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OS CONSÓRCIOS INTERMUNICIPAIS COMO POSSIBILIDADE DE COOPERAÇÃO SUPRAMUNICIPAL EM TORNO DOS RECURSOS HIDRICOS: O EXEMPLO DO COM10 NA RMBH

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OS CONSÓRCIOS INTERMUNICIPAIS COMO POSSIBILIDADE DE COOPERAÇÃO SUPRAMUNICIPAL EM TORNO DOS RECURSOS

HIDRICOS: O EXEMPLO DO COM10 NA RMBH

Guilherme Pereira de VARGAS Mestrando em Geografia do Instituto de Geociências da UFMG, e-mail: guivargas82@yahoo.com.br

INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho é realizar uma discussão sobre a dinâmica de formação de consórcios públicos intermunicipais como uma proposta de regionalização ascendente de políticas públicas fundamentada em redes sociais. A nosso ver, os conceitos de região e redes são importantes nos debates em torno dessas modalidades de associação regional fornecendo importante subsidio teórico para sua compreensão. Da mesma forma, pretendemos discorrer sobre a necessidade de um planejamento e gestão regional que tenha como elemento motivador o recurso hídrico que encerra em torno de si múltiplas possibilidades de atuação e cooperação governamental supramunicipal. Por fim, almejamos trazer o consórcio COM10, formado na porção norte da Região Metropolitana de Belo Horizonte, como exemplo empírico dos apontamentos teóricos realizados.

O DEBATE EM TORNO DOS CONCEITOS DE REGIÃO E REDES SOCIAIS

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Em seu trabalho Corrêa (1997) aponta que, até os anos 1970, o conceito de região possui três grandes acepções, o termo foi utilizado inicialmente na Geografia como qualquer superfície da terra que exibisse características de homogeneidade natural, ou seja, as chamadas regiões naturais. Esta concepção se baseava em uma visão darwinista das relações entre homem e natureza identificando as porções da superfície terrestre a partir das combinações especificas de elementos naturais.

A segunda acepção, das regiões humanas difundidas pela escola de Geografia francesa, cujo principal expoente foi Vidal de La Blache, de forte influência no Brasil, incorpora as características naturais às heranças históricas, políticas, econômicas e culturais que fornecem uma identidade a determinadas porções do globo. A região é entendida como um longo processo de transformação da paisagem natural em paisagem cultural, onde o conjunto integrado de traços culturais (língua, costumes) e o arranjo dos espaços agrícolas definem um determinado gênero de vida.

A terceira acepção é aquela do paradigma quantitativo em Geografia que considera a região a partir de propósitos específicos, não tendo a priori, como no caso da região natural e da região-paisagem, uma única base empírica. É possível identificar regiões climáticas, regiões industriais, regiões nodais, ou seja, tantos tipos de regiões quantos forem os propósitos do pesquisador. A região é entendida como uma classe de área, portanto, a regionalização é a classificação de regiões por meio de recursos matemáticos e estatísticos. A região, portanto, não se apresenta como produto acabado, mas obra do empenho do geógrafo em definir similaridades internas, e relações comuns. O paradigma quantitativo teve forte influência nas propostas de regionalização e no planejamento regional dos anos 1960 e 1970.

A partir da década de 1970, a corrente da Geografia Cultural desenvolve seu conceito de região como uma construção mental e submetida a uma subjetividade coletiva do grupo social, portanto inscrita na consciência coletiva e baseada no sentimento de pertencimento.

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Milton Santos (1985, p. 68) discutiu a elaboração de um conceito de região mais adequado às variáveis colocadas pela nova realidade econômica da globalização e dos fluxos na intenção de orientar a pesquisa no âmbito regional. Refletindo sobre a aplicação do conceito nos países subdesenvolvidos o autor afirma

a internalização da divisão internacional do trabalho acelera a divisão interna do trabalho, a criação de valores de troca, a espacialização mercantil dos subespaços, ao mesmo tempo em que o processo de centralização (econômico e geográfico) se reduz a áreas limitadas, de tal forma que o resto do país, graças também as novas condições de transportes e comunicações, deve manter relações obrigatórias e assimétricas com o “centro” assim reforçado ou criado. Do ponto de vista dos fluxos de mercadorias, o país inteiro se “torna a região do seu centro”. (p.68)

Dessa forma, a autonomia de uma região é relativa, principalmente porque as mudanças funcionais abalam as fronteiras historicamente construídas e reais, tornando-as instáveis. O dinamismo global que incide sobre esstornando-as áretornando-as revela regiões capazes de receber o impacto das novas relações, preservando sua forma espacial das formas e conteúdos precedentes. Por outro lado, surgem outras regiões que encontram um novo arranjo interno permitindo a reprodução das condições anteriores, gerando uma outra lei e outros contornos nessa nova fase.

Castro (1993) afirma que o avanço das relações capitalistas de produção numa escala planetária, reforça a importância das decisões nas escalas regional e local. Além disso, sustenta que a reproblematização da região, como objeto de pesquisa, requer a superação de postulados deterministas e simplificadores e a incorporação como questão central da complexidade dos fenômenos com destaque para a consideração da escala como problema fenomenológico.

Para a autora a dimensão regional deixou de ser estudada por muitos geógrafos em todo o mundo, no entanto, se a região é entendida como resultado de práticas sociais num determinado território, sua morte não está declarada. Se o território desempenha o papel de “acumulador da história”, a região será um “acumulador espacial” e deve-se enxergar os conteúdos do espaço geográfico que dão vida a região.

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posição contrária: “em primeiro lugar, o tempo acelerado, acentuando a diferenciação dos eventos, aumenta a diferenciação dos lugares; em segundo lugar, já que o espaço se torna mundial, o ecúmeno se redefine, com a extensão a todo ele do fenômeno de região”.

Uma região também pode ser resultado de um regionalismo efetivo, ou seja, da tentativa de forcas políticas de manter seu status quo político e econômico. O uso do termo interesses regionais pode esconder as manifestações de um grupo hegemônico se perpetuar no poder através da pressão por determinadas “regionalizações” no âmbito do aparelho de Estado. Por trás dos discursos sobre as regiões está um complexo processo de construção social e simbólica.

Cláudio Egler (1995) aborda a discussão de região e regionalismo através de uma análise das estruturas produtivas regionais no Brasil. Segundo o autor a região é a resultante de um duplo movimento: de um lado a regionalização, entendida como a divisão de um espaço em territórios econômicos com finalidades diversas; de outro, o regionalismo, onde os agentes sociais localizados em um determinado território, aí incluídas as firmas nele estabelecidas, procuram exercer pressão sobre o Estado para dispor de tratamento político diferenciado do restante do espaço econômico em que se inserem.

No entanto, para se entender os processos de regionalização é preciso ir além dos aspectos técnicos e captar os componentes da competição capitalista que em sua dimensão política são expressos no regionalismo. Na visão do autor o conceito de estrutura produtiva permite exprimir a materialidade dinâmica da economia capitalista no território, fundada na concorrência entre massas de capital e mediada e regulada pela ação do Estado. A crise e a reestruturação das parcelas da economia nacional têm mostrado que a região é a escala de operação produtiva do capitalismo, seja para consolidar e proteger seus próprios mercados seja para ampliar os limites dos territórios econômicos.

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autonomia. Os consórcios intermunicipais iniciam suas atividades partindo de certo capital social já consolidado e articulado em torno das propostas discutidas.

De acordo com Fazito (2002) a análise de redes sociais é considerada uma metodologia que se baseia no estudo das relações sociais, que constituem as unidades elementares da sociedade, entre entidades e objetos de qualquer natureza. A análise de redes sociais desloca-se dos atributos individuais para as relações entre os atores evidenciando a interdependência nas interações.

Na visão de Portes (1995) as redes sociais são conjuntos de associações recorrentes entre grupos de pessoas ligadas por profissões, laços familiares, culturais ou afetivos. As redes são importantes na vida econômica, porque são fontes de aquisição de meios escassos, como capital e informação, mas por outro lado impõe restrições a busca ilimitada pelo ganho pessoal.

Os estudos que indicam como caminho investigativo a análises de redes nos estudos de ações coletivas, tem apontado para a idéia de que as ações coletivas surgem de redes - que interagem e se influenciam mutuamente. Nesse sentido, o reconhecimento dessas redes seria um agente facilitador da compreensão dos processos de mobilização, de formação das redes, como também dos "caminhos" percorridos pela informação nesses movimentos.

As discussões no plano da política pública partem de uma rede social com preocupações semelhantes em cada estrutura institucional de âmbito local. Os atores políticos e sociais consolidaram um espaço de debates que culmina na atuação conjunta. A constituição de uma rede social que dialoga entre si e é composta por diversos segmentos da sociedade civil como políticos, movimentos sociais, empresários e organizações não-governamentais. Dessa forma, as redes sociais têm um protagonismo inegável na construção das iniciativas de consórcios intermunicipais e sua análise tem grande potencial para o entendimento de tais organizações e do capital social envolvido nos processos.

REFORMA POLÍTICA, DESCENTRALIZAÇÃO E CONSÓRCIOS

INTERMUNICIPAIS

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setores políticos demandam uma nova distribuição do poder e uma organização do Estado que desse maior autonomia às instâncias subnacionais. O fato marcante das reformas instituídas na Constituição de 1988 é a emergência do municipalismo com o fortalecimento dos municípios como gestores de políticas públicas.

Fernando Abrucio em uma definição objetiva de descentralização a caracteriza como

um processo nitidamente político, circunscrito a um Estado nacional que resulta da transferência ou conquista efetiva de poder decisório a governos subnacionais, que: a) adquirem autonomia para escolher seus governantes e legisladores; b) para comandar diretamente sua administração; c) para elaborar uma legislação referente as competências que lhe cabem; d) para cuidar de sua estrutura tributária e financeira (Abrucio, 2006, p.78).

Segundo Rocha e Faria “a descentralização galvaniza o interesse de diversos atores e ganha um lugar central no leque de objetivos que orientaram a redefinição das instituições políticas brasileiras” (Rocha; Faria, 2004, p.3). A descentralização torna-se um remédio para todos os defeitos da antiga estrutura governamental sendo adotado por uma multiplicidade de atores com os mais diversos interesses e significados.

A descentralização pode ser compreendida tanto como parte uma de estratégia de racionalização técnico-administrativa quanto como uma estratégia de democratização. No primeiro exemplo pode-se estabelecer uma relação entre descentralização e eficiência, no segundo, a descentralização associa-se a valores como universalização e capacidade de controle do Estado pela sociedade (Rocha; Faria, 2004, p.3).

O movimento de descentralização política e fiscal exerce papel fundamental para a afirmação do nível municipal como uma instância decisória dos processos relacionados ao planejamento urbano no Brasil trazendo a necessidade de se repensar as atividades no nível local, que passa a assumir novas responsabilidades e papéis. Apesar de terem aumentadas as suas atribuições, os municípios não contam com aportes financeiros, materiais e de recursos para implantação das diversas políticas públicas.

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estadual e federal, tais como a política habitacional, sistema viário e de circulação, educação, saúde, assistência social, dentre outros.

Os resultados dessas mudanças são a ampliação das competências municipais e a intensificação da vida política local. Também é possível pontuar que em reação à ausência de um tratamento mais amplo das questões regionais e urbanas, existe uma corrida em busca da atração de investimentos e da preparação de condições e vantagens para a instalação de empreendimentos, sobretudo, por parte da iniciativa privada. A chamada guerra fiscal se origina nesse processo de abertura e consiste numa competição acirrada que prejudica a governabilidade de vários municípios.

Se por um lado a participação de atores políticos locais no desenvolvimento das políticas é aumentada, a competição generalizada entre municípios é um aspecto negativo que modifica a forma de governar nas municipalidades brasileiras, restringindo certos ganhos sociais. Segundo Rocha e Faria

A descentralização fundamentou-se na crença de que uma maior autonomia aos governos subnacionais equacionaria os problemas das relações intergovernamentais no Brasil uma vez que no contexto de redemocratização, destacava-se a questão da hipertrofia do poder da União em detrimento dos estados e municípios (Rocha; Faria, 2004, p.4)

A descentralização pode gerar resultados opostos aos esperados como reforçar as desigualdades entre estados e municípios. Pode também não ser suficiente para garantir uma maior eficácia e eficiência das funções públicas, na medida em que também se depende de fatores como capacidade técnica e administrativa, dos recursos financeiros e da escala adequada de oferta dos serviços públicos pelos governos subnacionais.

Na visão de Abrucio (2006, p.76) existem cinco questões importantes que devem ser solucionadas em qualquer modelo de descentralização: a constituição de um sólido pacto nacional, o combate às desigualdades regionais, a montagem de boas administrativas subnacionais, a democratização dos governos locais e a criação de um ambiente de intergovernamental positivo. Na implantação de um processo descentralizador esses aspectos muitas vezes são encobertos pela força do discurso político.

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Novas responsabilidades, atividades e serviços são assumidos por esta esfera que se vê obrigada a lidar com questões que não tinha competência estabelecida ou experiência acumulada ate então.

Apesar de assumir maior número de atribuições os municípios não contam com aporte financeiro, materiais e recursos para implantação das diversas políticas públicas. Os municípios de pequeno porte, que compõe a grande maioria do quadro brasileiro, não se encontram preparados para suprir todas as demandas assumidas e tornam-se dependentes de municípios maiores que exercem alguma liderança regional. O movimento de descentralização do estado traz a necessidade de se repensar as atividades no nível local assumindo novas responsabilidades e papéis.

No caso brasileiro, no qual a grande maioria dos municípios sofre de aguda precariedade técnica, administrativa e financeira, a descentralização tem efeito reverso comprometendo a oferta de serviços e desarticulando as ações públicas. As desigualdades regionais são um grande obstáculo que aponta para a necessidade de coordenação federativa em um contexto de grande heterogeneidade e complexidade.

Matos (2008, p. 149-150) analisando as pertinentes às novas demandas da interescalaridade e seus desafios à gestão e governabilidade aponta que

novos investimentos teóricos revigoram a dimensão regional nos últimos anos. A endogeneização das estratégias de desenvolvimento regional e local apóia-se em novas contribuições teóricas, da mesma forma que a dimensão técnica não esgota nem elimina a necessidade de resolver novos problemas que a perspectiva do exercício de formas de gestão democrática e solidária impõe. Alguns desses problemas que eram típicos de grandes áreas urbanas, saturadas demográfica e economicamente, passam a ganhar visibilidade em espaços geográficos mediterrâneos, ainda de baixa densidade, onde o crescimento e o desenvolvimento impõem inéditos desafios à gestão e planejamento.

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atingiriam os mesmos resultados ou utilizariam um volume maior de recursos (Vaz, 1997).

No governo do presidente Luis Inácio Lula da Silva abriu-se novas perspectivas para a articulação municipal a partir da Lei de Consórcios (Lei 11.107), sancionada em abril de 2005. A nova legislação permite uma repartição de responsabilidades entre diferentes esferas de governo. A expectativa é de que os municípios brasileiros devem se unir mais em consórcios para executar projetos, obras ou serviços de interesse comum voltados para o desenvolvimento regional e metropolitano. Os consórcios intermunicipais são definidos pela Lei Federal 11.107/2005 como associações formadas por pessoas jurídicas políticas com personalidade de direito publico ou de direito privado, criadas mediante autorização legislativa, para a gestão associada de serviços públicos.

A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS: AS POSSIBILIDADES DAS INICIATIVAS CONSORCIADAS

Entre os discursos presentes no debate ambiental a água talvez tenha o maior potencial mobilizador. A escassez ou excesso, manifestos nos fenômenos das secas, enchentes, ou deslizamentos de terra são situações críticas vivenciadas pelas populações urbanas e rurais brasileiras. A qualidade da água, os serviços adequados de saneamento básico, grande parte dos problemas de saúde são demandas que passam pela questão da água. De acordo com Menezes, a água possui uma abrangência potencial que se refere tanto ao entendimento da problemática quanto a uma abordagem extensiva que tenta alcançar a inclusão total dos conhecimentos relativos a esse tema. De acordo com o autor (Menezes, 2008, p. 130), “em torno da água podem-se elaborar abordagens de amplo espectro e equacionar alguns dos problemas mais críticos sobre os quais se debruça o planejamento ambiental, urbano ou regional: drenagem, erosão, perda de solos, assoreamento, abastecimento, poluição hídrica (...)”. A água pode servir como uma porta de entrada perfeita para essa nova abordagem sistêmica, cumprindo o papel de eixo simbólico e, de fato, para uma nova visão compreensiva do planejamento e gestão.

Brito (2006) discute a questão de escala na gestão de serviços públicos:

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hoje uma terceira opção que é a articulação intermunicipal através de consórcios formados na escala de bacias ou sub-bacias hidrográficas, e construção de um modelo de gestão inter-setorial (Brito, 2006, s.p.).

Com ênfase na gestão de recursos hídricos, a autora defende a intersetorialidade como característica fundamental na equação das questões fundamentais enfrentadas pelas metrópoles brasileiras no que concerne a gestão das águas: a poluição dos recursos hídricos e a diminuição nas fontes para abastecimento.

Para ela os consórcios, cuja estrutura foi regulamentada pela lei federal 11.107/2005, devem atuar “exercendo funções relativas ao planejamento e regulação da gestão dos serviços, e atuando de forma integrada aos comitês de bacia”. Hoje os comitês constituem instâncias importantes de articulação e mediação de conflitos entre atores públicos e sociedade civil, e podem ser uma alternativa viável para a construção da intersetorialidade (Brito, 2006).

Os comitês de bacia hidrográfica são uma gestao e planejamento que vem se instaurando desde meados da década passada. Eles possuem uma composição tripartite e igualitária com participação de membros da sociedade civil, de órgãos do governo estadual e das prefeituras. Utilizam a bacia como unidade de planejamento, porém esbarram na falta de recursos e na impossibilidade de controle dos órgãos setoriais (Rolnik; Somekh 2003).

A formação dos comitês de Bacia criou uma nova articulação multisetorial que passou a colocar em questão a lógica setorizada de gestão das águas e do saneamento que vigorou até o inicio da década de 90. Um rio que recebe as águas usadas, tratadas ou não, mesmo que tenha seu curso restrito ao território municipal, vai desaguar em outro rio, que provavelmente se localizará um outro município. Isto implica necessariamente em pensar soluções dentro da escala de bacia. Uma série de novas questões, cujo encaminhamento de soluções depende da construção de uma interface entre gestão de serviços e gestão de recursos hídricos está hoje colocada.

Matos (2008, p.147) analisando os novos contextos da política e gestão do território e as necessidades impostas de se considerar a questão da sustentabilidade aponta que

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em conta a competitividade – o que envolve inovações, financiamento e negociação; a equidade – o que requer participação social, democracia e direitos humanos; ecologia – o que impõe limites ao uso do ambiente.

A existência de um elemento físico comum aos municípios tem grande importância para a integração em um projeto de cooperação. Um curso de água pode ser um amalgama fundamental que une os municípios na constituição de uma identidade regional. De fato, a adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento possibilita a integração de usos e a resolução de problemas que têm múltiplas causas e que extrapolam os limites administrativos municipais, como a poluição de um corpo hídrico, que tem entre suas causas o padrão de uso e ocupação do solo na área da bacia hidrográfica, as ocupações das faixas marginais, a falta de esgotamento sanitário, a coleta e disposição inadequada do lixo e dos resíduos industriais em toda área de influência da bacia hidrográfica.

Os consórcios intermunicipais são uma alternativa que busca eficácia e coordenação utilizando a escala de bacia hidrográfica como referência para o planejamento e gestão. As bacias hidrográficas são unidades obrigatórias para a abordagem do planejamento urbanístico-ambiental na medida em que o destino do esgoto e dos resíduos sólidos, apenas para ficar em dois exemplos, interfere na vida de praticamente todos os usuários de uma mesma bacia. Iniciativas consorciadas como o COM10 se inserem nesse debate por um estado mais eficiente e organizado com abertura para o controle social.

UMA INICIATIVA DE GESTÃO E PLANEJAMENTO A PARTIR DA BACIA HIDROGRÁFICA: O EXEMPLO DO COM10

O objeto de análise empírica é o COM10 - Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Sustentável da Região da Bacia do Ribeirão da Mata que é composto por dez municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte: Matozinhos, Capim Branco, Esmeraldas, Pedro Leopoldo, Ribeirão das Neves, São Jose da Lapa, Vespasiano, Confins, Lagoa Santa e Santa Luzia.

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Santa Luzia o ribeirão deságua na margem esquerda do Rio das Velhas, afluente do Rio São Francisco. O ribeirão da Mata nasce no encontro de duas formações rochosas: a sudoeste, o gnaisse e a noroeste, o calcário. Na região de gnaisse a maioria dos afluentes se encontra em superfície, no entanto, na região calcária, os tributários chegam ao curso do ribeirão subterraneamente devido à porosidade dessa rocha que permite a água chegar ao subsolo.

A concessão de abastecimento de água e a destinação do esgoto são de responsabilidade da COPASA. Devido à poluição, a água superficial do Ribeirão da Mata não é utilizada para o consumo, existindo na maioria das cidades poços artesianos. Em Santa Luzia, Pedro Leopoldo e Ribeirão das Neves, o abastecimento é feito pelo Sistema Integrado, que retira e trata a água do Rio das Velhas.

A região do Ribeirão da Mata se destaca historicamente por uma economia com bases fixadas no extrativismo mineral. A partir dos anos 1950, as indústrias cimenteiras e de outros derivados do calcário se instalam nessa bacia e até hoje assumem um papel importante na economia dos municípios. Três sítios arqueológicos foram destruídos e outros tantos descaracterizados pela ação das mineradoras. Além do impactar o solo e os recursos hídricos elas também causam poluição atmosférica. A extração de areia e argila é outra atividade importante para a região que contribui para o assoreamento do ribeirão. O principal problema é em relação aos pequenos mineradores (que muitas vezes atuam clandestinamente) já que as grandes empresas hoje são muito controladas pelos órgãos ambientais e obrigadas a oferecer medidas compensatórias.

A agricultura é praticada de forma mais intensa nos municípios de São José da Lapa, Lagoa Santa, Matozinhos e Capim Branco com culturas de feijão, cana-de-açúcar e milho. Os principais problemas enfrentados com a agricultura são relacionados à poluição das águas. A porosidade do terreno cárstico torna o fluxo de águas subterrâneas mais dinâmico e, dessa forma, a água contaminada não é depurada pelo solo e vai parar no aqüífero.

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dirigisse para esses municípios, e se instalasse nos chamados loteamentos de baixa renda que não seguiram as exigências urbanísticas e ambientais.

De fato os municípios próximos a Belo Horizonte sofreram um crescimento demográfico substancial, sobretudo de trabalhadores de baixa qualificação profissional que tiveram com única alternativa os bairros da periferia da metrópole para residir. O incremento populacional ocorrido na bacia do ribeirão da Mata criou grande pressão sobre os serviços públicos que as prefeituras frequentemente não têm condições de absorver. Em conseqüência a região da bacia enfrenta sérios problemas relacionados à falta de saneamento básico e a disposição dos resíduos sólidos.

O COM10 é uma iniciativa de tratamento de questões conjuntamente por 10 municípios que compõem a bacia do ribeirão da Mata na região norte da RMBH. Esse grupo de municípios vem realizando desde 2005 negociações entre si e com outros entes federados no sentido de promover uma gestão integrada a partir da escala da bacia hidrográfica. O COM10 tem propósitos mais amplos que não o simples tratamento de questões setoriais (Educação, Saúde, Lazer, Esporte, Turismo, Saneamento Básico, etc) buscando planejar e executar projetos e programas que visem ao desenvolvimento regional e aperfeiçoamento das gestões administrativas de seus consorciados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Retomando o objeto empírico do consórcio intermunicipal podemos afirmar que se trata de uma proposta de regionalização ascendente. De certa forma, o consórcio é a constituição de uma região planejamento pelo Estado, no caso em questão, de distintas institucionalidades municipais que propõe uma atuação conjunta frente a certos problemas comuns. Em relação à idéia de região, podemos afirmar que no caso do COM10 a prática consorciada está fortemente amparada tanto pelo elemento de contigüidade entre os municípios como pela existência do recurso hídrico comum que necessita de tratamento para além das fronteiras municipais.

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De maneira geral, podemos afirmar que as regionalizações constituem uma resposta a interesses específicos e delimitados dos atores políticos em um contexto de pacto federativo fortemente desigual como é o caso brasileiro. Os consórcios intermunicipais são uma manifestação voluntária, sobretudo do poder político, na busca de promoção de um reordenamento do território usado. À medida que os recortes institucionais tradicionais são insuficientes para contemplar a complexidade das políticas públicas que os municípios devem obrigatoriamente desenvolver são inevitáveis novas interações e articulações.

Por fim, gostaríamos de pontuar que não foi objetivo desse trabalho esgotar a discussão em torno dos conceitos de região e redes sociais e os respectivos potenciais no estudo dos consórcios intermunicipais como o COM10. No entanto, podemos concluir que os consórcios intermunicipais são experiências de regionalização ascendente das políticas de planejamento e gestão, que partem das esferas locais, e que tem fundamental participação das redes sociais de atores políticos e sociais.

A implantação de uma associação desta natureza é um processo de organização de uma série de acordos políticos e econômicos de longo prazo. Este fato revela as dificuldades da implementação de uma política pública de recorte regional mesmo quando há predisposição para tal. A literatura que utilizamos aponta nesse sentido: negociações levam sempre a conjunturas instáveis e por mais que exista uma leitura de atuação conjunta pelos municípios o paradigma da atuação local restrita predomina.

No entanto, o alcance político das manifestações regionais e das redes sociais envolvidas nesses processos não deve ser desprezado. Os consórcios têm sido apontados como instrumentos que permitem ganhos de escala nas políticas públicas, e que resgatam a cooperação e a solidariedade intergovernamental além de trazer um novo modelo gerencial que pode viabilizar a gestão microrregional.

Os avanços ocorridos na direção da integração regional e de um bom ambiente de relacionamento político regional não devem ser questionados. Apesar da morosidade na constituição da iniciativa regional, alguns ganhos já podem ser percebidos neste processo. A expectativa é de que o consórcio se torne uma realidade no campo jurídico e que se crie uma agenda conjunta de políticas públicas para a bacia do ribeirão da Mata, um ambiente com alta fragilidade ambiental e graves problemas urbanísticos.

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Referências

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