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O papel do Fórum de Macau no posicionamento geoestratégico da República Popular da China nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa:Relações de cooperação entre a República Popular da China e a República de Moçambique

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O papel do Fórum de Macau no

posicionamento geoestratégico da República

Popular da China nos Países Africanos de

Língua Oficial Portuguesa:

Relações de cooperação entre a República Popular da

China e a República de Moçambique

Sofia Dias Ramos

Orientador: Prof. Doutor Carlos Manuel Piteira

Dissertação para obtenção de grau de Mestre Em Estratégia

Lisboa

2017

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A presente dissertação foi financiada pela Bolsa para “Estudos sobre Macau”, concedida pela Fundação Macau

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Índice

CAPÍTULO I – Introdução p. 4

1.1. A iniciativa “One Belt One Road” p. 4

1.2. O eixo China-África p. 6

1.3. Geopolítica africana p. 7

1.4. Enquadramento de Macau na política externa chinesa p. 9

1.5. O foco China-PLP p. 10

1.6. O triângulo China – Fórum de Macau – PALOP p. 12

CAPÍTULO II – Enquadramento temático e metodológico p. 12

2.1. Objecto de estudo p. 12

2.2. Justificação da escolha do tema p. 13

2.3. Problemática de investigação p. 16 2.3.1. Pergunta de partida p. 17 2.3.2. Objectivos de pesquisa p. 17 2.4. Revisão de literatura p. 18 2.5. Enquadramento teórico p. 20 2.6. Conceitos centrais p. 22 2.6.1. Geoestratégia p. 23 2.6.2. Soft Power p. 23 2.6.3. Diplomacia económica p. 25 2.7. Enquadramento metodológico p. 26

CAPÍTULO III – Fórum de Macau p. 27

3.1. Especificidades da RAEM p. 27

3.2. O surgimento do Fórum de Macau p. 30

3.2.1. Objectivos e estrutura organizacional p. 32 3.2.2. Conferências Ministeriais e Planos de Acção: Síntese p. 35

CAPÍTULO IV – Relações China-Moçambique p. 41

4.1. Moçambique na política externa chinesa p. 41

4.1.1. Apontamento sobre a actualidade das relações bilaterais p. 42

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CAPÍTULO V – Nota final p. 50

Referências Bibliográficas p. 55

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CAPÍTULO I – Introdução

Em 1978 Deng Xiaoping subiu ao poder e implementou uma política de abertura da República Popular da China (RPC) ao exterior, mantendo a prioridade na estabilidade política interna baseada no regime do Partido Comunista Chinês (PCC), e um conjunto de reformas económicas inovadoras, ainda que sob liberalização controlada, “de modo a que a população chinesa pudesse alcançar um nível médio de

desenvolvimento” (Cunha, 2012, p. 48) e para “conferir ao Estado uma estrutura preparada para os desafios exigidos pela modernização” (Cavalera, 2010, p. 74).

Resultado do sucesso da abertura ao exterior e das reformas económicas encetadas, o desenvolvimento económico e a modernização industrial aprofundaram-se e tomaram um ritmo cada vez mais acelerado e intenso. O país passou a sentir necessidade de procurar novos mercados suficientemente receptivos para escoar a sua abundante produção e emergiu “uma procura voraz por matérias-primas e a

necessidade de procurar recursos muito além das suas fronteiras” (Moyo, 2013, p. 13).

As transformações geopolíticas e geoestratégicas decorrentes “geraram

sinergias que conduziram a China a uma gradual integração económica no sistema global, a um aumento do protagonismo no areópago internacional e à sua afirmação como um Estado director regional” (Romana, 2005, p. 298).

Entre o final dos anos 1990 e o início do século XXI a China começou a emergir como um dos principais polos de poder mundial. Redefiniu a sua política externa e intensificou a sua presença no plano internacional. Em virtude de tudo isso, capacitou-se para uma projecção geopolítica afastada ímpar na História nacional.

A RPC iniciou então uma projecção geopolítica sem precedentes. Esta nova estratégia é preconizada pelo desejo de uma nova ordem económica e política internacional em prol “da criação dum ambiente internacional favorável às reformas

económicas em curso e a uma descompressão nas acusações ao regime” (Romana,

2005, p. 298). Para tal, o governo chinês utiliza as potencialidades económicas do país para expandir e aprofundar as relações de que necessita de manter no exterior, levando a “uma reconfiguração da balança de poderes e a um novo ajustamento do sistema

estratégico mundial” (Romana, 2005, p. 298).

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A China tem um pensamento estratégico definido, nomeadamente para a sua actuação no plano internacional. No âmbito dos objectivos de política externa para uma imagem internacional favorável e para a manutenção do progresso económico interno e da estabilidade política nacional e como meio de enquadrar o posicionamento geoestratégico para alcançar tais finalidades, o Presidente Xi Jinping propôs, em 2013, a iniciativa “One Belt, One Road” (OBOR), “Uma Faixa, Uma Rota” em português.

A iniciativa OBOR – um projecto que pretende ter impacto regional e global – tornou-se, neste sentido, a Grande Estratégia de política externa da RPC para o século XXI. Num quadro de abertura ao mundo, o país tem vindo a conceber e a implementar, em várias frentes regionais, uma estratégia baseada no exercício de soft power por intermédio da diplomacia económica, cujo foco é a cooperação e a conectividade inter-regional a fim de alcançar para a China um papel mais relevante a nível global.

Esta estratégia tem duas componentes: uma cintura económica terrestre (economic land belt) que “includes States on the “original silk road” across Central

Asia, West Asia, the Middle East and Europe” (Leandro, 2016, p. 155) e uma rota

marítima (maritime road) “that connects South China maritime facilities to the African

coast and through the Suez Canal into the Mediterranean Sea” (Leandro, 2016, p. 155).

As duas vertentes são complementares, pelo que uma não traz os resultados desejados sem a operacionalização da outra.

A criação e reforço de mecanismos de cooperação multilateral em concordância com acordos a nível bilateral e, nesse contexto, a construção de infraestruturas, ambas formas de estabelecimento de alianças e reforço de relações, constituem a base desta iniciativa. E os investimentos chineses direcionam-se para a construção destas infraestruturas de transportes e comunicações porque estas representam investimentos a longo-prazo e como tal aumentam os retornos expectáveis.

Assim, os quatro grandes objectivos da OBOR são o desenvolvimento de infraestruturas regionais, a promoção e o aumento da coordenação das políticas económicas regionais, a remoção de barreiras aos fluxos comerciais e o fomento de laços culturais como suporte e apoio à extensão e sucesso do projecto (Leandro, 2016).

De facto, o objectivo principal deste projecto é “to transform the world political

and economic regime from a single hegemony, to a multi-polar systems, to provide more space to the development of China together with others, leveraging China strengthen and influence global economic and political affairs” (Leandro, 2016, p. 176).

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com os princípios da Coexistência Pacífica e com a política de boa vizinhança assumida por Pequim, a OBOR “relates geography, infrastructure and economic power” (Leandro, 2016, p. 157) a fim de redefinir o mapa geoeconómico e as dinâmicas geopolíticas globais através de uma rede global multidimensional de infraestruturas.

Sendo uma iniciativa com dinâmicas inter-regionais, a lógica da OBOR fragmenta-se e caracteriza-se consoante as regiões e países e o respectivo valor geoestratégico que a China lhes confere, pelo que o enfoque da presente investigação é a dimensão da OBOR em relação à República de Moçambique e à zona do continente africano na qual o país se insere e o papel do Fórum de Macau nesse contexto.

1.2. O eixo China-África

A RPC tem vindo a projectar o seu poder emergente para espaços fora da sua tradicional e natural área de influência. Um desses espaços é África, continente no qual o envolvimento é “characterized not by ideological considerations but by a singular

focus on resource acquisition and comercial opportunism” (Alden, 2007, p. 8) e que,

como tal, “assume uma importância primordial numa política externa dominada pela

obtenção de recursos energéticos” (Cunha, 2012, p. 338), minerais e agrícolas capazes

de garantir a sustentação e a sustentabilidade da maior população do mundo e da segunda maior economia mundial e de permitir o apoio político por parte dos países da região para a actuação internacional chinesa.

O relacionamento sino-africano mais recente é originário dos anos 1950 do século XX, quando a Conferência de Bandung, em 1955, “lançou as bases do

movimento dos não-alinhados e a esperança de um desenvolvimento Sul-Sul” (Michel

& Beuret, 2009, p. 31) e quando a China apoiou os movimentos de libertação dos vários países africanos em relação às potências colonizadoras europeias em troca de votos favoráveis à admissão do país na Organização das Nações Unidas (ONU), em 1971, e ao seu direito de assento no Conselho de Segurança (CdS). Após isso, só no final dos anos 1980, depois do desmembramento da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), da queda do Muro de Berlim e do fim da Guerra Fria é que a China, sedenta de recursos e a necessitar de escoar a produção nacional, viria a redescobrir África.

No início dos anos 1990 o desenvolvimento económico e a modernização industrial aprofundaram-se e o seu ritmo cada vez mais acelerado e intenso começou a fazer-se sentir. Isso resultou num aumento das necessidades energéticas, industriais e

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alimentares em virtude de uma população em franco crescimento, de uma classe média em ascensão e da imperatividade de acomodação do regime político do PCC.

No início do século XXI, mais precisamente em 2006, no contexto da redefinição da sua abordagem às relações internacionais, o Governo chinês publicou o

White Paper “China’s African Policy”, dando a conhecer ao mundo os objectivos da

política externa da China para África e no mesmo ano foi firmada a parceria estratégica sino-africana. Foi então que o gigante asiático iniciou realmente a concepção de uma política africana que “visava a obtenção e controlo na fonte de recursos energéticos e

matérias-primas, o reforço dos laços políticos com os líderes africanos, e a penetração dos interesses comerciais chineses em África” (Cunha, 2012, p. 340).

A abordagem chinesa ao continente africano é uma abordagem singular na medida em que é pautada por um apelo ao passado histórico comum de subjugação ao colonialismo e imperialismo do Ocidente e pela revitalização estratégica do espírito de Bandung e, naturalmente, dos Cinco Princípios da Coexistência Pacífica: “respeito

mútuo pela soberania e pela integridade territorial; pacto de não-agressão; não ingerência nos assuntos alheios; igualdade e benefícios mútuos; coexistência pacífica”

(Michel & Beuret, 2009, p. 41). Uma estratégia marcada pelo discurso da cooperação

win-win e pela inexistência prática de condicionalidades político-ideológicas.

O continente africano tem vindo a ser negligenciado por centros de poder tradicionais como os Estados Unidos da América (EUA) e a União Europeia (UE) e a RPC definiu esse como um dos espaços nos quais é imperativo implementar uma estratégia que articula as capacidades diplomáticas e os recursos económicos do país em prol de interesses e objectivos estratégicos nacionais. Com um papel internacional cada vez mais preponderante, o gigante asiático surge como um challenger ao sistema internacional e ao equilíbrio geopolítico de África.

1.3. Geopolítica africana

Falar de África em termos geopolíticos é falar de uma região que “é ao mesmo

tempo una e plural” (Hugon, 2015, p. vii), um continente muito diversificado do ponto

de vista geográfico, histórico, económico, sociocultural. Observando todos esses factores e as relações entre si podemos concluir que “não se pode olhar para o

Continente Africano como uma entidade geopolítica única mas, pelo contrário, como um mosaico geopolítico” (Veríssimo, 2013, p. 144).

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Outrora um continente periférico, África é hoje alvo de uma maior atenção, em virtude dos efeitos da revolução das tecnologias da informação e comunicação (TIC) e do aumento da necessidade de matérias-primas (Veríssimo, 2013, p. 143), e por isso ganhou mais importância na política internacional enquanto actor geopolítico.

Actualmente, África enfrenta uma multiplicidade de desafios conjunturais e estruturais, nomeadamente ao nível das fonteiras e da etnografia, da mobilidade humana para países da região ou de fora dela (fuga a conflitos, migração económica, emigração ilegal causadora de insegurança e aproveitada pelo terrorismo internacional), do ambiente, do capital humano, dos recursos e da integração regional.

Assim, a actual ordem internacional “que impõe novos desafios ao mundo e

particularmente ao Continente Africano, também lhe oferece oportunidades”

(Veríssimo, 2013, p. 144) para definir a sua posição no quadro geopolítico global. Então, relativamente ao enquadramento geográfico do continente para a posterior análise da geopolítica africana adoptámos duas estruturas sistemáticas. Em primeiro lugar, perfilhamos a organização geográfica estabelecida pela Organização da União Africana (OUA), hoje União Africana (UA), segundo a qual o continente está dividido em cinco regiões, sendo a África Meridional – também chamada de África Austral e designada como tal daqui em diante – a região na qual Moçambique, o nosso caso de estudo, se insere (Veríssimo, 2013, p. 140).

Em segundo lugar seguimos a divisão concebida por Veríssimo (2013) que insere igualmente Moçambique no Cone Austral do continente. Nesta concepção, Moçambique, pela sua localização, assume particular importância geoestratégica pois pertence à Southern African Development Community (SADC), Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral em português, e como tal permite o acesso directo ao mar aos países integrados nessa estrutura e aos outros países que na zona não o têm. Moçambique é, pois, uma porta de entrada e saída para a África Austral e apresenta desse modo particular valor estratégico: para os países vizinhos e para actores externos com interesses na região.

Então, no contexto da sua inserção geográfica e importância geoestratégica, Moçambique, enquanto país integrado na zona da África Austral e como tal na SADC, possui “importantes recursos minerais e vegetais essenciais ao desenvolvimento” (Veríssimo, 2013, p. 156) e permite o controlo da Rota do Cabo, conferindo à região e ao país em particular elevada importância para os países que dependem e investem no comércio marítimo e nos transportes terrestres para o comércio transfronteiriço. A

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China é um desses países e é por isso que a potência asiática confere especial valor estratégico a Moçambique no âmbito da iniciativa OBOR nesta zona do continente.

1.4. Enquadramento de Macau na política externa chinesa

No quadro da iniciativa OBOR, a política externa chinesa é direccionada para vários pontos do globo, os quais interessam aos objectivos nacionais deste país. Ora, os Países de Língua Portuguesa (PLP) agregam alguns desses pontos, nomeadamente, no continente africano, os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP). Com relações diplomáticas definitivamente estabelecidas apenas desde a 2ª metade do século XX surgiu a necessidade de encontrar algo em comum que permitisse a concretização da aproximação, no início do século XXI, entre a China e os PALOP. Nesse sentido, o elo de ligação e enquadramento ideal para essa aproximação foi desde logo definido pela RPC como sendo a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM).

Depois da entrega de Macau à China por parte de Portugal em 1999 surgiu, para o Governo chinês, uma “opportunity to envisage the creation of an entity internationally

relevant and nationally integrated” (Leandro, 2016, p. 169). A região tem um elevado

grau de autonomia política e económica e como tal bastante flexibilidade em reter e manter muitos dos legados coloniais portugueses, como a língua portuguesa, a herança histórico-cultural, o sistema jurídico e os direitos civis e sociais. Essa dualidade do sistema político e económico confere então características de funcionalidade a Macau, tornando-se esta região uma atractiva plataforma facilitadora de uma maior aproximação da China aos PLP e por isso aos PALOP.

A RAEM apresenta-se assim com uma dimensão distinta das tradicionais: é um território especial administrativo não-soberano, faz parte do enquadramento do Delta do Rio das Pérolas e permite o exercício de soft power funcional no quadro da OBOR, podendo tudo isto ser explorado no âmbito da cooperação inter-regional, ainda que limitado juridicamente aos domínios da economia, comércio, finanças, transportes marítimos, comunicações, turismo, cultura, ciência, tecnologia e desporto (Lei Básica da RAEM da RPC, 1993, p. 27).

Em suma, a RPC “identificou na cena internacional um bloco geopolítico, com o

qual se quer relacionar, que tem na língua portuguesa um património comum”

(Nóbrega, 2009, p. 127): os PLP. De facto, “o mercado dos países de língua

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crescimento, a China, parecem formar um par perfeito” (Piteira, 2009, p. 95). Portanto,

escolheu estrategicamente Macau, o ponto de encontro entre as culturas oriental e lusófona, como polo facilitador das relações e atribui-lhe “o papel de plataforma de

ligação entre a RPC e a lusofonia” (Nóbrega, 2009, p. 127) para “utilizar o território como base de triangulação e intermediação de relacionamentos económicos e comerciais” (Rodrigues, s.d., p. 19) entre as partes.

Tudo isto permite, através da valorização do importante legado simbólico macaense, o alcance da triangulação Ásia-África-América Latina. Desde logo “Pequim

e o Governo da RAEM, consideraram o legado histórico de Macau como uma singularidade a preservar” (Piteira, 2009, p. 94) precisamente em prol dessa finalidade.

É nesta lógica que se concretiza, depois, a aproximação específica aos PALOP enquanto subgrupo no seio do grupo dos países participantes do Fórum de Macau.

No quadro da política externa chinesa para o século XXI e especificamente da iniciativa OBOR, Macau é portanto um instrumento complementar e de apoio ao projecto e, desde 2003, através do Fórum de Macau criado nesse ano, enquanto plataforma para a aproximação da China aos PALOP.

O futuro da região, enquadrada como parte activa no projecto da OBOR, deve então passar pelo fomento da diversificação económica para que a mesma seja cada vez mais uma plataforma de excelência de serviços para o reforço das relações de cooperação económica e comercial sino-lusófonas. Posto isto, a RAEM deve ser “a

space of trust, reliance, partaking, facilitation, dialogue, perceptions, security, cultural identity and partnership planning” (Leandro, 2016, p. 173), um espaço “on which business and services opportunities can find a long-term stand, in order to contribute to “one belt, one road” initiative” (Leandro, 2016, p. 173).

Ora, o enquadramento da RAEM e dos respectivos benefícios das características lusófonas da região na acção da RPC no plano internacional tem trazido a Pequim inúmeras vantagens no seu relacionamento com os PLP, pois que essa função “de

plataforma no relacionamento da China com o mundo lusófono atribui à RAEM um papel simbólico mas importante na política externa chinesa, como facilitadora nas negociações” (Mendes, 2013, p. 281), depois, da potência asiática com esse grupo de

países no quadro do Fórum de Macau.

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No contexto geográfico africano, o Governo chinês identificou então um grupo estrategicamente importante com o qual pretende, a longo-prazo, cooperar: os PLP. Este é um grupo de oito países oficialmente falantes da língua portuguesa: Portugal, Brasil, Timor-Leste, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Angola, Moçambique, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe (STP). A opção chinesa pelo investimento nos PLP passa pelo facto de este ser um grupo de países “suficientemente amplo para permitir o acesso a todas as

regiões nas quais a China está interessada: América Latina, África e Sudeste da Ásia”

(Alves, 2009, pp. 22-23) e ainda o continente europeu.

No seio deste conjunto de países existe o subgrupo dos PALOP, para o qual a China tem dirigido de forma estratégica, sobretudo desde o início do século XXI, uma estratégia de diplomacia económica de modo a concretizar os seus objectivos nacionais e a granjear influência para obter suporte no plano político internacional.

Quanto à RPC, enumeramos quatro razões pelas quais se interessa pelo grupo dos PALOP: para diversificar as suas importações de recursos alimentares, energéticos e minerais e matérias-primas relativamente aos fornecedores tradicionais politicamente instáveis como o Golfo Pérsico, para obter acesso a um enorme mercado de consumo compatível com os bens e a tecnologia de baixo custo que o país produz para exportação, para permitir experiências de internacionalização às empresas chinesas e para desenvolver e aperfeiçoar o soft power do país e melhorar a imagem externa, ao envolver-se na cooperação e ajuda ao desenvolvimento destes países.

Por seu lado, os PALOP mostram-se, no geral, receptivos à aproximação, presença e contributo da RPC para a economia e sociedade dos seus territórios porque “percepcionam a China sobretudo como um importador de matérias-primas e como um

parceiro de desenvolvimento” (Alves, 2009, p. 29), o que gera a revitalização das suas

economias, e porque “a China é a maior fonte de bens de consumo e de tecnologia

economicamente acessível, mais ajustada à realidade social” (Alves, 2009, p. 30) das

suas sociedades, o que eleva e melhora os padrões de vida das populações.

Ora, as economias das duas partes complementam-se: os países lusófonos africanos são detentores de valiosos recursos naturais de que a China necessita para o continuar do seu desempenho económico e desenvolvimento nacional e de alargados mercados aptos a receber os produtos chineses produzidos de forma abundante e por isso a necessitar de escoação e, por seu lado, a China detém o know-how e o capital necessários ao desenvolvimento socioeconómico estrutural dos PALOP. Foi nesta lógica que o Governo chinês criou, em 2003, o Fórum de Macau.

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Assim, no contexto da incursão geoestratégica da RPC em África, o foco China-PALOP é o segmento no qual baseámos a abordagem à problemática da compreensão do papel do Fórum de Macau nas relações de cooperação entre a RPC e Moçambique.

1.6. O triângulo China – Fórum de Macau – PALOP

A China “está a emergir como um agente influente no contexto do mundo

lusófono” (Alves, 2009, p. 31) e tem vindo tornar-se num dos parceiros mais

importantes dos PALOP. O mercado lusófono é estratégico. Macau tem um significado simbólico, político e económico “dada a particularidade com que se insere numa lógica

de legitimação da liderança da República Popular da China no contexto dos mercados lusófonos” (Piteira, 2009, p. 122) e é, para a China, a plataforma de excelência para o

estabelecimento das ligações com esses mercados. Por isso, a região tem, pelas suas características, escala suficiente para alcançar, através da valorização do seu legado simbólico, a triangulação dos mercados Ásia-África-América Latina e é, portanto, o pólo dinamizador das actividades do Fórum de Macau.

O Fórum de Macau faz, assim, numa vertente multilateral, a convergência da estratégia de diplomacia económica da China para os PLP, com o auxílio da utilitária vertente da interculturalidade que legitima as relações entre as duas partes. Permite a maximização das potencialidades de Macau enquanto elo de ligação entre a China e os PALOP, sendo um instrumento da visão estratégica global chinesa segmentada para esse grupo de países, baseada na combinação das potencialidades diplomáticas e económicas ao serviço da política externa.

Foi, portanto, com base no triângulo estratégico China – Fórum de Macau – PALOP que analisámos, através do o caso da República de Moçambique, o papel que o Fórum de Macau desempenha no posicionamento geoestratégico da RPC na Lusofonia africana, onde é executada a estratégia de soft power da política externa do gigante asiático, assente na diplomacia económica.

II. Enquadramento temático e metodológico

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O objecto de estudo deve ser clara e concisamente delimitado e deve estar enquadrado nas áreas de estudo nas quais a dissertação se insere.

O objecto de estudo da presente dissertação corresponde, assim, ao papel do Fórum de Macau nas relações de cooperação económica e comercial entre a RPC e a República de Moçambique. Nesse sentido, a presente investigação está integrada nas áreas científicas das Relações Internacionais e da Estratégia e o objecto de estudo implica abordagens à Geoestratégia, ao Soft Power e à Diplomacia Económica.

Em termos temáticos, insere-se na política externa chinesa para o século XXI. Integra-se, depois, nas relações da China com os PLP e, subsequentemente, dentro dessas, nas relações do eixo China-África. No seio do continente africano insere-se no grupo dos PALOP e em paralelo baseia-se no Fórum de Macau enquanto instrumento de acção e interacção estratégica para a aproximação aos países lusófonos africanos.

2.2. Justificação da escolha do tema

A presente investigação pretende explorar a articulação entre as relações internacionais e a estratégia e, nesse âmbito, efectuar uma abordagem, no quadro da geoestratégia, a iniciativas de diplomacia económica enquanto instrumento de soft

power. Nesse sentido, importa demonstrar a pertinência e a importância analisar o papel

do Fórum de Macau no posicionamento geoestratégico da RPC nos PALOP, concretamente nas relações de cooperação entre a RPC e Moçambique.

Em primeiro lugar, a escolha do tema reflectido na problemática prende-se com interesses pessoais pela história e evolução da política externa chinesa contemporânea e, por outro lado, com as actuais dimensões relacionais económicas entre a China e os países lusófonos do continente africano. Além disso, o interesse surge também no âmbito da recente instrumentalização da RAEM, na figura do Fórum de Macau, como vértice de ligação entre as duas partes.

Desde o início do século XXI a RPC tem vindo, no quadro da sua abertura ao mundo, a emergir como um significativo polo de poder e por isso mesmo tem vindo a tornar-se progressivamente numa potência capaz de se afirmar como tal na arena internacional. A ascensão internacional e o carácter da política externa chinesa são assim um dos principais temas nas relações internacionais contemporâneas.

No âmbito da política externa chinesa para este século merece especial destaque aquela direccionada para o continente africano. A parceria sino-africana é actualmente –

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enquanto relação de cooperação inter-regional – uma das dinâmicas mais vibrantes para analisar e procurar compreender de uma perspectiva geoestratégica.

Para reforçar e aprofundar a aproximação a estes países que possuem tanto valor geoestratégico e que podem representar um importante apoio político-diplomático para o posicionamento internacional da China, o Governo Central de Pequim tem vindo a valorizar da RAEM como elo de ligação para a legitimação do desenvolvimento das relações económicas e comerciais sino-lusófonas. Para tal, investe no Fórum de Macau enquanto instrumento complementar às relações bilaterais e disso surge a relevância em analisar as dinâmicas das relações sino-lusófonas que acontecem no quadro do Fórum, nomeadamente no caso sino-moçambicano.

Em segundo lugar surge a relevância do caso de estudo de Moçambique. O abrandamento e recessão das economias ditas mais desenvolvidas, como é o caso das economias da Zona Euro e a dos EUA, fez com que as atenções por parte de economias como a chinesa se passassem a centrar, não só mas também, na parte do mundo em vias de desenvolvimento – África, América Latina, Ásia. Os países destas regiões tornaram-se bastante atractivos pelas suas potencialidades por explorar e pela postornaram-se de recursos e produtos tão necessários ao desenvolvimento de países como a China. Por sua vez, a China tornou-se para estes países uma alternativa mais chamativa face à actual desconfiança e dificuldades colocadas por doadores tradicionais como o FMI e alguns países ocidentais (Macauhub, 2016c).

Actualmente a economia chinesa encontra-se num momento de reajustamento e reestruturação. Recentemente, o FMI reviu “em alta a sua projecção para o

crescimento anual da China em 2017, para 6,5 por cento, o que representa uma subida de 0,3 pontos percentuais em relação à previsão avançada pelo organismo em Outubro” (Fórum de Macau, 2017b, para. 1) de 2016.

Por seu lado, os PALOP “deverão ser as “estrelas” do crescimento económico

em 2017 em África” (Macauhub, 2017a, para. 1), continente em relação ao qual um

relatório do Departamento de Assuntos Económicos e Sociais da ONU prevê alguma recuperação, ainda que a continuidade e estabilidade da mesma não seja certa. De entre esse grupo de países, Moçambique, a par de São Tomé e Príncipe, registará o mais elevado crescimento do Produto Interno Bruto (PIB): 5,5% (Macauhub, 2017a, para. 2). Em Maio de 2016 foi firmado entre a China e Moçambique o estabelecimento de uma Parceria Estratégica Global, que incluiu compromissos de cooperação em diversas áreas e que teve como principal objectivo a elevação da cooperação bilateral (Portal do

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Governo de Moçambique, 2016a; Observador, 2016a, para. 2). Isto demonstra a importância e valor que a RPC atribui a Moçambique bem como as oportunidades que daí podem surgir para este país lusófono da África Austral, pois este foi o primeiro país africano com o qual o gigante asiático firmou um acordo desta natureza (Macao Magazine, July 2016, p. 45).

Moçambique é, deste modo, um dos PALOP com quem a RPC tem vindo a manter estreitas relações de cooperação. Devido às dificuldades económico-financeiras que o país actualmente enfrenta e pelo recuo de doadores tradicionais (Macahub, 2016c) face à incerteza e instabilidade decorrentes disso, este país da África Austral apresenta-se bastante receptivo à cooperação e investimento chineapresenta-ses e está, por isso, a par de Cabo Verde, “entre os países africanos mais favoráveis aos interesses económicos e

políticos da China” (Macauhub, 2016a, para. 1).

O caso de estudo da República de Moçambique revela-se assim de análise bastante pertinente no âmbito das relações de cooperação China-PALOP: tem vindo a tornar-se num dos PALOP mais importantes para a RPC bem como a RPC se apresenta cada vez mais como um dos parceiros preferenciais e essenciais para o desenvolvimento socio-económico moçambicano (Lalbahadur & Otto, 2013).

Moçambique é o quarto maior parceiro comercial da China (O País, 2017a, para. 4) e o comércio entre os dois países aumentou para 168 milhões de dólares norte-americanos (USD) em Janeiro do presente ano, “um crescimento de 2,24% em

comparação com o que se verificou em Janeiro de 2016” (O País, 2017a, para. 1). Em

2015 a China tornou-se o principal credor deste PALOP depois de o país ter visto o financiamento chinês aumentar 160% desde 2012 (Macauhub, 2015a, para. 1). E desde 2001 que a China já perdoou a Moçambique 10 verbas de empréstimos concedidos com condições preferenciais (O País, 2016a, para. 3). Entre 2000 e 2014 o apoio financeiro da China aos PALOP ascendeu a 22,6 mil milhões de USD (Macauhub, 2016d, para. 1). Nesse período, “a ajuda oficial ao desenvolvimento da China aos PALOP foi de quase

11 mil milhões de dólares, sendo Moçambique o maior beneficiário, com 6,5 mil milhões de dólares” (Macauhub, 2016d, para. 3).

Neste contexto, o Primeiro-Ministro moçambicano Carlos Agostinho do Rosário afirmou, durante a útlima Conferência Ministerial do Fórum de Macau, que Moçambique vê no Fórum “um mecanismo complementar de cooperação bilateral, que

tem contribuído para elevar, consolidar e dinamizar as relações ao nível governamental, empresarial e comercial” (MINEC, 2016a, para. 1). Além disso para

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Moçambique o Fórum funciona como uma plataforma importante para o estabelecimento de diálogo e contactos com empresários e investidores chineses e para o acesso por parte de empresas e investidores moçambicanos ao mercado chinês.

E se “the Macau Forum is not the only force behind the impressive expansion in

Sino-lusophone relations, it has certainly played a crucial role in accelerating the proccess” (Horta, 2012, p. 2). Com a criação desta forma institucionalizada de

socialização inter-regional a RPC “has established a strong position in the lusophone

world and, despite the competition, is committed to keeping it” (p. 2). Isto tem, por sua

vez, permitido a construção de uma presença estável e sólida especificamente nos PALOP e o Fórum de Macau tem sido um instrumento utilizado para essa finalidade.

Em terceiro lugar, em virtude da investigação realizada em terreno na RAEM, a presente dissertação representa ainda um potencial contributo para o continuar da definição da posição e do papel tanto da RAEM como do Fórum de Macau na estratégia nacional e política externa chinesas e, no quadro desta última, na OBOR.

Da opção pela análise do papel do Fórum de Macau no posicionamento geoestratégico da RPC nos PALOP e em específico as relações de cooperação sino-moçambicanas resulta o enfoque na dimensão económica. Nesse sentido, o foco escolhido prende-se com as dinâmicas das relações internacionais do século XXI, no seio das quais o poder económico e as potencialidades inerentes se transformaram num dos grandes activos que os Estados têm ao dispor e utilizam na defesa dos seus interesses nacionais e na busca da concretização dos seus objectivos de política externa.

A RPC é um exemplo paradigmático disso mesmo: o poder económico é colocado ao serviço dos objectivos de política externa e na presente investigação essa linha de acção é direccionada para os países lusófonos africanos. O Fórum de Macau foi um instrumento criado para auxiliar a cumprir essa finalidade, na medida em que o fomento da cooperação económica e comercial entre os países participantes é o objectivo geral deste mecanismo de cooperação trilateral.

Consideramos que este objecto de estudo, delimitado na problemática pelos conceitos de Geoestratégia, Soft Power e Diplomacia Económica, é portanto relevante e pertinente para investigação científica no âmbito das disciplinas das Relações Internacionais e da Estratégia e como contributo para estudos no âmbito das mesmas.

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No final dos anos 1990 do século XX a RPC deu início a uma política de abertura ao mundo sem precedentes, e uma das realidades em foco aquando da análise da inserção da RPC no sistema internacional desde então é a estratégia de envolvimento deste país asiático no continente africano.

No início do século XXI, a China "colocou em campo um ambicioso plano

geoestratégico para a África, numa rápida investida que apanhou desprevenidos os grandes centros de decisão ocidentais" (Cunha, 2012, p. 224), nomeadamente os EUA e

a UE, e instituições financeiras internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM). Esta ascensão geopolítica da RPC e a sua aquisição de capacidade de projecção e de competição em novos e mais distantes espaços representa um desafio para a compreensão das relações internacionais. Esta é uma realidade que, pelas questões que coloca, é de extrema pertinência para investigação científica.

A problemática corresponde, assim, à finalidade de compreender qual o papel do Fórum de Macau enquanto plataforma para a cooperação económica e comercial entre a China e os PALOP, tendo como caso de estudo a República de Moçambique.

2.3.1. Pergunta de partida

A realização de uma investigação científica implica a formulação de um problema a fim de “focalizar a atenção do investigador para o fenómeno em análise” (Coutinho, 2014, p. 49). Esse problema deve ser formulado sob a forma de pergunta, que serve para circunscrever a investigação a uma área concreta e conferir uma referência basilar para elaborar a dissertação.

Neste sentido, a presente investigação pretende responder à pergunta de partida “Qual é o papel do Fórum de Macau no posicionamento geoestratégico da República Popular da China nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa?”, abordando nesse contexto as relações de cooperação entre a RPC e Moçambique (caso de estudo).

2.3.2. Objectivos de pesquisa

Um objectivo está relacionado com finalidades que se pretendem alcançar. A definição clara e explícita dos objectivos permite, depois, que o investigador tome as melhores decisões metodológicas. Ora, como forma de clarificar as pretensões da

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investigação e da pergunta de partida que lhe dá corpo, é imperativo delinear um conjunto de objectivos de pesquisa que orientem o processo de investigação.

O presente projecto de investigação visa, como objectivo geral: “Aferir o papel do Fórum de Macau como plataforma de serviços para a cooperação económica e comercial entre a China e os PLP e verificá-lo no caso da República de Moçambique no âmbito do posicionamento geoestratégico da China face a esse PALOP da África Austral, no quadro da iniciativa OBOR”.

Este objectivo geral, de escopo amplo e abrangente, desmultiplica-se, assim, em objectivos específicos, que o desconstroem de modo a compreender como é que o mesmo deve ser atingido. Assim sendo, os objectivos específicos de pesquisa são:

• Definir a estrutura organizacional e objectivos do Fórum de Macau;

• Analisar factual e reflexivamente os compromissos assumidos pela China e pelos PLP no âmbito do Fórum de Macau até à data;

• Compreender a importância de Moçambique para a RPC e vice-versa;

• Perceber a utilidade do Fórum de Macau nas relações entre a RPC e Moçambique.

2.4. Revisão de literatura

Um dos fenómenos mais visíveis e com maior impacto nas relações internacionais do século XXI é a ascensão geopolítica da RPC e, consequentemente, o seu papel no xadrez político global. Então, o posicionamento geoestratégico da RPC em Moçambique, no quadro dos PALOP, e a estratégia de soft power assente na diplomacia económica são um objecto de estudo que origina diversas perspectivas teóricas.

Ora, acerca da natureza da estratégia colocada em prática no âmbito de uma renovada postura internacional, Cunha (2012) sintetiza a questão numa dialética composta por dois polos opostos: a tese da ameaça e a tese da ascensão pacífica.

A primeira corresponde à teoria de que a ascensão da China representa uma ameaça para a ordem internacional vigente, na medida em que a actual política externa chinesa é de carácter expansionista, que a “adesão da China aos mecanismos

multilaterais é meramente funcional” (Cunha, 2012, p. 193) e que o crescente poder

internacional chinês é um constrangimento aos pressupostos da ordem em vigor. A segunda corresponde, por seu lado, à “principal resposta estratégica da liderança

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de Deng Xiaoping da necessidade de adopção de um low profile no plano internacional, sem aspirações hegemónicas ou pretensões de liderança mundial.

Em sequência, a China projecta os seus interesses geoestratégicos para África. Alden (2007) enumera três percepções acerca do envolvimento chinês no continente africano. A China como um parceiro de desenvolvimento, em que o envolvimento “is

driven by its own economic needs, a commitment to transmit its development experience to the continent and a desire to build effective cooperative partnerships across the developing world” (p. 5). Como concorrente económico, segundo a qual “China is engaged in a short-term ‘resource grab’ which, like some Western counterparts, takes little account of local needs and concerns, whether developmental, environmental or with respect to issues like human rights” (pp. 5-6). E como um colonizador, que afirma

que “China’s new engagement in Africa is part of a long-term strategy aimed at

displacing the traditional Western orientation of the continent by forging partnerships with African elites under the rubric of South solidarity” (p. 6). Alden (2007) conclui que

a abordagem chinesa a África é demasiado complexa para esta divisão simplista e defende que essa abordagem apresenta características das três dimensões (p. 125).

Quanto à existência de um plano director e preexistente no contexto do papel e presença contemporânea da China em África, Bunkenborg (2012) defende que não existe a materialização desse plano, pois que “são as contingências na periferia em vez

das decisões preconcebidas no centro, que vão determinar a forma como a política de expansão chinesa se irá desenvolver” (p. 96). Nesse sentido, defende também que a

China se adapta às circunstâncias e aos desafios que vão surgindo e a sua abordagem vai sendo moldada e adquirindo novas formas ao longo do tempo que têm vindo a durar e a evoluir as relações sino-africanas.

No caso do investimento estratégico nos PLP, a RPC opta por este grupo porque este representa uma porta de entrada para parte do mundo em vias de desenvolvimento – como é o caso dos PALOP em África – que possui aquilo de que o país necessita para manter o progresso económico e a estabilidade política interna e continuar o desenvolvimento nacional. Então, no contexto da aproximação específica aos países lusófonos africanos, Piteira (2009) afirma que Macau propicia a concretização dos interesses estratégicos chineses de âmbito económico e comercial no mundo lusófono, nomeadamente nas ex-colónias portuguesas em África. Neste sentido, o Governo chinês decidiu, em 2003, criar o Fórum de Macau, com sede na região, enquanto plataforma de

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maior aproximação entre as partes e de reforço da cooperação económica e comercial que já acontece por via bilateral – tendo Macau como epicentro da relação trilateral.

Ainda relativamente ao papel da RAEM e do Fórum de Macau, Rodrigues (s.d.), salientando o papel crescente da diplomacia económica na política externa chinesa, afirma que o Fórum é de facto utilizado para a cooperação da China com os PLP (p. 4), e por isso com os PALOP. Nesse sentido, a China tem então “usado a herança cultural

de Macau como “ex-colónia” da República Portuguesa de forma a fortalecer a ligação com estes países” (Rodrigues, s.d., p. 16) para fazer valer os seus interesses estratégicos

nos mesmos. A autora refere a funcionalidade de Macau através da sua “capacidade em

se integrar, devido à dualidade do sistema político e económico em que está inserido, a nível global” (p. 19) e a especificidade da região, que “tem sido maximizada nos seus aspectos geoeconómicos” (p. 19). Contudo, defende que a China tem continuado a

privilegiar a via bilateral para o reforço da sua presença nos PLP (p. 20) e que isso dificulta a aferição do valor que o Fórum acrescenta às relações sino-lusófonas.

Relativamente ao caso de Moçambique, Roque & Alden (2012) afirmam que a China tem usado uma abordagem diferente comparativamente aos outros países africanos nos quais também projecta a sua influência em virtude do valor geoestratégico que Moçambique representa pela sua localização geográfica, pelos portos e recursos que este país africano possui e pela relação que mantém e tenta equilibrar, a par da cooperação e investimento chineses, com doadores tradicionais, instituições financeiras internacionais e com Organizações Não-Governamentais (ONGs).

A presente revisão de literatura e respectivo estado da arte permitiu-nos deste modo enquadrar de forma mais adequada a problemática a que a nossa questão de partida corresponde e pretende responder.

2.5. Enquadramento teórico

A presente investigação foca-se em primeiro lugar na Teoria das Relações Internacionais, designadamente numa abordagem neo-realista aos fenómenos de acção e interacção estratégica entre dois actores internacionais formalmente instituídos como tal no plano relacional externo. Em segundo lugar, foca-se na Teoria da Estratégia, isto é, na instrumentalização da diplomacia económica enquanto recursos para o exercício de

soft power no contexto da projecção geoestratégica da RPC na África Austral e

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No contexto das teorias que procuram interpretar as dinâmicas das relações internacionais adoptámos os princípios fundamentais da perspectiva neo-realista. O Neo-Realismo corresponde a uma recuperação e actualização teórica do Realismo Clássico e a uma abordagem teórico-analítica inserida na perspectiva estruturalista e racionalista da teoria das relações internacionais (Santos & Ferreira, 2012).

A base do paradigma neo-realista é, assim, a prevalência dos princípios básicos do realismo clássico e as inovações introduzidas em consequência de mudanças no ambiente relacional internacional. O neo-realismo é, pois, “um esforço de actualização

adaptativa dos princípios do realismo clássico às novas condições decorrentes das alterações verificadas no plano internacional, após 1945” (Santos & Ferreira, 2012, p.

87), nomeadamente transformações estruturais ao nível do aumento quantitativo e qualitativo de actores internacionais e das interacções entre os mesmos.

Enquanto elementos de continuidade colhidos do realismo clássico, a teoria neo-realista valoriza o princípio estatocêntrico e a racionalidade de que decorre o critério da relevância dos ganhos relativos em prol da maximização dos benefícios e da redução dos custos. Enquanto princípios inovadores, esta teoria reconhece elementos de hierarquização e ordenamento na anarquia do sistema internacional (Santos, 2014) e confere elevada importância à estrutura enquanto condicionante das acções e comportamentos dos actores nas relações internacionais e enquanto “factor

determinante dos padrões de interacção sistémica” (Santos, 2014, p. 332).

No âmbito do neo-realismo adoptámos a abordagem do realismo neo-clássico. Esta perspectiva teórica defende a necessidade de análise às percepções diferenciadas do poder, às concepções também diferenciadas do exercício do mesmo e às perspectivas distintas dos decisores sobre aspectos e objectivos da política externa pois que os recursos e os factores de poder encontram-se desigualmente distribuídos.

Segundo o realismo neo-clássico “a explicação da lógica comportamental dos

estados deverá ser procurada nos efeitos exercidos por um conjunto de variáveis não estruturais em convergência interactiva com a estrutura” (Santos & Ferreira, 2012, p.

100). Esta relação entre as variáveis não estruturais e as condicionantes da estrutura permite perceber que “os estados não têm todos os mesmos interesses nem as mesmas

perspectivas sobre o exercício do poder no plano da gestão do seu relacionamento internacional” (Santos & Ferreira, 2012, p. 101). Portanto, os Estados têm diferentes

capacidades e possibilidades de transformar o poder nacional em poder efectivo e de o exercer no contexto da sua projecção internacional.

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No contexto da Teoria da Estratégia, Ribeiro (2010) define a estratégia como sendo “a ciência e a arte de edificar, dispor e empregar meios de coação num dado

meio e tempo, para se materializarem objectivos fixados pela política, superando problemas e explorando eventualidades em ambiente de desacordo” (p. 22). Assim, a

estratégia trata de criar, organizar e utilizar os meios de coacção disponíveis, da melhor forma possível, de acordo com os princípios e regras da estratégia, de forma a alcançar os objectivos políticos fixados. O ambiente de desacordo, por sua vez, pressupõe a existência de pelo menos duas entidades estratégicas, “os actores contrários, dotados de

vontade e de capacidade, que dispõem de estruturas de comando habilitares a tomar iniciativas e a reagir às ações realizadas, de forma a negar reciprocamente a materialização de objectivos nacionais divergentes” (Ribeiro, 2010, p. 45).

Couto (1988) operacionaliza o conceito de estratégia como sendo “a ciência e a

arte de desenvolver e utilizar as forças morais e materiais de uma unidade política ou coligação, a fim de se atingirem objectivos políticos que suscitam, ou podem suscitar, a hostilidade de uma outra vontade política” (p. 209).

Também no âmbito da teoria da estratégia, Dias (2012) define a estratégia como sendo “a ciência e arte de gerar, estruturar e utilizar recursos tangíveis e intangíveis a

fim de uma organização atingir objectivos por si estabelecidos, que suscitam ou podem suscitar hostilidade de uma outra vontade ou estrutura organizacional” (p. 278).

Com base no quadro teórico acima elaborado, para a concretização do posicionamento geoestratégico da RPC nos PALOP no quadro da iniciativa OBOR, o Governo Central de Pequim investe na capitalização das potencialidades da RAEM através do Fórum de Macau enquanto plataforma para legitimar o aprofundamento das relações de cooperação económica e comercial entre a China e os PLP, tendo a República de Moçambique como caso de estudo.

Assim, no âmbito da iniciativa OBOR enquanto estratégia da política externa chinesa para o século XXI, a China investe, numa óptica realista neo-clássica, no desenvolvimento do Fórum de Macau, criado em 2003, e no reforço do seu papel enquanto plataforma de serviços para a cooperação económica e comercial entre a China e o segmento dos PLP. Isto para concretizar o posicionamento geoestratégico delineado para os PALOP, especificamente na República de Moçambique, país com importantes localização e recursos e por isso com elevada importância geoestratégica.

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2.6.1. Geoestratégia

A maioria das definições e operacionalizações conhecidas do conceito de geostratégia estabelece uma relação entre factores estratégicos e geopolíticos (Veríssimo, 2013, p. 47). Nesse sentido, Brzezinski (1997) define a geoestratégia como sendo “the strategic management ofgeopolitical interests” (p. 31).

Então, tendo em conta que está assente na tentativa de compreensão das motivações políticas do Estado baseadas nas características geográficas próprias e nas do Estado para o qual projecta o poder, segundo Ariza (2005) a geoestratégia “estudia

la influencia de la geografía desde el punto de vista estratégico, de tal manera que permita el control y/o posicionamiento físico de los espacios que den, a quien los posea, ventajas geopolíticas” (p. 92).

Por seu lado, Martins (1996) considera a geoestratégia como sendo “o estudo

das relações entre os problemas estratégicos e os factores geográficos, à escala regional ou à mundial, procurando deduzir a influência dos factos geopolíticos (económicos, demográficos, sociais, etc.) nas situações estratégicas e na consecução dos respectivos objectivos” (p. 36).

Na presente investigação, a geoestratégia corresponde, pois, à compreensão das motivações políticas de um Estado, a China, baseadas nas suas características geográficas – potencialidades, condicionamentos e imperativos,– e nas características de outro Estado – Moçambique, para o qual o primeiro projecta o seu poder em prol de objectivos de política externa estrategicamente fixados.

2.6.2. Soft Power

No actual ambiente relacional internacional os Estados passaram a actuar privilegiando formas de conflitualidade não armada, e como tal o soft power é um instrumento de exercício de poder em prol dessas estratégias de actuação.

A revolução das TIC e a globalização económica geraram o aumento e a intensificação da interdependência e interconectividade entre os actores e a desmultiplicação quantitativa e qualitativa na distribuição do poder. Este cenário identificado por Adriano Moreira como a Complexidade Crescente dos relacionamentos introduziu alterações no fenómeno da conflitualidade nas relações internacionais e os Estados passaram a actuar privilegiando formas de conflitualidade não armada.

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Tudo isto trouxe novos contornos ao fenómeno do poder. Adriano Moreira (2014) define o poder como sendo o fruto de “recursos materiais (tangible) e imateriais

(intangible), que se integram à disposição da vontade política do agente, e que este usa para influenciar, condicionar, congregar, vencer, o poder de outros agentes que lutam por resultados favoráveis aos seus próprios interesses” (p. 237). O poder ganha, assim,

novas perspectivas de aplicação enquanto instrumento de alteração de cenários e de prossecução de objectivos de entidades actuantes na cena internacional.

Para concretizar objectivos de política externa, as formas de conflitualidade não armada são hoje instrumentos de exercício de poder preferenciais nas estratégias de actuação internacional de muitos Estados. Deste modo, a utilização da economia como modalidade de exercício de poder apresenta-se como um instrumento de acção estratégica no âmbito do soft power.

Nye Jr. (2004) define o soft power como “the ability to get the outcomes you

want without having to force people to change their behavior through threats or payments” (p. 15), como um exercício que resulta numa “intangible attraction that persuades us to go along with others’ purposes without any explicit threat or exchange taking place” (p. 7) e como um conjunto de activos catalisadores de atractividade e

capacidade de agenda setting.

Keck (2013) afirma que o que se altera não são os recursos empregues mas sim a forma como os mesmos são empregues, pois que “rather than instruments, the

distinction between hard and soft power is between the ways in which they influence (or attempt to influence) the behavior of others” (para. 9).

Kurlantzick (2007) cunhou o termo charm offensive aplicado à estratégia de política externa da China no século XXI e como tal no segmento do continente africano, onde preconiza a sua imagem externa enquanto potência pacífica e responsável, que entende as necessidades dos países em desenvolvimento e que não interfere nos seus assuntos internos, e molda a percepção que o mundo tem acerca da emergência chinesa.

De facto, o conceito de soft power tem vindo a ser integrado no meio académico e no léxico político oficial da RPC e já é uma forma de actuação essencial na visão estratégica chinesa, nomeadamente na politica externa da RPC direccioanda para Moçambique no quadro do Fórum de Macau. No caso do posicionamento geoestratégico da China em Moçambique é na lógica da política externa dirigida a esse PALOP que consideramos que a diplomacia económica por meio do Fórum de Macau é exercida como instrumento de soft power.

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2.6.3. Diplomacia económica

A diplomacia económica é, na presente investigação, considerada como um instrumento de soft power da política externa chinesa no âmbito do posicionamento geoestratégico do país em Moçambique, importando depois perceber o papel do Fórum de Macau nesse contexto.

Moreira (2014) afirma que a diplomacia se mantém actualmente como “o mais

importante instrumento da política internacional” (p. 85) e segundo o autor pode ser

definida como “uma arte da negociação ou o conjunto das técnicas e processos de

conduzir as relações entre os Estados” (p. 85).

Segundo Magalhães (1982) a diplomacia é um instrumento ao serviço da política externa “para estabelecer contacto pacífico entre os detentores de poder político de

dois Estados” (p. 81), contacto esse que é realizado pelos intermediários designados de

diplomatas ou agentes diplomáticos.

Num ambiente internacional em permanente mudança e sucessiva evolução pautado sobretudo pela ocorrência de fenómenos de interacção estratégica que privilegiam as formas de conflitualidade não armadas, “a comunidade diplomática de

um Estado passou a desempenhar um papel significativo no seu desenvolvimento económico” (Leal, 2014, p. 153).

Direccionando os dividendos do sucesso económico interno para a política externa, a RPC coloca em marcha uma estratégia de diplomacia económica em prol do acesso e obtenção de recursos vitais ao desenvolvimento nacional e instrumentaliza nessa estratégia, na figura do Fórum de Macau, a convergência das culturas oriental e lusófona que Macau consigna a fim de criar um ambiente favorável à concretização dos objectivos fixados para os PLP, mais especificamente para os PALOP.

Na presente investigação, a relação entre a diplomacia e a economia surge então no âmbito do exercício do soft power, no quadro da potencialização da interculturalidade singular de Macau através da criação do Fórum de Macau.

Com o fim da Guerra Fria, a queda do Muro de Berlim e o desmembramento da URSS, a agenda internacional e as relações diplomáticas deixaram de se centrar apenas em questões militares e securitárias e passaram a focar-se cada vez mais na vertente económica e o conceito de diplomacia económica ganhou relevância.

Então, a diplomacia económica resulta da articulação entre potencialidades diplomáticas e recursos económicos. Santos (2009) define o conceito como um

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“strategic instrument or practice in the implementation processes of foreign policy

actions for the inherent fulfilment of economic and political national interests, through creative innovation potential, promoting both the linkage between the private and public sectors and corporate internationalization developments” (pp. 95-96).

Leal (2014) defende que a diplomacia económica “abrange políticas ligadas ao

sector produtivo, ao movimento e troca de bens e serviços, aos fluxos de investimento e à informação e análise dos enquadramentos legais e internacionais” (p. 153) e inclui

também “a exploração, promoção e captação de oportunidades de comércio e de

investimento entre um país e os demais” (p. 153).

Aliando as suas capacidades diplomáticas ao progresso económico nacional, a RPC utiliza isso mesmo como um instrumento de charneira na sua projecção geoestratégica em Moçambique, em concreto no contexto da potencialização da lusofonia plasmada no Fórum de Macau.

2.7. Enquadramento metodológico

Uma investigação “é uma actividade de natureza cognitiva que consiste num

processo sistemático, flexível e objectivo de indagação e que contribui para explicar e compreender os fenómenos sociais” (Coutinho, 2014, p. 7). A multiplicidade de

abordagens, modelos ou paradigmas, a dependência contextual por parte do investigador e a importância do método para a investigação científica impõem a necessidade de definição de uma estratégia metodológica em todas as suas dimensões. Desde logo, a presente investigação pretende ser um estudo exploratório de natureza estratégica, implicando deste modo a produção de dados empíricos próprios.

Quanto ao paradigma de investigação, que serve para “unificar e legitimar a

investigação tanto nos aspectos conceptuais como nos aspectos metodológicos”

(Coutinho, 2014, p. 10), optámos pelo paradigma qualitativo, que privilegia uma posição relativista face ao fenómeno a investigar e a construção indutiva de teorias, que admite várias vias metodológicas e que valoriza o papel do investigador enquanto construtor de conhecimento científico.

Quanto ao emprego, no desenvolvimento da investigação, dos “diversos meios

que ajudam e/ou orientam o investigador na sua busca do conhecimento” (Coutinho,

2014, p. 24), a metodologia escolhida foi a perspectiva qualitativa, cujo objecto de estudo corresponde à descoberta da intenção e da finalidade e a base é o método

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indutivo, na medida em que “a teoria surge a posteriori dos factos e a partir da análise

dos dados” (Coutinho, 2014, p. 29), surgindo a teoria após a interpretação desses.

Sendo a tendência actual a de “diversas tentativas de integração das

perspectivas metodológicas quantitativa e qualitativa” (Coutinho, 2014, p. 35) e

seguindo o raciocínio das opções anteriores para a estratégia metodológica, optámos pelo método misto. Por sua vez, as técnicas são modalidades de acção auxiliares ao método, pois no âmbito de um método podem ser usadas várias técnicas metodológicas.

O trabalho de investigação no terreno foi realizado em Portugal e na RAEM. Recorremos à análise de conteúdos bibliográficos, jornalísticos, jurídicos e estatísticos, de documentos oficiais, de declarações em meios de comunicação social por parte de profissionais e especialistas relevantes e à realização de entrevistas semi-estruturadas e conversas informais com representantes institucionais e informadores qualificados.

Ainda, realizámos visitas a locais de interesse para a problemática em investigação, a saber: a Universidade de São José (USJ), a Universidade de Macau (UM), o Secretariado Permanente do Fórum de Macau, o Centro Cultural de Macau, a Biblioteca Central de Macau, o Centro de Exposição dos Produtos Alimentares dos Países de Língua Portuguesa e a Fundação Macau.

Contudo, houve entrevistas que foram referidas no projecto de proposta da presente dissertação mas que, por motivos de constrangimento temporal ou impossibilidade de agenda por parte das(os) entrevistadas(os) não foram realizadas, nomeadamente ao Cônsul de Portugal em Macau, Dr. Vítor Sereno, a um membro do Gabinete de Administração do Secretariado do Fórum, ao Vice-Reitor da UM, o Professor Doutor Rui Martins e a representantes do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM), da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), da Delegação Económica e Comercial de Macau (DECM), do Instituto Internacional de Macau (IIM) e das embaixadas chinesa e moçambicana em Portugal.

III.Fórum de Macau

3.1. Especificidades da RAEM

Quando abordámos a questão do enquadramento da RAEM na política externa chinesa para o século XXI mencionámos desde logo o papel que a região desempenha na concretização dos objectivos chineses definidos no âmbito do segmento do projecto

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da OBOR para a região da África Austral. Nessa região, o nosso foco na análise do posicionamento geoestratégico chinês é Moçambique enquanto PALOP participante do Fórum de Macau, fórum de relações internacionais criado pela China com base no investimento na potencialização da interculturalidade característica de Macau para assim legitimar o reforço e o aprofundamento das relações de cooperação com os PLP.

Neste sentido, a RAEM tem um conjunto de especificidades que fazem com que a região se apresente, através do Fórum de Macau no caso da política externa chinesa para os PLP, como um instrumento fundamental de acção e interacção estratégica para a RPC nas relações internacionais do século XXI. Depois da presença colonial portuguesa neste território e da sua transferência para a soberania chinesa, essas especificidades não foram apagadas (Mendes, 2013, p. 280) e têm sido mantidas e preservadas.

Tendo em conta as singularidades resultantes da fusão cultural que dá características únicas a Macau e que como tal representa inúmeras oportunidades para as relações da China com os PLP, o papel da RAEM deve, assim, ser analisado e prospectivado considerando a região como parte integrante do território chinês: nesse contexto é-lhe conferido um estatuto internacional único, nomeadamente útil para a concretização e efectivação da aproximação sino-lusófona.

Leandro (2016) identifica quatro pilares que caracterizam e sustentam a instrumentalização da RAEM no âmbito da política externa chinesa para os PLP, concretamente para Moçambique como PALOP e país da África Austral: a localização geográfica da região, a sua herança histórica e multicultural, a especialização do mercado macaense e o seu estatuto internacional enquanto território chinês.

Quanto ao primeiro pilar, a RAEM encontra-se localizada geograficamente à entrada da Bacia do Delta do Rio das Pérolas e está ligada a todas as cidades vizinhas por jetfoil, estradas, pontes e caminhos-de-ferro (Leandro, 2016, p. 171). Este factor confere então funcionalidade à região, tanto em termos de cooperação regional como em termos de cooperação com os países lusófonos (Leandro, 2016, p. 172).

O segundo pilar é a herança histórica e multicultural. Os “resquícios

arquitectónicos, culturais e linguísticos da presença portuguesa continuam a ser bem visíveis” (Mendes, 2013, p. 280) e “as marcas da história têm sido preservadas pela Administração chinesa de Macau, com o incentivo do governo central de Pequim”

(Mendes, 2013, p. 280). Esse património material e imaterial é considerado um dos motores da diversificação económica positiva da região, um dos grandes objectivos estabelecidos por Pequim para o futuro do desenvolvimento da região.

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