Identificação do Coeficiente de Elasticidade de Dispositivos
MEMS utilizando Modelo ARX e Estimador Recursivo de
Mínimos Quadrados
Manuel M. P. Reimbold
1Gideon V. Leandro
1Wang Chong
11Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - Departamento de Tecnologia
98700-000, Ijuí, RS
E-mail: {gede, manolo, wang}@unijui.edu.br
Renato P. Ribas
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Instituto de Informática 91501-970, Campus do Vale, Porto Alegre, RS
E-mail: rpribas@inf.ufrgs.br
Resumo:
O presente trabalho aborda, via estimação de parâmetros, a obtenção do valor do coeficiente de elasticidade de dispositivos MEMS. O coeficiente de elasticidade é obtido utilizando-se um modelo discreto ARX, e a técnica dos mínimos quadrados recursivos para a estimação de parâmetros. Os dados de entrada e saída, v(k) e x(k) respectivamente, utilizados na estimação de parâmetros, são coletados através do dispositivo virtual implementado, por Tang, com o simulador ANSYS (Analysis Systems). Os resultados obtidos mostram que o valor de elasticidade adotado por Tang e Howe, e o valor estimado estão próximo, evidenciando que a técnica utilizada é uma boa ferramenta para a determinação do coeficiente.Palavras-Chave: MEMS; Comb-drive;
Identificação de Sistemas; ARX; RMQ.1. Introdução
A demanda de MEMS (Micro
Electromechanical Systems) motiva, ao
mesmo tempo, novas aplicações e a investigação de novas técnicas de modelagem matemática, permitindo aprimorar o modelo proposto por William C. Tang e Robert T. Howe, nos anos 80, para dispositivos MEMS baseados em deformação elástica e força eletrostática.
Os MEMS são micro-trandutores que convertem energia elétrica em energia mecânica ou vice-versa. Estes, quando dispostos convenientemente como micro-sensores e micro-atuadores, integram relés, pinças, osciladores, filtros, transformadores,
mixers, giroscópios, acelerômetros, entre
outros [2,7,10,11]. Para sua construção utilizam-se os processos de fabricação da Microeletrônica, possibilitando assim, sua integração com dispositivos eletrônicos num único chip.
O baixo custo dos MEMS é garantido pelas técnicas de processamento em pacote, onde milhões de componentes são fabricados num único wafer. Entretanto, os custos de prototipagem são elevados. Para diminuí-los são utilizadas ferramentas de CAD (Computer
Aided Design). Cada uma delas é um conjunto
organizado de programas computacionais que baseados na modelagem matemática, permitem a simulação e estimação do desempenho comportamental de cada dispositivo a ser construído [8].
A modelagem matemática desse comportamento, envolve o estudo de vários fenômenos físicos como: amortecimento inércia, elasticidade e capacitância. O comportamento é descrito através de equações diferenciais, tanto ODEs (Ordinary
Differential Equations) como PDEs (Partial Differential Equations). Além dessas, circuitos
equivalentes de aproximação são usados. Em outras palavras, as partes mecânicas e elétricas dos transdutores são representadas por componentes elétricos equivalentes [13]. Também se utilizam equações características e condições de contorno [4]. FEA (Finite
Element Analysis) e BEA (Boundary Element Analysis) são métodos convencionais capazes
de realizarem simulações mecânicas e eletrostáticas. São métodos baseados em sistemas matriciais que utilizam malhas de estruturas mecânicas continuas e/ou campos
eletrostáticos, e resolvem o sistema de equações levando em consideração as condições de contorno [5]. Várias ferramentas computacionais comerciais têm sido desenvolvidas sob esses métodos, como: ANSYS, FEMLAB, CAEMEMS, SESES, ABAQUS, CoventorWare, IntelliCAD, SUGAR e SOLIDIS.
O objetivo primordial, tanto da modelagem como da simulação, é desenvolver métodos eficientes que permitam criar macro-modelos ou macro-modelos de ordem reduzida, pois permitem que os projetistas pensem rápido, agilizem os cálculos e insiram os mesmos a nível de sistema. Para isso, o macro-modelo deve ser energeticamente correto, conservador e dissipador quando necessário; possuir dependência das propriedades do material e da geometria do dispositivo. Também deve representar o desempenho estático como dinâmico do dispositivo, tanto para pequenas como grandes amplitudes de excitação. Finalmente o macro-modelo deve concordar com os resultados de simulações, 3D a nível físico, e concordar com os resultados experimentais obtidos das estruturas de teste [9].
Porém, obter os parâmetros característicos do macro-modelo de MEMS é complexo, pois as dimensões geométricas dos mesmos e do ambiente em que operam, são micrométricas. O processo, como exposto anteriormente é caro. E os métodos laboratoriais, utilizados atualmente, são delicados. Tudo isto dificulta a obtenção do perfil comportamental do conjugado força versus deslocamento desses dispositivos.
Consequentemente, o objetivo do presente trabalho investigativo é aplicar a identificação de sistemas de forma a estimar, principalmente, o coeficiente de elasticidade entre os outros parâmetros característicos, pois este é especificamente dimensionado por Willinam C. Tange e Robert T. Howe no seu projeto de MEMS [2].
2. MEMS baseados em comb-drive
e deformação elástica
Estes dispositivos se utilizam da ressonância como princípio de funcionamento, o qual consiste em que a freqüência f0 do sistema oscilador seja igual à freqüência natural fn do sistema vibratório, porém com maior amplitude, de forma a respeitar os
limites das propriedades físicas do sistema vibratório. Quando isto acontece, a freqüência do sistema se denomina de freqüência de ressonância fr. A idéia fundamental é não alterar as propriedades do sistema vibratório, porém faze-lo atingir maiores deslocamentos quando comparados àqueles em seu estado natural.
Para que o movimento ocasionado pela deformação aconteça, uma força de índole eletrostática ou puramente mecânica é aplicada ao dispositivo. Este fato permite explorar o dispositivo como sensor ou atuador. Essas funções necessitam da interação e da integração de dois dispositivos, um móvel ou deformável, o qual é denominado comumente de mola; e outro de índole eletrostática, conhecido por comb-drive. Ambos dispositivos são constituídos basicamente de: vigas; colunas; âncoras ou engastes e massa de “vai e vem”, como se ilustra na figura 1.
Figura 1: MEMS baseado em deformação e
comb-drive.
2.1 Macro-modelo
O modelo matemático clássico que descreve o comportamento destes dispositivos constitui-se de três equações: uma que descreve a parte elétrica, outra o desempenho mecânico, e uma terceira, cuja função é acoplar as duas primeiras. O modelo obtido é
uma ODE de segundo grau, não homogênea, linear e invariante no tempo, como se define na expressão 1.
( )
x(t) Kx( )
t F( )
t dt d D t x dt d M 22 + + = e (1)Onde M é a massa do corpo de “vai e vem” em kg, D é o amortecimento ocasionado pelo meio em Ns/m2, K é a coeficiente de elasticidade em N/m e Fe é a força eletrostática provocada pelo comb-drive e cuja unidade é N/m. Todos esses parâmetros podem ser definidos através dos parâmetros geométricos e dos materiais utilizados no dispositivo.
3. Identificação de Sistemas
De forma geral, há a possibilidade de agrupar as técnicas de modelagem matemática em duas grandes categorias: modelagem pela física do processo e modelagem a partir de testes. Esta última é normalmente conhecida por identificação de sistemas [3].
O problema de identificação de sistemas pode ser dividido em cinco etapas principais: testes dinâmicos e coleta de dados, escolha da representação matemática a ser usada, determinação da estrutura do modelo, estimação de parâmetros e validação do modelo [1,6].
Esse procedimento é válido tanto para sistemas lineares como para sistemas não-lineares, entretanto, o dispositivo ensaiado é considerado como sendo um sistema linear.
3.1 Testes dinâmicos e coleta de
dados
A coleta de dados é realizada sobre o MEMS baseado em deformação elástica e atuação eletrostática desenvolvido por Tang. Ele utilizou o aplicativo ANSYS (Analysis
Systems), ferramenta computacional que
permite fazer diferentes tipos de análises: Estática, Modal, Harmônica, Dinâmica de Transitórios, Espectral e Estrutural Não-Linear e é um dos simuladores mais utilizados na indústria e na academia, para implementar virtualmente um MEMS que utiliza comb-drive, porém com um único dedo.
A figura 2 mostra a interação de um dedo, parte fixa (lado esquerdo) e parte móvel (lado direito), cuja geometria obedece a um dedo com comprimento de 100 µm, largura igual a 10 µm e espaçamento entre dedos
vizinhos, ou gap, igual a 5 µm. O material utilizado na implementação é o polisílicio, o qual possui módulo de Young igual a 169 MPa, relação de Poisson 0,25, e densidade específica de 2,33X103 kg/m3. O ambiente em que se encontra inserido é o ar, o qual apresenta permissividade relativa de 1,1, e considera-se a permissividade do vácuo igual a 8,854x10-6 F/m.
Figura 2: Plataforma de ensaios. Os dados discretos de entrada, v(k) ou diferença de potencial elétrico, aplicados ao
comb-drive, variam numa faixa entre 0 e 25
volts, em incrementos de 0,5 volts. Os dados discretos de saída, x(k) ou deslocamento, são medidos e fornecidos pelo ANSYS, e comparados com o valor fornecido pela expressão 2, como mostra a figura 3.
Figura 3: Deslocamento analítico versus deslocamento medido pelo ANSYS.
( )
x g V ∆ t ε N K 2 ar = (2)Sendo que, N é o número de dedos, neste caso é 1, εar a permissividade do ar, ∆V a diferença de potencial entre os dedos, t espessura do dedo, g a distância entre as placas, e x o deslocamento do dedo móvel.
A fim de que o sinal amostrado retenha algumas das características fundamentais do sinal original, é necessário que o tempo de amostragem seja suficientemente curto. Segundo o teorema de Shannon, a freqüência de amostragem no decorrer desta investigação é 0,1 Hz, a qual é obtida a partir da expressão 3.
s a 2f
f ≥ (3)
Onde fa é a freqüência de amostragem e fs é a freqüência do sinal a ser amostrado.
3.2 Representação matemática
A construção de modelos dinâmicos de sistemas baseando-se em observações (i.e., medições) do processo é chamada de identificação de sistemas. Essencialmente, trata-se de selecionar uma estrutura de modelo e ajustar parâmetros desta estrutura até que as saídas calculadas pelo modelo coincidam com as saídas medidas do processo, quando o sistema e o seu modelo estão alimentados com as mesmas condições.
Para a realização deste estudo, o dispositivo MEMS é considerado como sendo um sistema linear. A identificação de sistemas para sistemas lineares dispõe dos modelos: ARX (autoregressive with exogenous inputs), ARMAX (autoregressive moveing average
inputs), ARMA (autoregressive moveing average without exogenous inputs), modelo de
erro na saída e modelo de Box-Jenkins.
A representação matemática a ser usada é o modelo ARX. Este permite calcular a saída x(t), ignorando as perturbações, e conhecendo as entradas presentes e passadas, e as saídas passadas.
3.3 Determinação da estrutura
Esta etapa se resume a escolher a ordem do modelo. Segundo a literatura técnica a determinação de ordem de um modelo linear é menos complexa. Num primeiro instante a ordem escolhida é a ordem do sistema
apresentado por William Tang na expressão 1, ou seja, o modelo é de segunda ordem. Com isto consegue-se a representação discreta final do sistema, a qual é expressa na equação (4).
(
k 1)
x(
k 2)
v(
k 1)
x ) k ( x =−α − −β − +γ − (4)Sendo que x(k) e v(k) representam, respectivamente, os dados de saída (deslocamento) e entrada (diferença de potencial) nos instantes k. α, β e γ são os parâmetros do sistema discreto a serem estimados posteriormente, o que permite deduzir a expressão 5.
(
) (
) (
)
[
]
γ β α − + − − − − = xk 1 x k 2 v k 1 ) k ( x (5)3.4 Estimação de parâmetros
Tendo disponibilizado os dados em forma seqüencial, pois a medição obtida pelo ANSYS correspondeu ao instante de aplicação da entrada, os parâmetros α, β e γ são obtidos utilizando-se o procedimento conhecido como estimação recursiva.
Assim para uma atualização recursiva a expressão pode ser re-escrita na forma 6.
θ ϕ = T ) k ( x (6)
Algoritmos desenvolvidos para esse fim são denominados de algoritmos recursivos. Na expressão 7 que segue, os subíndices indicam as iterações do algoritmo recursivo.
(
)
k ^ T k k 1 ) k ( x =ϕ − θ (7)Como se deseja estimar
^
θ de forma
recursiva, pois é nele que estão os parâmetros do sistema, utiliza-se o estimador recursivo dos mínimos quadrados RMQ conforme as expressões 8, 9 e 10.
( )
θ ϕ − + θ = θ − k−1 ^ T k k 1 k ^ k ^ k x K (8) 1 P P K k 1 k T k k 1 k k + ϕ ϕ ϕ = − − (9)1 k T k k 1 k k P K P P = − − ϕ − (10)
4. Resultados
A aplicação discreta da diferença de potencial, v(k), variando numa faixa entre 0 e 25 volts, com incrementos de 0,5 volts, aplicados à plataforma de ensaio desenvolvida em ANSYS, apresenta convergência para medir deslocamentos, x(t), a partir de 1,5 volts. Consequentemente, duas situações se apresentam; considerar as leituras obtidas igual a zero para valores menores que 1.5 volts e não considera-las como dados. No primeiro caso, o valor médio para o coeficiente de elasticidade é igual a 2.67x10-4 N/m, sendo que o valor obtido através do estimador recursivo dos mínimos quadrados é 2.387x10-4 N/m. No segundo caso, considerando menos amostras, o valor médio do coeficiente de elasticidade é 2.836x10-4 N/m, sendo que o valor obtido pelo estimador é 2.347x10-4 N/m. Logo, os valores obtidos pelo estimador recursivo dos mínimos quadrados quando comparados ao valor de 2.833x10-4 N/m, adotado por W. Tang e R. Howe para a elasticidade do MEMS, mostram-se bem próximos, gerando um erro de aproximadamente de 18%, o qual pode ser melhorado aumentando o número de amostras. Os resultados obtidos evidenciam que a técnica utilizada é uma ferramenta recomendável para a determinação do coeficiente de elasticidade. Esse resultado motiva a utilização do estimador recursivo de mínimos quadrados para obter, num próximo trabalho, a massa e o coeficiente de amortecimento e validar o modelo, verificando se o mesmo incorpora as características do sistema real.
Referências
[1] L. A. Aguirre, Identificação de sistemas não-lineares utilizando modelos NARMAX – Uma revisão e novos resultados, SBA Controle e Automação, vol. 9, no. 2, pp. 90-106, (1998).
[2] P. Bruschi, A method for cross-sensitivity and pull-in voltage measurement of MEMS two-axis accelerometers, Sensors and Actuators A, 123-124, pp. 184, (2005).
[3] M. V. Correa, Identificação caixa cinza de sistemas não-lineares utilizando representações NARMAX racionais e polinomias, UFMG, (2001).
[4] E. S. Hung, Generating Efficient dynamical models for microelectro-mechanical systems from few finite-element simulations run, IEEE Journal of Microelectromechanical Systems, vol. 8, pp. 280-289, (1999).
[5] R. M. Lin, Structural dynamics of microsystems-current state of research and future directions, Mechanical Systems and Signal Porcessing, vol. 20, pp. 1015-1043, (2006).
[6] L. Ljung, “Systems Identification. Theory for the user”, Prentice Hall, London, 1999.
[7] R. S. Muller, MEMS: Quo vadis in century XXI? Microelectronics Engineering, vol. 53, pp.47, (2000).
[8] S. D. Senturia, CAD for micro-electromechanical systems. The 8th International Conference on Solid State Sensors and Actuators, and Eurosensors IX, Stockholm, Sweden, 1995.
[9] S. D. Senturia, CAD challenges for microsensors, microactuators, and microsystems, Porceedings of the IEEE, vol. 86, No. 8, 1998.
[10] S. D. Senturia, Perspectives on MEMS, past and future: the tortuous pathway from beight ideas to real products, Transducers’03, The 12th International Conference on Solid State Sensors, Actuators and Microsystems, pp. 10, (2003).
[11] S. Sung, Development and test of MEMS accelerometer with self-sustained oscillation loop. Sensors and Actuators A, 109, pp.1, (2003).
[12] W. C. Tang, Eletrostatic comb-drive of lateral polysilicon resonators, Sensors and Actuators A, 21-23, pp.328-331, (1990).
[13] H. A. C. Tilmans, Equivalent circuit representation of electromechanical transducers: I. Lumped-parameter systems, Journal Micromechanical Micro engineering, Vol. 6, pp. 157-176, (1996).