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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA NATUREZA DEPARTAMENTO DE SISTEMÁTICA E ECOLOGIA LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA NATUREZA DEPARTAMENTO DE SISTEMÁTICA E ECOLOGIA

LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

CAPTURA E COMERCIALIZAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES NO SEMIÁRIDO PARAIBANO SOB A PERSPECTIVA DE CRIANÇAS E

ADOLESCENTES

TAINÁ SHERLAKYANN ALVES PESSOA

JOÃO PESSOA 2012

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TAINÁ SHERLAKYANN ALVES PESSOA

CAPTURA E COMERCIALIZAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES NO SEMIÁRIDO PARAIBANO SOB A PERSPECTIVA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba, em cumprimento às exigências para a obtenção do grau de Licenciada em Ciências Biológicas.

Orientador: Prof. Dr. Alfredo Ricardo Langguth Bonino.

Co-orientador: Paulo Guilherme Carniel Wagner.

JOÃO PESSOA 2012

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TAINÁ SHERLAKYANN ALVES PESSOA

CAPTURA E COMERCIALIZAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES NO SEMIÁRIDO PARAIBANO SOB A PERSPECTIVA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Trabalho Acadêmico de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba, em cumprimento às exigências para a obtenção do título de Licenciada em Ciências Biológicas.

Aprovada em 12 de novembro de 2012

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________ Prof. Dr. Alfredo Ricardo Langguth Bonino

Orientador

_____________________________________________ Profª. Drª. Carla Soraia Soares de Castro

Examinador

_____________________________________________ Prof. Dr. Helder Farias Pereira de Araujo

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Catalogação na publicação Universidade Federal da Paraíba

Biblioteca Setorial do CCEN P475c Pessoa, Tainá Sherlakyann Alves.

Captura e comercialização de animais silvestres no semiárido paraibano sob a perspectiva de crianças e adolescentes/Tainá Sherlakyann Alves Pessoa. – João Pessoa, 2012.

85p. : il.-

Monografia (Graduação em Ciências Biológicas) – Universidade Federal da Paraíba.

Orientador: Alfredo Ricardo Langguth Bonino.

. 1. Fauna silvestre – Métodos de captura 2. Animais silvestres – Semiárido paraibano. 3. Meio ambiente - Degradação. I. Título.

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À Maria Anunciada Silvestre, vó Ciada (

in memorian

),

por ter cultivado em mim o amor e o respeito a todas as

formas de vida.

Dedico

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AGRADECIMENTOS

Neste momento único em minha vida, pelo qual espero anos a fio, estou imersa em meio a um universo de sentimentos: amor, ansiedade, surpresa, gratidão, nervosismo, inquietação e felicidade. Todos eles fazem com que na ocasião em que escrevo esse texto, minha mão fique trêmula, o frio na barriga torne-se intenso e as lágrimas escorram pelos olhos. De fato, não posso descrever o que sinto agora, só sei que estou feliz... MUITO FELIZ e grata àqueles que proporcionaram a existência desse momento.

Meu Pai do céu pediu que eu tivesse paciência e, sem entender Seus desígnios, me frustrei por diversas vezes. Eu roguei incansavelmente a Maria Santíssima pela sua intercessão e ela, com todo o cuidado de Mãe, me ajudou a superar os obstáculos e frustrações que, naquele momento, impediam a realização do meu sonho. A Eles e por Eles sou eternamente grata, em especial pelo ensinamento de que os nossos desejos são realizados apenas no momento correto e que, todos os problemas que outrora podem nos afetar são apenas degraus que nos direcionam rumo à concretização do sonho.

Agradeço a toda minha família pelo apoio incondicional, a mainha, a minha vó Dulce e ao meu vô Zé, que são minha motivação de vida e aos quais agradeço por todo carinho, cuidado e amor oferecidos desde que fui concebida. À tio Junior, tio Rogério, Cláudia, tia Verônica, tio Bena, Hélder, Helton e Ninha por me apoiarem ainda que sem compreender integralmente os motivos, torcendo pelo meu sucesso e aceitando minha ausência em vários momentos. EU AMO VOCÊS!

Também importantes foram as famílias das quais fui integrante por um curto período, as que me abrigaram e deram todo o apoio logístico durante as minhas idas a campo. Em especial Emanuel e Fernanda que, além de tudo, me ofereceram horas de discussões e reflexões acerca do meu estudo e são, para mim, lições de vida.

Não menos importantes foram os meus sujeitos pesquisados, as crianças e adolescentes, essenciais para a construção deste trabalho,

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fazendo-se aqui presentes em cada frase e também em cada sorriso sincero que guardo na lembrança.

Com muito reconhecimento, destaco também a contribuição de duas pessoas que ajudaram a construir minha identidade profissional, dando-me liberdade para voar mas, ao mesmo tempo, orientando meu voo quando o caminho tomado não era o mais adequado. A Paulo Wagner e Professor Langguth sou grata pela oportunidade, pela paciência, pelo tempo dedicado, pelo apoio e, principalmente, pela confiança.

À Tarsila Cavalcanti por diversas vezes ter me acompanhado nas idas a campo, sendo uma parceira de viagem e me auxiliando também na identificação das aves. Do mesmo modo, sou grata ao nobre Washington Vieira pela correção da lista de répteis. Também a Lusi pela revisão do abstract e torcida diretamente de Ohio State, USA!

Ao CNPq pela concessão da bolsa que viabilizou minhas idas a campo e, por conseguinte, a concretização deste trabalho.

Aos meus amigos e amigas, Alin, Eri, Dezza, Poly, Bele, Nâne, a minha prima Hany e a mais nova mamãe (Mayara, a maga), por tolerarem meu chá de sumiço, torcendo por mim apesar da distância física.

À Jéssica por aguentar meu stress e correria diária, compartilhando momentos de alegria e tornando engraçadas as situações mais excêntricas.

Ao Professor de Biologia Adailton Paulino, por ter alavancado a vocação de uma adolescente de 14 anos, por volta do ano 2004 quando ainda cursava o 2º ano do ensino médio.

Sou grata ainda a Thiago César, pelo estímulo oferecido no momento em que eu mais precisei, também pelas broncas, por ter sido um dos grandes mentores da minha formação.

Por último e não menos importante, a Eudécio Neco, o meu Deto. Eu, sinceramente, agora parei! Não sei como te agradecer... Faltam-me palavras para descrever a gratidão que tenho por você ter me acompanhado nesta caminhada árdua, doída, mas feliz destes quatros anos passados. Dizer que te agradeço é novamente agradecer ao nosso bom Deus por ter fortalecido nossas forças ao unir eu e você.

(8)

É tão bonito quando a gente pisa firme nessas linhas que estão nas

palmas de nossas mãos. É tão bonito quando a gente vai à vida nos

caminhos onde bate bem mais forte o coração [...]

Gonzaguinha

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RESUMO

A relação que o homem mantém com os recursos naturais evoluiu numa perspectiva de crescente exploração não sustentável e degradação. Nesse contexto, a captura indiscriminada de animais silvestres se caracteriza como uma séria ameaça aos ecossistemas. Muitos estudos envolvem a relação entre populações tradicionais e Unidades de Conservação (UCs). Entretanto, é importante também priorizar pesquisas que sejam realizadas em áreas onde não existem esforços conservacionistas evidentes, pois a necessidade de manutenção da fauna ultrapassa a barreira de uma UC. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é identificar as motivações que levam algumas populações rurais da Paraíba a praticar a retirada ilegal ou a aquisição de animais silvestres vindos da natureza. Para tanto, durante novembro de 2009 a maio de 2011, foram aplicados questionários de caráter socioambiental e realizadas entrevistas semiestruturadas com estudantes de escolas rurais nos municípios de Quixaba, Passagem, Cacimba de Areia, Areia de Baraúnas, Salgadinho e na RPPN Fazenda Tamanduá, localizados nas macrorregiões do Sertão e da Borborema. Foram visitadas 26 escolas, sendo entrevistados 319 alunos, dos quais se obteve 231 questionários assim distribuídos: Quixaba (30), Passagem (47), Cacimba de Areia (51), Areia de Baraúnas (24), Salgadinho (54) e RPPN Fazenda Tamanduá (25). Em decorrência, verificou-se que a atividade de caça não é determinante para a sobrevivência das famílias nesta área de estudo. Notadamente a captura de animais silvestres está mais associada com uma motivação cultural, como se observa no elevado grau de uso para companhia. Os métodos e instrumentos de caça utilizados são diversos, com destaque para a caça com cachorros, o facheado e o emprego de espingarda. As aves correspondem ao grupo de animais mais utilizados, seguido dos mamíferos e répteis. Em suma, constatou-se que as crianças são fontes valiosas de conhecimento e podem fornecer informações importantes para estudos etnoecológicos, sendo ferramentas importantes para este fim.

Palavras chave: Fauna silvestre. Métodos de captura. Comercialização. Percepção ambiental.

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ABSTRACT

The relation that man maintains with natural resources developed in a perspective of increasing unsustainable exploitation and degradation. In this context, the indiscriminate capture of wild animals is characterized as a serious threat to ecosystems. Many studies involve the relation between traditional population and protected areas. However, it is important also to prioritize research in areas which does not have evident conservation efforts, because the necessity for maintenance of wildlife override the barrier of protected area. Thus, the aim of this study is to identify the motivations that lead some rural populations at Paraíba to poaching or acquire wild animals coming from nature. For this, from November 2009 to May 2011, were applied socio-environmental questionnaires and realized semistructured interviews with students from rural schools in the municipalities of Quixaba, Passagem, Cacimba de Areia, Areia de Baraúnas, Salgadinho and at RPPN Fazenda Tamanduá, located in macroregions of Sertão and Borborema. We visited 26 schools and interviewed 319 students, from which were obtained 231 questionnaires distributed as follow: Quixaba (30), Passagem (47), Cacimba de Areia (51), Areia de Baraúnas (24), Salgadinho (54) and RPPN Fazenda Tamanduá (25). Thereby, was found that the activity of poaching is not crucial to the families survival in this area of study. Notably, the capture of wild animals is more associated with a cultural motivation, as observed in the high level of usage for company. The methods and instruments of poaching used are diverse, especially the hunting with dogs, the ‘facheado’ (nocturnal hunting of birds) and the use of shotgun. The birds correspond to the most widely used group of animals, followed by mammals and reptiles. In short, it was found that children are valuable sources of knowledge and can give important information for ethnoecological studies, being important tools for this purpose.

Keywords: Wildlife. Methods of capture. Commercialization. Environmental perception.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Mapa do estado da Paraíba destacando a área de estudo, que inclui os municípios de Quixaba, Passagem, Cacimba de Areia, Areia de Baraúnas, Salgadinho e Santa Terezinha.

32

Figura 2 – Auxílio ao estudante durante a aplicação do questionário em uma escola do município de Cacimba de Areia, Paraíba.

35

Figura 3 – Número de alunos entrevistados e questionários preenchidos nas respectivas cidades avaliadas.

38

Figura 4 – Distribuição do número de entrevistados pela idade correspondente em ambos os sexos.

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Figura 5 – Relação entre as porcentagens de famílias que possuem ou capturam animais silvestres e das que não possuem ou não capturam por faixa de renda.

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Figura 6 – Relação entre a renda mensal e a quantidade de animais capturados e/ou adquiridos por cada família representada através dos entrevistados.

41

Figura 7 – Representação das três faixas de renda em cada categoria de uso (Companhia, comércio, troca e alimentação).

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Figura 8 – Distribuição do número absoluto de famílias que utilizam animais silvestres e das que não utilizam, de acordo com o número de membros que as compõe.

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Figura 9 – Relação da composição de membros das famílias e quantidade de espécies utilizadas por elas.

44

Figura 10 – Espécime de Columbina minuta perseguido e morto por crianças durante entrevista realizada em uma escola do município de Cacimba de Areia, na Paraíba.

45

Figura 11 – Gêneros de aves e suas respectivas frequências de citações nas localidades pesquisadas.

52

Figura 12 – Espécies de aves mais utilizadas, de acordo com os informantes, durante a pesquisa realizada no semiárido paraibano. A: Rolinha (Columbina talpacoti);

B: Galo-de-campina (Paroaria dominicana); C: Golado

macho (Sporophila albogularis); D: Concriz (Icterus

jamacaii); E: Gangarro (Aratinga cactorum); F: Ribaçã

(Zenaida auriculata); G: Azulão (Cyanoloxia brissonii).

53

Figura 13 – Gêneros de mamíferos e suas respectivas frequências de citações nas localidades pesquisadas.

54

Figura 14 – Espécies de mamíferos mais utilizadas, de acordo com os informantes, durante a pesquisa realizada no semiárido paraibano. A: Tatu-peba (Euphractus

sexcinctus); B: Tatu-verdadeiro (Dasypus

novemcinctus); C: Preá (Galea spixii); D: Tacaca juvenil

(Conepatus semistriatus); E: Tamanduá (Tamandua

tetradactyla).

55

Figura 15 – Espécies de répteis mais utilizadas, de acordo com os informantes, durante a pesquisa realizada no semiárido paraibano. A: Téju (Tupinambis merianae); B: Camaleão (Iguana iguana).

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Espécies da fauna silvestre capturadas e/ou utilizadas, com seus respectivos nomes locais, número de citações e valor de uso (VU) nas seis áreas estudadas: Quixaba, Passagem, Cacimba de Areia, Areia de Baraúnas, Salgadinho e RPPN Tamanduá.

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Tabela 2 – Distribuição das espécies da fauna silvestre em categorias de uso nas seis áreas estudadas: Quixaba, Passagem, Cacimba de Areia, Areia de Baraúnas, Salgadinho e RPPN Tamanduá. IUCN Red List status: (VU) vulnerável; (LC) pouca preocupação.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 16

1.1 Interações entre homem e natureza 17

1.2 Captura e comercialização de animais silvestres no Brasil 18

1.3 A Caatinga e suas ameaças 21

1.4 Aspectos da caça e comercialização de animais silvestres na Paraíba 22 1.5 Implicações ecológicas e sociais da caça ilegal 24 1.6 Relações entre crianças, adolescentes e o meio ambiente 27

2 OBJETIVOS 30 2.1 Geral 30 2.2 Específicos 30 3 METODOLOGIA 32 3.1 Área de estudo 32 3.2 Coleta de dados 33

3.3 Análise dos dados 36

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 38

4.1 Contexto socioeconômico e uso da fauna silvestre 38

4.2 Caracterização da atividade de caça 47

4.2.1 Locais preferenciais 47

4.2.2 Métodos e instrumentos de captura 48

4.2.3 Espécies capturadas e seus fins 50

4.2.4 Aspectos sobre a comercialização de animais 69

4.3 Percepção ambiental dos sujeitos 70

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 73

6 SUGESTÕES PRÁTICAS 75

REFERÊNCIAS 77

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1 INTRODUÇÃO

Como todo ser vivo o homem mantém desde sua origem uma relação com os demais componentes vivos do seu ambiente. Esta relação, no entanto, mudou em função das novas maneiras de explorar os recursos e do crescimento da população humana, tornando-se, em muitos casos, predatória e imprudente. Nesse contexto, o Brasil, um país de dimensão continental e detentor de ampla diversidade biológica, tem passado por um longo histórico de devastação e uso descomedido dos recursos naturais. A Caatinga, um domínio morfoclimático característico deste país, possui atualmente uma esparsa vegetação e está sujeita a constante degradação antrópica.

Dentro desta problemática, destaca-se a captura de animais silvestres, que normalmente está vinculada a utilização de espécimes da fauna como animais de estimação, como alimentação e na medicina tradicional. Do mesmo modo, o tráfico de animais silvestres é um fator estimulante para esta atividade, sendo responsável, a nível mundial, pela retirada de milhões de animais da natureza todos os anos. A região Nordeste contribui para este cenário através do fornecimento de diversas espécies, sendo caracterizada como área de captura e de pequenos e médios mercados (LOPES, 2003).

Visto que a captura excessiva é uma das principais causas da redução das populações naturais e que isto pode ocasionar graves efeitos no funcionamento do ecossistema (RIBEIRO; SILVA 2007), considera-se importante a elaboração de estudos e estratégias de conservação que regulem a relação do homem com os recursos faunísticos utilizados, bem como corrija as perturbações que dela sejam originadas.

A partir de uma análise mais sistemática observamos que estas alterações ocorrem, primariamente, no âmbito das populações rurais, as quais estão mais intimamente relacionadas com os animais silvestres e deles usufruem. Logo, a busca por alternativas para minimizar a destruição dos recursos faunísticos, incluindo formas de uso sustentável deve, necessariamente, considerar os aspectos socioeconômicos e culturais

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embutidos nas motivações para a utilização de espécimes da fauna silvestre por essas comunidades.

1.1 Interações entre homem e natureza

A relação do homem com os demais componentes vivos da natureza é mantida desde os primórdios e foi responsável por gerar uma série de conhecimentos sobre o meio ambiente. Contudo, evoluiu numa perspectiva crescente de exploração e consequente degradação dos recursos naturais, principalmente em função das novas maneiras de explorá-los (tecnologia) e do crescimento da população humana. Nesse contexto, as atividades humanas são extremamente variáveis na sua influência sobre os elementos da biodiversidade (TORRES et al., 2009).

Em culturas tradicionais evidencia-se a tendência da mudança entre um perfil de uso dos recursos adequado, sustentável e seguindo padrões culturais para outro que compromete a conservação do ambiente natural, principalmente pelo envolvimento dessas populações em atividades de garimpos, sobrepesca e de caça indiscriminada (LEONEL, 2000). Todas as tensões econômicas oriundas da ocupação dos espaços rural e urbano devem, possivelmente, ter influenciado o modo pelo qual estas populações tradicionais utilizam os recursos de seu entorno.

Contudo, ao longo dos anos estas populações reuniram conhecimentos valiosos acerca da fauna, flora, uso do solo e outros elementos que, sendo utilizados adequadamente, complementam o conhecimento científico em diversas áreas, tais como manejo de recursos, avaliação de impacto ambiental e desenvolvimento sustentável (ZWAHLEN, 1996). Por esse motivo, quando se procura realizar uma estratégia de conservação eficaz, é importante identificar e considerar os diversos valores que as comunidades locais embutem aos componentes do ambiente em questão (SALLENAVE, 1994). De acordo com este mesmo autor, tais valores podem ser classificados em: ecológico, social, cultural, econômico e espiritual.

Do mesmo modo, a captura da fauna silvestre proporcionou a apreensão de uma variedade de conhecimentos sobre o comportamento,

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distribuição, alimentação e reprodução das espécies alvo. Segundo Ellen (2012), esta gama de saberes são acumulados através das gerações por meio da experimentação e troca de informação oral.

A utilização dos recursos faunísticos se dá, em primeira instância, na atividade de caça, que é empregada para a obtenção de animais destinados a diversos fins, dentre os quais destacam-se o comércio, a alimentação humana, a domesticação e o uso medicinal.

1.2 Captura e comercialização de animais silvestres no Brasil

O Brasil é conhecido como detentor de uma grande diversidade biológica, o que pode ser justificado pela presença de cinco biomas, incluindo a maior área úmida tropical do mundo, o pantanal, e do maior sistema fluvial do mundo (BRANDON et al., 2005). Todavia, o país enfrenta um atual quadro de degradação que, segundo Padrone (2004), é o resultado de anos de exploração irracional dos recursos naturais.

A origem dessa utilização descomedida data do período colonial, com a livre exploração madeireira pelos europeus e o desenvolvimento da agricultura e criação de gado no país. No que tange o comércio de animais silvestres, nota-se que ele foi impulsionado pela necessidade dos europeus em conhecer, com mais detalhes, o esplêndido mundo natural que os viajantes encontravam no Brasil. Isso porque, as primeiras ilustrações foram realizadas através de relatos, excetuando-se as pinturas derivadas da expedição dos holandeses ao Nordeste (1630-1654). Tratando dessa curiosidade europeia e da dificuldade de transporte de alguns animais, Ribeiro (2006, p. 3) discorre:

Relatos e gravuras permitiram saciar, em parte, a curiosidade do Velho Mundo em torno da fauna brasileira, porém nunca substituíram o contato direto com o animal vivo ou empalhado, ou, pelo menos, com suas peles, penas, dentes, garras, bicos, esqueletos, etc. O transporte de espécimes vegetais sob a forma de sementes, mudas, plantas herborizadas, etc, sempre se apresentou mais fácil do que o de animais, em especial aqueles de maior porte, devido às dificuldades de capturá-los vivos e de assim mantê-los na travessia do Atlântico [...] resultando em muitas tentativas

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infrutíferas com a morte de vários animais, vitimados pela fome, frio, ou outros fatores.

A partir de então, portugueses e franceses demonstram maior interesse por esse tipo de atividade, que acabou modificando inclusive o hábito de caça dos índios, os quais tornaram os animais mercadorias para o escambo com os europeus. Em geral, os grupos mais comercializados eram psitacídeos e primatas, fato que leva a consagração da imagem do pirata ou marinheiro acompanhado destes animais. O avanço científico no mundo europeu, notadamente na França, Inglaterra e Alemanha, refletiu-se no crescente interesse por animais raros que seriam utilizados para estudos em História Natural. No final do século XIX, a exportação de animais silvestres para a Europa sistematizou-se e, a partir de então, foi intensificada a captura de várias espécies para atender a este mercado (PADRONE, 2004). O comércio da fauna silvestre passou a ser ilegal no Brasil apenas em 1967, através da lei 5.197, quando surgiu uma legislação direcionada para coibir esta atividade. Ladeia e Fenner (2010) destaca que, tão logo isto aconteceu, o tráfico ilegal de animais silvestres configurou-se no cenário brasileiro, pois não foram apresentadas alternativas às pessoas que antes viviam deste comércio, as quais passaram a praticar atividades ilícitas.

Atualmente o tráfico de animais silvestres ainda constitui uma das maiores ameaças a fauna brasileira. As pretensões com esse mercado não modificaram-se bruscamente, pois como relata Padrone (2004) ele se desenvolveu com o crescente interesse das pessoas por animais silvestres, os quais eram geralmente cobiçados para estimação. Segundo Bubiak (2008) não é de hoje que a domesticação de espécies silvestres desperta interesses no homem, mas ela tem se intensificado nas últimas décadas. No Brasil, manter estes animais em cativeiro domiciliar é um costume comum a diversas classes sociais, desde as mais privilegiadas financeiramente até as mais baixas, caracterizando-o como um hábito cultural da população (PADRONE, 2004). Aliada a este fato existe a influência da mídia, sobretudo televisiva, através da divulgação e ênfase na beleza faunística, sendo um estímulo indireto para o desejo de posse e consequente obtenção de animais silvestres.

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Não obstante, a caça indiscriminada também é constituinte fundamental do tráfico de animais silvestres, o qual se distingue como um dos três maiores negócios ilícitos do mundo, atrás apenas do tráfico de drogas e de armas, movimentando cerca de 10 bilhões de dólares ao ano (WWF, 1995). Desse total, o Brasil participa com 5% a 15%, aproximadamente US$ 900 milhões/ano, correspondendo a cerca de 38 milhões de animais retirados da natureza todos os anos (RENCTAS, 2001).

A legislação brasileira dispõe no art. 29 da lei nº 9.605/98 que matar, caçar, apanhar, perseguir, comercializar e utilizar animais silvestres, sejam nativos ou em rota migratória, sem ou em desacordo com a autorização do órgão competente implica em multa e detenção de seis meses a um ano. Se a espécie for considerada rara ou ameaçada de extinção esta pena é agravada (BRASIL, 1998).

Conforme a Renctas (2001), os indivíduos que atuam na comercialização ilegal da fauna silvestre são classificados em categorias funcionais como: os apanhadores, responsáveis pela captura, os distribuidores que são encarregados pelo transporte, os comerciantes que ofertam os animais para os consumidores, que são o destino final dos espécimes comercializados. Neste contexto, tal categoria é composta por criadores e colecionadores particulares, zoológicos, circos, artesãos, entre outros fins.

Lopes (2003) diferencia algumas regiões brasileiras incluídas nesse processo do tráfico. Nessa perspectiva, a região Nordeste distingui-se como área de captura e de pequenos e médios mercados, enquanto a região Sudeste participa do processo como a grande consumidora e promotora do tráfico internacional. Assim, os animais são transportados, através das rodovias federais e estaduais e até mesmo pelo espaço aéreo, para os grandes centros urbanos (PADRONE, 2004).

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1.3 A Caatinga e suas ameaças

Na região Nordeste destaca-se o domínio morfoclimático da Caatinga (AB’SÁBER, 1970), que apresenta elevada temperatura (BUCHER, 1982) e longos períodos de seca, exibindo um clima árido e semiárido (SAMPAIO, 1995). Este mesmo autor ainda ressalta o longo histórico de alterações à que esta região semiárida está sujeita. Dentre os fatores que ameaçam a sua conservação, um dos mais representativos é a caça ilegal e, nesse aspecto, a utilização de espécimes da fauna é um evento considerável na região.

Sabe-se que a Caatinga não é homogênea e pouco diversa, mas sim heterogênea e mais diversificada que qualquer outro bioma exposto às mesmas condições de clima e solo (MMA, 2002). Estudos recentes demonstram que esta região abriga várias espécies da fauna e flora, com um elevado índice de endemismo, o que enfatiza sua importância para a conservação da biodiversidade brasileira. Segundo Leal et al.(2003), o valor da Caatinga ultrapassa a elevada biodiversidade e endemismos, pois sendo uma anomalia climática, ela funciona ainda como um importante laboratório para estudos de evolução, por exemplo.

No entanto, como as atividades humanas exercem influência direta na manutenção da riqueza dos ecossistemas, a Caatinga tem sido ameaçada desde o início do século XVI por vários fatores, tal como desmatamento para implantar fazendas de gado (COIMBRA-FILHO; CÂMARA, 1996). Atualmente, a vegetação arbórea é esparsa e rara (PRADO, 2003), estando restrita às manchas de solos ricos em nutrientes (LEAL et al., 2005) e encostas de serras. De acordo com estes mesmos autores, a ação antrópica constante está causando perturbações no ambiente da Caatinga e estima-se que 30,4% a 51,7% de sua área já sofreu alterações. Entre as maiores ameaças a sua biodiversidade está a agricultura de corte e queima, o desmatamento para pastagens e a caça predatória.

Os longos períodos de seca, característicos deste domínio, reduzem a produtividade da terra, somando consequências para o empobrecimento da população rural (SAMPAIO; BATISTA, 2004), que desenvolveu uma estreita e intensa relação de uso com os recursos naturais disponíveis na região (LEAL

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et al., 2005; ALVES et al., 2009). Segundo Redford (1992), a necessidade de aquisição de proteína animal é um fator estimulante para a utilização da fauna silvestre, auxiliando na subsistência de comunidades interioranas do país.

Nesse contexto, diversos pesquisadores manifestam o crescente interesse em elaborar estratégias de conservação para a Caatinga, tais como programas de sustentabilidade que estimulem a utilização racional dos recursos pelos sertanejos e a criação de novas Unidades de Conservação (UCs).

Conforme LEAL et al. (2005), existem três objetivos essenciais que priorizam a conservação da Caatinga, o primeiro trata da evitar uma maior perda de habitat e a desertificação, o outro diz respeito a manutenção dos serviços ecológicos-chave e o último se refere a promoção do uso sustentável dos recursos naturais. Para subsidiar tais objetivos, é importante conhecer a biodiversidade dessa região semiárida, bem como seus modos de utilização pelas populações, visto que um recurso natural possui diferentes valores de ordem social, cultural, ecológica e econômica.

1.4 Aspectos da caça e comercialização de animais silvestres na Paraíba

O estado da Paraíba apresenta uma ampla área do seu território incluída no domínio das Caatingas, o que compreende as regiões do Sertão, Cariri, Seridó e Curimataú (MELO; RODRIGUES, 2003). Como já enfatizado, trata-se de um bioma rico em espécies e endemismos, característica que possivelmente favorece a utilização de diferentes espécimes da fauna e da flora pela população humana.

Até o presente momento não existe um estudo sistemático sobre a captura ilegal de animais silvestres em todo o estado, no entanto, têm sido conduzidos vários trabalhos em determinados municípios e regiões, os quais descrevem o perfil do caçador, bem como uma variedade de métodos de caça e de espécies capturadas. Frequentemente as técnicas de captura são seletivas (GAMA; SASSI, 2008; ALVES et al., 2009; BARBOSA; NOBREGA;

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ALVES, 2010), ou seja, consideram as características específicas de cada espécie, tais como o hábito alimentar, o comportamento e o hábitat.

Informações sobre o tráfico de animais silvestres são difíceis de ser mensuradas (WWF, 1995), entretanto estimativas sobre os registros de apreensões, entregas voluntárias e resgates nos CETAS (Centro de Triagem de Animais Silvestres) podem revelar algo sobre a captura e o comércio destes. Nesta perspectiva, pode-se considerar os dados apresentados por Marques et al. (2011) no que diz respeito a fauna com entrada no CETAS da Paraíba durante os anos 2009 e 2010. Segundo os autores, as aves correspondem a 81,24% dos 9.316 animais depositados no CETAS entre os anos abordados, seguidas dos répteis que representam 10,93% e dos mamíferos com 6,84%. De modo similar, Pagano et al. (2009) também constataram a prevalência de aves (88% do total) durante o período de estudo neste centro, que compreendeu os meses de agosto de 2006 a julho de 2007. Estes dados podem indicar aspectos relevantes sobre as atividades de caça e comercialização da fauna silvestre no estado, inclusive sobre os principais pontos de apreensão, porém são mais úteis no que diz respeito a avifauna em virtude de seu comércio mais aparente que o dos demais grupos, como mamíferos e répteis.

Na Paraíba, notadamente, os principais pontos de comercialização registrados são feiras, mercados informais e pontos específicos na capital, João Pessoa, e em Campina Grande (LOPES, 2003). Nesse contexto, Rocha et al. (2006) interpreta a presença de um tráfico interno de pequenas proporções e, tratando do comércio de aves, destaca que normalmente ele ocorre como um complemento financeiro à renda familiar.

Todavia, os fins da captura de animais silvestres no estado não se resumem a comercialização, ainda pode-se destacar a criação em cativeiro domiciliar, a alimentação, a produção de artesanatos, o lazer, o uso místico-religioso, o emprego da fauna ou de seus derivados na medicina popular e a caça para a resolução de conflitos que envolvem animais silvestres e domésticos. Apesar desta diversidade de usos ainda são escassos os trabalhos que a contemplam, de modo que se evidenciam estudos sobre a captura e comercialização, especialmente de aves, e outros sobre o uso

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medicinal. Além disso, algumas pesquisas de campo analisam essa temática de forma indireta, objetivando prioritariamente examinar a percepção ambiental de comunidades rurais.

1.5 Implicações ecológicas e sociais da caça ilegal

Visto que a captura excessiva é a uma das principais causas da redução das populações naturais, o tráfico de animais silvestres destaca-se como um dos impactos mais significativos para a diminuição da abundância de várias espécies, ocasionando sérios efeitos na estrutura das comunidades e nas suas funções ecológicas (RIBEIRO; SILVA, 2007).

As aves, por exemplo, desempenham papeis importantes para a manutenção do meio ambiente, tais como a polinização e dispersão de sementes e, por decorrência, a recuperação de áreas degradadas. Nesse contexto, a ornitocoria apresenta algumas vantagens: as aves possuem volume corpóreo relativamente grande e podem carregar sementes proporcionais a seu tamanho, bem como têm facilidade de deslocamento, o que favorece o seu raio de ação. Por outro lado, a fidelidade ao ambiente pode favorecer a dispersão de plantas que só desenvolvem-se naquele local (ARGEL-DE-OLIVEIRA, 1998), indicando que espécies de aves endêmicas atuam na conservação do ambiente original. Na recomposição de áreas degradadas as aves atuam de forma eficiente, pois movimentam-se entre bordas de matas e em espaços alterados pela ação antrópica, sendo veículos para a dispersão de plantas pioneiras (ARGEL-DE-OLIVEIRA, 1998). Assim, contribuem para o processo de sucessão ecológica, pois proporcionam aumento na cobertura e na biomassa vegetal, que modificam o ambiente permitindo que espécies dos estágios tardios se estabeleçam (RICKLEFS, 2009).

Os répteis constituem, em sua maioria, um grupo de predadores. Além disso, boa parte dos lagartos, algumas cobras e quelônios alimentam-se principalmente de insetos, sendo classificados como consumidores secundários. Os herbívoros além de se alimentarem de folhas, podem utilizar os frutos como fonte de energia e atuar assim na dispersão de sementes.

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Logo, são responsáveis por serviços ecológicos importantes para a manutenção funcional dos ecossistemas. Mas, enquanto alguns sobrevivem com sucesso em ambientes perturbados pela ação antrópica, a maioria só consegue resistir em ambientes específicos, sendo especialistas em hábitats (MARTINS; MOLINA, 2008).

Os mamíferos, por sua vez, podem constituir espécies-chave na estrutura das comunidades naturais através de serviços como a dispersão de sementes, polinização e predação (CUARÓN, 2000). Estas espécies incluem os predadores de topo de cadeia, que normalmente já possuem baixas densidades populacionais (LAURANCE, 1994) e, se afetados pela sobrecaça, ocorrem alterações na composição das comunidades por meio do aumento da densidade das espécies-presa (TERBORGH et al., 2001). Contudo, Townsend (2000) e Chiarello (1999) ressalvam que a maior pressão de caça é direcionada aos mamíferos frugívoros e herbívoros.

Existem também outras discussões acerca dos prejuízos causados pelo tráfico de animais silvestres, como as implicações no setor político-econômico, que distingue os hemisférios norte e sul do planeta, de modo que o primeiro destaca-se com o maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e poucos recursos naturais e o segundo com menor IDH e muitos recursos naturais, atuando como fornecedor destes (HESSEL; SAITO; STEINK, 2007).

Quando é abordado o assunto da caça e comercialização de animais silvestres, a imagem de que as comunidades humanas beneficiam-se dos recursos faunísticos em detrimento da perda de biodiversidade se sobressai em discursos conservacionistas. Por outro lado, muitos autores (COSTA-NETO, 2000; NOBREGA; BARBOSA; ALVES, 2009b; ROCHA et al., 2006) são prudentes ao tratar desse tema e utilizam argumentos que atenuam a visão negativa embutida nas populações humanas, contrapondo o discurso apresentado anteriormente ao ressaltar o uso dos recursos como forma de subsistência. Cunha e Nunes (2008) classificam esse tipo de postura como “visões românticas”.

No entanto, ainda são escassos os trabalhos que consideram estas variáveis, o benefício e/ou o prejuízo, para ambos os lados da relação homem-natureza. Por este motivo, aderir exclusivamente a apenas um

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destes discursos não é uma atitude sensata enquanto pouco se conheça da problemática.

Sendo assim, é necessário realizar um estudo sistemático da caça e verificar quais os fins desta prática e, do mesmo modo, analisar se há interferência na dinâmica populacional das espécies utilizadas, para dessa forma, segundo Mourão et al. (2006), entender a verdadeira relação recurso/caça na área. Com relação a esse primeiro ponto, sua importância reside no fato de fornecer subsídios importantes para a elaboração de estratégias de conservação das espécies. Além disso, estímulos recentes têm conseguido sensibilizar a população urbana, mas ficando longe de atingir o homem do campo, o qual mantém uma relação direta e próxima com os recursos faunísticos e deles usufruem. Neste contexto, nos confrontamos com alguns desafios como desenvolver estratégias adequadas de uso da fauna, o seu aproveitamento econômico e a conservação do potencial contido na megadiversidade brasileira e nos saberes culturais (LEONEL, 2000). De acordo com Vieira e Weber (1997), os planos de gestão e tomada de decisões devem contemplar as possibilidades de conexão com as comunidades rurais, que deste modo podem desempenhar papeis importantes na proteção do ambiente. Souto (2006) ressalta que o conhecimento ecológico tradicional medeia a retroalimentação entre biodiversidade e sociodiversidade, na qual uma atua na geração e manutenção da outra.

Sendo assim, na situação atual de avanço na destruição da natureza, e considerando o volume milionário de investimentos em conservação direcionados a alvos desconexos, entende-se que é urgente realizar estudos dos reais determinantes da destruição. Além disso, muitos estudos que envolvem a relação de populações tradicionais e o meio ambiente caracterizam-se pelo enfoque exclusivo a unidades de conservação (UCs). É inegável o valor destas pesquisas no fornecimento de subsídios para a incorporação da realidade das populações nas propostas de manejo da área. Entretanto, é importante priorizar estudos que sejam realizados em áreas onde não existem esforços conservacionistas evidentes, pois a necessidade de manutenção da fauna ultrapassa as barreiras de uma UC.

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1.6 Relações entre crianças, adolescentes e o meio ambiente

Crianças e adolescentes, através das relações que mantém com o meio ambiente, apreendem uma série de conhecimentos sobre a natureza, inclusive sobre a utilização que dela é feita por suas comunidades de origem. Logo, podem auxiliar significativamente no entendimento das motivações que levam às práticas de captura e comercialização de animais silvestres pelas populações rurais. Identificar as relações deste público e o conhecimento que adquiriram a partir da vivência com o ambiente natural que o cerca é um dos objetivos principais para a efetivação do presente trabalho.

De forma similar aos adultos, também participam claramente do processo de apreensão de saberes através das experiências vividas em sua formação. A difusão desses conhecimentos, através da tradição oral (POSEY, 1987), é do mesmo modo importante para o acúmulo de saberes entre as gerações. Sendo assim, o público infanto-juvenil mantém um conjunto de informações adquiridas por meio de diversos instrumentos e instituições, a exemplo da instituição escolar e, mais primariamente, a familiar.

Partindo desse pressuposto, indivíduos que de alguma forma convivem em ambientes naturais, especialmente aqueles que residem na zona rural e possuem uma relação mais íntima com os recursos do meio ambiente, constroem uma série de conhecimentos acerca da natureza, os quais fornecem novos meios de lidar com situações favoráveis ou adversas neste ambiente.

De acordo com Piaget (1970), a aquisição do conhecimento é dependente de alguns fatores internos e externos, tais como a maturação do sistema nervoso, a experiência e as transferências educativas ou sociais. O referido autor ainda acrescenta que na infância e adolescência o desenvolvimento intelectual situa-se no período das operações concretas (7 a 11-12 anos), que é caracterizado pela compreensão da relação entre o todo e as partes, bem como pela formação de um sistema de significação. Sendo assim, acredita-se que nessa fase o indivíduo apresenta um repertório de informações formidável, podendo ser aproveitado em seu benefício e a favor

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da sua comunidade, sobretudo quando se trata de assuntos relacionados ao meio ambiente e a utilização de seus recursos, notadamente os faunísticos.

No tocante a captura de animais silvestres, Alves et al. (2009) e Barbosa, Nobrega e Alves (2010) afirmam que durante a infância podem ser verificados os primeiros registros das atividades de caça, frequentemente pela utilização de um instrumento para captura de aves denominado “baladeira”.

Diversas pessoas, entre leigos e especialistas no assunto, destacam a importância da Educação Ambiental (EA) para a formação da consciência crítica das crianças. De fato, Carvalho (2001) afirma que elas constituem um grupo prioritário para fins de EA, fundamentando-se no argumento de que nelas este tipo de consciência pode ser refletida em seus comportamentos com maior sucesso do que nos adultos, visto que as crianças estão em fase de desenvolvimento cognitivo e aqueles apresentam um conjunto de hábitos e comportamentos de difícil reorientação.

A escolha de crianças e adolescentes para compor os sujeitos do presente trabalho não foi ao acaso, mas baseou-se nas características acima descritas, como também na inferência de que tal público não apresenta de forma intensa os preconceitos e receios que modificam a qualidade e quantidade das informações fornecidas pelos adultos.

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2 OBJETIVOS

2.1 Geral

Identificar quais as motivações que induzem as populações rurais do semiárido paraibano a praticar a retirada e/ou aquisição ilegal de animais silvestres a partir de relatos de crianças e adolescentes que se relacionam com as atividades de captura e comercialização, de modo a contribuir com informações que possam subsidiar ações eficazes para a conservação da natureza na região.

2.2 Específicos

 Identificar vivências e ações relatadas por crianças e adolescentes relativas à caça e comercialização de animais silvestres;

 Averiguar o perfil socioeconômico das famílias nas quais este público está inserido;

 Conhecer os métodos e instrumentos de caça empregados na região;

 Identificar as espécies utilizadas e seus respectivos fins;

 Conhecer o perfil do comércio de animais silvestres na região;

 Averiguar se o perfil socioeconômico das famílias determina a utilização de espécies da fauna silvestre;

 Verificar a percepção das crianças e adolescentes sobre a disponibilidade de animais silvestres em ambiente natural.

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3. METODOLOGIA

O presente estudo caracteriza-se, de acordo com Marconi e Lakatos (2011), como uma pesquisa de campo através do método da observação sistemática e utilizando como ferramentas um questionário e a entrevista semiestruturada focalizada. Nesse contexto, foi empregada a abordagem quali-quantitativa para atender aos objetivos de uma pesquisa exploratória. 3.1 Área de estudo

O estudo foi realizado em áreas rurais de seis municípios do estado da Paraíba: Quixaba, Passagem, Cacimba de Areia, Areia de Baraúnas, Salgadinho e Santa Terezinha. Os cinco primeiros são limítrofes, sendo Salgadinho localizado na microrregião do Seridó Ocidental (Macrorregião da Borborema) e os demais na microrregião de Patos (Macrorregião do Sertão). A cidade de Santa Terezinha, por sua vez, inclui-se também nesta localidade, porém faz divisa com a microrregião do Piancó a oeste (Figura 1).

Figura 1 – Mapa do estado da Paraíba destacando a área de estudo, que inclui os municípios de Quixaba, Passagem, Cacimba de Areia, Areia de Baraúnas, Salgadinho e Santa Terezinha.

A extensão territorial destes municípios é para Quixaba 157km2, para

Passagem 112km2, para Cacimba de Areia 220km2, para Areia de Baraúnas

96km2, para Salgadinho 184km2 e para Santa Terezinha 358km2. Em geral,

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1.699 em Quixaba, 2.233 em Passagem, 3.557 em Cacimba de Areia, 1.927 em Areia de Baraúnas, 3.508 em Salgadinho e 4.581 em Santa Teresinha (IBGE, 2010).

Estes municípios são caracterizados por baixos índices pluviométricos e um sistema de distribuição de chuvas bastante irregular. As regiões apresentam fitofisionomia típica do Bioma Caatinga, com vegetação xerófila, hiperxerófila e trechos de floresta caducifólia. Geralmente a topografia dos terrenos apresenta relevo com ondulações que podem ser suaves ou severas variando entre 270 e 981 metros, com a ocorrência de várias serras, a exemplo da serra de Pilões e Preacas em Quixaba e da serra da Borborema em Cacimba de Areia e Areia de Baraúnas. A economia da região está centrada no setor primário, notadamente em Areia de Baraúnas, seguido do setor terciário e secundário. Sendo a agricultura, a pecuária, a avicultura e o comércio as principais atividades econômicas (CPRM, 2005abcdef).

3.2 Coleta de dados

Durante os meses de novembro de 2009 a maio de 2011 foram realizadas as viagens à campo, nas quais a coleta de dados estava compreendida nos dias úteis da semana.

Para a execução do trabalho, realizamos um planejamento que incluiu uma viagem de reconhecimento da área de estudo. Neste período procuramos a colaboração de pessoas atuantes na comunidade local residentes da zona rural de Quixaba, os quais nos forneceram informações sobre as escolas, e fizemos também os contatos necessários com as administrações públicas da região.

Após esta etapa, foram visitadas 26 escolas rurais da rede pública de seis municípios: Quixaba (6), Passagem (3), Cacimba de Areia (6), Areia de Baraúnas (4), Salgadinho (4) e Santa Teresinha (3), onde foram aplicados os questionários e realizadas as entrevistas. Entretanto, nesta última cidade nem todas as áreas rurais foram contempladas, sendo visitadas apenas as escolas localizadas na Fazenda Tamanduá, a qual possui em seu interior uma Unidade de Conservação da categoria uso sustentável, a RPPN (Reserva

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Particular do Patrimônio Natural). De modo similar, no município de Salgadinho, poucas escolas foram visitadas devido a desativação de algumas e a reforma que naquele momento ocorria em outras. Mesmo assim foi possível realizar uma boa amostragem do município, pois estudantes de diversas localidades foram remanejados para as escolas visitadas. As turmas foram selecionadas de acordo com a disponibilidade e o critério de faixa etária, nesse último caso foi dada preferência as turmas em que os alunos possuíam, em média, oito anos.

Através de questionários de caráter socioambiental, foram obtidas informações sobre as atividades de captura e comercialização de animais silvestres na região, a partir das relações e percepções dos entrevistados com o tema mencionado, destacando também o perfil socioeconômico de suas famílias (ver apêndice 1).

Sendo assim, nas referidas escolas, as turmas amostradas foram divididas em grupos de irmãos, sem limite de pessoas, de modo que cada grupo representasse uma unidade familiar. Na ausência de outras pessoas da mesma família na turma, alguns alunos responderam as questões individualmente (Figura 2). Conforme a necessidade foi oferecido auxílio no entendimento das questões e aqueles que não tinham habilidades de leitura e escrita responderam verbalmente (entrevista semiestruturada). Vale ressaltar que durante o período de aplicação, perguntas não explícitas foram feitas procurando enriquecer os questionários com mais informações. Além disso, foram utilizadas pranchas com imagens de armadilhas, métodos de caça (Alves et al., 2009) e animais para subsidiar a identificação dos mesmos. Os controles foram feitos de acordo com Marques (1991), utilizando os testes de validade das respostas, com entrevistas reproduzidas em situações diacrônicas, quando uma pergunta é repetida a mesma pessoa em tempos diferentes, e sincrônicas quando uma mesma pergunta é feita a pessoas diferentes em momentos próximos.

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Figura 2 – Aplicação do questionário e entrevistas realizadas em uma escola localizada na RPPN Fazenda Tamanduá (A), em Cacimba de Areia (B) e em Passagem (C), no estado da Paraíba. Fonte: Professores das respectivas turmas.

B

A

(36)

3.3 Análise dos dados

De posse dos questionários, os dados obtidos foram tabulados em planilha eletrônica e feito o tratamento estatístico pertinente às análises da relação entre as variáveis: renda mensal, composição familiar (quantidade de membros), atitude de obtenção de animais silvestres, quantidade de espécies e de indivíduos utilizados.

Os animais citados foram identificados a partir das imagens mostradas durante as entrevistas e com base em nomes vulgares, neste último caso buscou-se auxílio na literatura específica e de especialistas familiarizados com a fauna da área de estudo.

Vale ressaltar que a expressão ‘caça’ adotada neste trabalho segue a descrição de FERREIRA (1988, p. 112): “s. f. 1. Ato de caçar; caçada. 2. Animais caçados. 3. Os animais que podem ser caçados. 4. Busca, perseguição, procura”.

O Valor de Uso (VU) é uma medida que demonstra a importância relativa de cada espécie para a comunidade local, sem a interferência da opinião do pesquisador. Logo, foi calculado o VU (adaptado de Phillips et al., 1994) para todas as espécies citadas através da seguinte fórmula:

onde U é o número de citações por espécies e n é o número de informantes. Nas análises estatísticas foi utilizado o teste de normalidade D’ Agostino que identificou as amostras como não paramétricas. Partindo dessa verificação, foram escolhidos os seguintes testes para analisar a relação entre as variáveis citadas anteriormente: Coeficiente de Contingência C e Coeficiente de Spearman, ambos com poder de decisão de 0.05. As demais informações foram analisadas conforme a frequência (%) das respostas dos entrevistados.

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(38)

0 30 60 90

Quixaba Passagem Cacimba de

Areia Baraúnas Areia de Salgadinho Teresinha Santa 30 47 51 24 54 25 71 55 66 34 60 33 N úmero abso luto Municípios amostrados

Questionários obtidos Estudantes entrevistados

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Contexto socioeconômico e uso da fauna silvestre

Nos municípios envolvidos, um total de 319 estudantes foi entrevistado. Contudo, como a abrangência da pesquisa estendeu-se à unidade familiar, obteve-se 231 questionários (Figura 3).

Figura 3 – Número de alunos entrevistados e questionários preenchidos nos respectivos municípios.

Considerando as informações declaradas através do questionário – que abrangeu o sexo, a idade e a série do indivíduo mais velho do grupo, quando este era formado – o número de indivíduos entrevistados do sexo masculino e feminino foi bastante similar: 121 na primeira categoria, 109 na segunda e um indivíduo que ocultou a informação. Os estudantes apresentaram, em média, 9 anos (4-23) e a proporção sexo/idade mostrou-se bastante harmoniosa (Figura 4).

Muitos dos pais citados pelos entrevistados trabalham de forma autônoma (77%) como vendedores, pedreiros, carpinteiros, cabeleireiros, agricultores e demais profissões. Esse tipo de fonte de renda também é comum entre as mães (47%), que são frequentemente costureiras, domésticas e agricultoras. O emprego em órgãos públicos, essencialmente municipais, surgiu em segundo lugar, sendo responsável pela fonte de renda de 17% das mães e 7% dos pais. Por outro lado, microempresas privadas

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0 10 20 30 40 0 5 10 15 20 25 N úmero abso luto Idade

Sexo feminino Sexo masculino

demonstraram relevância para o emprego dos pais (8%). Um percentual elevado (30%) das mães não possui emprego algum e apenas executam tarefas domésticas em seu próprio lar. O benefício da aposentadoria esteve presente como única fonte de renda em 2% dos pais e 4% das mães, estes em verdade eram os avós dos entrevistados, que em virtude de diversos motivos tornaram-se responsáveis pelos netos. Percebe-se então que existe uma tendência para o trabalho autônomo dos pais e, as mães, quando empregadas, exercem suas atividades nos órgãos públicos municipais.

Figura 4 – Distribuição do número de entrevistados pela idade correspondente em ambos os sexos.

Tanto pais quanto mães possuem, em geral, baixa escolaridade, sendo mais acentuada nos primeiros, dentre os quais 10% nunca frequentaram a escola. As mães com ensino médio completo (9%), por outro lado, foram relativamente representativas. Contudo, o ensino fundamental incompleto prevaleceu na escolaridade dos pais (40%) e mães (47%). Também houve casos de ensino superior completo em 1% das mães. Barbosa, Nobrega e Alves (2010) em seu estudo sobre caçadores de aves na Paraíba, também verificou que a maioria dos entrevistados apresenta baixa escolaridade, com destaque para o ensino fundamental incompleto.

Geralmente os responsáveis pelos estudantes possuem apenas uma fonte de renda (68% dos pais e 55% das mães), evidenciando-se também um

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0% 10% 20% 30% 40% 50% R$80 a R$200 R$201 a R$545 acima de R$545 Q uan tida de de f amília s Faixas de renda

Possuem e/ou capturam Não possuem e/ou não capturam

elevado nível de desemprego entre as mães (38%) quando comparado aos pais (3%).

Dos 231 questionários obtidos, apenas 83 registraram valores de renda mensal. Destes, 21 (25,3%) se inserem na faixa A, que corresponde a renda de R$80 a R$200, 38 (45,8%) na faixa B de R$201 a R$545 e 24 (28,9%) na faixa C, possuindo renda superior a R$545. Isto se aproxima do observado por Barbosa, Nobrega e Alves (2010), que diagnosticou a renda de um salário mínimo como a mais comum para entrevistados do semiárido paraibano. Alves et al., (2009) também observou valores similares de renda mensal, bem como de níveis de escolaridade.

Na primeira faixa, 21,7% dos entrevistados faz uso de animais silvestres, em contrapartida outros 3,6% declararam não capturar/adquirir estes animais ou ocultaram. Na faixa B, 37,3% afirmaram possuir estes animais em domicílio ou utilizá-los, já 8,4% não possuíam. Na faixa C, 8,4% assegurou não utilizar animais silvestres para nenhum fim, já 20,5% afirmaram fazer uso da fauna (Figura 5). Embora o uso de animais silvestres não difira de modo significante entre as faixas de renda (Coef. de contingência C=0.1419, p=0.4262), observamos uma tendência de maior uso por famílias com renda intermediária, seguida por famílias que se inserem nas faixas A e C, proporcionalmente semelhantes.

Figura 5 – Relação entre as porcentagens de famílias que possuem ou capturam animais silvestres e das que não possuem ou não capturam por faixa de renda.

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0 500 1000 1500 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 R en da men sa l

Qtde. animais utilizados

Faixa A Faixa B Faixa C

Tratando das espécies usadas pelas três faixas de renda, observa-se que não existe uma correlação significativa entre as categorias, quantidade de espécies e renda mensal (Coef. Spearman=-0.0577, p=0.6452). Entre quantidade de animais utilizados e a renda também não acontece correlação (Coef. Spearman=-0.0161, p=0.8988). No entanto, é perceptível que existe variabilidade entre as faixas de quantidade de animais que são utilizados por cada faixa de renda, em especial entre a C e as demais. Em suma, famílias que possuem menor renda e renda intermediária apresentam uma faixa mais extensa de quantidade de animais capturados, respectivamente de 1 a 17 e de 1 a 16. Por outro lado, as famílias com renda maior revelam uma faixa mais estreita, que varia de 3 a 11 animais utilizados. Verifica-se, contudo, que em todas as faixas de renda existe uma predominância para a utilização de cinco indivíduos, porém, em média, esse número se eleva ligeiramente para seis (Figura 6). Desta forma, evidencia-se que além de não haver diferenças entre as faixas de renda quanto a atitude de obtenção dos animais, a quantidade de indivíduos ou espécies utilizadas por elas também não difere de modo expressivo. Alves, Gonçalves e Vieira (2012), de modo similar, não constatam diferenças entre o número de espécies citadas e a renda.

Figura 6 – Relação entre a renda mensal e a quantidade de animais capturados e/ou adquiridos por cada família representada através dos entrevistados.

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0% 5% 10% 15% 20%

Companhia Comércio Troca Alimentação

Q uan tida de de f amília s Categorias de uso R$ 80 a R$ 200 R$ 201 a R$ 545 acima de R$ 545

Dentre os que afirmaram capturar animais silvestres e declararam a renda mensal (66 entrevistados), observou-se que a faixa de renda intermediária é a responsável pelos maiores índices de uso em todas as categorias (companhia, comércio, troca e alimentação), sendo seguida pelas famílias com maior renda (acima de R$545), exceto na categoria “companhia”, na qual a faixa A (R$80 – R$200) foi um pouco mais expressiva que a faixa C (Figura 7).

Figura 7 – Representação das três faixas de renda em cada categoria de uso (Companhia, comércio, troca e alimentação).

Costa-Neto (2000) suscita que o consumo de animais silvestres é importante para a nutrição dos moradores destas comunidades interioranas, e isso seria determinado pelos seus poucos recursos econômicos e a consequente falta de condições financeiras para a compra de carne vermelha oriunda de criações domésticas. De forma análoga, Nobrega, Barbosa e Alves (2009a) afirmam que a captura e venda de animais silvestres surge como uma alternativa de sobrevivência da população rural possuidora de uma situação socioeconômica não favorável. Porém, verificamos que a quantidade de animais ou espécies caçadas independe da faixa de renda, além disso, o uso pelas famílias de pouca renda é ligeiramente direcionado para a companhia quando comparado à alimentação. De modo oposto, a faixa B (R$201 a R$545) é a que possui um percentual mais elevado para estas e

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0 20 40 60 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 N úme ro de f amíl ias Número de membros

Utilizam animais silvestres Não utilizam animais silvestres

demais formas de uso, com destaque para a criação em domicílio (companhia). Em geral, a finalidade de companhia obteve o maior destaque entre todas as faixas de renda, representando 41% das categorias de uso abordadas. Já o comércio representou 16%, a ação de troca 9% e o consumo (alimentação) 34%.

Considerando todos os 231 questionários observa-se que a maioria das pessoas comumente faz uso de animais silvestres, representado 80% do total, em detrimento de 20% que declararam nunca terem feito uso. Dentre os primeiros, verificamos que a quantidade de membros da família residentes em um mesmo lar varia de 2 a 12 pessoas (Figura 8), tendo uma maior frequência para famílias com cinco membros (28,6%). Resultado similar foi encontrado por Barbosa, Nobrega e Alves (2010), que em seu trabalho apresentou a constância de um número de quatro indivíduos por residência.

Figura 8 – Distribuição do número absoluto de famílias que utilizam animais silvestres e das que não utilizam, de acordo com o número de membros que as compõe.

Os resultados apontam que famílias com menor número de membros tendem a capturar mais animais que famílias que sejam compostas por mais de sete membros. Existe então uma correlação entre as variáveis ‘número de membros’ e ‘quantidade de animais utilizados’, sendo o teste estatisticamente significativo (Coef. Spearman=0.1859, p=0.0114) (Figura 9).

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0 4 8 12 16 20 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Q td e. an imais utiliz ad o s Número de membros

Porém, talvez isso tenha sido influenciado pela pequena amostra de famílias que são compostas por mais de 10 membros.

Figura 9 – Relação da composição de membros das famílias e quantidade de animais utilizados por elas.

Dessa forma, a quantidade de animais capturados por cada família está relacionada com o número de membros que as compõe. Segundo Barbosa, Nobrega e Alves (2010) esta prática surgem da necessidade de acrescentar na alimentação e na renda das famílias que possuem uma quantidade relativamente alta de membros, suprindo assim suas necessidades básicas. Entretanto verificamos que, de modo geral, há um decréscimo na quantidade de animais capturados quando o número de membros aumenta.

Em geral, os mais envolvidos com a captura são familiares muito próximos, tais como o pai (25,6%) e o tio (14%), seguido do irmão (9,1%), do avô (7,9%) e do primo (6,4%). Observamos também participação significativa do próprio entrevistado, o que representou 18,7%. Coincidentemente, em uma das visitas realizadas no município de Cacimba de Areia, no momento de intervalo de aula, várias crianças envolveram-se para a captura de um espécime de Columbina minuta que acabara de ser baleado por um caçador e estava suscetível no solo (Figura 10). Nesta ocasião, um dos entrevistados discorreu sobre o fato com bastante entusiasmo: “Foi eu e os meninos, eu matei [...] Foi porque ‘baliaram’ e ela caiu ali dentro e ‘peguemo’ [...] Ela tava

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correndo e ‘nóis peguemo nas carreira’ [...] Isso se come”. Alves et al. (2009) apoia que estas atividades iniciam-se na infância, geralmente com a utilização de “baladeiras” ou mesmo armadilhas para a captura de aves, as quais são geralmente destinadas para estimação. Os amigos, padrinhos e outras pessoas foram citadas por 7,1% dos estudantes. Os demais declararam não utilizar animais silvestres ou não existir alguém na família que realize a captura destes (11,3%).

Figura 10 – Espécime de Columbina minuta perseguido e morto por crianças durante entrevista realizada em uma escola do município de Cacimba de Areia, na Paraíba. Fonte: Tainá Alves.

A atividade de caça é proibida pelo IBAMA e essa informação é difundida entre as diferentes classes sociais através dos meios de comunicação. Nobrega, Barbosa e Alves (2011) em uma pesquisa no semiárido paraibano constataram que as atividades de caça estão também relacionadas a uma prática de entretenimento e lazer.

Os resultados aqui obtidos, através das análises que envolveram a renda mensal das unidades familiares e a utilização da fauna realizada por elas, indicam que a captura de animais silvestres na área de estudo caracteriza-se como uma atividade que segue mais uma tendência cultural que uma necessidade decorrente da situação econômica. Isto é refletido pelo elevado uso de animais para criação (companhia) e para a alimentação. É exibido então um aparente paradoxo, pois, em geral, acredita-se que o

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consumo de animais silvestres está diretamente relacionado à subsistência, tal como sugere Costa-Neto (2000). No entanto, constatou-se que diversas famílias têm acesso fácil a carne de animais de criação doméstica, tais como caprinos, bovinos, suínos e aves, que, em muitos casos, são inclusive fontes de renda destas próprias famílias. Nesse contexto, a carne de animais silvestres surge como uma iguaria ou um petisco comumente encontrado em bares da região, como enfatizado por Alves, Gonçalves e Vieira (2012) quando discorrem sobre o consumo da caça associado a ocasiões de encontro entre caçadores e amigos. Possivelmente isto justifica o elevado percentual de uso para esta categoria, tratando-se também de uma atitude culturalmente disseminada.

A oralidade atua como um meio importante para este fim e, inclusive, registrou através de canções de grandes compositores e intérpretes da Música Popular Brasileira – tais como Luiz Gonzaga e Sivuca – as atividades de captura e comercialização da fauna silvestre no cotidiano das pessoas, detalhando aspectos do uso de animais e, em alguns casos, refletindo sobre tal. Visando elucidar esta forma de disseminação da cultura, são expostos os seguintes trechos de músicas:

[...] E Zé saiu correndo pra feira dos pássaros e foi pássaro voando pra todo lugar. Tinha uma vendinha no canto da rua, onde o mangaieiro ia se animar. Tomar uma bicada com lambu assado e olhar pra Maria do Joá [...] (OLIVEIRA; GADELHA, 1979)

[...] Tarvez por ignorança ou mardade das pio furaro os óio do assum preto pra ele assim, ai, cantá de mió. Assum preto veve sorto, mas num pode avuá. Mil vez a sina de uma gaiola desde que o céu, ai, pudesse oiá [...] (GONZAGA; TEIXEIRA, 2006) [...] Teve pena da rolinha que o menino matou, mas depois que torrou a bichinha, comeu com farinha... gostou! [...] (ANDRADE, 1999)

Deste modo, o conceito de ‘necessidade’ não deve ser contraposto com o aspecto cultural, mas sim reavaliado tendo em vista a força e rigidez deste último. Assim, é imprescindível que ocorra o balanço entre ambos os eixos deste domínio, de modo a elaborar estratégias de conservação mais eficazes

Referências

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