quanto às questões que constituíam o objecto da reclamação apresentada.

Não se pronunciou, entre outras questões levantadas, sobre:

- se a decisão proferida pelo Sr. Solicitador de execução era nula, por omissão de pronúncia e falta de fundamentação (art. 615º do CPC);

- se a executada agiu em abuso de direito (ut art. 334.º do Cód. Civil);

- se o PER aprovado é ineficaz em relação à exequente;

- se, tendo-se previsto no plano de recuperação, a manutenção das garantias existentes, as penhoras concretizadas no âmbito dos presentes autos deveriam ter sido convertidas em penhor nos termos do disposto no art. 807º, nº 1 do CPC.

*

Aqui chegados, pode-se, assim, concluir, sem necessidade de mais alongadas considerações, que a decisão sob recurso é nula, pois que omitiu completamente a pronúncia sobre as questões expressamente invocadas pela exequente (e contraditadas pela executada), não apresentado qualquer fundamento de onde pudesse decorrer as razões que levaram ao afastamento dos argumentos apresentado pela exequente (als. b) e d) do nº 1 do art. 615º do CPC).

Sucede que decorre do disposto no art. 665º do CPC que, “ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o Tribunal de recurso deve conhecer do objecto da apelação…”.

Decorre, pois, deste preceito legal que o legislador impõe, quanto às consequências ou procedimento subsequente à constatação da nulidade, por razões de economia processual, e desde que o processo contenha todos os elementos necessários, que, em princípio, se cumpra a regra da substituição ao

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Tribunal Recorrido (v. epígrafe do art. 665º, nº 1 do CPC), ao invés da regra do reenvio do processo ao Tribunal Recorrido para colmatar as omissões (quando se tratar de decisão que põe termo ao processo – como sucede no caso concreto)[12].

Assim, ainda que o presente Tribunal tenha confirmado a arguição da nulidade da decisão proferida, por omissão de pronúncia e falta de fundamentação, a consequência dessa constatação não impõe a remessa do Tribunal Recorrido para suprir aquela omissão.

Na verdade, se o processo contiver todos os elementos necessários que permitam a pronúncia do Tribunal da Relação, devem os autos prosseguir na presente Instância, com a apreciação da matéria cuja pronúncia foi omitida (e demais questões que tenham sido levantadas), na medida em que a(s) mesma(s) possam ser conhecidas, por que o processo contém os elementos necessários a que essa pronúncia possa ser efectuada.

Com efeito, só na eventualidade de assim não acontecer é que “se justifica a devolução do processo para o Tribunal a quo”[13].

Ora, no caso concreto, tendo sido constatada a omissão de pronúncia do tribunal recorrido não se pode deixar de concluir que o processo contém todos os elementos necessários que permitem que o presente Tribunal se possa pronunciar sobre as identificadas questões que não mereceram a pronúncia do Tribunal recorrido.

Assim sendo, no cumprimento da aludida regra da substituição, impõe-se que o presente Tribunal entre na referida “tarefa” de substituição, suprindo a nulidade da decisão quanto aos vícios apontados - que é o que iremos efectuar de seguida.

Antes de avançarmos para apreciação dessas questões, importa fazer uma breve referência à questão arguida pela exequente relativamente à decisão proferida pelo Sr. Solicitador de execução, apesar de esta não constituir o objecto do recurso.

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É que uma das questões levantadas pela exequente na reclamação que apresentou – e sobre a qual o tribunal recorrido omitiu a sua pronúncia – era a de saber se a decisão proferida pelo Sr. Solicitador de execução era nula (também por ter omitido a pronúncia sobre questões levantadas pelas partes e por falta de fundamentação).

Ora, salvo o devido respeito pela opinião contrária, não incumbia ao Sr.

Solicitador de execução pronunciar-se sobre as questões jurídicas levantadas pelas partes, pois que se tratavam de questões cuja competência se mostrava atribuída ao Juiz (art. 723º do CPC).

Incumbia às partes (e, em particular, à exequente/recorrente) a iniciativa de suscitar tais questões perante o Tribunal, pois que bem sabiam que a competência para a sua decisão se mostrava atribuída ao tribunal – e não ao Sr.

Solicitador de execução.

Nesta conformidade, só o tendo feito após proferimento da decisão de extinção de instância por parte do Sr. Solicitador, não se pode aqui acolher a argumentação da recorrente no sentido de se reconhecer a nulidade da decisão proferida pelo Sr. Solicitador de execução.

Na ausência daquela iniciativa, e tendo em conta a decisão proferida no PER, o Sr. Solicitador de execução proferiu a decisão de extinção de instância, fundamentando a mesma em termos fácticos e em termos jurídicos não se mostrando tal decisão viciada de nulidade.

De resto, tendo, entretanto, o tribunal recorrido proferido decisão a confirmar a extinção de instância, a arguição da nulidade da decisão do Sr. Solicitador de execução deixou de ter a relevância que, no momento em que a arguição da nulidade foi deduzida tinha, pois que tal alegado vicio teria necessariamente que ser suprido pelo juiz da execução (na sequência da reclamação apresentada), ou, caso assim não sucedesse, pelo presente Tribunal (como resultado da aludida regra da substituição).

Nesta conformidade, julga-se improcedente esta argumentação da recorrente.

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*

Avancemos, então, para o suprimento das nulidades invocadas, por força da aludida regra da substituição, impondo-se que o presente Tribunal se pronuncie, finalmente, sobre as questões levantadas pela recorrente/exequente (e que não mereceram pronúncia por parte do tribunal recorrido).

Como decorre do relatório elaborado, as questões levantadas pela recorrente dizem respeito, em geral, aos efeitos que a decisão de homologação do plano de revitalização aprovado produziu (ou pode produzir) na pretensão executiva deduzida pela exequente/recorrente nos presentes autos.

Entende a recorrente que a aludida decisão é ineficaz em relação à sua posição de exequente (e à presente execução), alegando, além disso, que a executada bem sabia disso, pelo que o requerimento que apresentou a pedir a extinção da execução e o levantamento das penhoras tem que se considerar exercido em abuso de direito (art. 334º do CC).

Na sequência, pede que a decisão recorrida - que ordenou a extinção, e por consequência o encerramento dos presentes autos e o cancelamento das penhoras - seja revogada e substituída por outra que mantenha a execução suspensa e as penhoras realizadas.

Ou, caso se venha entender que os efeitos da aprovação e homologação do plano vertidos no n.º 1 do artigo 17-E do CIRE, no que concerne com a extinção das acções, é igualmente aplicável à presente execução, sempre se deverão manter as penhoras com a respectiva conversão em penhor.

Comecemos por apreciar a primeira questão.

Como é consabido, o processo de revitalização constitui uma novidade da reforma do CIRE, operada pela Lei n.º 16/2012, de 20/04, ao introduzir um remédio – o processo especial de revitalização – a que o credor que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente eminente, mas ainda susceptível de ser recuperado, pode lançar mão com vista

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a estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir, com estes, acordo conducente à sua revitalização (art. 17º-A, nº 1).

O processo de revitalização não constitui uma modalidade do processo de insolvência, “mas uma espécie que vive em paralelo e autonomamente àquele, construído para a obtenção de resultados distintos”, constituindo o meio que se destina a evitar que o credor chegue à situação de insolvência e, nessa medida, visa satisfazer os interesses do credor, mas também o dos seus credores[14].

Trata-se de um processo de carácter urgente (artigo 17º-A, nº 3), que se caracteriza pela sua celeridade, simplicidade e norteado para atingir o escopo que o anima e que é o acordo de revitalização.

O processo inicia-se com uma declaração escrita, apresentada pelo devedor junto do tribunal competente para declarar a sua insolvência, manifestando, juntamente com pelo menos, um dos seus credores, o propósito de encetarem negociações conducentes à revitalização do primeiro por meio de aprovação de um plano de recuperação - artigo 17º-C, nº 1, al. a).

O juiz nomeia, de imediato, ao devedor, administrador judicial provisório (artigo 17º-C, nº 3), obstaculizando este despacho à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação (artigo 17º-E, nº 1).

Na tramitação subsequente do processo de revitalização, o devedor deve comunicar por carta registada, a todos os seus credores que não tenham subscrito o pedido de revitalização, notificando-os que deu início às negociações com vista à sua revitalização e convidando-os a participar nessas negociações, caso assim o entendam, informando-os que a documentação a que se refere o nº 1 do art. 24º se encontra na secretaria do tribunal para consulta (artigo 17º-D, nº 1).

Qualquer credor dispõe do prazo de vinte dias a contar da publicação no portal

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Citius do despacho a que se refere a al. a), do n.º 3 do artigo 17.º-C – despacho nomeando administrado judicial provisório ao devedor – para reclamar os seus créditos, devendo essas reclamações serem remetidas ao administrador judicial provisório que, no prazo de cinco dias, elabora uma lista provisória de créditos, que é imediatamente apresentada na secretaria no portal Citius, podendo ser impugnada no prazo de cinco dias, sob pena de se converter em lista definitiva (artigo 17.º-D, n.ºs 2, 3 e 4).

Em caso de existir impugnações, o juiz dispõe do prazo de cinco dias para decidir as impugnações formuladas (artigo 17.º-D. n.º 3).

Note-se que as impugnações de que sejam alvo os créditos incluídos pelo administrador judicial na lista provisória de créditos e as decisões que sobre essas reclamações recaírem não operam caso julgado material, uma vez que as reclamações de crédito no âmbito do PER têm como único objectivo, por um lado, legitimar a intervenção do credor no PER e, por outro, calcular o quórum deliberativo e a maioria prevista no nº 3 do artigo 17º-F, além de que a natureza célere e simplificada do PER é incompatível com a operatividade do caso julgado material.

Como decorre do exposto, em termos legais, está em causa a interpretação do disposto no art. 17º-E, nº 1, do CIRE.

De acordo com este preceito legal:

“A decisão a que se refere a alínea a) do nº 3 do artigo 17º-C (nº 4 do art. 222º- C) obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação”.

No que concerne à elucidação do conceito “acção para cobrança de dívidas” a posição maioritária na jurisprudência[15] é a de que esse conceito abarca também as acções declarativas, designadamente as relativas ao cumprimento

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de obrigações pecuniárias.

No entanto, como informa Pestana Vasconcelos quer a Jurisprudência, quer a Doutrina mostram-se divididas[16].

Este autor defende na obra citada que, neste âmbito, apenas estão abrangidas as acções executivas.

“Não sendo embora a letra da lei clara, o aspecto decisivo é, sempre, a sua ratio, que aqui consiste em evitar que nesse período de tempo o sujeito fique privado dos seus bens no seio de uma execução, o que poderia inviabilizar a sua actividade e, portanto, qualquer recuperação. Basta pensar nos efeitos para a continuação daquela da penhora das contas bancárias do devedor.

As acções declarativas, pelo contrário, não comportam qualquer prejuízo para a recuperação do devedor. Ao invés, a sua suspensão prejudicaria, de forma desnecessária, o demandante (…)”.

Já Menezes Leitão[17] defende a inclusão das acções declarativas no conceito de “acção para cobrança de dívidas” previsto no citado preceito legal.

No mesmo sentido, se pronunciam Ana Prata/Jorge Morais Carvalho/Rui Simões[18], que defendem que: “Cabem neste conceito quer as acções declarativas de condenação quer acções executivas.”.

Como quer que seja, é inequívoco que a presente acção executiva se inclui naquele conceito de “acção para cobrança de dívidas”, pelo que, por força do referido comando legal, ter-se-ia de extinguir “… logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação” (ressalva que não se verifica no caso concreto, como se pode ver dos excertos atrás transcritos do plano aprovado).

Como se referiu, o processo especial de revitalização destina-se a permitir ao devedor estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com este acordo conducente à sua revitalização (art. 17º-A, nº 1, do CIRE); deste modo, a impossibilidade de instaurar acções para cobrança de dívidas contra o devedor enquanto decorrerem as negociações, ou a suspensão

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das acções existentes, destina-se justamente a prevenir uma eventual inviabilização de um acordo por força do aparecimento de credores que invocam créditos ainda por definir (mas anteriores a esse momento).

“Este regime de “protecção perante os credores”, apesar de susceptível de abusos, é fundamental para garantir a eficácia de qualquer medida de recuperação, pois se os actos de agressão do património do devedor continuassem, estaria provavelmente inviabilizada qualquer possibilidade de condução bem sucedida de negociação com credores”[19].

Da análise do artigo 17.º E, n.º 1 do CIRE resulta que os efeitos da decisão de nomeação do administrador judicial provisório no âmbito do PER podem conduzir a três distintas situações, a saber:

- obstar à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor;

- suspender quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade;

- extinguir aquelas acções logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação (com trânsito em julgado da respectiva decisão).

Esta última situação (este último efeito processual), como se vê, já não decorre do despacho de nomeação do administrador provisório, “mas sim da aprovação e da homologação do plano de recuperação – ou, em bom rigor, da sentença homologatória do plano -, salvo quando o plano preveja a sua continuação”.

Apesar de aparecerem regulados nas mesmas normas e de caberem na categoria “dos efeitos processuais”, os efeitos do despacho de nomeação do administrador provisório e o efeito da homologação do plano de recuperação merecem tratamento autónomo. Isto porque são distintos os respectivos pressupostos, e, por isso, distintos os respectivos alcances (…)”.

Desde logo, “não é absolutamente certo que as acções suspensas venham a extinguir-se, sendo admissível o seu prosseguimento quando o plano de recuperação preveja a sua continuação (cfr. art. 17º-E, nº 1, in fine)…” [20].

Assim, no que respeita à extinção de acções – que é o que nos interessa -,

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resulta do citado art. 17°-E, nº 1, do CIRE, que, para ser decretada a extinção da acção destinadas à cobrança de créditos de devedores que apresentem PER, é necessário o preenchimento de dois requisitos cumulativos:

- que seja aprovado, por decisão transitada em julgado, plano de recuperação apresentado;

- que não se preveja no plano de recuperação a continuação da acção.

Ora, estes requisitos estão plenamente preenchidos no caso concreto.

Não há dúvidas que o plano de recuperação (apesar da oposição da recorrente) foi homologado por decisão transitado em julgado.

E, por outro lado, não se prevê no plano a continuação da presente acção.

A recorrente alega, no entanto, que no plano aprovado não se prevê expressamente a extinção dos presentes autos (nem a sua continuação), mas o requisito legal, como se acaba de evidenciar, é apenas que “não se preveja no plano de recuperação a continuação da acção” (“salvo quanto este preveja a sua continuação” – nº 1 do art. 17º-E do CIRE).

Ora, é inequívoco, como resulta do teor do plano de revitalização aprovado (v.

factos atrás mencionados), que tal cláusula (a prever a continuação da presente acção) não ficou prevista no plano.

O facto de não ter ficado estabelecida a situação contrária (a extinção da presente acção) é irrelevante para a ponderação que aqui se tem que efectuar, pois que a situação ressalvada pelo legislador é aquela primeira.

Nesta conformidade, outra decisão não podia ter sido proferida pelo Tribunal Recorrido, uma vez que o legislador impõe (“ope legis”) que, uma vez que seja aprovado e homologado o plano de recuperação, a presente execução se extinga (caso não tenha sido prevista a sua continuação, como efectivamente não foi no caso concreto).

Concluindo: encontrando-se constituído e vencido, à data da propositura do PER, o crédito peticionado pela recorrente/exequente, tendo sido aprovado e homologado plano de revitalização e não estando previsto nesse plano a

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continuação da presente acção executiva, por força do disposto no nº 1 do artigo 17º-E do CIRE, bem andou o Tribunal recorrido em julgar extinta a instância executiva (por impossibilidade legal de prosseguir), ainda que a exequente, conforme alega, se tenha oposto à aprovação do plano homologado pelo tribunal – e é este, o outro argumento da recorrente.

Na verdade, cumpre ainda esclarecer que o plano de recuperação aprovado no PER, uma vez que seja homologado, vincula o credor, mesmo que este dele discorde (como sucedeu, no caso concreto, com a recorrente), porquanto se destina, não há protecção ou salvaguarda do seu crédito, mas principalmente à revitalização (recuperação) da empresa (cfr. art. 17º-F, nº. 10 de onde decorre que a decisão do juiz que homologa o plano de recuperação vincula todos os credores, mesmo aqueles que não tenham participado nas negociações ou que discordem desse plano)[21].

Assim, contrariamente àquilo que defende a recorrente, “a decisão é vinculativa para todos os credores, mesmo para aqueles que não tenham participado nas negociações ou que, tendo participado, tenham rejeitado o plano de recuperação aprovado”[22].

Na verdade, como explicita Catarina Serra[23] “a homologação vincula ao plano de recuperação todos os titulares do direito de participar plenamente nas negociações (todos os participantes potenciais e não apenas os efectivos), mas só os titulares do direito de participar plenamente nas negociações. Se a primeira oração tem o objectivo de sublinhar a tão mencionada eficácia universal do plano de recuperação (não é preciso participar nem votar favoravelmente o plano para estar sujeito aos seus efeitos), a segunda tem o objectivo de alertar para o facto de que há sujeitos justificadamente ressalvados” (exemplificando depois estas últimas situações, que não têm aplicação ao caso concreto).

Conclui-se, assim, que a recorrente também não tem razão quando pretende que a decisão que homologou o plano de revitalização aprovado “é ineficaz em

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relação à sua posição de exequente (e à presente execução)” (porque votou contra a aprovação do plano), pois que essa sua “tese” se mostra contrariada pelo disposto no art. 17º-F, nº 10 do CIRE nos termos que se acaba de expor.

Nesta conformidade, e sem necessidade de mais alongadas considerações, decide-se julgar improcedente o Recurso com este fundamento.

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Levanta ainda a recorrente uma última questão, para o caso de se julgar, como se julgou, que a execução deve ser considerada extinta.

Trata-se de saber se, tendo-se previsto no plano de recuperação, a manutenção das garantias existentes, as penhoras concretizadas no âmbito dos presentes autos deveriam ser convertidas em penhor nos termos do disposto no art. 807º, nº 1 do CPC.

Como já se referiu, a presente execução, em face da decisão proferida no PER, tem que necessariamente se extinguir por força do citado nº 1 do art. 17º-E do CIRE.

Ora, se a presente acção executiva se extingue por imposição legal, não podem ser mantidas as penhoras efectivadas no presente processo.

Efectivamente, pela sua própria natureza, razão de ser e instrumentalidade, a penhora está ligada indelevelmente ao processo executivo e só com este se entende e faz sentido.

Sempre que ocorre o incumprimento de determinada obrigação, o credor recorre à acção declarativa nos casos em que não tenha título executivo, mas depois, ou tendo já este título, terá de executar o património do devedor, ou seja, terá de recorrer a uma acção executiva e "no seio desta terão que se penhorar bens do devedor (ou, eventualmente, em certos casos, de terceiro) que serão afectos aos fins da execução "[24].

A execução – sempre que vise o pagamento de quantia certa -, "abrange, como fases fundamentais, a apreensão de bens (penhora), a venda judicial dos bens

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penhorados (quando não haja adjudicação) e o pagamento aos credores"[25].

“Efectuada a penhora, ela irá, em princípio, subsistir até à venda do bem penhorado. Pode, porém, extinguir-se por causa diferente da venda executiva (ou do pagamento imediato), quer essa causa implique a realização do fim da execução, quer não. Então, a penhora é levantada. É o que acontece: quando ocorra uma causa de extinção da execução, diferente do pagamento posterior à venda executiva (…)”[26].

Nesta conformidade, tendo o acto de penhora aquela finalidade só se justifica a sua manutenção (o seu não levantamento) se a execução não for extinta, pois que, quando esta se extingue por qualquer causa diferente da venda executiva, a penhora tem que necessariamente ser levantada.

Aliás, importa referir que é questionável se a penhora constitui uma verdadeira garantia real (direito real de garantia), pois que há quem entenda que constitui simplesmente uma figura de efeitos similares a ela[27].

De qualquer forma, se, como já referimos, a homologação do plano de recuperação no processo especial de revitalização determina a extinção da execução onde a penhora tinha sido efectivada - a menos que o próprio plano preveja o seu prosseguimento - temos de concluir, pelo que se acaba de expor, que extinta a acção executiva têm necessariamente de deixar de subsistir as penhoras que haviam sido efectivadas, uma vez que estas se destinavam unicamente à "realização dos fins" da execução.

A recorrente defende, no entanto, que tal manutenção das garantias (e a manutenção das penhoras concretizadas) decorreria do próprio plano de revitalização, pois que, segundo alega, aí ficou expressamente previsto que os credores comuns mantinham as garantias existentes.

Mas a verdade é que, se interpretarmos o clausulado do plano de revitalização, podemos antes concluir que as garantias dos credores comuns que se mantêm, e a que o plano se refere, são apenas as “garantias prestadas no âmbito dos financiamentos, mútuos, empréstimos”, determinando o plano, nas

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CONDIÇÕES GENÉRICAS estabelecidas, que só estas “serão mantidas” – condição vi).

Ora, o crédito exequendo da recorrente/exequente não tem por fonte qualquer uma daquelas realidades jurídicas.

De resto, a impossibilidade de outra interpretação possível decorre justamente do facto de não se ter expressamente ressalvado o prosseguimento das execuções (e a inerente manutenção das penhoras nelas efectivadas).

Na verdade, seriam estipulações incompatíveis prever que as penhoras concretizadas se mantivessem e, ao mesmo tempo, não se prever o prosseguimento das acções executivas, onde as mesmas foram concretizadas, pois que, como já referimos, aquelas destinam-se à realização dos fins destas últimas (e não prosseguindo a execução - não se prevendo o seu prosseguimento -, as penhoras concretizadas terão que necessariamente ser levantadas).

Por todas estas considerações é que se pode, ainda, concluir que a recorrida, quando apresentou o seu requerimento peticionando a extinção da execução (e o levantamento das penhoras) não agiu em abuso de direito (art. 334.º do Cód.

Civil) – até porque, para que esta situação se pudesse verificar, teria a recorrente que ter alegado que a executada tinha o direito que exerceu (só depois dessa afirmação é que se poderá depois afirmar o abuso), o que, como decorre do exposto, a recorrente nem sequer aceita, defendendo antes que a executada não tinha o direito de requerer a extinção da instância executiva.

A recorrente defende, no entanto, e ainda, que, mesmo que se entenda que as penhoras concretizadas não podem ser mantidas- como atrás se decidiu -, nada impedirá que as mesmas sejam convertidas em penhor por aplicação do disposto no art. 807º do CC.

Este preceito legal mostra-se estabelecido no âmbito do acordo de pagamento em prestações da divida exequenda (arts. 806º e 807º do CC), onde se prevê justamente que, no caso de tal acordo ser concretizado na acção executiva, “se

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o exequente declarar que não prescinde da penhora já feita na execução, aquela converte-se automaticamente em hipoteca ou penhor, beneficiando estas garantias da prioridade que a penhora tenha … “(cfr. nº 1 do art. 807º do CPC).

No entanto, tal como já se decidiu no ac. da RP de 18.12.2013 (relator: José Eusébio Almeida)[28], in dgsi.pt (que aqui seguimos de perto): “entendemos que o regime previsto para o acordo de pagamento em prestações não é aplicável (o actual, mas o anterior igualmente o não seria) aos efeitos na acção executiva da homologação do plano de recuperação (…).

No domínio do CPC anterior, e na redacção dada pelo DL. 226/2008, admitia-se o pagamento em prestações da dívida exequenda e, de comum acordo, exequente e executado, requeressem ao agente de execução a suspensão da execução. O requerimento para pagamento em prestação era subscrito por ambos, devia conter o plano de pagamento acordado e podia ser apresentado até à transmissão do bem penhorado ou até à aceitação de proposta, no caso de venda (artigo 882 do CPC). E, assim acontecendo, e como garantia do crédito exequendo, mas salvo convenção contrária, valia a penhora já feita na execução, sem prejuízo da tutela dos direitos dos restantes credores e ainda sem prejuízo das partes acordarem noutras garantias adicionais ou na substituição da penhora (artigo 883 do CPC) (…).

No actual CPC, o exequente e o executado continuam a poder acordar no pagamento em prestações da dívida exequenda, "definindo um plano de pagamento e comunicando tal acordo ao agente de execução", desde que o façam, como anteriormente, até à transmissão do bem penhorado ou até à aceitação de proposta, no caso de venda (artigo 806 do CPC). No entanto, agora, a comunicação tempestiva do acordo/plano de pagamento determina a extinção da execução (artigo 806º, n.º 2, parte final). E agora, porque o efeito do acordo deixou de ser a suspensão da execução para passar a ser a sua extinção, o artigo 807º, nº 1 esclarece que "Se o exequente declarar que não

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prescinde da penhora já feita na execução, aquela converte-se automaticamente em hipoteca ou penhor, beneficiando estas garantias da prioridade que a penhora tenha, sem prejuízo do disposto no artigo 809º"

(Tutela dos direitos dos restantes credores).

Com o novo diploma, como se vê, determinou-se a extinção da execução, em lugar da sua simples suspensão e atribuiu-se ao credor/exequente o benefício da conversão automática da penhora em hipoteca ou penhor, desde que o mesmo declare que daquela não prescinde[29].

Como já se adiantou, não vemos como possa ser coerentemente aplicável este preceito – e, com ele, a conversão automática das penhoras em hipotecas ou penhores – ao caso presente, isto é, a uma execução que se extingue por ter sido aprovado e homologado um plano de recuperação, em sede de um processo especial de revitalização.

Em primeiro lugar, sendo certo que o processo de insolvência se rege pelo CPC, em tudo quanto não contrarie as disposições do CIRE (artigo 17 do CIRE), esta aplicação subsidiária tem de ser correctamente entendida, pois não é inócua a expressão utilizada no diploma: "O processo… rege-se". Isto significa, salvo melhor saber, que a aplicação subsidiária tem um sentido processual e não abrange – ou, pelo menos, não abrange necessariamente – as normas do CPC que tenham uma natureza substantiva. E a conversão de penhoras em hipotecas ou penhores tem esta última natureza. Por outro lado, a aplicação do processo civil está sempre dependente da sua própria necessidade, ou seja, uma omissão pensada ou decorrente dos princípios inerentes à insolvência ou a alguns dos seus processos especiais, não precisa de ser colmatada; não é, em rigor, uma omissão.

Em segundo lugar, a razão de ser e a finalidade do PER e do plano de recuperação contrariam a previsão do artigo 807º do NCPC, a qual, mesmo que com alguma surpresa, atenta a sua novidade, se compreende para a execução singular, mas não se entende para a insolvência e, em especial, para o processo

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