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Pontifícia Universidade Católica De São Paulo PUC – SP Agda Malheiro Ferraz de Carvalho

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Pontifícia Universidade Católica De São Paulo

PUC

SP

Agda Malheiro Ferraz de Carvalho

Atuação profissional do agente de inclusão escolar: um estudo sobre os sentidos e significados constituídos por um deles

Mestrado em Educação: Psicologia da Educação

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Pontifícia Universidade Católica De São Paulo

PUC

SP

Agda Malheiro Ferraz de Carvalho

Atuação profissional do agente de inclusão escolar: um estudo sobre os sentidos e significados constituídos por um deles

Mestrado em Educação: Psicologia da Educação

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Educação: Psicologia da Educação, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Claudia Leme Ferreira Davis.

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BANCA EXAMINADORA

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha família pelo incentivo durante esses dois anos. Eliane, Rui, João, Bruno, Ana, Caio, Bruna, Tomás e Catarina: cada pergunta sobre o processo, cada olhar atento enquanto eu explicava e o entendimento sobre ausências fizeram toda a diferença para eu chegar até aqui. Mamis e João, mais de perto, agradeço pelas dicas, escutas, cafés e colos. Apoio fundamental!

À Claudia, orientadora sábia, firme e acolhedora: adorei a parceria, aprendi muito e sou grata pelas conversas, intervenções e leituras. Te admiro pela transparência e pelo olhar crítico à educação. Obrigada por ter acreditado em mim!

À Ia, pelos encontros às quartas-feiras que foram momentos de transformação. Sua disponibilidade e atenção colaboraram muito nessa pesquisa. Estendo os agradecimentos ao grupo de pesquisa pela partilha de conhecimentos.

À Carla Biancha, gênia, pela luta, pelo posicionamento e militância. Gratidão pelas ricas contribuições desde a especialização, passando por seus textos e pela Banca. Gratidão!

À Mimi pelas ótimas aulas e pelo brilho no olhar. Também agradeço aos demais professores do PED por auxiliarem minha formação.

Durante esse caminho os amigos foram importantíssimos! Vieram pra ficar. Minha ―irmã alemã‖ Karin e sua sabedoria, Rafaela e as idas e vindas de trem para os estudos e todo o grupo ―produtivo‖: Henrique, Bruna, Cintia e Mariana. Para Denise, Brisa, Jéssica... desejo o melhor!

Sandra e Margarete (também a todos da Creche Beth Lobo): pela compreensão e pelo carinho. Torço por vocês!

Edimara e Priscila saibam que são fundamentais nessa história.

Aos alunos e alunas que há 20 anos estão comigo. Isso tudo é pra vocês!

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Amo tanto e de tanto amar Acho que ela é bonita Tem um olho sempre a boiar E outro que agita

Tem um olho que não está Meus olhares evita

E outro olho a me arregalar Sua pepita

A metade do seu olhar

Está chamando pra luta, aflita E metade quer madrugar Na bodeguita

Se os seus olhos eu for cantar Um seu olho me atura

E outro olho vai desmanchar Toda a pintura

Ela pode rodopiar E mudar de figura A paloma do seu mirar Virar miúra

É na soma do seu olhar

Que eu vou me conhecer inteiro Se nasci pra enfrentar o mar Ou faroleiro

Amo tanto e de tanto amar Acho que ela acredita Tem um olho a pestanejar E outro me fita

Suas pernas vão me enroscar Num balé esquisito

Seus dois olhos vão se encontrar No infinito

Amo tanto e de tanto amar Em Manágua temos um chico Já pensamos em nos casar Em Porto Rico

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Carvalho, A. M. F. Atuação profissional do agente de inclusão escolar: um estudo sobre os sentidos e significados constituídos por um deles. 128 f. Dissertação

(Mestrado em Educação: Psicologia da Educação) – Pontifícia Universidade Católica

de São Paulo, São Paulo, 2016.

RESUMO

O objetivo deste estudo foi ampliar os conhecimentos acerca da atuação profissional de agentes de inclusão escolar (AIEs), buscando apreender sentidos e significados dessa atuação. Vale dizer que o termo AIE nomeia os profissionais de apoio ou auxiliares, que atuam nas escolas regulares, junto aos alunos com deficiência. A pesquisa foi realizada em um município da Grande São Paulo, onde se entrevistou um agente de inclusão escolar (José); foi também gravada, transcrita, sistematizada e analisada na perspectiva seguindo a proposta de Aguiar e Ozella (2006, 2013) e Aguiar, Soares e Machado (2015), autores vinculados à Psicologia Sociohistórica. Nesse sentido, construíram-se núcleos de significação, que permitem maior aproximação das zonas de sentido. Na análise de dados, constatou-se que José chegou à profissão por meio de concurso público, com poucas informações sobre qual seria seu trabalho. Ao realizá-lo, percebeu a necessidade de aprimorar suas intervenções junto aos alunos para que eles participassem efetivamente do processo de ensino-aprendizagem. As muitas frustrações do entrevistado parecem decorrer da ambiguidade entre o que ele faz e o que acredita ser sua função, na medida em que se dá conta das dificuldades enfrentadas pelos alunos com deficiência e, também, das suas ao com eles lidar. Assim, a compreensão do que é ser e agir como um AIE pode auxiliar a melhor definir o que se espera desse profissional em termos de atendimento às necessidades de apoio aos alunos com diferenças funcionais, na expectativa de se alcançar uma educação efetivamente inclusiva.

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Carvalho, A. M. F. Professional practice of school inclusion agent: a study about the senses and meanings constructed by one of them. 128 p. Dissertation (Masters in

Education: Educational Psychology) – Pontifícia Universidade Católica of São Paulo,

São Paulo (BR), 2016.

ABSTRACT

The aim of this study was to gain knowledge about the professional practice of school inclusion agents (SIAs), in order to understand the senses and meanings constructed by one of them about his job. It is worth mentioning that the term SIAs refers to persons that provide assistance and care to students with disabilities attending regular schools. The research was conducted in a small county near the city of São Paulo (SP), where the SIA (Joseph) was interviewed. The data was recorded, transcribed, systematized and analyzed following the proposal of Aguiar and Ozella (2006, 2013) and Aguiar, Machado and Soares (2015), authors linked to the Sociocultural Psychology. It was found that Joseph came to the profession through public tender, with little information about what his task should be. Doing it, he came to realize the need to improve his interventions with the students, so that they could be active

participants in the teaching-learning-evaluation process. The respondent‘s many

frustrations seem to arise from the ambiguity between what he does and what he believes he should do, since he perceived the difficulties faced by students with disabilities and also those involved in dealing with them. Thus, the understanding of what is to be and to act as an SIA can help to better define what is expected of them in terms of providing support and education to students with functional differences, an essential feature of a truly inclusive education.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 13

2. EDUCAÇÃO ESPECIAL COMO MODALIDADE DE ENSINO E EDUCAÇÃO INCLUSIVA PROPONDO UMA EDUCAÇÃO PARA TODOS E TODAS ... 18

2.1 Política pública: esfera federal ... 18

2.2 Política pública: esfera municipal ... 21

3. REFERENCIAL TEÓRICO: A PERSPECTIVA SOCIOHISTÓRICA ... 23

3.1 Contradição ... 25

3.2 Historicidade ... 26

3.4 Sentidos e Significados ... 27

4. MÉTODO ... 29

4.1 Bases teórico-metodológicas ... 29

4.2 Sujeito ... 30

4.3 Local (escola e setor da Secretaria de Educação) ... 30

4.4 Instrumentos ... 30

4.5 Procedimentos ... 31

4.6 Referencial de análise – núcleos de significação ... 31

5. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS ... 33

5.1 Informações sobre o município ... 33

5.2 Núcleos de significação e apresentação ... 33

5.2.1 Núcleo 1: Trajetória pessoal –“O que a vida me ensinou com esse trabalho é que tenho essa missão aqui na Terra, com esse trabalho com pessoa com deficiência” ... 34

5.2.2 Núcleo 2: Atuação profissional –“No autista, é contenção, é aplicação de atividades; no caso do cadeirante, é mobilidade, higiene, alimentação, é o que realmente eles precisam” ... 37

5.2.3 Núcleo 3: Interações sociais no trabalho –“Eles não pedem para eu os ajudarem a aplicar; eles querem que eu aplique a atividade. Não tem muito essa parceria de o professor também aplicar a atividade: eles precisam do AIE” ... 41

5.2.4 Núcleo 4: Problemas percebidos no trabalho – “O cargo de AIE é visto errado dentro da escola” ... 46

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 49

REFERÊNCIAS ... 55

APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ... 59

APÊNDICE B – Questionário ... 61

APÊNDICE C – Tabulação dos questionários ... 63

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APÊNDICE E – Transcrição da entrevista com gerente de educação inclusiva ... 73

APÊNDICE F – Roteiro de entrevista – Agente de inclusão escolar José ... 84

APÊNDICE G – Transcrição da entrevista – Agente de inclusão escolar José ... 85

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LISTA DE SIGLAS

AIE Agente de Inclusão Escolar

APAE Associação de Pais e Amigos do Excepcional

ASI Agente Social de Inclusão

CADE Centro de Atenção ao Desenvolvimento Educacional

CNE/CP Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno

DEIF Departamento de Educação Infantil e Ensino Fundamental

EJA Educação de Jovens e Adultos

Emeief Escola Municipal de educação infantil e ensino fundamental

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

PAEI Professor Assessor de Educação Inclusiva

PNE Plano Nacional de Educação

PNEEPEI Plano Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva

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1. INTRODUÇÃO

Em Santo André, município da Grande São Paulo, a Lei nº 8.144 de 22, de dezembro

de 2000, criou a unidade administrativa CADE – Centro de Atenção ao Desenvolvimento

Educacional – subordinada ao Departamento de Educação Infantil e Ensino Fundamental –

DEIF, da Secretaria de Educação e Formação Profissional. As competências dessa unidade administrativa pautavam-se, à época, em auxiliar o professor no diagnóstico das dificuldades no processo de ensino-aprendizagem de alunos com deficiência, orientando-os no sentido de delinear caminhos para superar as dificuldades de ordem pedagógica ou clínica. Competia, também, a essa unidade oferecer atendimento tanto clínico, em parceria com a Secretaria de Saúde, como a formação dos funcionários das unidades escolares.

O grupo de profissionais do CADE era composto por quatro professores habilitados na área de Educação Especial, cedidos pela Secretaria de Educação e, ainda, por psicóloga, fonoaudióloga e fisioterapeuta disponibilizadas pela Secretaria de Saúde, como consta da Lei Municipal já citada. As atribuições desses profissionais intencionavam garantir o atendimento especializado aos alunos com deficiência, em conformidade com a concepção de educação inclusiva, promover a formação permanente dos professores e monitores das creches que recebiam alunos com deficiência e, ainda, mobilizar os recursos humanos intersecretarias.

Após seis anos, uma nova lei retoma as funções do CADE. A Lei nº 8.887, de 10 de novembro de 2006, trata da criação de quadros e funções gratificadas na prefeitura municipal e altera a denominação da Gerência de Educação Especial, datada de 2002, para Gerência de Educação Inclusiva. Foram criados trinta cargos para Professor Assessor de Educação

Inclusiva – PAEI (com exigência de formação em ensino superior) e um cargo de Gerente de

Projetos Educacionais, como chefia direta das PAEIs. Nesses quase quinze anos de existência, notou-se diversas modificações na atuação do CADE e no perfil e na diversidade dos profissionais que nele atuam.

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psicopedagogos, somando trinta e quatro profissionais. Cabe a essa equipe apoiar os professores da sala de recursos, bem como realizar diagnósticos clínicos e intervenções terapêuticas em alunos.

Quanto à atuação, fica explícita a linha de trabalho das PAEIs em documentos oficiais, como os Projetos Políticos Pedagógicos das unidades escolares. O foco do trabalho segue diretrizes construídas nesse processo histórico. Cada PAEI é responsável por, em média, quatro escolas (entre Creches, Escolas Municipais de Educação Infantil e Ensino Fundamental e Centros Públicos de Educação de Jovens e Adultos) e o número de alunos com transtorno do espectro autista, deficiência física, intelectual, auditiva e visual atendidos por tais profissionais, está em torno de quarenta. Sendo assim, o número de professores de sala regular, assessorado pelas PAEIs, é quase o mesmo que o número de alunos, salvo exceções em que há dois ou mais deles sendo atendidos na mesma sala de aula.

Essa função de assessoria educacional busca oferecer apoio e subsídios pedagógicos para o professor da sala regular da rede municipal de ensino e caracteriza-se como um serviço itinerante, que pretende colaborar com o processo de Educação na Perspectiva Inclusiva. Ou seja, a atuação da PAEI dá-se diretamente com alunos, professores e cuidadores no âmbito escolar e, indiretamente, com os demais atores envolvidos nesse processo: equipe gestora, demais profissionais das escolas, famílias e equipe clínica.

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Em meio a essa história, após concurso público, entrei, em 2006, para o quadro de professores de educação infantil e ensino fundamental da rede pública de Santo André. Minha experiência profissional, até então, se deu como professora de educação especial na APAE (Associação de Pais e Amigos do Excepcional) de Marília, cidade do interior de São Paulo, e como professora de educação infantil no mesmo município, lugar onde tive a primeira oportunidade de, em uma sala de ensino regular, dar aulas para alunos com deficiência. A partir daí, comecei a constatar que há diferença entre educação especial e educação inclusiva, observando, principalmente, como o grupo de alunos é fator determinante na aprendizagem de seus pares. Após uma breve passagem atuando como coordenadora pedagógica em uma creche conveniada no município de São Paulo, cheguei a Santo André. Em três anos na sala de aula do ensino fundamental, tive, mais uma vez, a oportunidade de lecionar para alunos com deficiência em minhas turmas. E podia contar com o apoio de PAEI, para pensar nas intervenções pedagógicas.

Em 2007, a PAEI que me assessorava questionou-me sobre a possibilidade de contarmos, em minha sala de aula, com a presença de uma Agente Social de Inclusão (ASI). Essa profissional daria aos meus alunos, um com paralisia cerebral e outra com transtorno do espectro autista, apoio à mobilidade, alimentação e higiene. Lembro que respondi que não considerava necessário, pois estávamos (alunos e eu) envolvidos com a dinâmica de sala de aula e as crianças vinham conquistando, progressivamente, autonomia nessas áreas. De qualquer forma, essa profissional, a ASI, chegou à escola e eu a via constantemente conduzindo uma aluna com deficiência física de outra sala e alimentando uma criança com deficiência intelectual também de outra turma, ambas tarefas feitas anteriormente pelas professoras dos respectivos alunos.

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convidada a compor o grupo de profissionais do CADE, como professora do Atendimento Educacional Especializado, atuando em sala de recursos multifuncional. Foram três anos com quatro ASIs atuando comigo nessa sala.

A parceria com eles foi diferente. Os atendimentos educacionais aos alunos ocorriam no contra turno da sala regular e em pequenos grupos de crianças, com, em média, uma hora e trinta minutos de duração. Os ASIs ajudavam-me a confeccionar material, conduzir os alunos nos diversos ambientes escolares, trocar fraldas e em outras ações. Foram grandes parceiros de trabalho. Àquela época, não conseguia imaginar minha atuação na sala de recursos multifuncional sem a presença deles. Era de fato eu quem pensava as ações e eles me ajudavam a executá-las. Sozinha, com grupos de seis crianças com transtorno do espectro autista, por exemplo, eu não conseguiria fazer o que estava previsto.

Em 2012, deixei a sala de recursos multifuncionais para atuar como PAEI, realizando o serviço itinerante de assessoria em educação inclusiva em quatro escolas, com quarenta e quatro alunos com deficiência incluídos em salas regulares, nas quais lecionavam trinta e oito professores. Somavam-se a isso treze gestores de tais escolas, diversos profissionais clínicos que atendiam os alunos, alguns professores de Educação Física, além de monitores de informática, das famílias dos alunos e dos professores que realizavam o atendimento em sala de recursos multifuncional, compondo a rede de apoio. E mais oito ASIs.

A cada ida minha às escolas dava-me conta de um fenômeno: quem respondia mais questões sobre os alunos com deficiência eram os ASIs. No processo de escolarização, eles eram a grande referência e eram percebidos como essenciais pelas equipes gestoras e docentes. Ouvi, por diversas vezes, que sem eles seria impossível incluir as crianças com deficiência. Em 2013, com a mesma proposta de trabalho, os ASIs passaram a ser

denominados Agentes de Inclusão Escolar – AIEs, nomenclatura estabelecida pela gestão da

Secretaria de Educação para a entrada desses profissionais, por meio de concursos públicos, em 2011 (iniciando em 2013).

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tem base legal, mas ela estipula tão somente sua presença, sem informar (ou mensurar) o tempo junto ao aluno ou, ainda, os critérios para a indicação de sua presença.

Desta forma, fazem-se necessárias pesquisas para compreender como a atividade exercida por esses profissionais são por eles significadas. Essa compreensão possibilitará uma atuação mais bem qualificada, que beneficiará o processo de inclusão escolar no município de Santo André. Essa pesquisa busca, de uma forma mais abrangente, analisar os sentidos e significados que um AIE constitui para sua atuação profissional. Para essa análise, o proposto é seguir o trabalho de Aguiar e Ozella (2006, 2013) e Aguiar, Soares e Machado (2015), de modo que, como outras pesquisas na vertente da psicologia sociohistórica, a intenção é apreender os sentidos e significados constituídos na e pela atuação do AIE em sala de aula.

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2. EDUCAÇÃO ESPECIAL COMO MODALIDADE DE ENSINO E EDUCAÇÃO INCLUSIVA PROPONDO UMA EDUCAÇÃO PARA TODOS E TODAS

2.1 Política pública: esfera federal

Para compreender o papel desempenhado pelo agente de inclusão escolar – AIE no município de Santo André, na grande São Paulo, é necessário discorrer sobre Educação Especial e sobre Educação Inclusiva. Primeiramente, a Lei 9394/96, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) reza que a Educação Especial é uma modalidade de Educação oferecida preferencialmente no sistema regular de ensino, que compreende toda a rede que oferece serviços de apoio, como o atendimento educacional especializado. A rede de apoio e os serviços de apoio foram organizados pela Resolução do Conselho Nacional de Educação/ Câmara de Educação Básica número 2/2001 (BRASIL, 2001) com a função de complementar, suprir e, por vezes, substituir o serviço educacional comum, sempre no intuito de garantir uma educação que promova o desenvolvimento dos alunos com necessidades educacionais especiais, descritos da seguinte forma pela Resolução:

Art. 5º Consideram-se educandos com necessidades educacionais especiais os que, durante o processo educacional, apresentarem: I - dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares, compreendidas em dois grupos: a) aquelas não vinculadas a uma causa orgânica específica; b) aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências; II – dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais alunos, demandando a utilização de linguagens e códigos aplicáveis; III - altas habilidades/ superdotação, grande facilidade de aprendizagem que os leve a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes.

Art. 6º Para a identificação das necessidades educacionais especiais dos alunos e a tomada de decisões quanto ao atendimento necessário, a escola deve realizar, com assessoramento técnico, avaliação do aluno no processo de ensino e aprendizagem, contando, para tal, com: I - a experiência de seu corpo docente, seus diretores, coordenadores, orientadores e supervisores educacionais; II - o setor responsável pela educação especial do respectivo sistema; III – a colaboração da família e a cooperação dos serviços de Saúde, Assistência Social, Trabalho, Justiça e Esporte, bem como do Ministério Público, quando necessário. (BRASIL, 2001)

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Educação/Secretaria de Educação Especial em 2008, denominado Política Nacional de

Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva – PNEEPEI – documento que é

marco histórico e que reformula e aprimora a Resolução acima citada:

A Educação Inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos que conjuga a igualdade e a diferença como valores indissociáveis e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas de produção da exclusão dentro e fora da escola. Ao reconhecer que as dificuldades enfrentadas no sistema de ensino evidenciam a necessidade de confrontar as práticas discriminatórias e criar alternativas para superá-las, a educação inclusiva assume espaço central no debate acerca da sociedade contemporânea e do papel da escola na superação da lógica da exclusão. A partir dos referenciais para a construção de sistemas educacionais inclusivos, a organização de escolas e classes especiais passa a ser repensada, implicando uma mudança estrutural e cultural da escola para que todos os alunos tenham suas especificidades atendidas. (BRASIL, 2008)

O documento PNEEPEI, ao abordar ―especificidades atendidas‖, não faz referência e não especifica se as mudanças estruturais ou culturais incluem a presença de um profissional de apoio para os alunos com deficiências nas salas de aulas.

Como este é um trabalho que adota a perspectiva sociohistórica, é importante ressaltar que a prática educacional vygotskiana, voltada para alunos com deficiência, pauta-se na compreensão do autor a respeito do desenvolvimento humano. De fato, ele considerava que é papel da psicologia estudar o desenvolvimento humano e destacava peculiaridades do desenvolvimento de alunos que, em seu contexto histórico, poderiam ser alvo do olhar constituído pela sociedade, que denomina os seres humanos como ―normais‖ e ―anormais‖.

Vygotski não faz distinção quanto ao desenvolvimento ontogenético (desenvolvimento do indivíduo) de alunos com ou sem deficiência. Sendo assim, ele considera que a vida social desempenha um fator determinante no desenvolvimento. As limitações orgânicas dos sujeitos são consideradas primárias e as funções superiores, mediadas pelo pensamento, são consideradas secundárias. Por isso, justifica-se a diferenciação nas abordagens terapêuticas e pedagógicas, uma vez que a última deve levar em conta a não homogeneização do ensino e as diferenças individuais que constituem os sujeitos aprendizes. O ―investimento‖ na atuação pedagógica para alunos com deficiência deve primar pela elaboração das funções mentais superiores, constituídas no meio social, ou seja, a escola, a família e a comunidade são constituintes da linguagem, do pensamento e da aprendizagem.

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sociais, que privam a criança de conviver com crianças com um aparato cognitivo formado por funções psicológicas superiores ricas e variadas.

A legislação brasileira, também por meio do PNEEPEI, entre outros documentos legais, especifica o que entende por deficiência.

Consideram-se alunos com deficiência àqueles que têm impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que em interação com diversas barreiras podem ter restringida sua participação plena e efetiva na escola e na sociedade. Os alunos com transtornos globais do desenvolvimento são aqueles que apresentam alterações qualitativas das interações sociais recíprocas e na comunicação, um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. Incluem-se nesse grupo alunos com autismo, síndromes do espectro do autismo e psicose infantil. Alunos com altas habilidades/ superdotação demonstram potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotricidade e artes. Também apresentam elevada criatividade, grande envolvimento na aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu interesse. (BRASIL, 2008)

A Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que tem valor de emenda constitucional, em 2009, no seu artigo 24 trata da Educação e, entre diversas

considerações, diz que ―medidas de apoio individualizadas e efetivas sejam adotadas em

ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena‖. Há aí mais uma indicação para efetivar e justificar a presença do profissional que colabora e dá assistência ao aluno com deficiência.

Nas Orientações para Implementação da Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2015) encontram-se orientações do Ministério da Educação, assim como notas técnicas, pareceres, portarias e resoluções que permeiam a pesquisa relativa aos profissionais que dão apoio aos estudantes com deficiência. Consta no documento:

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Em 6 de julho de 2015 entra em vigor mais uma lei federal que traz nomenclaturas similares ao papel desempenhado pelo AIE no município de Santo André. Mais uma que mostra uma preocupação da sociedade que implica políticas públicas para pessoas com deficiência, em âmbito escolar. Porém as nomenclaturas constam nas Disposições Gerais (não constam na parte específica que trata da Educação). Diz a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (2009):

XII - atendente pessoal: pessoa, membro ou não da família, que, com ou sem remuneração, assiste ou presta cuidados básicos e essenciais à pessoa com deficiência no exercício de suas atividades diárias, excluídas as técnicas ou os procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecidas;

XIII - profissional de apoio escolar: pessoa que exerce atividades de alimentação, higiene e locomoção do estudante com deficiência e atua em todas as atividades escolares nas quais se fizer necessária, em todos os níveis e modalidades de ensino, em instituições públicas e privadas, excluídas as técnicas ou os procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecidas;

XIV - acompanhante: aquele que acompanha a pessoa com deficiência, podendo ou não desempenhar as funções de atendente pessoal. (BRASIL, 2009)

A seguir mostraremos como o que foi demonstrado na primeira parte deste capítulo influenciou e transformou políticas públicas na rede de ensino de Santo André, bem como suas articulações para assegurar a presença do profissional de apoio escolar/agente de inclusão escolar.

2.2 Política pública: esfera municipal

A história do profissional de apoio às demandas dos alunos com deficiência em Santo André tem início no ano de 2007. Na falta de documentos que comprovem como essa história foi constituída, recorremos, além dos poucos registros escritos (edital de concurso público e o Projeto Político Pedagógico das escolas, por exemplo) à uma entrevista (APÊNDICE D) com

a gerente do setor responsável – CADE, que esteve à frente da Gerência de Educação

Inclusiva nos anos de 2002 até 2008, retornando ao cargo de gerente em 2013, onde permanece até a conclusão dessa pesquisa.

Segundo a gerente ―(...) as pessoas já aceitavam as pessoas com deficiência dentro da

sua sala de aula, mas elas queriam melhores condições para atuar com esse aluno (...)‖. Na

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precisa utilizar o banheiro, a professora não teria como deixar a sala sozinha para acompanhá-lo. Assim, a gerente ressalta: ―Mas nunca houve a ideia, nunca houve a ideia de ser alguém

que pudesse tomar o lugar dessa professora no trato com esse aluno. Nunca!‖.

A primeira nomenclatura utilizada para reportar-se ao profissional de apoio, em 2007, foi agente social de inclusão ASI. O perfil desses profissionais, que não entraram por concurso público e sim por análise de curriculum, era de um profissional que tivesse pelo menos o ensino médio completo e experiências prévias na área da saúde, ou na área da educação ou em ambas. Tiveram formação inicial e encontros periódicos também formativos.

A ideia inicial era ter um ASI por escola. Atualmente há escolas com dois ou mais profissionais de apoio.

Em 2011 a Prefeitura Municipal divulgou um edital de concurso público para contratação de novos profissionais de apoio, com nova nomenclatura: agente de inclusão escolar. O edital número 08/2011 indica que há 64 vagas para o cargo (60 gerais e 4 para pessoas com deficiência), com jornada semanal de 40 horas, salário de R$ 1519,03 e a prova objetiva constava com questões de conhecimento básico (Português e Raciocínio Lógico), conhecimentos de informática (Word e Excel) e conhecimentos específicos com a seguinte bibliografia:

 Lei Federal n.º 8.069/1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente (Livro I:

Título I, Título II arts 7º a 24 e 53 a 59 e Livro II: Título I, Título II e Título III);

 BRASIL. Ministério da Educação. Política Nacional de Educação Especial na

Perspectiva da Educação Inclusiva – PNEEPEI

 FAVERO, Eugênia Augusta Gonzaga. Direitos das Pessoas com Deficiência:

Garantia de Igualdade na Diversidade. Rio de Janeiro: WVA, 2004.

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3. REFERENCIAL TEÓRICO: A PERSPECTIVA SOCIOHISTÓRICA

Este estudo soma-se a outros estudos que se pautam na Psicologia Sociohistórica, na tentativa de compreender um sujeito em sua história, além das relações por ele estabelecidas com o mundo social. De forma contínua, essa perspectiva afirma que o fenômeno psicológico não tem sua gênese no biológico e, sim, nas relações estabelecidas com o mundo. O processo psíquico constitui-se socialmente e, ao mesmo tempo, forma o social.

Lev Semenovich Vygotski inicia esta vertente da Psicologia na antiga União Soviética, nas décadas iniciais do século XX. Insatisfeito com as explicações dadas à época para a consciência e a conduta humanas, retomou a teoria de Marx e Engels, proposta no século anterior, relembrando que o homem é constituído pelo lugar que ocupa nas relações sociais e por suas condições materiais. Sendo assim, alguns dos pressupostos centrais da abordagem vygotskiana são os seguintes:

 Todos os fenômenos devem ser estudados como processos em permanente movimento e transformação.

 O homem constitui-se e transforma-se ao atuar sobre a natureza com sua atividade e seus instrumentos.

 Não se pode construir qualquer conhecimento a partir do aparente, pois não se captam as determinações que são constitutivas do objeto. Ao contrário, é preciso rastrear a evolução dos fenômenos, pois estão em sua gênese e em seu movimento as explicações para sua aparência atual.

 A mudança individual tem sua raiz nas condições sociais de vida. Assim, não é a consciência do homem que determina as formas de vida, mas é a vida que se tem que determina a consciência. (BOCK, 2002, p. 87)

Esta teoria supera a concepção de que o sujeito traz, desde o nascimento, aptidões que podem vir a ser desenvolvidas ao longo dos anos e na vida adulta. Postulando que nada há no mundo social que seja natural, a proposta é entender quais são as possibilidades que esse sujeito teve no decorrer de sua vida para constituir-se como tal. Pode-se, então, afirmar que o ser humano não nasce humano; ele aprende a ser humano com outros seres humanos, de modo que se é diferente pela afiliação a grupos sociais distintos e a depender do acesso que se tem à cultura humana. E cultura, nessa perspectiva, é aquilo que os seres humanos criaram ao longo da história, tanto no aspecto material, quanto no aspecto não material.

Na vida humana, tudo é movimento, de modo que nada é perene. As condições de vida do ser humano podem, portanto, ser modificadas. Os conhecimentos e a cultura produzidos

pela humanidade são acumulados e ―transmitidos‖ de geração em geração, o que constitui a

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por Vygotski como uma ―atividade especificamente humana, conscientemente orientada, que só se tornou possível no âmbito das relações sociais e emergiu na história dessas relações [...]‖ (2009, p. 11). Cada nova geração de humanos aperfeiçoa e transforma as condições de trabalho; as crianças e os adultos acumulam experiências em conjunto com outros humanos. O processo de desenvolvimento está tão intimamente ligado ao aprender que se pode mesmo dizer que é a aprendizagem que dirige o desenvolvimento, pois o impulsiona, situação que permite novas aprendizagens que impulsionarão mais uma vez e sempre o desenvolvimento, abrindo espaço para outras aprendizagens. Ora, aprender é um processo socialmente mediado, que se dá, em geral, na parceria com sujeitos mais experientes. A aprendizagem pode se dar mediante o ensino, que evidencia uma intenção educativa, ou por meio da experiência direta da criança, sem o auxílio de um par ou um adulto mais avançado nesse processo.

O processo de ensino-aprendizagem assegura e possibilita a história. Assim, pode-se dizer que é por meio da Educação que se conta com a possibilidade de acessar a cultura historicamente acumulada. Família, professores e parceiros mais experientes têm um papel determinante nesse processo. São eles que medeiam a relação da criança com o mundo, permitindo-lhe o sentido, o significado e o uso social dos objetos da cultura. Ao apropriar-se paulatinamente de sua cultura, por estar nela imerso, aspectos que de outra forma não surgiriam acabam por se desenvolver, como é o caso da linguagem, da memória voluntária, da autorregulação da conduta, entre tantos outros. Essa apropriação da cultura ocorre nas e pelas interações sociais, organizadas em atividades práticas humanas. Assim, o bebê humano encontra um mundo já constituído ao nascer e, quando dele se apropria, constitui seu plano interno (ou seu psiquismo): torna-se humano. Esse processo de constituição do humano deve-se ao que Vygotski denomina de processo de internalização.

Em situações escolares, cada aluno conta com parceiros mais experientes (os professores e demais profissionais da educação), que ―garantem a apropriação‖ do saber escolar (e auxiliam a possibilidade de criação), uma versão do conhecimento produzido pelo conjunto da humanidade. Ao aprender, funções psicológicas superiores são constituídas, promovendo os aspectos cognitivos que, por sua vez, têm por base aspectos volitivos. Assim, o desenvolvimento mesmo da ‗inteligência‘ tem origem social, de onde se depreende que melhor será se houver condições favoráveis para tal.

(25)

[...] como aspectos do fenômeno, constituídos a partir do estudo do processo, do movimento, da gênese deste último. As categorias de análise devem dar conta de explicar o fenômeno estudado em sua totalidade. São construções ideais (no plano das ideias) que representam a realidade concreta e, como tais, carregam o movimento do fenômeno estudado, suas contradições e sua historicidade. Explicando melhor: temos no início de nosso estudo um fato empírico, que está ao alcance de nossos sentidos. No entanto, os fatos empíricos não podem ser tomados como o fim de nosso estudo, pois assim ficaríamos no nível das aparências. É preciso ir adiante e conhecer o fenômeno em sua concretude, ou seja, é preciso que o pensamento invada o fenômeno e possa desvendar relações e determinações que o constituem e que não ficam evidentes no imediato, ou seja, no nível empírico. (AGUIAR, 2001, p. 95)

Nesta pesquisa serão utilizadas as categorias contradição, historicidade, mediação, sentido e significado. A partir delas e com elas haverá a análise dos dados obtidos, objetivando apreender os sentidos e significados da atuação profissional do agente de inclusão escolar.

3.1 Contradição

Há diferentes realidades com íntimas conexões e elas constroem unidades contraditórias. Na dialética, a contradição é tida como princípio básico do movimento de existência dos seres. No contexto vygotskiano, a categoria contradição não equivale ao termo ―problema‖ ou ainda ―dúvida‖. Neste contexto, contradição, no curso do desenvolvimento da realidade, que é contraditória e dialética, refere-se a uma situação interna, mútua e antagônica. O movimento de superação da realidade se dá pela negação da negação, de modo que o novo nega o antes estabelecido, mesmo mantendo em si elementos do que foi superado, em um constante ―vir a ser‖.

Na perspectiva da psicologia sociohistórica, ―todo real é um processo que contém, sem

encerrar, o possível numa unidade de contrários‖ (CURY, 1995, p. 31). Não é possível, portanto, retirar dele entre as partes, existem tanto contradições como uniões. Os fenômenos estudados podem ser contraditórios por conterem elementos de reprodução e de transformação. Segundo o mesmo autor, tomando como exemplo a categoria contradição na Educação:

A categoria contradição é tomada, aqui, como base de uma metodologia dialética. Vista como fator do desenvolvimento da sociedade, a contradição não pode ser negada em seu movimento histórico, o que levaria a uma falsa concepção da educação, representada ―de modo linear e mecânico‖. (CURY, 1884, p. 31)

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3.2 Historicidade

Essa categoria fala do movimento constante no qual estamos, como humanos, inseridos: o homem transforma e é transformado pelas condições criadas por ele e por seus pares, ao longo da existência. Ao olhar para a realidade, nota-se que ela não é estática, que está em constante movimento. Analisando-a, é importante apreender seu movimento, ou seja, sua gênese, o processo de transformação e o caminho que ela criou. A essência do fenômeno estudado deve assim ser estudada, pois a história não se faz apenas com um fato após o outro e, sim, com fatos que têm uma gênese e um processo de desenvolvimento que lhes são constitutivos. O homem, da mesma forma, é um sujeito histórico e, como tal, sua gênese e constituição devem ser analisadas. Na perspectiva da psicologia sociohistórica, a categoria historicidade auxilia a compreensão de como a mudança, a transformação, foi se constituindo. Conforme Aguiar e Machado:

Ao discutirmos a categoria historicidade, é fundamental reconhecermos, ainda, apoiados em Vygotski, suas duas dimensões, dialeticamente ligadas, sendo que uma constitui a outra como ―dialética geral das coisas‖, no seu sentido geral, e como a ―história humana‖, no seu sentido restrito. (AGUIAR; MACHADO, 2012, p. 30)

As condutas humanas são determinadas pela cultura e pelos ambientes sociais nos quais o homem vive sua história. Ao utilizar a categoria historicidade, buscamos considerar as falas do sujeito como históricas, além de permitirem apreender as significações nelas contidas. A linha teórica que sustenta essa pesquisa objetiva explicar a realidade concreta do sujeito pesquisado, tendo como ponto de partida a lógica dialética.

A historicidade é um movimento marcado por contradições e não considerá-la dessa forma, é entender os movimentos de forma cristalizada. No caminho, na trajetória do sujeito e da humanidade, há elementos históricos que não podem ser negados.

3.3 Mediação

Para Saviani (2015, p. 26) a ―mediação é uma categoria central da dialética que, em

articulação com a ‗ação recíproca‘, compõe com a ‗totalidade‘ e a ‗contradição‘, o arcabouço

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que, sendo um processo dialético, não é linear e imediato. Essa categoria é útil, quando se trata de apreender os sentidos e significados constituídos por alguém, levando à compreensão das relações contidas no pensamento, que se concretizam na fala.

Segundo Aguiar e Ozella (2013, p. 302), o sujeito é um ―ser social e singular, síntese de múltiplas determinações, que constitui sua singularidade nas relações sociais (universal),

por meio das mediações sociais (particularidades/ circunstâncias específicas)‖. Sendo assim, a

particularidade atua como mediação, que é o que organiza — e não apenas relaciona de forma

direta — o singular e o universal. Sem que se considere a particularidade, os sentidos e significados não podem ser compreendidos. Oliveira expressa bem essa ideia:

Ora, a importância da particularidade (na relação singular-particular-universal) na análise de um determinado fenômeno está no fato de que ela se constitui em mediações que explicam os mecanismos que interferem decisivamente no modo de ser da singularidade. A cuidadosa identificação e caracterização da particularidade é condição "sine qua non" para compreender-se como se dá essa concretização da universalidade no vir-a-ser da singularidade. Somente dessa forma é possível a aproximação do pensamento ao ser concreto da realidade em movimento, ao movimento processual da tensão entre a universalidade e a singularidade mediada pela particularidade. (OLIVEIRA, 2005, p. 48)

A constituição do humano não seria possível sem a mediação, pois o homem não nasce homem: ele se torna homem pela mediação dos grupos sociais em que está inserido. Sentir, agir e pensar no mundo perpassam as relações estabelecidas no e pelo mundo, pois o sujeito é ele mesmo uma unidade de contrários, expressão tanto do social como do individual, apropriadas nas e pelas interações estabelecidas em sua sociedade. A sociedade, portanto, medeia conhecimentos.

3.4 Sentidos e Significados

Para entender os sentidos e significados, recorremos à Vygotski (2001), para quem

sentido se refere a ―um agregado de todos os fatos psicológicos que surgem na nossa

consciência, como resultada da palavra‖, enquanto o significado é produzido pela história, de modo que são compartilhados, permitindo a comunicação humana e colaborando na constituição do psiquismo. Aguiar e Ozella (2006) norteiam o entendimento dessas categorias:

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constitui a articulação dos eventos psicológicos que o sujeito produz frente a uma realidade. (AGUIAR; OZELLA, 2006, p. 227)

Como os significados são compartilhados socialmente, há um movimento quando o sujeito dele se apropria, pois, quando isso ocorre, imprimem-se nos significados as experiências e os conhecimentos individuais, constituindo sentidos (individuais). Como a fala representa o sujeito e o sentido, objetivado na fala, expressa o pensamento do indivíduo, pode-se dizer que o sentido aponta a subjetividade do sujeito. Como afirmam Aguiar, Liebesny, Marchesan e Sanchez (2009) ―[...] falar de sentidos é falar de subjetividade, da dialética afeto/ cognição, é falar de um sujeito não diluído, de um sujeito histórico e singular ao mesmo tempo‖.

(29)

4. MÉTODO

4.1 Bases teórico-metodológicas

A intenção desta pesquisa é produzir conhecimentos acerca da atuação de um profissional de apoio aos alunos com deficiência. No caso do município estudado (Santo André), esses profissionais são denominados agentes de inclusão escolar (AIE). A partir dos pressupostos da psicologia sociohistórica, serão utilizados procedimentos deles decorrentes, que se apoiam no materialismo histórico e dialético, origem desses pressupostos. Com isto, será possível por meio da análise, alcançar aproximações que permitam compreender melhor esse sujeito social, estudando em especial, suas condições objetivas e subjetivas de vida:

A postura teórica e metodológica da PSH permite, assim, afirmar que serão os sujeitos, personagens deste espaço, aqueles que revelarão, a partir de sua subjetividade - de sua biografia social e historicamente constituída - e por meio de seus sentidos e significados, a realidade social e institucional da escola. (AGUIAR; DAVIS, 2012, p. 187)

Nas obras vygotskianas, o método tem um papel fundamental para conceber e orientar pesquisas. Pautando-se em uma concepção de homem que transforma a natureza e é por ela transformado, entende-se que, para apreender um fenômeno, é necessário que a investigação e a análise levem em conta que ―o método é, ao mesmo tempo, pré-requisito e produto, o instrumento e o resultado do estudo‖ (VYGOTSKI, 1991). Como a presente investigação segue uma abordagem qualitativa, supõe-se que o pesquisador investigue o contexto para, em um processo permanente de reflexão, orientado pela teoria, possa encontrar respostas, ainda que provisórias, para o problema estudado:

A pesquisa qualitativa também envolve a imersão do pesquisador no campo de pesquisa, considerando este como o cenário social em que tem lugar o fenômeno estudado em todo o conjunto de elementos que o constitui, e que, por sua vez, está constituído por ele. O pesquisador vai construindo, de forma progressiva e sem seguir nenhum outro critério que não seja o de sua própria reflexão teórica, os distintos elementos relevantes que irão se configurar no modelo do problema estudado. (GONZÁLES REY, 2012, p. 81)

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constituição histórica, social e cultural desse sujeitos e, ainda, entendê-los inseridos em uma rede de ensino e atuando em condições que os afetam e o modificam, de modo que, modificado, ele também afeta essa rede.

4.2 Sujeito

Os agentes de inclusão escolar que fizeram parte dessa pesquisa desenvolvem suas

ações profissionais na educação básica, atuando em Emeiefs1 (Escola Municipal de Educação

Infantil e Ensino Fundamental), atendendo, ao longo de oito horas diárias de trabalho, alunos que foram a eles designados pela PAEI. Desses AIEs, um foi selecionado para participar da pesquisa. A seleção deveu-se à indicação de uma PAEI e, ainda, em função de seu tempo de serviço e de atender a uma diversidade de alunos em diferentes áreas de deficiência (intelectual, física, auditiva, visual e transtorno do espectro autista). Trata-se de um homem que já ocupou um cargo público anterior nessa rede de ensino, de modo que ela lhe é familiar. A identidade do AIE ficará em sigilo, conforme os termos do consentimento livre e esclarecido assinado. A partir deste momento, seu nome fictício será José.

4.3 Local (escola e setor da Secretaria de Educação)

A pesquisa foi realizada em uma rede municipal de ensino (Santo André) e, mais precisamente, em um setor da secretaria de educação, que é responsável pela organização da educação inclusiva (CADE). O AIE José atua em uma Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental (Emeief). Mais dados sobre a rede municipal de ensino estarão no capítulo posterior.

4.4 Instrumentos

Foram selecionados dois instrumentos de coleta de dados: um questionário de caracterização dos AIEs e uma entrevista semiestruturada a ser realizada com um deles. O primeiro instrumento buscou investigar quem são os AIEs que atuam na rede de ensino: idade, sexo, estado civil, número de filhos, formação (médio ou técnico, graduação e pós-graduação, todos com ano de conclusão), cursos oferecidos pelo setor de trabalho na secretaria de educação, experiências profissionais, horário de trabalho, eventuais atuações paralelas, data de início no cargo, número de alunos que atende e em quais níveis da educação, bem como as deficiências apresentadas pelos estudantes. Para que os AIEs da rede

1

Apenas uma parte pequena dos AIEs exerce seu ofício em um centro público de educação de jovens e adultos. 2

(31)

municipal pudessem preencher o questionário, foi escolhido um dia de formação em serviço, data em que eles também assinaram o termo de consentimento dessa pesquisa. Já a entrevista procurou levantar a história de vida de um dos AIEs e colher seu depoimento sobre sua atuação profissional, posições perante o trabalho e opiniões relativas à atividade desenvolvida; o conteúdo foi gravado e transcrito, para posterior análise. Também foi realizada entrevista com a gerente de educação inclusiva e esta entrevista não será a entrevista contemplada para análise nos núcleos de significação. Será analisada a entrevista com José.

4.5 Procedimentos

No início da pesquisa, foi realizada uma conversa explicativa sobre objetivos do estudo com a gerente responsável pelo setor de educação inclusiva, assim como com a coordenadora deste mesmo setor e com a Professora Assessora de Educação Inclusiva que nele atuavam. Em seguida, outra conversa de mesma natureza foi entabulada com o secretário de educação, momento no qual se colheu sua autorização para coletar os dados e divulgar os resultados da análise. O próximo passo foi coletar os dados. Finalmente, a parte central dos procedimentos adotados nesse estudo foram as leituras da legislação que regula a Educação Inclusiva e sua interpretação, dos editais de concursos públicos para atribuição dos AIE na rede municipal, das atas de formação continuada, bem como a revisão de literatura. Todas essas leituras contribuíram para a tomada de decisões e certamente orientarão a análise dos dados coletados.

4.6 Referencial de análise – núcleos de significação

(32)
(33)

5. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS

5.1 Informações sobre o município

As informações deste item foram colhidas no documento Plano Municipal de Educação: Diagnóstico; elaborado em janeiro de 2015, é um instrumento para elaboração e acompanhamento das estratégias e metas do Plano Municipal de Educação - PME.

O município de Santo André tem 704942 habitantes segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2013.

A Secretaria de Educação conta no seu quadro funcional com 4425 funcionários. Há 1389 professores atuando em educação infantil, 1638 professores atuando nos anos iniciais do ensino fundamental e EJA e 279 atuando nos anos finais do ensino fundamental da EJA.

Compõem a estrutura física o seguinte número de escolas: 33 creches municipais (com 6026 alunos dos 0 aos 3 anos), 51 emeiefs (com 25620 alunos distribuídos nos anos finais da educação infantil e no Ensino Fundamental I) e 5 centros públicos de educação de jovens e

adultos – além das salas de EJA nas emeiefs (com 4728 alunos distribuídos na EJA I e na EJA

II.)

Quanto ao número de alunos com deficiência, segundo dados do município, em 2009 contava-se com 505 frequentando escolas municipais; em 2014 esse número amplia para 975. Estima-se que em 2015 esteja por volta de 1200 (informação do CADE).

5.2 Núcleos de significação e apresentação

Por meio da entrevista com José e análise da mesma constroem-se os núcleos de significação que permitem desvelar e aproximar às zonas de sentido do AIE entrevistado.

No Apêndice G há a elaboração e a apresentação dos pré-indicadores, indicadores e núcleos de significação. Foram elaborados 4 núcleos de significação a partir da análise da entrevista com José. São eles:

Núcleo 1: Trajetória pessoal – “O que a vida me ensinou com esse trabalho é

que tenho essa missão aqui na Terra, com esse trabalho com pessoa com deficiência”2

2

(34)

Núcleo 2: Atuação profissional – “No autista, é contenção, é aplicação de

atividades; no caso do cadeirante, é mobilidade, higiene, alimentação, é o que realmente eles

precisam”

Núcleo 3: Interações sociais no trabalho – “Eles não pedem para eu os ajudarem a aplicar; eles querem que eu aplique a atividade. Não tem muito essa parceria de o professor também aplicar a atividade: eles precisam do AIE”

Núcleo 4: Problemas percebidos no trabalho –“O cargo de AIE é visto errado dentro da escola”

Veremos agora o conteúdo de cada núcleo.

5.2.1 Núcleo 1: Trajetória pessoal – “O que a vida me ensinou com esse trabalho é

que tenho essa missão aqui na Terra, com esse trabalho com pessoa com deficiência”

José (nome fictício) relata, em sua entrevista, que durante a infância e a adolescência, ele e sua família passaram por dificuldades financeiras. Com a saída do pai de casa, a manutenção do lar passou a depender do trabalho da mãe que, por meio de seu salário, conseguiu oferecer gradativamente aos filhos (José tem uma irmã sete anos mais nova do que ele) melhores condições de moradia. O entrevistado percebe-se como alguém cuidador desde cedo, pois se sentia responsável por dar atenção à mãe e à irmã, uma fase de sua vida que ele considera preparatória para sua carreira como profissional da educação. O participante estabelece um paralelo entre a escola que estudou durante todo o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, que é por ele descrita como ―uma escola de bairro‖, como o é aquela em que trabalha atualmente. Nesse sentido, aproxima o perfil dos alunos que frequentam as duas instituições como bastante semelhante ao seu próprio perfil, tanto no aspecto financeiro como na constituição familiar.

(35)

Na acepção dialética desta ―historicidade‖, o homem, assim como seu produto (e sua aprendizagem é um resultado dele), deve ser analisado de acordo com o momento histórico em que vive, ou seja, considerando as influências sociais e culturais prevalecentes em sua sociedade e cultura em determinado momento de sua história individual-social. (DÍAZ, 2012, p. 68)

Em diversos momentos de sua fala, o participante refere-se à fé como algo marcante em sua vida, uma vez que diz dever-se à religião tanto a escolha da profissão como sua permanência na área da educação. José revela-se, portanto, alguém bastante místico:

“O que a vida me ensinou com esse trabalho é que tenho essa missão aqui na Terra,

com esse trabalho com pessoa com deficiência” (José)

Para o participante, ele atua profissionalmente como agente de inclusão escolar por ter algo que lhe permite auxiliar os alunos com deficiência. Segundo relatou, não está lá por acaso: trata-se de uma missão, pois estabelece conexões entre ―os planos de Deus‖ e sua colaboração na formação do aluno com deficiência. Pode-se, nesse sentido, observar que se José acredita em predestinação, o materialismo histórico-dialético considera condição humana:

Não há nada em termos de habilidade, faculdade, valores, aptidões ou tendências que nasçam com o ser humano. As condições biológicas hereditárias do homem são a sustentação de um desenvolvimento sociohistórico, que lhe imprimirá possibilidades, habilidades, valores, aptidões e tendências historicamente conquistadas pela humanidade e que se encontram condensadas nas formas culturais desenvolvidas pelo homem em sociedade. (BOCK, 1997, p.38).

A família, a comunidade, a escola e os amigos são instâncias constituintes da pessoa que hoje é José. De igual modo, a vida familiar e, ainda, a religião que lhe foi apresentada pela mãe desde sempre, foram agências formadoras do processo identitário do participante. Vale mencionar, no entanto, que a identidade se encontra em constante transformação e movimento: no decorrer da existência humana, novos grupos sociais, com suas respectivas culturas, engendram a constituição do sujeito e suas opções (dentre elas, por exemplo, a escolha profissional). Foi assim que, na convivência com uma namorada e sua família, José optou por prestar alguns concursos para conseguir um emprego, visto que o namoro estava a exigir perspectivas de futuro e de estabilidade financeira. Caso o participante fosse aprovado em um dos concursos prestados, esse problema estaria solucionado:

“Aí, eu comecei a namorar uma menina e os pais dela eram muito envolvidos com

(36)

Classificado em dois concursos, ambos na área da educação, José dá início à carreira como funcionário público. Para ele, o primeiro emprego como funcionário público permitiu-lhe construir a base necessária para exercer o segundo. E justifica essa visão com base na principal função exercida em um e no outro: cuidar de crianças, mediante as orientações de um professor. Foi assim que o participante se tornou um profissional da educação.

As novas identidades profissionais – primeiramente como auxiliar de desenvolvimento

infantil e, mais tarde, como agente de inclusão escolar – permitiram a síntese entre

objetividade e subjetividade: se as demandas dos dois ambientes escolares foram apropriadas por José, ele pode, também, objetivar seu modo de agir, pensar e sentir profissionalmente, ou seja, como se identifica e reconhece-se atuando no ambiente escolar. Novos aspectos passam a fazer parte de sua vida, como a vontade de cursar o ensino superior. José prestou vestibular em três faculdades distintas e em três cursos diferentes. Um deles ele nem chegou a começar; os outros não foram concluídos. O participante explica que isso se deveu às muitas dúvidas em relação ao seu interesse em seguir tais carreiras. Atualmente, pretende retornar ao ensino superior, mesmo não tendo solucionado a contento suas questões e sem saber ao certo qual curso deve eleger. Ao que tudo indica, ele considera estudar algo relacionado à sua atuação profissional atual, mesmo que o título não lhe assegure qualquer aumento em sua remuneração salarial, já que isso não estava especificado no edital de seu concurso.

Segundo Silvio Bock (2002) ―a melhor escolha profissional é aquela que consegue dar conta do maior número de determinações para, a partir delas, construir esboços de projeto de vida profissional e pessoal‖. A experiência acumulada em um determinado trabalho auxilia a tomada de decisões, pois a escolha e a permanência em uma profissão são modos de intervir no mundo e, eventualmente, de permanecer ou mudar de nível socioeconômico. O curso superior, para José, é uma maneira de aproximar-se da área da educação, de alcançar um

maior conhecimento teórico a respeito daquilo que faz – indicando que o participante aprecia

(37)

5.2.2 Núcleo 2: Atuação profissional –“No autista, é contenção, é aplicação de

atividades; no caso do cadeirante, é mobilidade, higiene, alimentação, é o que

realmente eles precisam”

Conforme já relatado na análise do núcleo 1, José inicia sua atuação profissional como agente de inclusão escolar por ter sido aprovado em concurso público e ter sido chamado para trabalhar. Antes, ele atuou como agente de desenvolvimento infantil, cargo que demandava dele funções semelhantes. Neste núcleo serão analisadas as atuações profissionais do participante, segundo sua ótica. De início, ele menciona que, mesmo tendo lido várias vezes o edital do concurso, não ficou clara a natureza da tarefa que deveria desempenhar:

“[...] ficou muito vago pra mim. Mesmo lendo o edital, não compreendi bem.” (José) Na entrevista, José relata que, ao começar a trabalhar, surgiram contradições entre o que ele entende que deve fazer na escola e o que é dele esperado por outras pessoas (professores e as famílias dos alunos que atende) e por setores que, através de documentos, estipulam seu papel (PAEI, a designação dos afazeres no edital e no Projeto Político Pedagógico). De fato, a atuação profissional de José é definida mais pelas diretrizes traçadas pelas pessoas supracitadas, do que pelo PAEI e o Projeto Político Pedagógico. José percebe, no entanto, que ―falta‖ algo nas diretrizes traçadas, seja porque não há parceria dele com os demais profissionais de educação, seja porque os professores não conhecem os alunos tão bem como ele diz conhecer, seja pelo processo escolar (e histórico) vivido pelos alunos com deficiência, nessa instituição. É importante lembrar que se os alunos com deficiência se encontram em processo de inclusão, é porque eles ainda são excluídos: nesse sentido, inclusão e exclusão formam um par dialético, pois uma não existe sem a outra:

Quando falamos de inclusão escolar, referimo-nos a todas as formas possíveis por meio das quais se busca, no decorrer do processo educacional escolar, minimizar os processos de exclusão, maximizando a participação do aluno no processo educativo e produzindo uma educação consciente para todos, levando em consideração quaisquer que sejam as origens e barreiras para o processo de aprendizagem. (SANTOS, 2008, p. 17)

(38)

próprio sistema educacional deixam de fazer ou não sabem como fazer. As atribuições previstas encontram-se, consequentemente, em um contínuo processo de transformação, uma vez que dependem das demandas postas pelo ambiente escolar, as quais, por sua vez, são definidas pelas lacunas que a escola precisa sobrepujar. Daí José dizer que:

“Acredito que o AIE, o que ele deveria fazer na escola, é ter o olhar mesmo, estar ali para o que precisar.” (José)

Vejamos o que previa o concurso público 08/2011 da Prefeitura Municipal de Santo André, quanto às atribuições do agente de inclusão escolar:

 Oferecer suporte a professores e alunos do ensino regular com foco no

processo de inclusão, inclusive:

 Auxiliar a mobilidade do aluno de acordo com suas especificidades (cadeiras

de rodas, andador, muleta, bengalas, etc.);

 Efetuar troca de fraldas e roupas, acompanhamento ao banheiro, higiene bucal,

banho quando necessário;

 Auxiliar na alimentação, supervisionando os alunos de acordo com suas

especificidades;

 Acompanhar as atividades pedagógicas frente ao processo de inclusão

educacional mediante orientação do professor (atividades classe e extraclasse);

 Executar quaisquer outras atividades que, por sua natureza, estejam inseridas

no âmbito das atribuições pertinentes à área.

O entrevistado acrescenta a este rol mais uma função: a de conter os alunos com deficiência. Durante a entrevista, por diversas vezes, ele menciona momentos em que é preciso estabelecer com um aluno uma relação ―um a um‖, cabendo ao AIE segurá-los, ampará-los, mantê-los sentados e levá-los a prestar atenção nas atividades escolares.

“Para o T. (aluno) seria contenção, evitar que ele fuja, que saia da rotina da escola, do que é apresentado para ele, aplicar atividades com o T., aplicar atividades com o P. (aluno) Como eu falei, como eles são muito hiperativos, não têm foco. Realmente, seria bom se pessoas auxiliassem aquela atividade a acontecer. Seria isso mesmo: auxiliar a realizar”

(José)

(39)

um grande número de alunos que, possivelmente, não se enquadram no perfil de aluno com deficiência definido no edital, ou seja, aquele que precisa de apoio ou ajuda nas atividades de vida diária (higiene, alimentação e mobilidade). Segundo os dados do questionário conta-se, por exemplo, com 11 alunos na rede municipal de ensino que apresentam, baseando-se em diagnósticos da área da saúde, transtornos funcionais específicos, como Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), Transtorno Opositor Desafiador e um citado apenas como ―transtorno‖. Mas quais são as necessidades de apoio à higiene, alimentação e mobilidade que tais alunos teriam? Com esses estudantes, o que cabe como função do agente de inclusão escolar? Como podem ―acompanhar atividades pedagógicas‖, se o exercício do cargo não requer formação em pedagogia?

José relata que, durante sua jornada de trabalho, ele acompanha um aluno que tem paralisia cerebral, deficiência intelectual e transtorno do espectro autista. De acordo com o relato apresentado, o aluno não usa fralda, alimenta-se sozinho e não enfrenta nenhuma dificuldade de mobilidade. Fica implícito, assim, que o agente de inclusão escolar está acompanhando o aluno basicamente para mantê-lo junto à turma (ano/série que frequenta), para atuar como seu parceiro nas duplas que se formam durante as atividades escolares. O aluno não interage, portanto, com seus companheiros de sala: José permanece junto ao aluno com deficiência durante todo o período em que ele fica na escola. O participante deixa explícito, em sua fala, que só se justifica a carga horária reduzida na escola dos alunos com deficiência porque há a compreensão de que eles só podem nela ficar se acompanhados por um agente de inclusão escolar que, no final, acaba sendo a pessoa que deles cuida e por eles se responsabiliza.

“[...] eu passo o tempo todo sentado ao lado deles” (José)

(40)

Nos indicadores do núcleo 2, nota-se uma diferenciação entre as tarefas designadas ao agente de inclusão escolar e as que ele se propõe a fazer, por sua própria iniciativa:

“Tem, no meu lado pessoal, de eu não encarar só aquilo que me foi atribuído, dentro

do que faço, de não ficar só olhando o mínimo” (José)

Mais uma vez, fica claro o envolvimento afetivo de José com os alunos e sua tentativa de suprir as necessidades que eles apresentam no âmbito educacional. O participante se diz feliz com a profissão, satisfeito com o salário (por volta de dois salários mínimos) e vê vantagens no cargo exercido. Vale aqui ressaltar que a profissão de AIE ainda não é regulamentada: o Projeto de Lei nº 2880/2008 está em trâmite na câmara dos deputados para definir a profissão de ―cuidador‖:

Parágrafo único – Considera-se Cuidador, o profissional responsável por cuidar da pessoa doente ou dependente, facilitando o exercício de suas atividades diárias, tais como alimentação, higiene pessoal, além de aplicar a medicação de rotina e acompanhá-la junto aos serviços de saúde, ou outros requeridos no seu cotidiano, excluindo, para tal, técnicas ou procedimentos identificados como exclusivos de outras profissões legalmente estabelecidas. (BRASIL, 2008)

Como citado aqui, em capítulo anterior, no município pesquisado, o nome dado ao ―cuidador‖ é agente de inclusão escolar, mas há outras denominações, todas elas referindo-se a pessoas que, no território nacional, desenvolvem essa mesma função: tutor, agente de apoio, auxiliar de vida escolar, entre outras. Delimitar essa atuação profissional pode ser muito difícil, talvez por ser uma novidade tanto para quem propõe o serviço, quanto para quem o executa.

Reportando-se à questão relativa ao gênero, José é um homem atuando em um ambiente predominantemente feminino, algo que aparece continuamente em todo o seu discurso, durante a entrevista. Na rede em que atua, o participante está entre os 20 AIE homens, de um total de 53. Desse modo, além de atuar em uma área nova e de ter que aprender as tarefas que deve desempenhar, é preciso lidar com os relacionamentos afetivos dentro e fora da escola, com preconceitos relativos ao seu papel, em geral exercido por mulheres. Mas José não é minoria apenas como AIE: ele o é também na área da educação:

Podemos observar que o ingresso de educadores em uma profissão majoritariamente feminina pode modificar a experiência que profissionais, crianças e familiares vivenciam nas diferentes instituições, porque o ritual e a cultura existentes no interior da creche são alterados em alguns aspectos. (LOPES, 2010, p. 80)

Imagem

Tabela 2- Estado civil
Tabela 4 - Número de filhos
Tabela 6 - Cursos profissionalizantes
Tabela 9 - Ano de conclusão do ensino médio
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Referências

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