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AS DIMENSÕES PARA A ESCRITA DO GÊNERO MEMORIAL DE FORMAÇÃO

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VII Congresso Internacional de Pesquisa (Auto)Biográfica UFMT – Cuiabá – 17 a 20/07/2016

Anais VII CIPA – ISSN 2178-0676

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AS DIMENSÕES PARA A ESCRITA DO GÊNERO MEMORIAL DE FORMAÇÃO Mônica Maria Gadêlha Gaspar Universidade de Pernambuco Campus Mata Norte / SEDUC monicaggaspar@gmail.com

INTRODUÇÃO

A escrita no ensino superior tem se tornado objeto de estudo nas pesquisas que buscam compreender como os estudantes dos cursos de formação de professores têm se apropriam dos gêneros acadêmicos nas Instituições de Ensino Superior - IES (FIAD, 2011; BEZERRA; 2012). Como professora do curso de Pedagogia tenho me debruçado sobre essa questão, com um olhar mais atento sobre como os estudantes organizam seu texto para expor suas ideias.

Os discursos de professores que atuam nas Instituições do Ensino Superior (IES) expressam recorrentemente as dificuldades alunos para ler, compreender e escrever os textos que lhes são solicitados. Marinho (2010, p. 364) chama nossa atenção, sinalizando para transformar essa dificuldade em uma “proposta para ensino e pesquisa”. Essa proposta não tem intenção “em oferecer aos alunos, que têm dificuldades de leitura e de escrita, a oportunidade de recompor lacunas de um processo de escolarização supostamente deficitário, de aprender aquilo que deveriam ter aprendido antes de entrar na universidade” (MARINHO, 2010, p. 371), mas de prepará-los para a apropriação de gêneros exigidos na e para a academia, já que é nesse espaço institucional que eles iniciam os primeiros contatos com alguns gêneros acadêmicos.

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2 Como revela Passeggi (2008), escrever sobre a formação não é "uma tarefa fácil", exige-se um debruçar sobre si, um movimento de introspecção, de diálogo entre o narrador/autor do texto; de escolhas do que dizer e como dizer.

O memorial é considerado um gênero textual de natureza híbrida: elaborado tanto como um dispositivo de avaliação quanto como uma prática reflexiva de formação. Como ato de criação exige o encadeamento de fatos significativos dentro das lógicas de valorização da formação profissional.

A pesquisa concluída em 2014, intitulada “O acompanhamento da escrita do Memorial de formação – entre formar e formar-se”, analisou como se realizava o acompanhamento da escrita desse gênero com dois grupos de profissionais, as professoras-formadoras que orientavam a escrita do memorial e as alunas-formandas, professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental, narradoras desse gênero autobiográfico, em um Programa de Graduação em Pedagogia da Universidade de Pernambuco campus Mata Norte.

Neste texto, direciono o olhar para as inquietações das narradoras do Memorial de Formação na busca de compreender como se dá o processo de escrita desse gênero constituído na academia como uma prática reflexiva de formação e para a academia como um dispositivo de avaliação.

Dessa forma, trago a voz das alunas-formandas durante o processo de escrita de seu memorial de formação, nessa difícil tarefa de escrever sua história ainda no acontecer de sua formação: Como transformar em textos nossas experiências? Que caminho tomar? Que palavras escolher para se dizer?

Para orientar o leitor, no primeiro momento, apresento o memorial de formação enquanto gênero narrativo autobiográfico que proporciona a quem escreve uma reflexão sobre seus processos formativos e situo o grupo reflexivo de mediação biográfica (GRMB) como espaço dialógico que proporciona a quem escreve uma reflexão sobre si e o outro; em seguida, as falas das alunas-formandas sobre essa escrita acadêmica que exige ir além das formas de um texto; por fim, as considerações acerca do processo de escrita dessas alunas.

1. MEMORIAL DE FORMAÇÃO – GÊNERO NARRATIVO AUTOBIOGRÁFICO

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3 por um professor orientador e concebido como trabalho de conclusão de curso (TCC ou TFC) (PASSEGGI, 2008)

A escrita nessa modalidade de memorial conta com um roteiro definindo, normas de apresentação e informações que devem enfatizar o processo de reflexão sobre as experiências vivenciadas no decorrer da formação estabelecendo uma relação com a experiência profissional. Essa dinâmica de trabalho é acompanhada por um professor formador que orienta a escrita tecendo comentários para a reescrita textual. Esse processo acontece até a versão final.

Passeggi (2007) destaca que o memorial de formação abarca interesses epistemológicoao ao situá-lo entre a lógica de uma avaliação conteudista e uma (auto)avaliação reflexiva, nesse sentido há inovação com relação às avaliações tradicionais; no metodológico a escrita possibilita o sujeito constituir-se como sujeito do conhecimento ao explicitar suas aprendizagens, o que pode permitir uma avaliação formativa com o objetivo de permitir a compreensão de suas fragilidades e potencialidades; e, político com a validade científica da subjetividade na avaliação, visto que a escrita do memorial situa-se no interior de uma relação institucional.

Ao escrever o memorial, ou seja, ao biografar-se, a história de vida do professor em formação é transformada, pelo processo de escrita, em um texto acadêmico que adquire um valor social e afetivo para o autor. Passeggi (2010) afirma que, tratando-se de um gênero autobiográfico, o narrador coincide, enquanto escreve, com o autor empírico do texto.

Nesse momento, o narrador se torna personagem de sua história. Ao narrar sobre sua vida profissional cujos personagens são os outros, o narrador no entrelace com os personagens, coloca-se na condição de personagem em sua narração. Segundo Bakhtin (2010),

Esse outro que se apossou de mim não entra em conflito com meu eu-para-mim uma vez que não me desligo axiologicamente do mundo dos outros, percebo a mim mesmo numa coletividade: na família, na nação, na humanidade culta; aqui a posição axiológica do outro em mim tem autoridade e ele pode narrar minha vida com minha plena concordância com ele (p. 140).

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4 ponto de vista do conteúdo da forma. Aquele que escreve tem de ser, quase ao mesmo tempo, autor, leitor e revisor” (p.34).

A escrita de memoriais de formação tem se tornado o foco de investigação de Passeggi (2006, 2007, 2008, 2010) com referenciais teóricos voltados para mediação biográfica como processos envolvidos no acompanhamento de pessoas em formação que escrevem e trabalham sobre as suas narrativas. Para elaboração desse conceito, a autora se inspirou nos trabalhos de Vygotsky e da tríplice mimese de Paul Ricoeur (1997).

Assim, destaco a importância da mediação biográfica para a escrita do memorial de formação através composição do grupo reflexivo, cujo objetivo é refletir sobre o processo de escrita: seus bloqueios, avanços, as conquistas e as aprendizagens proporcionadas pela reflexividade biográfica.

1.1 O grupo reflexivo - espaço dialógico para o processo de escrita

Tomar o grupo reflexivo como espaço de formação e metodologia de pesquisa é acreditar que o sujeito é um ser socialmente dialógico. O seu ser/dizer está entrelaçado "eu" e/ou "outro", pois somos seres sócio históricos constituídos singular e coletivamente, tal qual nos diz Ferrarotti (1998)

O homem é universal singular. Pela sua experiência pela sua práxis sintética, singulariza nos seus atos a universalidade de uma estrutura social. Pela sua actividade destotalizadora/retotalizadora, individualiza a generalidade de uma história social coletiva [...]. Se nós somos, se todo indivíduo é a reapropriação singular do universal social e histórico que o rodeia, podemos conhecer o social a partir da especificidade irredutível de uma práxis individual (p. 26)

Estamos, como afirma Bakhtin (2010), inevitavelmente, interagindo com o outro, constituindo esse outro e sendo por ele constituídos. Nessa interação, nesse diálogo constante de mim com o outro, 'encontro o outro' e 'o outro em mim'. Este é o cerne da existência humana.

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5 afetiva, cognitiva, sociocultural, que vão além daquelas de caráter teórico e metodológico, geralmente discutidas nas disciplinas (PASSEGGI, ibid).

Para a autora (2011, p. 150), este tipo de grupo surge da demarcação entre o grupo focal e o grupo de discussão. Ela aponta três características: a primeira o situa como uma prática de formação haja vista, "O que nele se fala, ou se cala, não visa ao interesse do pesquisador, mas, primordialmente, ao da pessoa em formação e, posteriormente, do grupo que aprende com a história do outro". A segunda diz respeito às participantes do grupo. Estas apresentam traços comuns que possibilitam o reconhecimento enquanto grupo, seu pertencimento social - professoras formadoras e em formação - ao "partilhar com o outro a experiência vivida para compreender a si mesmo e ao outro como sujeitos históricos" (ibdem) e, por fim, a última característica, diz respeito à continuidade do relacionamento no grupo. Para a autora (ibid), o grupo por constituir-se em "um contexto institucional e ser acompanhado por um formador que zela pelos princípios éticos e deontológicos das práticas de reflexão autobiográfica", o relacionamento entre os participantes pode ir além do tempo de formação no espaço institucional.

Considero que essas foram características importantes para o nosso grupo. Nele, houve abertura para falar e ouvir, criando momentos de ressignificação de atitudes, valores e reconstrução de representações e, assim, abriu-se um novo olhar sobre as vivências e a elaboração de dificuldades de cada um do grupo, sustentadas por uma rede de interações.

Há, dessa forma, o compromisso de cada uma e do grupo com todas na busca de compreender o processo de (trans)formação à medida em que ressignifica sua experiência. Nesse sentido, adotei o modelo de coinvestimento dialógico entre a pessoa que narra e o grupo, entre eles e quem os acompanha (PASSEGGI, 2008).

No percurso da escrita da narrativa do memorial de formação, Passeggi (2006, 2008) identifica três dimensões biográficas que dão elementos para interpretação da atuação no grupo reflexivo: a iniciática, a maiêutica e a hermenêutica que são articuladas aos estudos de Ricoeur (1997) com a tríplice mimese.

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6 Na segunda dimensão, a maiêutica, o narrador se familiariza com o trabalho biográfico à medida que avança na escrita e se conscientiza de seu processo de mudança. Nesta fase, o narrador "partilha com o formador no grupo reflexivo as sucessivas versões da história", ao mesmo tempo em que ultrapassa os temores iniciais vencendo as primeiras resistências (PASSEGGI, ibid, p. 49). Refere-se à mimese II - configuração do tempo, da experiência configurada (RICOEUR, 1997). A configuração é a operação na qual o narrador transforma os fatos rememorados em história.

Este último momento da mediação biográfica, a mimese III – Refiguração, para Ricoeur, corresponde à hermenêutica defendida por Passeggi (ibid, p. 52). Segundo a autora, nesta fase, o narrador pergunta: "o que faço agora com o que isso me fez?" Neste momento, ocorre o processo de interpretação da experiência. O objetivo dessa interpretação é encontrar o sentido despertado pela reflexão sobre a condição histórica de si, de sua existência particular e seu lugar no grupo.

Identifiquei os três momentos da mediação biográfica - iniciática, maiêutica e hermenêutica - no grupo, ocorridos de forma não linear. Estes momentos suscitaram pela forma como as professoras-formadoras acompanharam suas alunas na escrita: respeito ao tempo de cada uma; muito embora houvesse tempo determinado para conclusão do trabalho biográfico.

Pineau (2004) nos alerta que o trabalho biográfico não é uma simples inscrição de sua vida, mas a construção de sua identidade (Auto), historicidade, que precisa das operações: reflexão, análise e interpretação.

Diante dessa dimensão complexa de escrita, questiono quais movimentos possibilitaram a escrita desse gênero acadêmico?

2. ESCREVER SOBRE SI – UMA PRÁTICA EM TRÊS DIMENSÕES

Para compreender como os professores refletem sobre si e sobre a sua formação, a pesquisa qualitativa assume a própria natureza da investigação. Assim, o objeto de análise centraliza sobre as discussões sobre a escrita do memorial, realizadas no grupo reflexivo de mediação biográfica em 2011, de duas alunas formandas Maria e Rejane1 do Programa de Formação Especial em Pedagogia - PROGRAPE da Universidade de Pernambuco, Campus Nazaré da Mata.

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7 Para alcançar este objetivo, tive que ficar atenta aos diálogos relacionados à escrita do memorial: os questionamentos, os bloqueios, as descobertas das alunas-formandas. Atentei, também, para as relações que não estão à mostra na versão definitiva do memorial, mas que se tornam extremamente importantes para compreender o processo de escrita do memorial de formação

3.1 Da iniciativa à hermenêutica: os movimentos entre a prefiguração e a reconfiguração

Os encontros no grupo favoreceram o exercício da memória e da narração, reflexões sobre o processo narrativo das alunas-formandas oportunizaram vislumbrar as aprendizagens ocorridas durante essa experiência. Tal experiência contada, refletida e analisada traz indícios peculiares do narrador que tece sua história demonstrando sua forma de ser e estar no mundo. Cada uma, a seu modo, usou de recursos para trazer, do passado, os acontecimentos, lugares e pessoas que marcaram sua trajetória.

Mas essa não foi uma tarefa fácil, ainda mais quando essa escrita versa pela subjetividade do sujeito e pela objetividade de um texto que deve atender aos critérios avaliativos, ou seja, atender ao instituído. Essa dificuldade se expressa na voz das alunas-formandas Rejane e Maria.

Para mim aquilo (refere-se ao memorial) era quase impossível, era muito difícil. Todo mundo ficava falando do memorial. [...] O difícil é escolher as palavras para escrever as situações do nosso dia a dia. Não pode ser qualquer palavra porque estamos escrevendo o nosso memorial (REJANE, GR, 05/03/2011).

No começo foi difícil para todo mundo. A minha dificuldade está em começar o capítulo fazendo uma relação com o curso e o ensino aprendizagem (MARIA, 05/03/2011)

A fala das alunas expressa a dificuldade em escrever sobre si. Rejane não se achava capaz de escrever seu memorial, pois teria que “escolher as palavras certas, e não poderia ser qualquer palavra”, afinal tratava-se da escrita de seu memorial.

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8 (história), se há algo a revelar, se tem uma história (p. 211). Ele começa a selecionar, em sua memória, os fatos, experiências/situações que foram formadoras, o que é memorável.

As palavras para falar de suas experiências, ainda se encontram imersas. Esse momento de prefiguração ocorre quando as ideias estão envoltas, o narrador começa a selecionar, em sua memória, os fatos, experiências/situações que foram formadoras, o que é memorável (RICOEUR, 1997).

Nesse momento, as discussões com o grupo auxiliaram a dar um passo à frente, as alunas passam a traçar suas ideias, ainda inseguras, é bem verdade. O medo faz com que as palavras apareçam como sombras, sem deixar as marcas no papel. Difícil esse movimento de configurar o dito, embora tenha um interlocutor para auxiliá-las nessa escrita.

Essa dificuldade de escolha das palavras, os sentimentos de medo e de insegurança são descritos pelas alunas que ainda persistem na pergunta: o que dizer? Como se dizer?

As discussões no grupo reflexivo, proporcionaram a transição da dimensão iniciática para maiêutica, dos fatos antes prefigurados para sua configuração. Identificamos esse movimento com as alunas Maria e Rejane

Eu fiz o primeiro capítulo com muita dificuldade, com medo de errar. Dei para corrigir, para ver onde eu deveria mudar, onde deveria inserir [...] percebi que estava com menos erros. A pessoa vai se sentindo segura. (MARIA, GR, 19/03/2011).

Depois quando as coisas foram clareando, veio a alegria na hora dos acertos, na hora do estalo. Àquela hora que já dava para escrever sozinha. Muita alegria nos encontros. Através dos encontros foi se descobrindo uma com outra: a experiência que passou de uma para outra facilitou bastante o trabalho da escrita memorial. [...] Através das dinâmicas a gente ficou mais à vontade (REJANE, GRMB, 10/10/2011).

Maria fez seu primeiro capítulo ainda com receio, mas pode contar com o apoio da professora e da escuta do grupo para corrigir, reelaborar e elogiar até mesmo dar sugestões para sua escrita. Esse contar com o outro, no interlocutor que acompanha seu desenvolvimento na escrita deixou-a mais segura porque foi percebendo seu desenvolvimento enquanto narradora.

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9 participantes, deixando-as sem medo de falar e, consequentemente, de escrever seu memorial de formação.

Para Passeggi (2008, p. 49), a dimensão maiêutica é o momento em que as alunas se familiarizam com o trabalho biográfico à medida que avançam na escrita e se conscientizam de seu processo de mudança. Nesta fase, ocorre a "partilha com o formador no grupo reflexivo as sucessivas versões da história", vencendo seus temores iniciais.

Desse modo, a discussão com o grupo auxiliou as alunas na travessia entre os fatos prefigurados aos configurados (RICOEUR, 1994). A pré-compreensão prática do mundo da ação, sua própria vivência para a composição do discurso em que se exige sintaxe e uma ordem cronológica são auxiliadas pelos encontros no grupo reflexivo, pelas descobertas entre as alunas, pois “a experiência que passou de uma para outra facilitou bastante o trabalho da escrita memorial” (REJANE, GRMB, 10/10/2011) e, especificamente, das professoras-formadoras que sabem "usar recursos experienciais, competências forjadas ao longo do tempo e sabe fazer o trabalho possibilitando transferi-las para a situação presente" (JOSSO, 2012, p. 128).

Percebe-se ao longo dessa trajetória de pesquisa e formação que as histórias das narrativas autobiográficas foram compondo o memorial de cada uma das narradoras, escrevendo, reescrevendo, ressignificando à medida que compartilhavam suas narrativas no grupo.

No ato de leitura/escuta das narrativas do memorial, houve a construção de sentidos, ou seja, as histórias narradas não foram recebidas passivamente pelas participantes do grupo, interlocutoras das narrativas, houve um movimento de atividades e de processo. As alunas Rejane e Maria demonstram essa construção de sentido após a leitura da narrativa de suas colegas no grupo, segundo elas

Através dos encontros foi se descobrindo uma com outra: a experiência que passou de uma para outra facilitou bastante o trabalho da escrita memorial. [...]Através das dinâmicas a gente ficou mais à vontade (REJANE, GRMB, 10/10/2011).

Parecia que estava ali, vivendo dentro da realidade delas. Foi muito gratificante aquela troca de leitura do que foi escrito, a realidade de cada uma (MARIA, GRMB, 10/10/2011).

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10 culturais, imaginários) que podem ser integrados a minha própria construção biográfica, na medida em que respondem aqui e agora, ao meu próprio mundo de vida”.

Essa dimensão vivenciada pelas alunas-formandas corresponde à hermenêutica defendida por Passeggi (2008, p. 52). Maria sentiu-se vivendo a história, pois “Parecia que estava ali, vivendo dentro da realidade delas”, as experiências expressas pela narradora, aparentemente era individual, mas se tornou coletiva quando seus interlocutores se encontravam no tempo narrado.

Esse momento é da refiguração da história (RICOEUR, 1997) que toma diversos sentidos de acordo com a experiência de cada leitor. A história, embora individual, se torna coletiva pelos sujeitos que tomam a experiência do outro para refletir sobre sua própria experiência para, a partir dela, ocorrer a aprendizagem.

E foi assim que as alunas-formandas biografaram-se à medida que íamos oportunizando através das atividades no grupo um olhar sobre si e sobre o outro, refletindo, interpretando. Muitas vezes, as vozes das experiências do eu tocaram o outro, outras vezes, foi necessário o apoio das professoras-formadoras para se sentirem tocadas e, assim, tornarem-se autoras de sua história.

CONSIDERAÇÕES

A análise do processo de escrita das alunas-formandas demonstra que o grupo de mediação biográfica (GRMB) contribuiu para dinâmica do coinvestimento à medida que nessa dinâmica foi possível identificar nas fases dos movimentos da escrita das alunas, a forma como foram superando as inquietações para essa escrita e a enfrentando os desafios para que vencessem as etapas vivenciadas nesse processo.

Esse processo que foi desde a dimensão iniciática, passando pelo ato de escrita maiêutica, à dimensão hermenêutica tornando possível identificar os bloqueios, os avanços, e o reconhecimento de si enquanto ator e autor de suas histórias. Além disso, evidencia a importância de vivenciar essas etapas para que o narrador de suas experiências desperte sobre si e o outro, relembrando e ressignificando no presente suas histórias de formação.

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11 Ressalto, assim, que o memorial é um gênero textual que oferece potencialidades para o processo de reflexão dos sujeitos sobre seus percursos de vida e formação permitindo uma tomada de consciência como sujeito que tem uma história

REFERÊNCIAS

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