• Nenhum resultado encontrado

Alienação fiduciária de bens imóveis na legislação brasileira

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Alienação fiduciária de bens imóveis na legislação brasileira"

Copied!
38
0
0

Texto

(1)

RICARDO LORENZON GONZATTO

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BENS IMÓVEIS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Ijuí (RS) 2016

(2)

RICARDO LORENZON GONZATTO

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BENS IMÓVEIS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: MSc. Fabiana Fachinetto

Ijuí (RS) 2016

(3)

Dedico este trabalho à minha família, meu pai minha mãe pelo incentivo e apoio, à minha irmã que sempre acreditou em mim, e a minha noiva Ivana pela nossa trajetória na faculdade, e sempre me dando força, em fim, agradeço a todos pela confiança em mim depositado durante toda a minha jornada.

(4)

AGRADECIMENTOS

A Deus acima de tudo, pela vida, força e coragem, a minha família, que sempre esteve presente e me incentivou com apoio e confiança nas batalhas da vida e com quem aprendi que os desafios são as molas propulsoras para a evolução e o desenvolvimento.

À minha orientadora Fabiana

Fachinetto, com quem tive o privilégio de

contar com sua dedicação e

disponibilidade, me guiando sempre pelo caminho certo.

(5)

“A justiça é o direito do mais fraco.” Joseph Joubert

(6)

RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise sobre a alienação fiduciária de bens imóveis, vinculada como garantia nos financiamentos imobiliários. Primeiramente analisam-se os aspectos históricos e conceituais da instituição da alienação fiduciária, para em seguida estudar-se os requisitos para obtenção do crédito a partir dos critérios traçados na Lei n° 9.514/97. Em seguida aborda-se a questão do cumprimento do contrato de financiamento com a consequente extinção da alienação fiduciária, e, ainda, como se dá a execução da garantia fiduciária no caso de inadimplemento contratual.

Palavras-chave: Alienação fiduciária. Garantia de bem imóvel. Direito real. Execução extrajudicial.

(7)

ABSTRACT

The present work of conclusion of course makes an analysis on the fiduciary alienation of real estate, bound as collateral in real estate financing. Firstly, the historical and conceptual aspects of the fiduciary alienation institution are analyzed, and then the requirements for obtaining credit based on the criteria outlined in Law 9,514 / 97 are studied. Next, the issue of compliance with the financing agreement is discussed, with the consequent extinction of the fiduciary alienation, and also how the execution of the fiduciary guarantee in the case of contractual default.

(8)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8 1 ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEIS ... 10 1.1 Evolução histórica da alienação fiduciária em garantia ... 10 1.2 Dos direitos reais tradicionais de garantia à alienação fiduciária de imó- veis ... 10 1.3 Conceito de alienação fiduciária e suas características... 17 1.4 Direitos e obrigações do fiduciante e do fiduciário ... 20 2 DO PAGAMENTO AO INADIMPLEMENTO CONTRATUAL E A EXECUÇÃO DA GARANTIA FIDUCIÁRIA ... 24 2.1 O pagamento, o termo de quitação do débito e a extinção da propriedade resolúvel... 24 2.2 O inadimplemento e as consequências do inadimplemento ... 26 2.3 Questionamento quanto à inconstitucionalidade da execução extrajudicial da garantia fiduciária ... 30 2.4 Posição dos tribunais a respeito da constitucionalidade da execução extrajudicial ... 31 CONCLUSÃO ... 34 REFERÊNCIAS ... 36

(9)

INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo acerca da alienação fiduciária de bens imóveis na legislação brasileira, tendo como objetivos estudar os requisitos para a obtenção do crédito através da alienação fiduciária, verificar o que estabelece a Lei n° 9.514/97 para fins de instituição do imóvel como garantia real, bem como analisar como se dá a execução extrajudicial.

O instituto da alienação fiduciária é de grande importância na atualidade, tendo em vista que, para a concessão de crédito, especialmente no crédito imobiliário, a garantia fiduciária é utilizada na maioria dos contratos de financiamento. Neste contexto, o problema deste trabalho é estudar no que consiste a alienação fiduciária de bens imóveis, quais os requisitos para sua instituição, quais as implicações daí decorrentes ao devedor, em especial no caso de inadimplemento.

A instituição da alienação fiduciária é regulamentada no Brasil pela Lei n° 9.514/97, visto ser muito utilizada na concessão do crédito habitacional. Por meio desta garantia real, existe um bem especifico que irá garantir o crédito concedido pelo credor fiduciário, sendo que, na hipótese de inadimplemento, restará ao credor fiduciário reaver o bem que serve de garantia. A referida lei estabelece o procedimento legal a ser seguido pelo credor fiduciário, tendo os nossos tribunais se manifestado reiteradas vezes sobre a constitucionalidade do procedimento ali estabelecido.

O trabalho foi divido em dois capítulos, sendo que no primeiro capítulo aborda-se aspectos históricos e conceituais da alienação fiduciária de imóveis, e, no

(10)

segundo capítulo, a questão do pagamento ao inadimplemento contratual e a execução da garantia fiduciária.

Ao longo do primeiro capítulo faz-se um estudo voltado à evolução histórica da alienação fiduciária em garantia, inclusive no que se refere à evolução dos direitos reais e tradicionais de garantia até chegar na alienação fiduciária. Também analisam-se os conceitos sobre este instituto trazidos pela doutrina, assim com suas características e os direitos e obrigações do fiduciante e do fiduciário.

O segundo capítulo dedica-se ao estudo do adimplemento e do inadimplemento e suas consequências jurídicas. Havendo cumprimento do contrato de financiamento, analisam-se os requisitos do termo de quitação e a extinção da propriedade resolúvel; e, no caso de inadimplemento, as consequências daí advindas, inclusive o questionamento por parte da doutrinária a respeito da inconstitucionalidade da execução extrajudicial, e, por fim, o entendimento prevalente nos tribunais pátrios no sentido da constitucionalidade deste procedimento.

(11)

1 ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEIS

De forma sucinta, o instituto da alienação fiduciária representa a transferência da posse de um bem móvel ou imóvel de um devedor para um credor, com a finalidade de garantir o cumprimento de uma obrigação. Existem, contudo, especificidades e certa controvérsia acerca da origem da alienação, e longo foi o trajeto entre os direitos reais tradicionais de garantia à alienação fiduciária de imóveis. Essas e outras questões, inclusive os direitos e obrigações do fiduciante e do fiduciário, são objeto deste capítulo.

1.1 Evolução histórica da alienação fiduciária em garantia

Ao buscar na história o nascedouro da alienação fiduciária, percebe-se a ausência de consenso entre os estudiosos em torno da origem e constituição do instituto. Nas palavras de Saad (2001, p. 44), é significativa a “controvérsia na nossa doutrina acerca da indicação de qual instituto de direito haveria aflorado a alienação fiduciária em garantia.”

Nesse sentido, para alguns autores a alienação fiduciária provém do direito romano; para outros advém do negócio fiduciário germânico; e há ainda quem visualize a origem no direito anglo-americano, em figuras como o trust receipt ou ainda na mortgage. Como salienta Roque (2010, p. 118), ainda que notadamente uma figura inovadora representa a alienação fiduciária em garantia no direito pátrio (ela só existe no Brasil e tem tido ampla aplicabilidade), é imperioso reconhecer “[...] muitos antecedentes, com ideias formuladas pelos séculos anteriores ao atual direito brasileiro, começando naturalmente na antiga Roma”. Nessa linha de pensamento, esclarece Negratto (2010, p. 3) que, embora os romanistas,

[...] não tenham conseguido precisar com exatidão o momento do surgimento da fidúcia no direito romano, atribui-se a sua origem à Lei das XII Tábuas (450 a.C.), mais especificamente a preceito contido na Tábua VI que concedia força de lei aos acordos firmados entre as partes. Nesse momento, no entanto, inexistia sanção para o caso de descumprimento da obrigação, que tinha suas bases em valores morais como a lealdade e a confiança.

(12)

O instituto da fidúcia, no legado romano, nesse sentido, abre o corolário da investigação (que no direito pátrio é denominado negócio fiduciário). Tratava, em linhas gerais, de uma modalidade fictícia de venda simulada, mas despida de má-fé ou qualquer figura delituosa, de maneira que o proprietário de dados bens, “[...] temendo alguma agressão contra eles, procura se resguardar, transferindo os bens à pessoa de sua confiança, com o compromisso do comprador em devolver esses bens” (ROQUE, 2010, p. 118). A fidúcia dividia-se em distintas espécies, sendo duas as mais conhecidas – a fiducia cum amico e a fiducia cum creditore, com finalidades bem diferenciadas. A fiducia cum amico visava, nas palavras de Saad (2001, p. 50), à transmissão da coisa a um amigo, para que, através dele,

[...] se guardassem seguramente os bens do transmitente contra diversos tipos de ataque ao seu patrimônio. Portanto, [...] objetivava fins políticos e jurídicos, pois poderia servir para elidir as proibições legais ou suprir a sua deficiência, através dos préstimos de um amigo.

Já a fiducia cum creditore tinha por intuito dar ao credor a coisa em garantia de um débito (como atualmente garantem o penhor, a hipoteca e a alienação fiduciária), representando, assim, a fidúcia uma garantia segura. Nas palavras de Saad (2001, p. 51), na medida em que implicava na

[...] transferência do bem para o fiduciário, através da mancipatio ou pela in iure cessio. [...] obrigava-se o credor-fiduciário, em uma fiducia cum creditore e através do pactum fiduciae, a remancipar, uma vez paga a obrigação do devedor-fiduciante.

Em outras palavras, a diferença principal com a modalidade cum amico é que na fiducia cum creditore o vendedor transferia bens a terceiros com “escopo de garantia”, ou, nas palavras de Roque (2010, p. 118), com “finalidade assecuratória”:

O vendedor assumiu com outra pessoa uma dívida para pagamento num determinado dia; para garantir esse pagamento, o devedor transferia uma coisa ao credor, mas este ficará obrigado a retransferir essa coisa ao vendedor no momento em que pagar a dívida. Podemos ver nessa operação o retrato da nossa AFG.

Interessante, contudo, pontuar algumas considerações de Saad (2001, p. 52-53), segundo o qual a transferência da propriedade não implicava em transmissão da posse, pelo que poderia,

(13)

[...] muitas vezes e por diversas formas, o fiduciante manter-se na posse e até readquirir a propriedade pelo uso de um instituto similar ao usucapião denominado de usureceptio fudiciae.

[...].

Destacavam-se, também, como importante efeito nascido das características da fiducia cum creditore, as ações que eram postas à disposição do credor-fiduciário, dentre elas a reivindicatória que poderia ser exercida contra terceiros e até mesmo contra o fiduciante que eventualmente tivesse sido mantido na posse. O declínio da fiducia acelerou-se ao mesmo tempo em que o penhor e a hipoteca foram surgindo no direito romano, com objetivo de abrandar exatamente os inconvenientes da fiducia cum creditore que despojava o devedor de seu bem, apesar de ser, o desaparecimento da fidúcia, atribuído ao desuso da mancipatio e da in iure cessio. Com efeito, impende registrar que, a despeito do seu desaparecimento por um bom período, a fidúcia romana serviu de fonte inspiradora para um dos colaboradores do anteprojeto de lei que deu origem, no nosso ordenamento, à alienação fiduciária em garantia.

Importante igualmente salientar a perspectiva germânica. Nesse sentido, os estudos de Negratto (2010) trazem importantes considerações acerca da distinção entre o instituto germânico e o romano. As principais diferenças, segundo o autor, entre a fidúcia romana e a do antigo direito germânico residem na consequência de cada qual:

[...] uma vez que nesta o bem era dado em garantia sob condição resolutiva que, cumprida, determinava o retorno da propriedade ao antigo proprietário, enquanto que no direito romano o poder jurídico conferido ao fiduciário era ilimitado, embora se comprometesse a restituir a coisa transmitida tão logo fosse implementada a obrigação do devedor. (NEGRATTO, 2010, p. 10-11).

Nas palavras de Roque (2010, p. 119), a inovação trazida pelo direito germânico foi de limitar o poder jurídico do fiduciário pelo caráter resolutório da propriedade, de modo a possibilitar ao fiduciante seu direito de propriedade sobre o bem alienado, de modo que, se na fidúcia romana a alienação era incondicional, com a obrigação pessoal de restituir a coisa, ao ser extinta a dívida, na perspectiva germânica, “[...] a coisa era transmitida sob condição resolutiva do pagamento da dívida. Tão logo a dívida fosse paga, a propriedade voltava ao domínio do alienante, como efeito da condição resolutiva”. O autor enfatiza ainda outra conquista do direito germânico – a aplicabilidade do direito de sequela, com o sentido de “continuação”. Já a fidúcia inglesa teve especificidades. Introduziram um instituto denominado trust

receipt, pelo qual o bem alienado é transferido só com finalidade de garantia – não é

(14)

esse instituto representava a continuidade da fidúcia romana, mas minorava os efeitos nocivos ao fiduciante.

Talvez sob a inspiração do direito germânico, restringiu ainda os poderes amplos do fiduciário: os bens alienados fiduciariamente não são transferidos da posse e propriedade para se integrarem no patrimônio ativo do fiduciário. Os bens ficam apenas afetados pela restrição quanto à livre disposição do fiduciário, que deles não pode dispor; ficam apenas afetos a ele para garantia de seu crédito. (ROQUE, 2010, p. 120).

Nessa modalidade, esclarece Saad (2001, p. 58), forma-se uma relação jurídica a partir do instante em que o financiador “[...] recebe do vendedor um bem e o entrega ao financiado-comprador, que, por sua vez, emite recibo (trust receipt) onde infirma ser possuidor da coisa em nome do financiador e que irá aliená-la posteriormente para pagamento.”

A partir do momento em que se dava a satisfação do crédito, cessava qualquer vínculo dos bens com o fiduciário, retornando a posse e propriedade plena para o fuduciante, de modo que, nas explicações de Roque (2010, p. 120), “[...] se este não pagasse, surgiriam os direitos do fiduciário sobre a posse e a propriedade, que lhe serão transferidos”. Salienta ainda o autor que o direito inglês já tinha um instituto chamado mortgage, que influenciou a fidúcia inglesa e também o direito germânico, introduzindo outra vantagem ao fiduciante:

[...] a possibilidade de pagar a dívida num prazo determinado, mesmo depois de vencido o prazo para o pagamento. É a cláusula de equity of redemption. Por outro lado, o credor poderia no processo propor um prazo, findo o qual ficava autorizado judicialmente a vender o bem, caso o fiduciante não a pagasse. Essa cláusula foi incorporada definitivamente na fidúcia inglesa e está na nossa legislação com a possibilidade de o fiduciante purgar a mora. (ROQUE, 2010, p. 121).

Ao falar sobre o negócio fiduciário no direito moderno, a maior parte dos autores apresenta uma perspectiva comparada para trazer inclusive a temática da alienação ao encontro do direito pátrio. Acredita-se que a introdução da alienação fiduciária o Brasil tenha se dado em grande medida pelas sementes do direito anglo e germânico. Fato maior é que seu nascedouro está intimamente ligada ao “crédito”, à evolução deste outro instituto. Como leciona Roque (2010, p. 121, grifo do autor),

(15)

Os direitos creditórios foram regulados na antiga Roma, mas, com o desenvolvimento do crédito os romanos sentiram a necessidade da sua proteção e valorização, surgindo, em consequência, as garantias. A princípio foram apresentados o penhor, a hipoteca e a anticrese. Com o tempo, foram ampliados os direitos reais, o jus in re aliena (direitos sobre coisas alheias), estendendo-se as garantias ao crédito.

No Brasil surgiu a alienação fiduciária em garantia como uma nova espécie de garantia real, com o dever de dar mais segurança e valor ao crédito. Nas palavras de Roque (2010), esse instituto, que já tem mais de meio século de aplicação no solo pátrio, não mais pode ser visto como uma inovação. Foi introduzida pela Lei nº 4.728/65 que disciplinou o mercado de capitais.

Primeiro foi aplicada somente a bens móveis. Em 1969, do Decreto-lei 911/69 reformulou esta lei de tal maneira que poderia considerá-la revogada. Vários anos depois, a Lei 4.728/65 foi expressamente revogada. Ainda em 1969 o Decreto-lei 423/69 estendeu a aplicação da AFG à cédula de crédito industrial, que ele criou. Seguiram-se outros tipos de cédulas, todas com AFG. O grande passo foi dado em 1997, com a inclusão de imóveis na AFG. Essa inclusão se deu com a Lei 9.514/97, representando significativa revolução no campo das garantias reais. (ROQUE, 2010, p. 122).

Na pesquisa, merece maior detalhamento o caminho percorrido entre os direitos reais tradicionais de garantia à alienação fiduciária de imóveis, que será objeto do item seguinte.

1.2 Dos direitos reais tradicionais de garantia à alienação fiduciária de imóveis

O caminho que trouxe os direitos reais “tradicionais” de garantia à alienação fiduciária até a perspectiva dos imóveis foi longo, e relativamente recente a incorporação no ordenamento dessa possibilidade. Com relação à garantia imobiliária, a legislação brasileira prevê a hipoteca (prevista nos arts. 1473 a 1501 CC) e a alienação fiduciária de imóveis (Lei n° 9.514/97). Até então a aplicação dessa garantia era estendida somente a bens móveis.

Nas palavras de Roque (2010, p. 157), “não foi lei preparada para esse tipo de garantia, mas para estabelecer o Sistema Financeiro Imobiliário e alargar as formas de financiamento para a aquisição de imóveis”. O art. 22 da Lei n° 9.514/97 contém, no capítulo II, a especificidade “Da Alienação Fiduciária de Coisa Imóvel”, e

(16)

disciplina no art. 22 o que segue: “A alienação fiduciária regulada por essa Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.” (ROQUE, 2010, p. 157).

Convém falar um pouco sobre a hipoteca. Importante frisar que ela foi e segue sendo uma garantia de grande utilidade no ordenamento jurídico pátrio, e o Código Civil de 1916 já fazia previsão da mesma. Ensina Rodrigues (2003, p. 126) que a hipoteca “[...] é o direito real recainte sobre um imóvel, um navio ou um avião, que, embora não entregues ao credor, o asseguram, preferentemente, do cumprimento da obrigação”. Assim, diante do não pagamento da dívida, o credor poderá executar judicialmente o bem dado em garantia, para com o produto apurado em leilão judicial pagar-se, preferencialmente, e com exclusão dos outros credores, que só terão direito a, eventualmente, valores que restarem.

Nesse ponto é importante destacar o motivo pelos quais a hipoteca deixou de representar uma garantia positiva ao “setor imobiliário” e os motivos pelos quais a figura da alienação fiduciária apresenta-se com maior eficácia para este fim. Para tanto, cumpre informar que o déficit imobiliário acompanha a história nacional. Inúmeras políticas e ações governamentais foram criadas ao longo do tempo para reduzir essa carência, a exemplo do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), criado pela Lei n° 4.380/64. Ocorre que a significativa inadimplência dos mutuários, ante as disparadas inflacionárias de outrora que alcançavam esses financiamentos, tornaram vulnerável o SFH e forçou, nas palavras de Restiffe e Restiffe Neto (2009, p. 19), “[...] os credores hipotecários de se valerem massivamente do contencioso de retomada em juízo, entupindo com centenas de milhares de processos o Poder Judiciário, com frustração também para as partes”. Dessa forma, foram múltiplos os motivos que desencadearam a fragilidade da hipoteca como garantia nas transações imobiliárias, evidenciando-se três fatores principais:

(1) Nas execuções concursais (falência e insolvência civil) a ordem de preferência privilegiava outros créditos (trabalhistas e fiscais) em detrimento dos credores com garantia real tradicional, sobre bem do devedor – caso da hipoteca. [...] (2) As execuções individuais extrajudiciais sumárias, pelo rito do Decreto-lei 70, de 21.11.1996, vinham sofrendo restrições pelo Judiciário por fundamento de vício de inconstitucionalidade. [...] (3) nas execuções

(17)

judiciais individuais surgiram inúmeros percalços decorrentes da lentidão do rito processual, agravados por liminares e crescente onda de oposição de embargos de terceiros à penhora, por possuidores de imóveis a título de compromissários com título inscrito (Súmula 621 do STF) e, presente a boa-fé, até não inscrito o título no Registro de Imóveis (Súmula 84 do STJ), anterior ou posterior à hipoteca, na espécie de contratos coligados e interdependentes excepcionada na Súmula 308 do STJ. (RESTIFFE; RESTIFFE NETTO, 2009, p. 21-22).

No Brasil, é facultada às partes optarem quais garantias utilizar, embora comumente o agente financeiro que empresta o dinheiro para a aquisição do imóvel realize a escolha. Nesse caso, quando a opção é do agente financeiro, o intuito é ter a maior segurança na hipotética retomada do bem em caso de inadimplemento, casos em que se percebe a declinação pelo instituto da alienação fiduciária de imóveis, eis que pode ser contratada por pessoa física e pessoa jurídica em qualquer posição de credor ou devedor, conforme disciplina o parágrafo único do art. 22 da lei mencionada: “A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, não sendo privativa de entidades que operam no Sistema de Financiamento Imobiliário.” (BRASIL, 1997).

Cabe ainda ressaltar, que, na hipótese de descumprimento do contrato de alienação fiduciária de imóveis, a sua execução se dá ante Cartório do Registro de Imóveis, ou seja, extrajudicialmente. Já na hipoteca, é obrigatória a execução estritamente pela via judicial que não possui mecanismos para entregar, com maior rapidez, o capital emprestado pelo credor. Ainda, no decorrer da judicialização, na hipoteca o devedor usufrui normalmente do bem, não havendo previsão legal de valor compensatório para o prazo de ocupação após a falta de pagamento do financiamento. Mas na alienação fiduciária de imóveis, o legislador prevê que o devedor deverá pagar ao credor o equivalente a um por cento da avaliação contratual do imóvel, até a desocupação.

Resumidamente, é compreensível o motivo pelos quais a maioria dos contratos de financiamentos imobiliários amoldem-se à garantia via alienação fiduciária, sobretudo diante da oferta de crédito para financiamentos de aquisição de imóveis promovida nas últimas décadas. Nas palavras de Restiffe e Retiffe Neto (2009, p. 26), com o negócio jurídico de coisa imóvel, a Lei n° 9.514/97 almejou criar um novo mecanismo típico de garantia real, a “propriedade fiduciária”, que se

(18)

apresenta como espécie de “[...] ônus dominial em coisa própria do credor (própria, claro, porque alienada a este.”

Salientam ainda os autores a importância da função econômica e social do instituto, capaz de alcançar eficácia e rapidez diante de eventual inadimplência, através da

[...] separação jurídica do objeto fiduciado da universalidade do patrimônio do devedor ou alienante, sem privá-lo do uso normal da coisa, ao afetá-lo ao credor, nem sujeição deste às regras de preferência em eventual execução concursal contra aquele. (RESTIFFE; RETIFFE NETO, 2009, p. 17).

Representa, pois, palpável inovação a fidúcia como instrumento de garantia dos negócios imobiliários, de modo que, o pacto da garantia fiduciária gera um “direito real dominial resolúvel” para o credor, através do registro imobiliário do “contrato de transferência do imóvel vinculada à dívida que lhe deu origem”, e cujo pagamento opera reversão ao alienante, ou, ante inadimplemento possibilita a “consolidação do domínio pleno no fiduciário para fins de excussão satisfativa extrajudicial específica.” (RESTIFFE; RETIFFE NETO, 2009, p. 18).

1.3 Conceito de alienação fiduciária e suas características

Nas palavras de Restiffe e Restiffe Neto (2009, p. 14), a Lei n° 9.514/97 trouxe a figura da alienação fiduciária mais especificamente para dentro do ordenamento jurídico pátrio, estabelecendo a possibilidade para além de utilização desse instituto apenas para bens móveis. A lei mencionada atua em profunda interação e harmonia com os preceitos do Código Civil.

Na lição de Orlando Gomes (apud SAAD, 2001), é possível interpretar que o jurista classificou a alienação fiduciária em garantia como uma das espécies do gênero negócio fiduciário, o que, ao olhar de muitos, não pode ser confundida. Ainda assim, apresenta-se a definição de Orlando Gomes (apud SAAD, 2001, p. 79):

(19)

Em sentido lato, a alienação fiduciária é o negócio jurídico pelo qual uma das partes adquire, em confiança, a propriedade de um bem, obrigando-se à devolvê-la quando se verifique o acontecimento a que se tenha subordinado tal obrigação, ou lhe seja pedida a restituição.

Encontra-se na Lei n° 9.514/97, art. 22, a discriminação do referido instituto:

Art. 22 A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel. (BRASIL, 1997).

Cumpre, pois, trazer o olhar de outros autores sobre o tema, eis que apresentam-se distintas correntes interpretativas, bem como algumas características específicas desse instituto. Nesse sentido, Saad (2001, p. 82) conceitua a alienação fiduciária como,

Contrato de efeitos reais que visa à constituição de direito real acessório de garantia, segundo o qual se transferem ao fiduciário (credor) a propriedade resolúvel e a posse indireta de uma coisa, com a finalidade de assegurar o cumprimento da obrigação principal pelo fiduciante (devedor) que se tornará possuidor indireto do aludido bem.

Ao analisar os fatores sócio-econômicos conducentes à extensão da alienação fiduciária aos bens imóveis, Negratto (2010, p. 46) salienta que o instituto surgiu para solucionar alguns problemas dos direitos reais em garantia tradicionais, servindo, de acordo com Melhim Namem Chalub, de “instrumento que permite a recomposição do capital investido em financiamentos imobiliários, nas hipóteses de mora devedor, em prazos e custos compatíveis com as necessidades da economia moderna”. Representou, portanto, um novo direito real de garantia, com especificidades que lhe são inerentes.

Nessa linha de ideias, Roque (2010) analisa o Decreto n° 911/69 e a Lei n° 9.514/97 e traz as principais características dessa operação creditícia, a começar pela sua natureza contratual – conforme sinalizado pela Lei 9514/97, que explicita ser um “negócio jurídico”:

Essa expressão foi introduzida pelo Código Civil de 2002, substituindo a expressão ato jurídico, que se dividia em dois tipos: unilateral e bilateral. O negócio jurídico substitui a designação de ato jurídico bilateral, um acordo entre partes, uma avença, um acerto, um ajuste entre duas pessoas. Todos

(20)

esses termos são sinônimos de contrato. Além disso, a Lei fala que o fiduciante ‘contrata’, o que significa a existência de um contrato. (ROQUE, 2010, p. 17-18).

Além disso, trata-se de uma “garantia de crédito”, pois tem como escopo alargar a aplicação do crédito. Esse instituto enaltece, igualmente, a figura da propriedade, na “segurança que ela apresenta como a mais eficaz das garantias”, como esclarece Roque (2010, p. 18).

Importante também salientar que essa modalidade de crédito tem forte amparo do Judiciário, sendo possível defender essa garantia com ações que em grande medida reduzem os riscos do contrato. Vê-se, pois, com bons olhos o instituto da alienação fiduciária, sobretudo por ser mais favorável ao credor, uma vez titular do bem imóvel, facilitando os negócios imobiliários como visto no item 1.1 e 1.2 do trabalho e conferindo maior segurança jurídica.

Há, contudo, que se expor que o fiduciário tem, nesse instituto, a “propriedade resolúvel do bem”, outra característica da alienação. Não é, portanto, uma propriedade plena, pois embora detenha a propriedade, não alcança a posse do bem, conforme exposto no art. 22 já mencionado e que se resolve conforme art. 25 da Lei n° 9.514/97:

Art. 25. Com o pagamento da dívida e seus encargos, resolve-se, nos termos deste artigo, a propriedade fiduciária do imóvel.

§ 2º À vista do termo de quitação de que trata o parágrafo anterior, o oficial do competente Registro de Imóveis efetuará o cancelamento do registro da propriedade fiduciária. (BRASIL, 1997).

A esse respeito, salienta Negratto (2010, p. 52) que a propriedade resolúvel e a fiduciária não são sinônimos, mas que a resolúvel representa um elemento característico da propriedade fiduciária, na medida em que, “implementados os requisitos previstos em lei, notadamente o cumprimento da obrigação principal pelo fiduciante, a propriedade limitada transferida ao fiduciário resolver-se-á, retornando, de modo pleno, a seu antigo proprietário.”

(21)

1.4 Direitos e obrigações do fiduciante e do fiduciário

Com relação às partes constitutivas na alienação fiduciária sobre bens imóveis, especificamente, ressalta Saad (2001, p. 142) que denomina-se “fiduciário”, o “credor”, aquele que recebe o bem em garantia; e de “devedor” aquele que dá o bem em garantia, qual seja, o “fiduciante”. Salienta ainda o autor que a análise dos direitos e obrigações de ambas as partes na constituição e execução de uma alienação fiduciária em garantia será feita sob a ótica da autonomia da vontade, e sua eventual limitação pelo ordenamento jurídico.

Como direitos do fiduciante, na esteira do que traz Roque (2010, p. 61-62), pode-se elencar o “direito de propriedade”:

O primeiro direito do fiduciante, previsto na lei e no contrato, é o de obter a propriedade plena do bem objeto da alienação fiduciária em garantia, assim que ele adimplir suas obrigações. O objeto primacial de todas essas operações é a aquisição de um bem – da posse e propriedade desse bem. A alienação fiduciária em garantia visa a facilitar a compra de um bem, assegurando seu aperfeiçoamento definitivo. Por isso, a lei lhe impõe ao fiduciário atender a esse direito do fiduciante e entregar-lhe o termo de quitação da dívida.

Além disso, cabe ao fiduciante o direito de fazer uso do bem e fruir os benefícios dele, seja ele proprietário ou não. Isso representa, nas palavras de Roque (2010, p. 61), “o seu direito de posse direta da coisa, ainda que dependente de condição resolutiva.”

Outro direito do fiduciante é o de não ter prejuízos:

Se houver o inadimplemento de suas obrigações, os pagamentos feitos devem prevalecer. Ele poderá perder o carro, que será vendido em leilão, mas se houver superavit na venda, o saldo será direito seu e lhe será entregue. Tem ele o direito de ser intimado de todas as medidas tomadas contra ele. (ROQUE, 2010, p. 62).

Conforme disciplina o art. 926 do Código de Processo Civil, o possuidor “tem o direito a ser mantido na posse em caso de turbação e reintegração no de esbulho”. A par dessa leitura, é direito – e também obrigação - do fiduciante defender a posse do bem e o livre uso dele. Além disso, na hipótese de vir a ser processado por

(22)

inadimplemento, é direito do fiduciante defender-se, conforme melhor será tratado no capítulo II deste trabalho.

A respeito das obrigações do fiduciante, a principal é o “pagamento da dívida” referente ao financiamento, ao que esclarece Roque (2010, p. 63) que além do principal, responsabiliza-se também pelos acessórios, a exemplo de “impostos e taxas, juros, correção monetária” e, que também integram a dívida o “saldo remanescente, que for observado, caso a venda em leilão da coisa alienada tenha sido por valor inferior ao da dívida, tendo sobrado um resíduo”. Além disso, figura como obrigação do fiduciante a “responsabilidade perante terceiros”, e também assume as obrigações de “depositário” do bem alienado, como explica Roque (2010, p. 63): “como seu direito de propriedade é precário, por ser propriedade resolúvel, ele fica com o bem em suas mãos, com autorização de uso, mas assumindo os riscos; assume as vestes de depositário.”

A “entrega do bem” alienado é, pois, outra obrigação, pois uma vez sofrendo ação de busca e apreensão deverá entregar a coisa ao fiduciário nos termos da sentença judicial, como destaca Roque (2010, p. 64), o fiduciante estava em posse mas essa era “provisória e revogável”. Contudo, em vista do “inadimplemento da dívida garantida pela alienação fiduciária, perdeu o direito de posse, e se retiver a coisa em seu poder estará agindo ilegalmente, por reter uma coisa que não lhe pertence e sobre a qual não mais tem direitos.”

Sobre esse assunto, sintetiza Negratto (2010, p. 59-60) que,

Seus principais deveres [...] consistem no pontual pagamento das prestações devidas ao fiduciário, de tributos e de eventuais contribuições condominiais incidentes sobre o imóvel enquanto ocupá-lo, devendo, equiparado por lei à figura do depositário, cuidar do imóvel como se seu fosse, evitando sua deterioração. Constituído em mora e consolidada a propriedade em nome do fiduciário, deve o fiduciante desocupar o imóvel, sob pena de ser deferida liminarmente reintegração de posse em favor do credor, arcando o devedor com as despesas inerentes à ocupação não autorizada.

Com relação aos direitos e obrigações do fiduciário, pode-se elencar serem direitos do mesmo o “recebimento do crédito”, permitindo-lhe a lei a exigir o pagamento de distintas maneiras. Além disso, conforme previsto no art. 7º da Lei já

(23)

mencionada, caso o fiduciante for empresa mercantil e tiver sua falência decretada, o fiduciário não precisará habilitar seu crédito no processo falimentar, bastando requerer ao Juízo da Falência a restituição da coisa alienada, que tiver sido arrecadada para formar a massa falida.

Detém, ainda, o fiduciário a posse “indireta” do bem, e, caso haja inadimplemento, do fiduciante, o fiduciário pode pleitear a transformação da posse “indireta em direta”, conforme ensina Roque (2010, p. 68). Além disso, cabe ler o teor do Art. 26 da Lei, na qual se abstrai que ao fiduciante cabe o direito de “consolidação do bem“, sendo este,

[...] um direito de o fiduciário considerar-se proprietário pleno da coisa, cessando a propriedade resolúvel, embora reste ao fiduciante o direito de purgar a mora no prazo de cinco dias. O nome dá uma ideia do que seja esse direito: o bem se consolida no patrimônio do fiduciário. Esse direito somente surge se houver o inadimplemento das obrigações do fiduciante. O fiduciário poderá requerer à Justiça a concessão liminar da consolidação, bastando que seja comprovada a mora do fiduciante. (ROQUE, 2010, p. 68). Figura ainda como direito do fiduciário o “autopagamento de seu crédito”, pois uma vez consolidado o bem em seu nome, o fiduciário pode vender o bem, “arrecadando seu valor e apropriando-se dele, para usá-lo no pagamento do débito do fiduciante para com ele” (ROQUE, 2010, p. 68). Pode igualmente o fiduciário “ceder seus direitos creditórios”, retirando-se da relação contratual, conforme disposto nos Art. 28 e 29 da Lei n° 9.514/97. Ainda, a “capacidade processual” é outro direito que assiste ao fiduciário, além de requerer os benefícios do “vencimento antecipado” ante inadimplemente, conforme resguarda o § 2º do Art. 3º da Lei supra.

A despeito do rol de obrigações, estabelece-se, pois, a necessidade de o mesmo “dar a quitação final”, como esclarece Roque (2010, p. 70):

o fiduciário está na obrigação de dar ao fiduciante a quitação final da dívida, liberando a garantia. Deve dar ao fiduciante o documento válido para que este providencie o cancelamento da garantia nos órgãos competentes, como por exemplo, no DETRAN se o bem for veículo automotor ou no Cartório de Registro de Imóveis se for bem imóvel.

Além disso, enquanto o fiduciante for adimplente, o fiduciário deverá respeitar o direito de posse direta deste, não perturbando, nem tentando esbulhar o fiduciante,

(24)

a não ser que tenha amparo legal e avisando o fiduciante das medidas que pretende tomar. Pode igualmente “resistir ao pagamento”, para colocar o devedor em mora, mas está na obrigação do fiduciário “facilitar o pagamento, atendendo com prontidão o fiduciante.” (ROQUE, 2010, p. 70-71).

Salienta-se ainda a necessidade de “constituição legal” do fiduciário para atuar nesta área e que, diante de eventual recebimento de “excessos”, o valor sobressalente deverá ser devolvido ao fiduciante. Roque (2010, p. 71-72) igualmente traz a perspectiva do Registro do contrato como uma obrigação do fiduciário, salientando que o deve fazê-lo caso queira fazer valer “erga omnes, isto é, contra terceiros”. Representa igualmente obrigação do fiduciário intimar o fiduciante a respeito de medidas tomadas contra ele, a exemplo da ação de busca e apreensão, de modo que “se o bem alienado for imóvel, o fiduciário deverá requerer ao Cartório de Registro de Imóveis a intimação. Também no caso de purgação da mora, o fiduciário deverá intimar o fiduciante sobre o prazo.” (ROQUE, 2010, p. 72).

Os principais deveres do fiduciário consistem na entrega ao devedor do termo de quitação para cancelamento da propriedade fiduciária, no prazo de 30 dias a contar da liquidação do débito, sob pensa de pagamento de multa de 0,5% do valor do contrato por mês ou fração, na realização de leilões públicos para a venda do imóvel, na entrego ao fiduciário do valor que sobejar do produto arrecadado com a venda e na entrega de termo de quitação ao devedor nas hipóteses de arrematação do bem e em segundo leilão pelo valor do débito ou de frustração dos leilões, quando a dívida será considerada extinta e a propriedade do credor passará a ser plena. [...] O bem alienado fiduciariamente pode responder por débitos tributários incidentes sobre a propriedade, mesmo que tenha sido ajustada contratualmente a responsabilidade do fiduciante pelo seu pagamento. Isso porque o fiduciário, sendo o proprietário, é o contribuinte do tributo ou o responsável legal pelo seu recolhimento perante o Fisco (CTN, arts. 130 e 131 e Lei n. 8.009/90, art. 3º, IV), podendo, contudo, ser incluído o valor correspondente no cálculo das despesas a serem reembolsadas na excussão do débito em público leilão. (NEGRATTO, 2010, p. 60-61).

Resumidamente, esses são os principais direitos e obrigações que cabem às partes numa relação contratual fiduciária, quais sejam, fiduciante e fiduciário. No próximo capítulo da pesquisa, pretende-se melhor expor sobre o pagamento e inadimplemento em relações desse tipo, apresentando por fim os mais atuais posicionamentos dos tribunais a respeito da temática.

(25)

2 DO PAGAMENTO AO INADIMPLEMENTO CONTRATUAL E A EXECUÇÃO DA GARANTIA FIDUCIÁRIA

Nesse capítulo aborda-se o pagamento até a quitação integral da dívida, com a extinção da propriedade resolúvel, das conseqüências em caso de inadimplemento por parte do devedor fiduciário, os requisitos que estão estabelecidos na Lei n° 9.514/97 em relação à execução extrajudicial da garantia fiduciária, e, por fim, o posicionamento dos tribunais a respeito da execução extrajudicial.

2.1 O pagamento, o termo de quitação do débito e a extinção da propriedade resolúvel

Pelo pagamento é que ocorre a extinção da obrigação assumida pelo devedor. Conforme dispõe o artigo 25 da Lei n° 9.514/97, somente com o pagamento da dívida é que se dá por encerrada a obrigação. Não efetuando o pagamento, podem ocorrer sanções ao fiduciante, conforme vai ser trabalhado no item seguinte.

Com o pagamento da dívida que está vinculada à alienação fiduciária é que o imóvel adquirido e que serviu de garantia de pagamento da obrigação junto ao credor fiduciário dar-se-á por quitado, ou seja, “a prioritária obrigação do fiduciante é a de pagar a dívida referente ao financiamento para a aquisição do bem objeto da alienação fiduciária e seus acessórios.” (ROQUE, 2010, p. 63).

Após o pagamento da dívida, o credor fiduciário tem de fornecer ao devedor fiduciante, no prazo de trinta dias, o termo de sua quitação. Esse então será levado ao Registro de Imóveis competente, para ser realizada a baixa do registro de alienação fiduciária que grava o respectivo imóvel dado em garantia.

Uma vez resgatada a dívida, compete ao fiduciário fornecer ao fiduciante o respectivo termo de quitação, o que faz emergir dúvida em torno do procedimento necessário à extinção da propriedade fiduciária, com a sua respectiva baixa em registro. (SAAD, 2001, p. 198).

Se não for fornecido o termo de quitação no prazo de 30 dias a contar da quitação do débito, fará jus o devedor fiduciante ao recebimento de multa que corresponde 0,5% (meio por cento) do valor da dívida que está estipulada no

(26)

contrato, podendo ainda, ingressar com ação judicial para execução da aludida obrigação de fazer.

Art. 25, § 1º No prazo de trinta dias, a contar da data de liquidação da dívida, o fiduciário fornecerá o respectivo termo de quitação ao fiduciante, sob pena de multa em favor deste, equivalente a meio por cento ao mês, ou fração, sobre o valor do contrato. (BRASIL, 1997).

Com a baixa definitiva do registro de alienação fiduciária, chega ao fim a propriedade resolúvel, e, com isso, torna-se plena propriedade do fiduciante.

Trata-se, por conseguinte, de instrumento capaz de gerar, validamente, a obrigação de transferência do domínio, na medida em que, diante do termo de quitação, a propriedade deixa de ser resolúvel e de pertencer ao fiduciário para se tornar plena e sob o domínio do fiduciante. (SAAD, 2001, p. 198).

Apesar de haver dúvidas quanto ao termo de quitação, entre ele ser particular ou através de escritura pública, o registro de imóveis aceita-o de qualquer maneira. “Art. 251, I - à vista de autorização expressa ou quitação outorgada pelo credor ou seu sucessor, em instrumento público ou particular; [...].” (BRASIL, 1977).

Uma grande parte dos doutrinadores procura a conceituação de uma forma mais direta do que consiste a propriedade resolúvel. Para Gomes (1975, p. 351):

[...] negócio jurídico pelo qual uma das partes adquire, em confiança, a propriedade de um bem, obrigando-se a devolvê-la quando se verifique o acontecimento a que se tenha subordinado tal obrigação, ou lhe seja pedida restituição, isso quer dizer, que com o honrado pagamento se resolve a propriedade resolúvel.

Como se sabe a propriedade resolúvel é quando o devedor transfere de forma indireta a propriedade do bem para o credor, mas ficando com a posse para si, nesse mesmo sentido é o conceito dado por Diniz (2002, p. 356):

A alienação fiduciária em garantia consiste na transferência, feita pelo devedor ao credor, da propriedade resolúvel e da posse indireta de um bem como garantia do seu débito, resolvendo-se o direito do adquirente com o adimplemento da obrigação.

Então, com o pagamento, o devedor fiduciante terá o termo de quitação, e munido deste termo, se chega ao fim da propriedade resolúvel, tornado-se

(27)

propriedade plena sob o domínio do fiduciante. Com o fim da propriedade resolúvel o fiduciante fica livre, para, se quiser vender, ou novamente onerar o bem imóvel.

2.2 O inadimplemento e as consequências do inadimplemento

Desse ponto em diante, destaca-se a eficácia da alienação fiduciária de bens imóveis nos parâmetros em que ela é aplicada, através da Lei n° 9.514/97, como foi visto anteriormente. Além disso, trouxe muito mais vigor e segurança quanto à necessidade de, por parte do credor fiduciário, reaver o crédito concedido quando o devedor fiduciante ficar em inadimplência.

Quanto aos procedimentos por inadimplemento nos contratos de alienação fiduciária de bens imóveis, estão elencados no artigo 26 da Lei n° 9.514/97, o qual prescreve que, uma vez vencida a dívida e não paga, no todo ou em parte, e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.

Destacou-se anteriormente que a alienação fiduciária de bens imóveis, a partir do procedimento estabelecido na Lei n° 9.514/97, trouxe mais vigor e celeridade nas execuções, possibilitando a execução extrajudicialmente. Esse procedimento, se de um lado diminuiu os riscos de não recebimento e evitou o processo judicial ao credor fiduciário, por outro lado também facilitou e ampliou o acesso e a concessão do crédito para o devedor fiduciante. Tal afirmação está vinculada com o que ordena o artigo 26 desta lei.

Neste sentido, Eduardo Takemi (apud FARIAS; ROSENVALD, 2006, p. 387):

A grande facilitação da retomada e consolidação da propriedade do imóvel pelo credor em caso de inadimplemento, inclusive com a dispensa do processo – ao contrario da lenta execução que ocorre no sistema hipotecário -, torna-se um fator de estímulo à construção civil, pois incita o financiador a busca a atividade cujo risco é mitigado pelo ordenamento jurídico pela célere recuperação do crédito, reflexamente, esta confiança conduzirá a uma redução nas taxas de juros, muito influenciadas pelo fator de risco).

(28)

As conseqüências de inadimplemento são várias, como a constituição do devedor em mora, a possibilidade de purgação da mora, a consolidação da propriedade, o leilão e a reintegração na posse.

Na alienação fiduciária o credor fiduciário transfere a propriedade do imóvel ao devedor sob condição resolutiva, imposta pela alienação fiduciária, a qual somente se tornara plena e livre de qualquer condição com o pagamento, a quitação plena do respectivo contrato.

No contrato de alienação fiduciária em garantia, o fiduciante transfere ao fiduciário, em caráter temporário, seus direitos de propriedade do imóvel alienado. [...]

Com o pagamento do empréstimo, ou mais precisamente, da divida, resolve-se a propriedade fiduciária sobre o imóvel e assim entra o fiduciante na posse e propriedade plena do imóvel. (ROQUE, 2010, p. 162).

A constituição do devedor em mora se dá quando o mesmo não paga as parcelas do contrato de alienação fiduciária, conforme diz o artigo 26 da Lei n° 9.514/97.

Para que ocorra esse procedimento, o credor fiduciário, munido de requerimento, deve solicitar junto ao registro de imóveis competente, a intimação do devedor fiduciante, a qual será feito pelo Oficial do Registro de Imóveis. O devedor fiduciante terá o prazo de quinze dias após a sua intimação para efetuar o pagamento do débito e todas as demais despesas referentes à intimação.

Esse processo extrajudicial deve iniciar pela intimação do fiduciante por requerimento do fiduciário, a ser feito ao Oficial do Registro de Imóveis, para satisfazer a prestação vencida e as que se vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação. (ROQUE, 2010, p. 162).

Existem questionamentos judiciais quanto à legalidade dessa intimação não ser feita na diretamente na pessoa do devedor, uma vez que a lei autoriza que a intimação seja efetuada na pessoa de representante legal ou constituído. Entretanto, o entendimento dos tribunais é no sentido da legalidade da intimação estabelecida na Lei, conforme mostra a jurisprudência:

(29)

PROCESSO CIVIL. SFH. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. ART. LEI 9514/97. NOTIFICAÇÃO PESSOAL. VERIFICAÇÃO. REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO. APELAÇÃO IMPROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta por JOSE ARNOBIO BEZERRA contra sentença do douto Juízo da 34ª Vara da SJ/CE, que julgou improcedente o pedido da parte autora consubstanciado na declaração de nulidade do procedimento de execução extrajudicial de consolidação da propriedade do imóvel, realizado pela CEF. 2. A Lei nº 9.514/97, que dispõe sobre o Sistema Financeiro Imobiliário e institui a alienação fiduciária de coisa móvel, traz a hipótese de consolidação da propriedade em nome do fiduciário em seu art. 26, estabelecendo que ‘o fiduciante, ou seu representante legal ou procurador regularmente constituído, será intimado, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação vencida e as que se vencerem até a data do pagamento’ (parágrafo 1º), bem como que ‘a intimação far-se-á pessoalmente ao fiduciante, ou ao seu representante legal ou ao procurador regularmente constituído, podendo ser promovida, por solicitação do oficial do Registro de Imóveis, por oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento’ (parágrafo 3º). Por fim, estabelece que ‘decorrido o prazo de que trata o parágrafo 1o sem a purgação da mora, o oficial do competente Registro de Imóveis, certificando esse fato, promoverá a averbação, na matrícula do imóvel, da consolidação da propriedade em nome do fiduciário, à vista da prova do pagamento por este, do imposto de transmissão inter vivos e, se for o caso, do laudêmio.’ (parágrafo 7º). 3. A Caixa Econômica Federal juntou cópia da notificação realizada pelo oficial do competente Registro de Imóveis (Id. 4058109.807994). 4. Procedeu corretamente a instituição financeira, tendo em vista que há nos autos comprovação da notificação pessoal do mutuário. Destarte, tendo a Caixa Econômica Federal cumprido corretamente todo o procedimento exigido pela Lei nº 9.514/97 para a realização da execução extrajudicial, deve ser reconhecida a regularidade do procedimento expropriatório. 5. Apelação improvida. (BRASIL, 2016a).

Caso o devedor fiduciário não seja encontrado, o Oficial do Registro de Imóveis cientificará o fato e realizara a intimação via edital, o qual deverá ser publicado três dias em um jornal de grande circulação.

Uma vez intimado, abre-se ao devedor a possibilidade de efetuar a purgação da mora, que se dá quando o devedor fiduciante efetua o pagamento do que lhe foi cobrado na constituição em mora; neste caso, o Oficial do Registro de Imóveis em três dias repassará ao credor fiduciante os valores recebidos, descontado os emolumentos cartorários.

Para Roque (2010, p. 163), “O Oficial do Registro de Imóveis, nos três dias seguintes à purgação da mora, entregará ao fiduciário às importâncias recebidas, deduzidas as despesas de cobrança e de intimação”. Entretanto, não sendo

(30)

adimplida a dívida no prazo legal, irremediavelmente acontecerá a consolidação da propriedade em favor do credor. Neste momento, cabe ao Oficial do Registro de Imóveis realizar, na matrícula do imóvel, através de uma averbação, a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário. Para que isso ocorra o credor fiduciário deve ter pagado junto ao órgão competente o imposto de transmissão inter

vivos.

[...] o oficial do competente Registro de imóveis, certificando esse fato, promoverá a averbação na matrícula do imóvel, da consolidação da

propriedade em nome do fiduciário, à vista da prova do pagamento por

este, do imposto de transmissão inter vivos. (ROQUE, 2010, p. 163, grifo nosso).

Posteriormente, deve o credor promover os atos de alienação do imóvel, por meio de leilão. Significa dizer, após consolidada a propriedade em nome do credor fiduciário, terá de ser realizado, no prazo de trinta dias, depois de registrada a consolidação de propriedade do imóvel, os atos para alienação em hasta pública.

Não sendo alcançado o valor do imóvel no primeiro leilão, será realizado um segundo leilão, no prazo de quinze dias seguintes; já no segundo leilão será aceito o lance maior, desde que superior ou igual o valor da divida e demais encargos que estejam relacionados ao imóvel. Neste sentido, é o artigo 26 da Lei n° 9.514/97:

Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.

§ 1º Se, no primeiro público leilão, o maior lance oferecido for inferior ao valor do imóvel, estipulado na forma do inciso VI do art. 24, será realizado o segundo leilão, nos quinze dias seguintes.

§ 2º No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais. (BRASIL, 1997).

Por fim, a reintegração na posse, que está elencada no artigo 30 da Lei n° 9.514/97, onde diz que depois de consolidada a propriedade, o adquirente tem de esperar até sessenta dias pela desocupação do imóvel adquirido.

Art. 30. É assegurada ao fiduciário, seu cessionário ou sucessores, inclusive o adquirente do imóvel por força do público leilão de que tratam os §§ 1° e 2° do art. 27, a reintegração na posse do imóvel, que será concedida liminarmente, para desocupação em sessenta dias, desde que comprovada, na forma do disposto no art. 26, a consolidação da propriedade em seu nome. (BRASIL, 1977).

(31)

Como vimos nesse item, o procedimento no caso de inadimplemento se resolve de maneira rápida, sem que o credor fiduciante tenha que requerer judicialmente a execução. Veremos a adiante sobre a sua inconstitucionalidade e constitucionalidade.

2.3 Questionamento quanto à inconstitucionalidade da execução extrajudicial da garantia fiduciária

O Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), criado pela Lei n° 9.514/97, autoriza o credor fiduciário a aplicar livremente as sanções extrajudiciais da retomada do bem imóvel, sem que haja intervenção do Poder Judiciário.

Ocorre que para alguns juristas esse procedimento é inconstitucional, sob o argumento de que a retomada do bem imóvel, por parte do próprio credor fiduciário, é incompatível com os princípios do juiz natural, do contraditório e do devido processo legal, elencados no art. 5º, XXXV, LIV e LV da Constituição Federal vigente.

Art. 5º. XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. (BRASIL, 1988).

Argumenta-se que o procedimento da execução extrajudicial fere a Constituição Federal, na medida em que a Lei n° 9.514/97 não obriga o credor fiduciante a ter de procurar o Poder Judiciário para realizar a execução. A retomada do bem imóvel por parte do credor fiduciante, através de execução realizada diretamente na via extrajudicial também caracteriza violação do inciso XXXVII da Constituição Federal vigente, pois, assim o credor fiduciário assume diretamente a função de “juízo e tribunal de exceção”, conforme segue o inciso: “Art. 5º. XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção; [...]”. Além disso, a Constituição Federal vigente é clara, no que diz o art. 5º onde diz que somos todos iguais perante a Lei, mais especificamente em seus incisos XXII, XXIII e XXXII. “XXII - é garantido o

(32)

direito de propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;” (BRASIL, 1988).

Para Luiz Fux (apud MIGALHAS n° 3978, 2011), ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), é inconstitucional a aplicação da execução extrajudicial, pois a Constituição Federal vigente garante o direito de propriedade. Sendo assim deveria o credor fiduciário executar a divida com a intervenção do Poder Judiciário. De acordo com o Ministro, “Esse decreto-lei inverte completamente a lógica do acesso à justiça”, disse. “O devedor é submetido a atos de expropriação sem ser ouvido e se ele eventualmente quiser reclamar ele que ingressa em juízo.” (FUX apud MIGALHAS nº 3978, 2011).

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio (apud MIGALHAS n° 3978, 2011), disse também que “a Constituição determina que a perda de um bem deve respeitar o devido processo legal e, portanto, deve sempre ser analisada pelo Poder Judiciário. "Ninguém pode fazer justiça com as próprias mãos."

Segundo as palavras do Defensor Público do Rio de Janeiro Paulo Cesar Ribeiro Galiez (apud MIGALHAS n° 3978, 2011), “Frise-se, mais uma vez, a exceção contemplada no citado decreto e contrária a um verdadeiro Estado Democrático de Direito. Com este é incompatível a perda de bem sem um devido processo legal”. Porém, o que podemos concluir nesse item, é que essa posição, entretanto, não é a que domina em nossos tribunais, que entendem pela constitucionalidade da execução extrajudicial, abordada no item que segue.

2.4 Posição dos tribunais a respeito da constitucionalidade da execução extrajudicial

Como dito anteriormente, a posição majoritária da jurisprudência é pela constitucionalidade da execução extrajudicial, pois não afrontaria o direito da ampla defesa e o devido processo legal, já que o Poder Judiciário pode ser acionado a qualquer momento.

Um argumento relevante para que seja constitucional a execução extrajudicial, é o fato de não movimentar a máquina do Judiciário, pois a mesma

(33)

gera custos, os quais podem ser evitados sendo realizados os tramites extrajudicialmente. A execução extrajudicial pode acomodar a satisfação coercitiva do credor através do procedimento, que tem inicio e pode se extinguir sem a ligação com os tribunais, conforme a Lei n° 9.514/97 prevê em seus respectivos artigos.

A jurisprudência a seguir mostra uma devedora fiduciante que ao não conseguir purgar a mora, se mostra inconformada com a situação, e apela para o Judiciário. O mesmo não acolheu a sua tese de inconstitucionalidade, e decide que é constitucional sim a execução extrajudicial, conforme vemos:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. DECRETO-LEI 70/66. CONSTITUCIONALIDADE. CONTRATO DE MÚTUO

HABITACIONAL REGIDO PELO SFH. INADIMPLEMENTO.

CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DA CEF. LEI 9.514/97. LEILÃO. POSSIBILIDADE. 1. Cuida-se de agravo de instrumento manejado pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL contra decisão proferida pelo Juízo da 13ª Vara Federal da Seção Judiciária de Alagoas que, nos autos de ação ordinária (de revisão contratual c/c repetição de indébito), ajuizada por IRACILDA ALVES DA COSTA CUNHA SEIXAS, deferiu medida cautelar para que a CEF ré, ora agravante, se abstivesse de levar o imóvel objeto da lide à leilão, no bojo de execução extrajudicial embasada no Decreto n. 70/66,por entender que o prosseguimento deste feito executivo e de seus atos expropriatórios poderia ensejar a perda do bem utilizado como moradia pela autora, tornando qualquer resultado processual favorável virtualmente inócuo. 2. Ab initio, é importante ressaltar que o Supremo Tribunal Federal já se pronunciou em diversos julgados (AI-AgR 688010, RE-AgR 408224 e RE 287453) pela constitucionalidade do Decreto-Lei nº. 70/66, firmando o entendimento no sentido de que a referida legislação não viola o princípio da inafastabilidade da jurisdição, tampouco o devido processo legal, o contraditório ou a ampla defesa. 3. O presente contrato (contrato de Mútuo Habitacional regido pelo Sistema Financeiro de Habitação) possui cláusula de alienação fiduciária em garantia, na forma do artigo 38 da Lei nº 9.514/97. Em casos como tais, na hipótese de inadimplemento e decorrido o prazo para a purgação da mora, ocorre a consolidação da propriedade do imóvel em nome da credora fiduciária, in casu, da Caixa Econômica Federal. 4. Não há falar em qualquer tipo de ilegalidade na forma utilizada para satisfação dos direitos da credora, posto que o trâmite procedimental seguiu todos preceitos legalmente previstos, sendo inadmissível obstá-la de promover atos expropriatórios ou de venda, uma vez que, com a consolidação da propriedade, o bem se incorporou ao patrimônio da empresa pública agravada. 5. Registre-se, de resto, que,dado que a própria mutuária confessa que não teve condições de purgar a mora de acordo com os ditames legais, essa sua inadimplência ensejou, portanto, a consolidação da propriedade do agente fiduciário (é dizer, da CEF agravante), resultando daí ser absolutamente legítima a realização do leilão público, nos termos do art. 27 da Lei nº 9.514/97. 6. Agravo de Instrumento provido. (BRASIL, 2016b).

Muitos são os casos que acontecem como esse citado. Em outro julgado, o devedor ficou inconformado de ser notificado via edital, o qual é expressamente

(34)

previsto no artigo 26, § 4°, da Lei n° 9.514/97, o que da total autonomia para o Oficial do Registro de Imóveis em publicar em jornal de circulação o presente edital.

MANDADO DE SEGURANÇA. SFH. CONSTITUCIONALIDADE. DECRETO-LEI Nº 70/66 E LEI Nº 9.514/97. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA DE IMÓVEL. IMPONTUALIDADE. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DA CEF. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. 1. A execução extrajudicial não é vedada no direito pátrio, conforme vinha se pronunciando a jurisprudência pátria dominante, assim que, especialmente sob a ótica da execução do DL 70/66, impõe-se a observância da decisão proferida pelo STF no âmbito do RE nº 223.075/DF 2. O contrato de mútuo foi firmado sob a égide do Sistema de Financiamento Imobiliário, no qual o imóvel garante a avença mediante alienação fiduciária - e não hipoteca. Tal procedimento é regulado pela Lei nº 9.514/97. 3. Em havendo descumprimento contratual e decorrido o prazo para a purgação da mora, a propriedade será consolidada em nome da Caixa Econômica Federal (artigo 26 da Lei nº 9.514/97), não havendo nisso a mínima inconstitucionalidade. Precedentes jurisprudenciais 4. Colocando-se no centro da controvérsia do presente caso a forma de notificação da autora, vejo que a notificação por edital é expressamente prevista no art. 26 § 4º da Lei 9.514/97, e, no caso, infrutíferas as tentativas de notificação no endereço declarado, não se vê, nesta fase, equívoco na notificação levada a cabo pela via editalícia. [...] "a alegação de que o autor não foi notificado para purgar a mora depende, para estudo quanto à sua verossimilhança, da análise dos documentos integrantes do processo administrativo conduzido pelo agente fiduciário." 5. Agravo improvido. (BRASIL, 2016c).

Com as jurisprudências, observa-se que os devedores fiduciantes procuram a via judicial para dirimir alguns questionamentos referentes à execução extrajudicial. Mesmo com a Lei n° 9.514/97, prevendo todos os tramites para que seja efetuada de uma maneira correta, clara e célere a execução extrajudicial, ainda assim há procura pelo Poder Judiciário, tentando obter respaldo legal para seu questionamento.

(35)

CONCLUSÃO

Ao final da pesquisa, pode-se dizer que foi de extrema importância o estudo da Lei n° 9.515/97, que trata da alienação fiduciária, em nosso ordenamento jurídico. Desde o nascedouro da alienação fiduciária que não se sabe ao certo onde teve inicio, se foi no direito romano, ou no direito germânico, ou ainda no direito anglo-americano, ela tem se mostrado muito eficiente. Contudo, aqui no Brasil surgiu a alienação fiduciária em garantia como uma nova espécie de garantia real, com o dever de dar mais segurança e valor ao crédito, o que possibilitou ao credor fiduciário muito mais segurança.

Com relação às garantias reais, a hipoteca deixou de ser a principal forma de garantia, perdendo espaço para a alienação fiduciária, pois, em casos de inadimplemento, a hipoteca foi, e, é muito discutida em nosso Poder Judiciário, fazendo com que o mesmo fique sobrecarregado de processos, diferentemente da alienação fiduciária, cuja execução, em caso de inadimplemento, não precisa ser levada ao Judiciário, podendo ser realizada via extrajudicialmente.

O conceito de alienação fiduciária surgiu com o intuito de solucionar alguns dos problemas dos direitos reais em garantias tradicionais.

A Lei que rege a alienação fiduciária, também trouxe direitos e obrigações, tanto para o devedor fiduciante como para o credor fiduciário, o que proporcionou maior respeito entre as partes, quando digo respeito entre as partes falo de cumprir com o que esta estabelecido no contrato, de ambas não se “lograrem” uma da outra em momento algum, na vigência do contrato.

Referências

Documentos relacionados

[r]

Ao captarmos a imagem, devemos ter uma ideia prévia daquilo que será o projeto, isto porque para quando formos a editar não faltar “pintura” (seleção de

Cenário O mapa do jogo foi construído a partir de blocos tridimensionais, sprites, fontes de iluminação do tipo Spotlight e triggers Figura 8 e Figura 9, distribuídos dessa

Apesar da edificação do Modelo 1 ter duas janelas voltadas para o norte, a edificação teve maior consumo de energia total e para resfriamento, tendo relação direta com o

Neste problema, por´em, dada a descri¸c˜ao de uma linguagem simples, um programa escrito nessa linguagem e uma entrada para esse programa, vocˆe deve determinar se o programa dado

A menor dimensão dos reguladores GENIE permite que per- maneçam de forma segura no interior das pegas da garrafa, evitan- do danos no regulador e acidentes em caso de queda da

Na tabela 1 são apresentados os tempos de geração de cada um dos arquivos VRML para cada função de geração, utilizando o VRMLGer. Os tempos apresentados na tabela 1 foram obtidos

O Manejo Integrado de Pragas (MIP) combina a abordagem cultural, química, mecânica e outras práticas adequadas, quando disponíveis, para controlar pragas, doenças ou