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EGRESSOS DE UM CURSO DE BACHARELADO E LICENCIATURA EM ENFERMAGEM E OS DESAFIOS DA DOCÊNCIA

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EGRESSOS DE UM CURSO DE BACHARELADO E LICENCIATURA EM

ENFERMAGEM E OS DESAFIOS DA DOCÊNCIA

Luciane Sá de ANDRADE, Marlene Fagundes Carvalho GONÇALVES, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo - EERP/USP Eixo 02 - Formação continuada e desenvolvimento profissional de professores da educação básica CNPq Universal e CAPES - Pró-Ensino na Saúde E-mail: lucianeandrade@eerp.usp.br 1. Introdução

O curso de Licenciatura oferece um diferencial para o enfermeiro que tem como possibilidade, além de instituições de saúde, o trabalho em escolas técnicas de formação de técnicos de enfermagem.

Este trabalho busca analisar os desafios enfrentados por egressos de um Curso de Licenciatura em Enfermagem para o desenvolvimento de atividades no campo da docência. A pesquisa tem como participantes egressos do Curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – EERP/USP.

Este trabalho parte da necessidade de se realizar estudos focando a articulação entre a formação recebida pelos professores e as condições concretas de realização do trabalho deste professor, já no contexto do mercado de trabalho, após sua formação (TARDIF, 2005).

2. Percurso metodológico

Este trabalho fundamenta-se numa abordagem qualitativa de pesquisa, em que o olhar do sujeito para os processos que vivencia fornece ao pesquisador possibilidades de interpretação do fenômeno estudado a partir da base teórica construída num campo científico (MINAYO, 2014).

Foi realizado um estudo descritivo exploratório, numa abordagem qualitativa com dados coletados por entrevistas semiestruturadas com egressos da primeira turma formada pelo curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem da EERP-USP.

Foram realizadas entrevistas com 39% dos egressos formados na primeira turma, que concluíram o curso no ano de 2010, totalizando 14 entrevistas. A EERP/USP oferece anualmente 50 vagas para o curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem cuja duração é de 10 semestres.

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As entrevistas foram transcritas e analisadas considerando cada sujeito em particular. Em seguida, foram levantados núcleos temáticos que eram de interesse para o trabalho e procedida nova análise comparando as falas dos diferentes sujeitos sobre a mesma categoria, dentro de um referencial qualitativo (MINAYO, 2014). Esses núcleos temáticos foram analisados com base na literatura e nos autores escolhidos para este trabalho.

Esta pesquisa foi submetida e aprovada por Comitê de Ética, atendendo os preceitos éticos e o rigor científico.

3. Da formação à atuação na docência

Parte dos entrevistados iniciou a vida profissional como professores no curso técnico, o que evidencia a docência como uma possibilidade importante para recém-formados num curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem.

Eu dei algumas aulas também, estava precisando de professor eu fiquei um tempo dando aula no curso técnico, me virei sozinha, alguma coisa você pergunta para o colega, mas os colegas que você ia perguntar eram justamente os colegas que estudaram comigo, então a gente se ajudava, montar aula, cronograma, plano de aula, coisa que a gente nem vê por aí, a gente aprendeu lá na escola. (Entrevistado 2)

A Licenciatura foi um diferencial para a contratação destes enfermeiros no mercado de trabalho de escolas técnicas na área de enfermagem. Embora a prática de contratação de professores sem a licenciatura tenha sido uma prática muito comum até alguns anos atrás, as mudanças na legislação e a valorização da formação para a docência tem apontado uma mudança nestas práticas, o que é evidenciado no discurso dos entrevistados.

Mas o mercado de trabalho necessita de profissionais com Licenciatura, o mercado de trabalho em São Paulo para essa parte de Educação tem. (Entrevistado 4)

Hoje você não pega mais emprego em escola se você não tiver, você pode ter a prática que for, eles podem até te contratar, mas ela vai exigir que você ingresse o mais rápido possível num curso de licenciatura. (Entrevistado 11)

Para além das questões formais, a formação para docência mostrou-se essencial para o trabalho como professor. Isto foi valorizado pelos egressos que perceberam a importância de sua formação quando tiveram oportunidades de atuação no mercado de trabalho.

Para essa escola que eu entrei que eu fui dar algumas aulas, a Licenciatura foi o essencial, se eu não tivesse Licenciatura eu não teria dado aula... (Entrevistado 2)

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Eu me preparei para ser docente então, eu gosto da docência, eu me sinto bem dando aula, me sinto bem atuando lá, ao mesmo tempo, fico bastante incomodado porque assim, (...) não tem uma hora aula paga e eu não quero uma hora aula paga no sentido que eu quero ganhar mais, eu preciso de uma aula paga para que a escola me leve pra dentro dela que não seja só no horário que seja de aula, aonde eu possa construir algumas coisas com os outros professores. (Entrevistado 5)

Esta vivência na formação traz a possibilidade de uma atuação docente que gera prazer a este professor. Entretanto isto não é suficiente para sua realização enquanto professor, pois a docência é realizada em condições concretas do trabalho, que muitas vezes, “expressam sensação de insegurança e desamparo tanto do ponto de vista objetivo – faltam-lhes condições de trabalho adequadas – quanto do ponto de vista subjetivo (OLIVEIRA, 2004).

A formação que recebem oferece novas possibilidades de atuação para este professor, mas isto não garante uma atuação diferenciada, pois os professores recém-formados deparam-se com uma cultura escolar já estabelecida nas escolas técnicas, cultura esta que muitas vezes coloca enorme resistência a uma prática pedagógica diferenciada.

Eu só consigo fazer isso lá porque eu vivenciei isso na minha formação, porque eu acho que se eu não tivesse vivenciado isso na minha formação, eu estava dando aula na lousa ou no (Power Point), “olha, isso é desse jeito, para isso é desse jeito, para isso é desse jeito”. Porque na enfermagem a gente tem isso, “olha, esse é o problema, essa é a prescrição de enfermagem, essa é a sistematização da enfermagem”. (Entrevistado 14)

Na prática como docente, os alunos esperam do professor enfermeiro a experiência na assistência, na realização daquilo que está ensinado, o que coloca para este professor uma demanda psíquica importante.

Eu tinha medo de ir lá ensinar meus alunos a fazer aspiração de vias aéreas, então eu tive que pedir ajuda, “...porque eu acho que tenho medo de errar os materiais com ele ou até a sequência da técnica...”, aí o professor que era excelente comigo, foi comigo, eu fui aprendendo, aí eu fui me sentindo enfermeira para dar aula, mas parece que eu me sentia muito superficial, mesmo dando aula. (Entrevistado 7)

O fazer pedagógico do professor coloca a responsabilidade diante de um grupo de alunos, o que pode ser “sinônimo ao mesmo tempo de autonomia, de responsabilidade, mas, também, de vulnerabilidade” (TARDIF, 2005, P. 64).

A relação com os alunos também coloca grandes desafios para o professor recém-formado, conforme evidencia o egresso:

Olha, de dar aula, não sei, tem certos momentos que é difícil, eu gosto muito de dar aula, mas acho que eu preciso amadurecer mais, mas é uma coisa que eu gosto muito, é um trabalho legal (...) Exemplo, o aluno que

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quer medir o seu conhecimento, que quer saber até onde você sabe, tentar diminuir sua aula, (...) às vezes certas situações eu não vivi no mercado de trabalho ainda, situações mais críticas que me deem mais experiência no momento de lecionar Enfermagem (...). (Entrevistado 7)

Como atividade complexa, a docência requer diferentes saberes (CUNHA, 2010) que podem ser trabalhados na formação, e como prática social caracteriza-se por se dar em interações humanas, com “pessoas capazes de iniciativa e dotadas de uma certa capacidade de resistir ou de participar da ação dos professores (TARDIF, 2005, P. 35).

Outros entrevistados apontam os limites na realidade de trabalho da escola técnica em se trabalhar com metodologias da maneira em que foi formado.

A gente tem a questão, assim, do professor facilitador, que é o que eu gosto, quando você chega lá você vê, a maior dica que os professores te dão, “...oh tem tudo isso, a gente acredita nisso também, mas faça o que é mais fácil pra você, para dar conta aqui...”, então você vai trabalhar numa aula mais expositiva quando precisa ou você vai trabalhar numa aula mais construtivista quando dá e assim por diante. (Entrevistado 5)

Porque tem professores que trabalham há vinte anos, trinta anos, e eu estou começando, sou formado há pouco tempo então, o pessoal mais antigo é mais complicado, tem outra visão de como dar aula, visão bem diferente de como a gente aprendeu aqui na graduação, e tentar implantar às vezes assim é difícil implantar certas metodologias (...) e tem certas metodologias que você tenta implantar e encontra barreiras, então tem essas dificuldades. (Entrevistado 4)

A mudança no posicionamento do papel do professor nem sempre é bem aceita pelos alunos das escolas técnicas, habituados ao método tradicional.

Quando você quer preparar alguma coisa você tem um contexto de alunos que não entendem que aquela aula está tendo um conhecimento, eles querem a coisa pronta. Eu já tive alunos que trouxeram para mim, “professor, ao invés de você ficar dando exercício de estudo de caso para gente ficar pensando, traz para gente exercício de alternativa, porque aí é mais fácil para gente responder e é mais fácil pra você corrigir”. (Entrevistado 14)

Além da complexidade do trabalho cotidiano do professor que atua em interação com o outro, que tem suas necessidades, personalidades, projetos de vida, autonomia (TARDIF, 2005, P. 20), as condições institucionais para o exercício da docência demarcam um importante limitador para as possibilidades de docência que os professores construíram durante a sua formação. O contexto de trabalho nas escolas, depois de formados, entra em choque com a formação:

Eu avalio, eu vejo, eu tento adotá-las né, fazer um ativo mesmo né. É o que eu falo como professor. Eu lembro que as professoras sempre falavam, “gente, discussão de grupo não é só reunir um grupo de pessoas, né”. Isso tem todo um fundamento, né, mas eu vejo que tem horas que quando você não tem o apoio da instituição em si, né, isso se torna um

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pouco massacrante, né, mas mesmo assim, é um desafio. (Entrevistado 13)

A gente tem uma formação, assim, sobre as metodologias de ensino, sobre a importância da educação, que quando você vai pra sala de aula você valoriza, né. Embora todo cansaço, porque não é fácil, né, eu falo que a cada dia, você dá uma aula, tem dia que você dá a aula dos seus sonhos, do jeito que você planejou e saiu, mas tem dia que não dá para ser assim e você tem que aceitar, né. (Entrevistado 13)

Os professores experimentam assim relações com seus alunos ora prazerosas, ora decepcionantes (TARDIF, 2005, p. 160).

Por fim, a falta de valorização e de remuneração adequada leva o enfermeiro a encarar a docência como uma atividade secundária.

E muitas vezes, como eu te falei da questão financeira, muitas vezes o professor que está formando auxiliar e técnico tem uma remuneração menor do que esse profissional que ele vai ter no mercado. E aí isso acaba trazendo para o profissional de enfermagem a questão de encarar a docência ou em múltiplos horários de aula ou como um bico, que aí ele não vai se programar e não vai se dedicar para isso. (Entrevistado 14) A precarização das condições do trabalho dos professores é uma realidade cotidiana para professores recém-formados, que, embora identificados com a docência, não se sentem retribuídos em termos do investimento que realizaram na sua formação e para realização do seu trabalho.

4. Conclusões

A docência deve ser concebida como prática social (TARDIF, 2005) e como ação complexa (CUNHA, 2010) e para a realização de ações de formação continuada deve ser considerado este contexto, que coloca desafios ao professor que deve a todo momento compatibilizar aspectos da formação que recebeu e a realidade de seu contexto de trabalho.

A construção da identidade profissional dos professores não se encerra no momento de sua formação, mas articula-se com a cultura do grupo de pertencimento profissional e com o contexto sociopolítico em que a ação profissional do professor se desenvolve (MOITA, 2007).

Os egressos deste estudo apontaram os limites na realidade de trabalho da escola técnica em se trabalhar com metodologias da maneira em que foi formado. Na fala dos egressos surgem as dificuldades em ser professor, relacionadas ao cansaço, à sensação da aula não ter sido proveitosa, à frustração em relação às expectativas criadas sobre a docência, particularmente no que se refere à possibilidade de adoção de metodologias diferentes do ensino tradicional e ao recebimento de uma remuneração

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adequada. Assim, a falta de valorização e de remuneração adequada tem levado o enfermeiro a encarar a docência como uma atividade secundária.

Referências Bibliográficas

CUNHA, M.I. A docência como ação complexa. In: ______. (Org). Trajetórias e Lugares de Formação da Docência Universitária: da perspectiva individual ao espaço institucional. Araraquara, SP: Junqueira & Marin; Brasília, DF: CAPES: CNPq, 2010. p.19-34.

MINAYO, M. C.S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde./Maria Cecília de Souza Minayo. – 14.ed. – São Paulo: Hucitec, 2014.

MOITA, M.C. Percursos de formação e de transformação. In: Nóvoa, A. (org.) Vidas de professores. Porto: Porto Editora, 2007.

OLIVEIRA, D.A. A reestruturação do trabalho docente: precarização e flexibilização. Educação e Sociedade. Campinas, v. 25, n.89, p. 1127-1144, Set./Dez. 2004

TARDIF, M.; LESSARD, C. O Trabalho Docente: elementos para uma teoria da docência como profissão de interações humanas. 2.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005.

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