• Nenhum resultado encontrado

A casa real portuguesa ao tempo de D. Pedro II (1668-1706)

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A casa real portuguesa ao tempo de D. Pedro II (1668-1706)"

Copied!
770
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

A CASA REAL PORTUGUESA AO TEMPO DE D. PEDRO II (1668-1706)

Joana Leandro Pinheiro de Almeida Troni

(2)
(3)

UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE LETRAS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

A CASA REAL PORTUGUESA AO TEMPO DE D. PEDRO II (1668-1706)

Joana Leandro Pinheiro de Almeida Troni

Tese para obtenção do grau de Doutor em História Moderna, orientada pela Prof.ª Doutora Maria Paula Marçal Lourenço

(4)
(5)

Índice Índice Tabelas ... 9 Resumo ... 11 Abstract ... 11 Abreviaturas ... 13 Introdução ... 15

1ª PARTE – A CASA REAL PORTUGUESA AO TEMPO DA ENTRONIZAÇÃO DOS BRAGANÇA ... 41

1. «O ser Príncipe de um Reino, vale o mesmo que ser Pai de uma Família […]»: os conceitos de Corte e Casa na Idade Moderna. ... 41

2. Os regimentos dos oficiais e do serviço da pessoa régia ao tempo de D. João IV ... 59

3. Os cargos-mores da Casa Real Portuguesa no século XVII ... 83

3.1 Mordomo-mor ... 83 3.2 Camareiro-mor ... 91 3.3 Estribeiro-mor ... 97 3.4 Guarda-mor ... 103 3.5 Vedor da Casa ... 105 3.6 Porteiro-mor ... 111 3.7 Mestre-sala ... 114 3.8 Reposteiro-mor ... 115 3.9 Copeiro-mor ... 117 3.10 Trinchantes ... 118

3.11 Os Capitães da Guarda e a Guarda Real ... 119

3.12 A Capela Real ... 126 3.12.1 Capelão-mor ... 131 3.12.2 Deão ... 132 3.12.3 Sumilher da cortina ... 133 3.13 Esmoler-mor ... 133 3.14 O aio... 137 3.15 Confessor ... 149 3.16 Monteiro-mor ... 152 3.17 Caçador-mor ... 152 3.18 Aposentador-mor ... 154

(6)

3.19 Armador-mor ... 155

3.20 Alferes-mor ... 157

3.21 Meirinho-mor ... 158

3.22 Almotacé-mor ... 158

3.23 Condestável ... 159

3.24 Outros oficiais-mores do reino ... 160

4. A Casa Real no centro da dinâmica política nos reinados de D. João IV e de D. Afonso VI ... 162

4.1 A constituição da casa do infante D. Pedro ... 183

2ª PARTE – A CASA REAL PORTUGUESA AO TEMPO DE D. PEDRO (1668-1706) ... 197

1. Afastar o rei: D. Pedro a caminho do poder ... 197

1.1 O juramento do príncipe D. Pedro no Paço da Ribeira ... 205

1.2 Uma nova ordem política no reino e as mudanças na Casa Real (1668-1706) ... 209

1.3 O sustento da Casa Real ... 212

2. As Casas dentro da Casa Real ... 220

2.1 Os espaços Régios da Dinastia de Bragança ... 220

2.2 As Casas de Angra e de Sintra ... 229

2.3 A Casa das Rainhas e a Casa dos Príncipes e Infantes ... 238

2.4 A Casa Real portuguesa em 1704 ... 246

3. Os cargos-mores de D. Pedro II: continuidades e ruturas ... 250

3.1 O camareiro-mor e os gentis-homens da câmara ... 278

4. Os gentis-homens na Casa Real portuguesa ... 296

4. 1 Os gentis-homens na Casa do príncipe D. Teodósio ... 300

4.2 Os gentis-homens na Casa de D. Afonso VI ... 304

4.3 Os gentis-homens na casa de D. Pedro ... 307

4.4 Os gentis-homens da câmara na Regência e Reinado de D. Pedro II ... 312

4.4.1 D. Rodrigo de Meneses ... 317

4.4.2 D. António Luís de Meneses, 1º marquês de Marialva ... 320

4.4.3 D. Pedro António de Meneses, 2º marquês de Marialva ... 324

4.4.4 D. Luís da Silva Telo de Meneses, 2º conde de Aveiras ... 325

4.4.5 D. João Mascarenhas, 2º conde da Torre, 1º marquês de Fronteira ... 325

4.4.6 D. Luís Álvares de Távora, 3º conde de S. João e 1º marquês de Távora ... 330

4.4.7 D. Manuel Teles da Silva, 2º conde de Vilar Maior e 1º marquês de Alegrete ... 333

(7)

5. Dinâmicas e redes de poder na corte de D. Pedro II ... 337

6. O bom governo do Príncipe ... 371

7. O governo do reino através da Casa Real (1668-1706) ... 395

3ª PARTE - A IMAGEM DA CASA REAL PORTUGUESA AO TEMPO DE D. PEDRO (1668-1706) ... 445

1. Uma corte «temerosa»: tempos da regência ... 445

1.1 Um «rei preso inimigo da conservação de Sua Alteza» ... 448

1.2 As conspirações contra D. Pedro ... 451

2. De regente a rei: o título e a coroação de D. Pedro II ... 459

2.1 D. Pedro rei. A renúncia à coroa? ... 475

3. A imagem de D. Pedro, regente e rei ... 482

4. Codificação da vida áulica ... 500

4.1 As disputas de precedências no espaço da Corte e da Casa Real ... 509

5. Festas e cerimónias da Família Real ... 549

5.1 Celebrar as etapas da vida: do nascimento à morte ... 549

5.2 Casamentos e Alianças ... 583

5.3 Representação portuguesa no Estrangeiro ... 593

5.4 Receções em Portugal ... 597

5.5 Receção ao arquiduque Carlos de Áustria ... 602

5.5.1 Dúvidas no recebimento do arquiduque ... 606

5.5.2 A chegada do pretendente ao trono espanhol a Portugal ... 613

CONCLUSÃO ... 625

ANEXOS ... 625

(8)
(9)

ÍNDICE TABELAS

Tabela 1 – Comparação das notas à margem do documento do reposteiro-mor

(ANTT) com o texto do Regimento de 1641 (BGUC) p. 70 Tabela 2 – Lista dos textos produzidos pós-Restauração com vista à disposição

do serviço da Casa e Ofícios Régios p. 78

Tabela 3 – Da constituição da Casa do Infante às primeiras modificações p. 189 Tabela 4 – Das primeiras alterações à Casa do Infante até à nomeação de

D. Simão de Vasconcelos e Sousa como governador da Casa de D. Pedro, 12 de janeiro de 1664

p. 191 Tabela 5 – Casa do Infante D. Pedro entre 1664 e 1666 p. 193 Tabela 6 – gentis-homens da câmara da casa de D. Pedro desde as últimas

nomeações em 1666 até 1668, enquanto infante, e depois de 1668, como regente e governador de Portugal

p. 196 Tabela 7 – Senhoras inglesas e irlandesas ao serviço de D. Catarina de Bragança

em Portugal p. 244

Tabela 8 – Mordomos-mores da Casa Real p. 254

Tabela 9 – Porteiros-mores da Casa Real p. 256

Tabela 10 – Capitães da Guarda p. 258

Tabela 11 – Aposentadores-mores da Casa Real p. 260

Tabela 12 – Monteiros-mores do reino p. 261

Tabela 13 – Copeiros-mores da Casa Real p. 262

Tabela 14 – Reposteiros-mores da Casa Real p. 263

Tabela 15 – Trinchantes da Casa Real p. 265

Tabela 16 – Mestres-Sala da Casa Real p. 267

Tabela 17 – Vedores da Casa Real p. 269

Tabela 18 – Capelães-mores da Capela Real p. 273

Tabela 19 – Estribeiros-mores da Casa Real p. 277

Tabela 20 – Gentis-homens da Câmara durante a Regência e Reinado de

D. Pedro II p. 317

(10)
(11)

Resumo

É o principal objetivo deste trabalho o estudo da Casa Real portuguesa ao tempo de D. Pedro II englobando dois momentos distintos: entre 1668 e 1683, durante o período em que é príncipe-regente de Portugal, e quando se torna rei, após o falecimento do seu irmão, D. Afonso VI, até 1706, data em que D. Pedro morre. Não obstante, considera-se igualmente o processo de construção da Casa Real portuguesa após a Restauração, analisando, em especial, o Regimento da Casa Real, do reinado de D. João IV, e as funções dos cargos-mores. A dinâmica da Casa Real de D. Pedro II é estudada através dos detentores dos ofícios maiores, como sejam o mordomo-mor e o estribeiro-mor, identificam-se continuidades e ruturas, examinando-se com detalhe o esvaziamento da função do camareiro-mor, cargo detido pelos condes de Penaguião/marqueses de Fontes, e a entrada dos camaristas na estrutura do serviço e da casa, alteração que se mantém no reinado de D. João V. Privilegia-se ainda o estudo do governo do reino através da Casa Real, com particular enfoque no papel dos gentis-homens da câmara.

Continuando a acompanhar o processo de estruturação da Casa Real, privilegia-se o estudo da imagem de D. Pedro como governante de Portugal. Neste passo, destaca-se a codificação da vida áulica e abordam-se momentos de representação no exterior, mas também dentro do próprio reino, com especial atenção para a receção ao arquiduque Carlos de Áustria no contexto da participação portuguesa na Guerra da Sucessão de Espanha e o que isso significou para D. Pedro II.

Palavras-chave: Estado Moderno; Restauração; Casa Real portuguesa; sociedade de

Corte; D. Pedro II (1668-1706)

Abstract

The main purpose of this work is the study of the Portuguese Royal Household at the time of D. Pedro II including two distinct moments: firstly, between 1668 and 1683, during the period that D. Pedro was Prince Regent of Portugal; and, in second place, when he becomes king of Portugal after the death of his brother, D. Afonso VI, until 1706, the year of his death. Nevertheless, it is also considered the process of construction of the Portuguese Royal Household after the Portuguese Restoration, in particular through the detailed analysis of the Regiment of the Royal Household, dated from D. João IV’s reign, and of the household higher offices.

(12)

We address the political dynamic of D. Pedro’s II Royal Household through its major officers, such as the mordomo-mor (Lord Steward) and the estribeiro-mor (Master of the Horse), identifying continuities and ruptures. Among the latter, we analyze in detail the loss of meaning and importance of the camareiro-mor (Lord Chamberlain), a position that was held by the Counts of Penaguião / Marquis of Fontes, and the entry of the camaristas (gentlemen of the privy chamber) in the structure and the royal household, a change that remains throughout King João’s V reign. We also study the government of the kingdom through the Royal Household, emphasizing the role of the gentlemen of the privy chamber.

Continuing to follow the process of the Royal Household structuring, we focus on the image D. Pedro as ruler of Portugal. In this stage, we stress the increasing complexity of court life and highlight moments of Portuguese representation abroad, but also within the limits of the kingdom, giving special attention to the reception of the Archduke Carlos of Austria in the context of the Portuguese participation in the War of Spanish Succession and what it meant to D. Pedro II’s image.

Keywords: Modern State; Portuguese Restoration; Portuguese Royal Household; court

(13)

Abreviaturas

1. Arquivos e Bibliotecas

AGS – Archivo General de Simancas, Espanha

AMAE – Archive du Ministères des Affaires Étrangers, França ANTT – Arquivo Nacional Torre do Tombo

BA – Biblioteca da Ajuda

BGUC – Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra BL – British Library, Reino Unido

BNF – Bibliothèque Nationale de France, França BNP – Biblioteca Nacional de Portugal

BPE – Biblioteca Pública de Évora NA – National Archives, Reino Unido

2. Coleções

PBA – Coleção Pombalina dos Reservados da Biblioteca Nacional de Portugal SP – State Papers Foreigner, coleção do National Archives do Reino Unido

(14)

3. Outras Cf. Confrontar Cód. Códice Coord. Coordenador Ed. Editor Fl. Fólio Ms. Manuscrito pp. páginas rs. reis ss. seguintes

Quanto às normas de transcrição adotadas, optou-se pela uniformização das variantes i/j/y e u/v, pela separação de palavras e pela sua modernização (por ex.º, em vez de «he», colocamos «é»), sempre que tal não alterou o significado. Esta decisão prende-se com a dimensão do trabalho e para maior clareza na leitura.

No que às citações bibliográficas respeita, segue-se a norma NP 405 do Instituto Português de Qualidade, à exceção, contudo, dos manuscritos para os quais se considera que a norma não facilita a apresentação dos dados. Neste sentido, cita-se Arquivo/Biblioteca, coleção, cota, fólios e, sendo conhecidos, também o título e data.

Para citações de manuscritos e textos contemporâneos utilizam-se as aspas angulares, reservando as aspas curvas para o nosso uso, em caso, por exemplo, de expressões que julgamos necessitarem de algum esclarecimento adicional em nota de rodapé ou se usadas por algum autor em frases por nós transcritas.

(15)

INTRODUÇÃO

Em 1640, Lisboa voltou a ser Corte, pondo fim a um longo período em que a cidade esteve «adormecida», «sozinha e «viúva»1. A nova dinastia reinante era uma antiga família

da nobreza ducal que encerrava em si uma já longa tradição de memórias e usos dos estilos régios que adotara no seu quotidiano.

Com D. João IV, o primeiro monarca brigantino, recuperou-se o serviço da Casa Real através do Regimento que regulava o seu modo de funcionamento. Foi logo a seguir à Restauração que se deu início à recolha das competências e responsabilidades dos oficiais desta instituição, trabalho que, todavia, não veio a ser concluído. Apesar disso, havia textos orientadores e que serviam de guia às dúvidas que frequentemente assomavam e que continuaram a emergir pelas décadas seguintes.

Ao reinado do Restaurador, seguiu-se a regência de D. Luísa de Gusmão que, de um modo geral, se limitou a manter a estrutura da Casa Real, clarificando pontualmente dúvidas que despontavam, como a das precedências entre o mordomo-mor e o estribeiro-mor, em 1662, no dia do embarque de D. Catarina de Bragança para Inglaterra.

Pouco tempo depois, D. Afonso VI assumiu o governo de Portugal e algumas alterações começaram a verificar-se. Alguns dos detentores dos ofícios régios viram parte das suas responsabilidades serem limitadas pelo 3º conde de Castelo Melhor, um jovem que se impunha no governo e que ocupava o recém-recuperado cargo de Escrivão da Puridade, cuja esfera de ação acabou por se estender ao governo doméstico da Casa Real.

Os anos do reinado pessoal do Vitorioso ficaram marcados pelo descontentamento de parte da nobreza contra as medidas de Castelo Melhor que desequilibraram a relação entre a coroa e os diversos corpos do reino, o que conduziu, por fim, ao golpe de estado de 1667, com a consequente substituição do rei pelo irmão, D. Pedro.

D. Pedro não adotou, porém, o título de rei. Foi jurado regente do reino nas Cortes de 1668 e foi nessa qualidade que assumiu o governo da Casa Real portuguesa. É deste período de que nos ocupamos de forma mais detalhada nesta dissertação. São trinta e oito anos que se dividem em dois momentos distintos: o primeiro, de 1668 a 1683, que abarca o período

(16)

da regência que apenas termina com a morte de D. Afonso VI, a 12 de setembro; o segundo, de 1683 a 1706, altura em que D. Pedro se tornou rei até à data da sua morte, ponto de viragem para um novo reinado, o do seu filho, D. João V.

O trabalho que se apresenta não é um estudo sobre D. Pedro II, mas sim sobre a Casa Real ao seu tempo. Contudo, sendo o rei a primeira figura desta Instituição, é inevitável que a sua presença seja uma constante ao longo destas páginas. É que compreender a Casa Real é entender o monarca, apreender a composição da Corte e, enfim, tentar perceber a articulação da monarquia.

O despertar do interesse pelo tema da Corte na historiografia europeia teve, sem dúvida, génese nos trabalhos de Norbert Elias, com destaque para as obras O Processo

Civilizacional2 e a A Sociedade de Corte3.

A tese do sociólogo alemão baseava-se na ideia de Corte como um espaço social onde se desenvolveram específicas formas de estar. Elias considerava-a como uma instituição disciplinadora do comportamento cortesão, impondo o autocontrolo e a contenção da violência e dos instintos.

Assim, a Corte surgia como o centro do processo civilizador, através do qual se podia observar como este se desenrolou desde a Idade Média até à época Contemporânea no contexto da construção do Estado. Por outras palavras, observando e estudando o espaço da

2 Na sua versão original Über den Prozeβ der Zivilisation. Soziogenetische und psychogenetische

Untersuchungen publicada pela primeira vez em 1939. As traduções para outras línguas surgiram décadas mais

tarde. A francesa, de 1973, dividiu a obra em dois volumes, o que também sucedeu na versão portuguesa. ELIAS, Norbert – O processo civilizacional: investigações socio genéticas e psicogenéticas. 2 volumes. Lisboa: Edições D. Quixote, 1989-1990.

À primeira parte intitulou de «La Civilisation des Mœurs» e à segunda «La Dynamique de l’Occident». Em português os títulos foram traduzidos para «Transformações do Comportamento das Camadas Superiores Seculares do Ocidente» e «Transformações da Sociedade». Esta obra debruça-se mais sobre a evolução da relação do homem com o seu próprio corpo e com as necessidades fisiológicas (do assoar, do cuspir, do comportamento no quarto, etc.), bem como relativamente ao comportamento humano em diversas áreas.

Em Portugal, a obra Sociedade de Corte (original de 1969) foi publicada primeiro do que esta que lhe antecede cronologicamente.

3 Publicado em 1969 com o título Die höfische Gesellschaft. ELIAS, Norbert – A Sociedade de Corte. Lisboa:

Editorial Estampa, 1995.

Norbert Elias publicou uns anos mais tarde a obra Sociedade dos Indivíduos, no original Die Gesellschaft

der Individuen de 1987. ELIAS, Norbert – A Sociedade dos Indivíduos. 2ª ed. [1ª de 1993]. Lisboa: Publicações

D. Quixote, 2004. Obra em que o autor explora as correlações existentes entre indivíduo e sociedade que por vezes surgiam como antagónicos.

(17)

Corte, podia-se compreender e interpretar os processos históricos, do ponto de vista sociológico, tomando como protagonistas o rei e os nobres que em seu torno gravitavam, recorrendo, sobretudo, ao exemplo da monarquia francesa.

Volvidos tantos anos de esquecimento, foi o trabalho de Norbert Elias que fez incidir uma nova luz sobre a Corte e que teve o mérito de a recuperar como campo de estudo, afastando-a de ideias feitas que a reduziam apenas a um lugar de vícios, paixões, intrigas e de historietas sem relevância. Não obstante, o tema permaneceu na sombra e foi preciso aguardar mais algumas décadas para se assistir ao seu retomar enquanto área de interesse.

Na realidade, os estudos áulicos tinham caído em desuso. Os motivos que conduziram a uma depreciação desta temática foram vários, muitos deles relacionados com os próprios contextos históricos e nacionais.

Com efeito, uma historiografia romântico-liberal, pretendendo construir o passado em função do presente, ou seja, tentando ler o passado a partir de estruturas e moldes da segunda metade do século XIX, desvalorizou a área da Corte5. Por outro lado, a luta contra

as monarquias fora uma das batalhas do Liberalismo, pelo que explorar o poder do rei na sociedade era algo quase contraditório à luz do «estado burguês».

Em Inglaterra, a historiografia Whig privilegiava a ideia de que o seu país era exemplar pela liberdade, pela tolerância religiosa, e, em especial, pelo parlamentarismo. O estudo da

5 Para todo este percurso historiográfico ver a introdução de José Martínez Millán na obra MARTÍNEZ

MILLÁN, José e FERNÁNDEZ CONTI, Santiago (dirs.) – La Monarquía de Felipe II: La Casa del Rey. volume I. Madrid: Fundación MAPFRE Tavera, 2005; VÁZQUEZ-GESTAL, Pablo – El espacio del poder. La Corte en la

historiografía modernista española y europea. Valladolid: Univ. de Valladolid (Colección Estudios y

Documentos), 2005. Infelizmente, para o panorama português, este livro revela-se algo incompleto, ao não citar os principais estudos de autores como Mafalda Soares da Cunha – A Casa de Bragança 1560-1640.

Práticas senhoriais e redes clientelares. Lisboa: Editorial Estampa, 2000 (ainda que na p. 362 faça menção ao

trabalho da autora), ou de Nuno Gonçalo Monteiro – O Crepúsculo dos Grandes. A Casa e o Património da

Aristocracia em Portugal (1750-1850). 2ª ed. revista. Lisboa: Imprensa Nacional, 2003, fazendo referência

apenas a alguns dos seus trabalhos mais pequenos, ainda que importantes. Também não cita o de Maria Paula Lourenço – A Casa e o Estado do Infantado (1654-1706). Formas e práticas administrativas de um património

senhorial. Lisboa: JNICT, Centro de História da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1995 e Casa, Corte e Património das Rainhas de Portugal (1640-1754). Poderes, Instituições e Relações Sociais. Lisboa: Faculdade de Letras da

Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999. Dissertação de doutoramento.

Ver também MOZZARELLI, Cesare – Principe e Corte. Porquê e como Estudar, Hoje, a Corte? in Penélope.

Fazer e Desfazer a História. Nº 9/10, 1993, pp. 225-229; ÁLVAREZ-OSSORIO ALVARIÑO, Antonio – La Corte: Un

espacio abierto para la Historia Social. In CASTILLO, Santiago (coord.) – La Historia Social en España. Actualidad

y Perspectivas. Actas del I Congreso de la Asociación de Historia Social. Madrid: Siglo XXI de España Editores,

(18)

Corte não tinha, pois, cabimento, sendo vista quase como «un-English»6. Em França, enveredar por esta temática seria como que negar o significado e o papel da Revolução Francesa. Em Itália, significava acentuar ainda mais as divisões existentes no território – principados, ducados, reinos – quando se tentava criar um espírito de nacionalismo. Na Alemanha, era difícil conciliar a ideia de um estado nacional com a herança do Sacro-Império Romano-Germânico e com a ineficácia da governação Habsburga. Em Portugal, o discurso legitimador da Revolução Liberal e todo o processo que desde então decorreu e que levou ao 5 de outubro de 1910 e à proclamação da República, condicionaram as perspetivas sobre a aristocracia, o rei e a monarquia7.

Também a historiografia marxista, no período do pós 2ª guerra mundial, contribuiu para a desvalorização do estudo da Corte e das elites. Apostada em redimir o papel das «classes» sociais desfavorecidas, atribuía uma carga negativa ao soberano numa lógica de «luta de classes». Estudar a Corte, que era o lugar do rei e dos príncipes, era, pois, contrário aos objetivos da corrente do marxismo histórico.

Por seu turno, para a escola dos Annales a Corte era encarada como superfície da história. Além disso, consideravam-na como uma área muito próxima da História Positivista, da qual procuravam distanciar-se8.

O panorama começou finalmente a mudar nos anos 70, do século XX. Por um lado, com a receção à obra de Elias à medida que esta foi sendo traduzida para outros idiomas9.

6 Expressão utilizada por STARKEY, David – Foreword. In CRUICKSHANKS, Eveline (ed.) – The Stuart Courts.

Stroud: Sutton, 2000, p. XII.

7 Veja-se, apenas a título ilustrativo: MELLO, Antão de – A imbecilidade e a degenerescência nas Famílias

Reais. Lisboa: Livraria Central de Gomes de Carvalho, 1908. No subtítulo da obra é possível ler: «A

hereditariedade, as suas taras físicas, os estigmas intelectuais da degenerescência, perturbações nutritivas, a educação, o problema sexual, a loucura mística, etc.».

8 À exceção de Emannuel Le Roy Ladurie, historiador da escola dos Annales, que publicou o artigo Auprès du

Roi, La Cour. In Annales. Économies, Sociétés, Civilisations. 38e année, N. 1, 1983. pp. 21-41.

9 Em França, La civilisation des mœurs. Paris: Calmann-Lévy, 1973; La société de cour. Paris: Calmann-Lévy,

1974 [Tradução do original Die höfische Gesellschaft, mas não na sua totalidade. Faltam, por exemplo, os dois apêndices, sendo que no primeiro o autor propunha algumas semelhanças nas estruturas de poder de Luís XIV e do regime Nazi].

Em Inglaterra, The Civilizing Process: The History of Manners. vol. 1. Oxford: Blackwell/New York: Urizen Books, 1978; The Court Society. Oxford: Basil Blackwell/New York: Pantheon Books, 1983.

(19)

Por outro, com a crise dos modelos historiográficos e com a revisão de conceitos como Absolutismo, Monarquia, Política e Poder. Chegava-se à conclusão de que ao tentar encontrar as origens do Estado Moderno em épocas recuadas, desvalorizavam-se importantes formas de poder tais como a Corte, que não se enquadravam em moldes de leituras pré-estabelecidos, assim permitindo uma revisão dos limites do poder do rei e a novas leituras do poder da nobreza e das elites.

De Inglaterra começaram a chegar relevantes incursões pelo tema da Corte, mais especificamente na área da Casa Real. O trabalho de Geoffrey Elton foi pioneiro neste campo e marcou o início de um intenso debate sobre a definição e a importância destas temáticas.

Para Elton, a Corte inglesa do século XVI congregava «all those who at any given time were within ‘his grace’s house’; and all those with a right to be there were courtiers to whom the fact, and the problems, of the Court constituted a central preoccupation in their official lives and in the search for personal satisfaction»10.

Neste sentido, considerava que a Corte dos Tudor era um «point of contact» entre rei e súbditos, e, consequentemente ter acesso ao monarca era fundamental para os cortesãos atingirem os seus objetivos. Assim, era neste espaço que o jogo político se concretizava, sucedendo-se as lutas entre os nobres pelo favor régio11.

O trabalho de Elton inspirou David Starkey, seu aluno, a prosseguir os estudos nesta matéria. Foram os contributos deste historiador que trouxeram uma nova luz à análise da Casa Real. Para Starkey, era na Casa Real, em conjunto com a Corte, que se desenvolviam redes de poder informais que, pela intimidade e acesso que alcançavam junto do monarca, se tornavam indispensáveis instrumentos de influência política e de governo. Isto é, a

Em Itália, La società di Corte. Bologna: Società editrice il Mulino, Saggi, 1980; La civiltà delle buone

maniere. La trasformazione dei costumi nel mondo aristocratico occidentale. Bologna: Società editrice il

Mulino, Saggi, 1982.

10 ELTON, G. – Tudor Government: the points of contact. III The Court. (consultámos a versão integrada na

colectânea de trabalhos do prof. Elton – Studies in Tudor and Stuart Politics and Government: Volume 3,

Papers and Reviews 1973-1981. Cambridge: Cambridge University Press, 2002, pp. 38-58 [1ª edição de 1983].

P. 45.

Note-se nesta afirmação a influência dos trabalhos de Norbert Elias.

11 IDEM – ibidem, «The Tudor Court was the centre of politics not only in the sense that those seeking

power needed to pursue it there, but more significantly still in the sense that the battle of politics was there fought out.», p. 56.

(20)

governação do reino estava intimamente ligada à Corte e à Casa Real. Mas, ao contrário do que o seu mestre defendia, para Starkey, a câmara, a Casa Real e a Corte mantiveram a sua importância política no século seguinte.

Com efeito, G. Elton defendia que, por volta de 1530, durante o reinado de Henrique VIII, ocorrera uma «Revolução»12 sob a administração de Thomas Cromwell que alterara as estruturas administrativas medievais da governação. Neste âmbito, a Casa Real deixara de ocupar com a dinastia Stuart o papel relevante que tivera durante o reinado dos Tudor. Starkey não concordava com este argumento, defendendo nos seus trabalhos que a Casa Real e a Corte conservaram a sua valência política após 1530, inclusive durante o reinado de Henrique VIII14.

A partir deste momento, o estudo da Corte como local de exercício de poder começou a ganhar consistência e as investigações que se foram desenvolvendo neste domínio passaram a contemplar diferentes perspetivas e ângulos.

Convém, pois, assinalar algumas das obras pioneiras que surgiram neste contexto e que ainda hoje ocupam um lugar importante na historiografia sobre a Corte europeia: The

Courts of Europe: Politics, Patronage and Royalty, 1400–180015, editado por Arthur

Geoffrey Dickens; de Linda Levy Peck, Court Patronage and Corruption in Early Stuart

England16; a obra Courts, Patronage and the Nobility at the Beginning of the Modern

12 ELTON, Geoffrey – The Tudor Revolution in Government: Administrative Changes in the Reign of Henry

VIII. Cambridge: Cambridge University Press, 1953.

Apenas aqui citamos o seu estudo inaugural, com a ressalva de que muitos outros se seguiram. Para a controvérsia que entretanto se gerou entre Elton e Starkey vejam-se os vários artigos de ambos, em especial, na revista Past and Present, que no seu sítio na Internet disponibilizam grande parte do seu arquivo, quase desde a fundação da revista em 1952. http://past.oxfordjournals.org/ .

14 STARKEY, David – The King's Privy Chamber, 1485-1547. Cambridge: University of Cambridge, 1973.

Dissertação de Doutoramento; IDEM – Court and Government. In COLEMAN, C. e STARKEY, D. (eds.) –

Revolution Reassessed. Revisions in the History of Tudor Government and Administration. Oxford: Clarendon

Press, 1986, pp. 29-58; IDEM – Intimacy and innovation: the rise of the Privy Chamber, 1485-1547. in AAVV. –

The English Court: from the Wars of the Roses to the Civil War. London and New York: Longman, 1987, pp.

71-118;

15 DICKENS, Arthur Geoffrey – The Courts of Europe: Politics, Patronage and Royalty, 1400–1800. New

York: McGraw-Hill, 1977.

(21)

Period, 1450–165017, editado por Adolf Birke e Ronald Asch; ou o trabalho The Princely

Courts of Europe, 1500–1750. Ritual, Politics and Culture under the Ancien Regime, 1500-1750, editado por John Adamson18.

Gradualmente, as historiografias congéneres foram retomando os trabalhos sobre o mundo áulico. Em Itália surgiram as primeiras obras sobre o tema19, nomeadamente as de Cesare Mozzarelli, e assistiu-se à criação, ainda em 1976, do instituto Europa delle Corti.

Centro studi sulle società di Antico Regime20, por Giancarlo Mazzacurati e Amedeo

Quondam, dedicado, sobretudo, ao universo de valores e de atitudes da vida cortesã.

Em França despontaram trabalhos que permanecem hoje uma referência obrigatória, como o de Jacqueline Boucher, La Cour de Henri III21; Jean-François Solnon, La Cour de France22 ou o de Emmanuel Le Roy Ladurie, Saint-Simon ou le système de la Cour23.

17 BIRKE, Adolf; ASCH, Ronald (ed.) – Courts, Patronage and the Nobility at the Beginning of the Modern

Period, 1450–1650.Oxford: Oxford University Press, 1991.

18 ADAMSON, John (ed.) – The Princely Courts of Europe, 1500–1750. Ritual, Politics and Culture under the

Ancien Regime, 1500-1750. London: Weidenfeld & Nicolson, 1999.

19 PROSPERI, Adriano e OSSOLA, Carlo (eds.) – La Corte e il “Cortegiano”. 2 vols. Roma: Bulzoni, 1980.

MOZZARELLI, Cesare – Corte e amministrazione nel Principato gonzaghesco. In Societá e storia. Nº 16, 1982, pp. 245-262; MOZZARELLI, Cesare e OLMI (ed.) – La Corte nella cultura e nella storiografia: immagini e

posizioni tra otto e novecento. Roma, Bulzoni, 1983; MOZZARELLI, Cesare – L' Europa delle corti alla fine dell'Antico Regime. Roma: Bulzoni, 1991; MERLIN, Pierpaolo – Il tema della Corte nella storiografia italiana ed

europea. In Studi Storici. Ano 27, nº 1, 1986, pp. 203-244.

20 Integrado neste instituto constam-se inúmeras publicações pela Bulzoni Editori (Roma), das quais

destacamos apenas algumas: ROMANI, Marzio A. e QUONDAM, Amedeo (eds.) – Le corti farnesiane di Parma e

Piacenza 1545-1622. 2 vols., 1978; PROSPERI, Adriano e OSSOLA, Carlo (eds.) – La Corte e il “Cortegiano”. 2

vols. 1980; PAPAGNO, Giuseppe e QUONDAM, Amedeo (dirs.) – La Corte e lo spazio. Ferrara estense. 3 vols., 1982; FRIGO, Daniela – Il padre di famiglia. Governo della casa e governo civile nella tradizione

dell'economica tra Cinque e Seicento. 1985; FANTONI, Marcello – La Corte del Granduca: Forma e simboli del potere mediceo fra Cinque e Seicento. 1994; FOSI, Irene – All’ombra dei Barberini. Fedeltà e servizio nella Roma barocca. 1997.

21 BOUCHER, Jacqueline – La Cour de Henri III. Rennes: Ouest France, 1986. 22 SOLNON, Jean-François – La Cour de France. Paris: Fayard, 1987.

23 LADURIE, Emmanuel Le Roy – Saint-Simon ou le système de la cour. Avec la collaboration de

Jean-François Fitou. Paris: Fayard, 1997. Consultámos a versão brasileira Saint-Simon ou o sistema da Corte. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 2004.

O autor publicou ainda um artigo mais curto mas já ele baseado nas informações de Saint-Simon e em que assinala a importância de se estar perto do rei e de o servir publicamente. Refere ainda a importância da hierarquia, destacando os bastardos régios num contexto de puro/impuro e do que isso significava na representação da sociedade. IDEM – Auprès du roi, la Cour. In Annales. Économies, Sociétés, Civilisations. 38e année, N. 1, 1983. pp. 21-41.

(22)

Em Espanha também esta temática colheu grande interesse. Relembrem-se somente alguns dos especialistas que, desde os finais dos anos 80, inícios dos anos 90, se dedicaram a esta área: Feros24, Menéndez25, Rodríguez Gil26, Alvar27, Begoña Lolo28, Bouza Álvarez29 e Martínez Millán30, sem esquecer os trabalhos de Yves Bottineau31, de John Elliott32, de Mia

24 FEROS CARRASCO, A. – Gobierno de Corte y patronazgo real en el reinado de Felipe III. Madrid:

Universidad Autónoma de Madrid, 1986; IDEM – Capítulo 1. Felipe III. Gobierno de Corte. «Gobierno de hechuras». In DOMÍNGUEZ ORTIZ, A. – Historia de España. t. 6: La crisis del siglo XVII. Barcelona: Planeta, 1988, pp. 22-37.

25 MENÉNDEZ REXACH, A. – La separación entre la casa del rey y la administración del estado. In Revista de

Estudios Políticos. Nº 55, 1987, pp. 55-121.

26 RODRÍGUEZ GIL, M. – La nueva planta de la Real Casa. Los oficios de Contralor y Grefier General.

Madrid: Universidad Complutense, 1989.

27 ALVAR EZQUERRA, A. – Aspectos de la vida diaria en la Corte del rey de España. In La vida cotidiana en la

España de Velázquez. Madrid: Temas de Hoy, 1989, pp. 91-108.

28 LOLO HERRANZ, Begoña – La música en la Real Capilla de Madrid, José de Torres y Martínez Bravo (h.

1670-1738). Madrid: Universidad Autónoma de Madrid, 1990; IDEM – Phelipe Falconi, maestro de música de la

Real Capilla (1721-1738). In Anuario musical: Revista de musicología del CSIC. Nº 45, 1990, pp. 117-132.

29 BOUZA ÁLVAREZ, F. – Locos, enanos y hombres de placer en la Corte de los Austrias. Oficio de burlas.

Madrid: Temas de Hoy, 1991; IDEM – Cortes festejantes y ocio en el cursus honorum cortesano. In Manuscrits. 13, 1995, pp. 185-203; IDEM – El Rey y los cortesanos. In Torre de los Lujanes. 32, 1996, pp. 77-88.

30 Numa lista que não pretende ser exaustiva: MARTÍNEZ MILLÁN, José – Las elites de poder durante el

reinado de Carlos V a través de los miembros del Consejo de Inquisición (1516-1558). In Hispania: Revista

española de historia. Vol. 48, Nº 168, 1988, pp. 103-168; IDEM – Elites de poder en tiempos de Felipe II

(1539-1572). In Hispania: Revista española de historia. Vol. 49, Nº 171, 1989, pp. 111-149; IDEM – Grupos de poder en la Corte durante el reinado de Felipe II: la facción ebolista, 1554-1573. In MARTÍNEZ MILLÁN, José (ed.) –

Instituciones y élites de poder en la monarquía hispana durante el siglo XVI. Madrid: Universidad Autónoma,

1992, pp. 137-197.

Vejam-se ainda MARTÍNEZ MILLÁN, José (dir.) – La Corte de Felipe II. Madrid; Alianza Editorial, 1994; MARTÍNEZ MILLÁN, José (dir.) – La Corte de Carlos V. Madrid: Sociedad Estatal para la Conmemoración de los Centenarios de Felipe II y Carlos V, 2000; MARTÍNEZ MILLÁN, José e VISCEGLIA, María Antonietta (coord.) – La

monarquía de Felipe II: la Casa del Rey. Madrid: Fundación MAPFRE Tavera, 2005; MARTÍNEZ MILLÁN, José

(coord.) – La monarquía de Felipe III: la Casa del Rey. Madrid: Fundación MAPFRE Tavera, 2005-2008. Para lá da coordenação e direção destas obras, vejam-se os artigos específicos de Martínez Millán.

31 BOTTINEAU, Yves – L’art de cour dans l’Espagne des lumières. 1746-1808. Paris: De Boccard, 1986; El

arte cortesano en la España de Felipe V (1700-1746). Madrid: Fundación Universitaria Española, 1986 (original

em francês de 1962); IDEM – L'Alcázar de Madrid et l'inventaire de 1686. Aspects de la cour d'Espagne au XVIIe siècle. In Bulletin Hispanique. Tome 58, N°4, 1956, pp. 421-452 (continuado nos nº 60).

Anos antes, o autor começara a estudar aspetos da Corte portuguesa, nomeadamente ao tempo de D. João V. Cite-se um dos seus mais conhecidos trabalhos. IDEM – Le gout de Jean V: art et gouvernement. Braga : [s.n.], 1974.

(23)

Rodriguez-Salgado33 e de Glynn Redworth34. Um pouco mais recentes35, mas de menção obrigatória, são os trabalhos de Carlos Gómez-Centurión36, de Juan Sánchez Belén37 e de Antonio Álvarez-Ossorio38.

32 ELLIOTT, John – Philip IV of Spain. Prisioner of ceremony. In DICKENS, A. G. (ed) – The Courts of Europe.

Politics, Patronage and Royalty, 1400-1800. London: Thames and Hudson, 1977, pp. 169-189.

33 RODRIGUEZ-SALGADO, Mia – The Court of Philip II of Spain. In ASCH, R. G., e BIRKE, A. M. (eds.) – Princes,

Patronage and the Nobility. The Court at the beginning of the Modern Age, c. 1450-1650. Oxford: Oxford U.

P., 1991, pp. 205-244; Honour and profit in the court of Philip II of Spain. In AYMARD, M. e ROMANI, M. A. (dirs.) – La cour comme institution économique. Paris : Éditions de la Maison des Sciences de l’Homme, 1998, pp. 67-88.

34 REDWORTH, Glynn em co-autoria com CHECA, Fernando – The kingdoms of Spain: the courts of the

Spanish Habsburgs, 1500-1700. in ADAMSON, J. (ed) – The princely courts of Europe: Ritual, politics and

culture under the Ancien Régime, 1500-1700. London: Weidenfeld & Nicolson, 1999, pp. 42-65.

35 Sublinhe-se que esta lista dos estudos realizados pela historiografia espanhola apenas se atende aos

trabalhos realizados até finais da década de 90.

36 GÓMEZ-CENTURIÓN JIMÉNEZ, Carlos María – Etiqueta y ceremonial palatino durante el reinado de Felipe

V: el reglamento de entradas de 1709 y el acceso a la persona del rey. In Hispania. Revista Española de

Historia. 194, 1996, pp. 965-1005; IDEM – Al cuidado del cuerpo del Rey: los sumilleres de corps en el siglo

XVIII. In Cuadernos de Historia Moderna. Anejos. Nº 2, 2003, pp. 199-239; IDEM – La reforma de las casas reales del Marqués de la Ensenada. In Cuadernos de historia moderna. Nº 20, 1998, pp. 59-83.

Mais recentes, IDEM – La Corte de Felipe V: el ceremonial y las casas reales durante el reinado del primer Borbón. In SERRANO MARTÍN, Eliseo (coord.) – Felipe V y su tiempo: congreso internacional. Vol. 1, 2004, pp. 879-914; IDEM – La Corte de Carlos III. In Enciso Alonso-Muñumer, Isabel (coord.) – Carlos III y su época: la

monarquía ilustrada. 2003, pp. 271-294.

37 SÁNCHEZ BELÉN, Juan – El cortesano. Historia 16, Nº 259, 1997, pp. 10-15; IDEM – La Capilla Real de

palacio a finales del siglo XVII. In GARCÍA GARCÍA, Bernardo José e CARRERAS ARES, Juan José (eds. lit.) – La

capilla real de los Austrias: música y ritual de Corte en la Europa moderna. 2001, pp. 411-448; IDEM – Corte,

fiesta y diplomacia: la embajada española del Conde de Mansfel al Ducado de Lorena en 1569. In por RIBOT GARCÍA, Luis Antonio e Belenguer Cebrià, Ernest (coords.) – Las sociedades ibéricas y el mar a finales del siglo

XVI: Congreso Internacional. Vol. 1, La Corte. Centro e imagen del poder. Sociedad Estatal Lisboa '98, 1998,

pp. 239-255; IDEM – Los capellanes de honor de la Capilla Real (1701-1757): aproximación a su estudio. In SUÁREZ GRIMÓN, Vicente J.; MARTÍNEZ RUIZ, Enrique; LOBO CABRERA, Manuel (coords.) – III Reunión

Científica de Historia Moderna. Asociación Española de Historia Moderna. Vol. 1, Iglesia y sociedad en el Antiguo Régimen, 1995, pp. 177-186; GÓMEZ-CENTURIÓN JIMÉNEZ, Carlos María e SÁNCHEZ BELÉN, Juan

Antonio – La herencia de Borgoña. La hacienda de las Reales Casas durante el reinado de Felipe V. Madrid: Centro de Estudios Políticos e Institucionales, 1999. SAAVEDRA ZAPATER, Juan Carlos – La Capilla Real de Felipe V durante la Guerra de Sucesión. In Homenaje a Antonio de Béthencourt Massieu. Vol. 3, 1995, pp. 367-402.

38 ÁLVAREZ-OSSORIO, Antonio – La Corte: un espacio abierto para la historia social. In CASTILLO, Santiago

(coord.) – La historia social en España: actualidad y perspectivas: actas del I Congreso de la Asociación de

Historia Social: Zaragoza, septiembre 1990. Madrid: Siglo XXI de España, 1991, pp. 247-260; IDEM – Virtud

coronada: Carlos II y la piedad de la Casa de Austria. In FERNÁNDEZ ALBALADEJO, Pablo, PINTO CRESPO, Virgilio e MARTÍNEZ MILLÁN, José (coord.) – Política, religión e inquisición en la España moderna: homenaje a

Joaquín Pérez Villanueva. Madrid: Universidad Autonoma, 1996, pp. 29-58; IDEM – El cortesano discreto:

itinerario de una ciencia áulica (SS. XVI-XVII). In Historia social, Nº 28, 1997, pp. 73-94; IDEM – La discreción del cortesano. In Edad de oro, vol. 18, 1999, pp. 9-45; IDEM – Rango y apariencia: el decoro y la quiebra de la

(24)

Em Londres, no Reino Unido, foi fundada, em 1995, a The Society for Court Studies46, em pleno funcionamento nos dias de hoje, por David Starkey, Robert Oresko47, Simon Thurley48 e Philip Mansel49, com o objetivo de estimular e coordenar o estudo da Corte a partir do século XVI. Além de se dedicarem à organização de vários seminários sobre a temática da Corte, publicam a revista The Court Historian. Deste grupo destacam-se estudiosos como Andrew Barclay50, Clarissa Campbell Orr51, Anna Keay52, Charles Curties Noel53, Dries Raeymaekers54 e Jonathan Spangler55.

distinción en Castilla (siglos XVI-XVIII). In Revista de historia moderna: Anales de la Universidad de Alicante, nº 17, 1998-1999, pp. 263-278.

46 Ver http://www.courtstudies.org/

47 ORESKO, Robert – Royal and Republican Sovereignty in Early Modern Europe: Essays in Memory of

Ragnhild Hatton. Cambridge: Cambridge University Press, 1997; IDEM – Power and Politics in Early Modern

Italy. In History Today. Vol. 39, nº 9, 1989; IDEM – The Duchy of Savoy and the Kingdom of Sardinia. The Sabaudian Court 1563-c. 1750. In ADAMSON, J. (ed) – The princely courts of Europe: Ritual, politics and

culture under the Ancien Régime, 1500-1700. London: Weidenfeld & Nicolson, 1999, pp. 231-253.

48 Entre vários trabalhos de Simon Thurley, ver – Whitehall Palace: an architectural history of the royal

apartments 1240-1648. Yale University Press, 1999; Somerset House, The Palace of England's Queens 1551-1692. London: Topographical Society Publication 168, 2009. The King’s Privy Garden at Hampton Court Palace, 1689-1995. Apollo, 1995; Henry VIII and the Building of Hampton Court: A Reconstruction of the Tudor Palace.

In Architectural History, 31, (1998), pp. 1-57; The Tudor Kitchens at Hampton Court. In Journal of the British

Archaeological Association, CXLIII, (1990), pp.1-28; The Stuart Kings, Oliver Cromwell and the Chapel Royal

1618-1685. In Architectural History, 45, (2002), pp.238-274; A Country House fit for a King Charles II, Winchester and Greenwich. In CRUICKSHANKS, Evelyne (ed.) – The Stuart Courts. Stroud: Sutton, 2000, pp.214-239.

49 MANSEL, Philip – Dressed to Rule: Royal and Court Costume from Louis XIV to Elizabeth II. New Haven

and London: Yale University Press, 2005; IDEM – Prince of Europe: The Life of Charles-Joseph de Ligne

(1735-1814). London, Weidenfeld & Nicolson, 2003 [edição alargada da versão de 1992]; IDEM (ed.) com RIOTTE,

Torsten – Monarchy and Exile: the Politics of Legitimacy from Marie de Medicis to Wilhelm II. London: Palgrave Macmillan, 2011.

50 BARCLAY, Andrew – The inventories of the English royal collection, temp. James II. In Oxford Journals,

Volume 22, nº 1, 2010, pp. 1-13; Charles II’s failed Restoration: administrative reform below stairs, 1660-4. in CRUICKSHANKS, Eveline (ed.) – The Stuart Courts. Stroud: Sutton, 2000. IDEM – Mary Beatrice of Modena: the “Second Bless’d of Woman-kind?. In ORR, Clarissa Campbell (ed.) – Queenship in Britain 1660-1837. Royal

patronage, court culture and dynastic politics. Manchester and New York, Manchester University Press, 2002,

pp. 74-93.

51 ORR, Clarissa Campbell (ed.) – Queenship in Britain 1660-1837. Royal patronage, court culture and

dynastic politics. Manchester and New York, Manchester University Press, 2002; IDEM – Queenship in Europe 1660-1815: the role of the consort. Cambridge, Cambridge University Press, 2004.

52 KEAY, Anna – The Magnificent Monarch: Charles II and the Ceremonies of Power. London and New York:

Continuum, 2008.

(25)

Três anos depois, foi instituída uma filial nos Estados Unidos da América, país onde, note-se, a publicação de livros sobre o mundo áulico tivera início em 1977 com a já citada obra editada por Arthur Geoffrey Dickens. A internacionalização da rede The Society for

Court Studies passou a incluir especialistas como Lawrence Bryant56, Robert Bucholz57, George Gorse58, Linda Levy Peck59, Magdalena Sanchez60, Malcolm Smuts61 e Richard Wortman62.

54 RAEYMAEKERS, Dries – The Court and Household of the Archdukes Albert and Isabella in Brussels

(1598-1621). Antwerp: University of Antwerp, 2009. Dissertação de Doutoramento. HOUBEN, Birgit e RAEYMAEKERS,

Dries – Changing Formats. Court and Household in the Habsburg Netherlands, 1598-1641. (Paper for the second Low Countries Conference, Antwerp 2006), disponível em http://www.lowcountries.nl/papers/2006-1_raeymakers.pdf – último acesso em fevereiro de 2012.

55 SPANGLER, Jonathan – The Society of Princes: The Lorraine-Guise and the Conservation of Power and

Wealth in Seventeenth-Century France. London: Ashgate, 2009; IDEM – Aulic Spaces Transplanted: the design

and layout of a Franco-Burgundian court in a Scottish palace, Court Historian, vol. 14, no. 1 (Summer, 2009).

56 BRYANT, Lawrence – Some Observations on the Staging of Royal Entries (1450-1600): From Ritual to

Spectacle. in RUSSEL, Nicolas e VISENTIN, Hèléne (eds.) – French Ceremonial Entries in the Sixteenth Century:

Event, Image, Text. Toronto: University of Toronto/Centre for Reformation and Renaissance Studies; IDEM –

‘What Face to Put On?’ Splendid Extravagances, Royal Authority, and Louis XI’s Ceremonies. In CASCIANI, Santa e CONTRENI, John J. (eds.) – Word, Image, Number: Communication in the Middle Ages. Sismel-Edizioni del Galluzzo, 2002, pp.319-350; IDEM – Making History: Ceremonial Texts, Royal Space, and Political Theory in the Sixteenth Century. In WRITE, Michael (ed.) – Changing Identities in Early Modern France. Dunham: Duke University Press, 1997, pp. 46-47; IDEM – The King and the City in the Parisian Royal Entry Ceremony: Politics, Art, and Ritual in the Renaissance. In Travaux d'Humanisme et Renaissance. Geneva : Librairie Droz, 1986, entre outros.

57 Robert Bucholz é autor em co-autoria com J. C. Sainty da obra Officials of the Royal Household

1660-1837. 2 vols. Londres: Institute of Historical Research, 1997-98, parte do texto disponível para consulta em

http://luc.edu/history/fac_resources/bucholz/DCO/DCO.html . LEVIN, C. e BUCHOLZ, R. (eds.) – Queens and

Power in Medieval and Early Modern England. University of Nebraska Press, 2009.

58 GORSE, George – Agricultural Practice and Garden Design in Renaissance Genoa. In Design and

Construction in the Middle Ages and Early Modern Era: Essays in Honor of Bradford Blaine. Ottawa: Institute

for Medieval Music, 1998; IDEM – Genova: repubblica dell'Impero. in CONFORTI, C. e TUTTLE, R. (eds.) – Storia

dell' architettura italiana: il secondo Cinquecento, 240-265. Milano: Electa, 2001.

59 Para lá do trabalho já citado no corpo do texto, vejam-se: PECK, Linda Levy – Consuming Splendor:

Society and Culture in Seventeenth Century England. Cambridge: Cambridge University Press, 2005; IDEM

(ed.) – The Mental World of the Jacobean Court. Cambridge: Cambridge University Press, 1991.

60 SANCHEZ, Magdalena – The Empress, the Queen and the Nun. Women and Power at the Court of Philip

III of Spain. Baltimore and London: The John Hopkins University Press, 1998.

61 Além do já citado no corpo do texto, ver, entre muitos, SMUTS, Malcolm – Court Culture and the Origins

of a Royalist Tradition in Early Stuart England. University of Pennsylvania Press, 1987 (paperback edition

1998); IDEM – The Stuart Court and Europe: Essays in Politics and Political Culture. Cambridge University Press, 1996; IDEM –The Court and the Emergence of a Royalist Party. in MCELLIGOTT, Jason e SMITH, David (eds.) – Royalists and Royalism during the English Civil War. Cambridge University Press, 2007, pp. 43-65;

(26)

Já no século XXI, os temas da Corte e da Casa Real continuam a reunir grande interesse enquanto campos de estudo, sendo de assinalar, nestes últimos 30 anos, uma notória modificação e renovação do panorama historiográfico. É certo que se procura demonstrar que estas duas realidades faziam parte do Estado Moderno, contudo, o enfoque é diferente daquele que foi inicialmente proposto por Norbert Elias, principalmente no que toca à natureza das relações entretecidas nestes locais entre monarca e cortesãos. Para o sociólogo alemão, a nobreza fora domesticada pelo rei. Atraindo-a à Corte, obrigara-a a endividar-se de forma a manter o estatuto e um estilo de vida cortesão, anulando assim o seu poder e contribuindo para a construção do Estado Moderno63. Esta perspetiva quase unilateral tem

sido colocada de lado pela maior parte dos historiadores.

As propostas renovadas de abordagem metodológica nestas duas áreas, levadas a cabo, em especial, pelas historiografias inglesa, francesa e espanhola, no seguimento, quer por afinidade como por oposição das formulações teóricas de Elias, têm conduzido a uma consolidação e maturidade destes domínios, onde se realça o contributo da interdisciplinaridade.

Instituição de complexa definição conceptual, a Corte é hoje estudada enquanto realidade física, mas também como espaço social, cultural, político e económico.

Afonso X, o Sábio, nas suas célebres Siete Partidas – texto que, como teremos oportunidade de demonstrar, estará sempre muito presente nas definições das palavras ligadas ao universo cortesão em Portugal – descrevia a Corte como «el logar do es el rey, et sus vassalos et sus oficiales com él, que le han cotianamente de consejar et de servir»64. Assinalava ainda o duplo significado da palavra Corte, tanto significando «cohors», como «curia», ou seja, um grupo de pessoas específico e um lugar físico.

FANTONI e SMUTS (co-eds.) – The Politics of Space: European Courts, ca. 1500-1750. Rome: Bulzoni Editori, 2009.

62 WORTMAN, Richard – Scenarios of Power: Myth and Ceremony in Russian Monarchy. Volume One:

From Peter the Great to the Death of Nicholas I. Princenton: Princeton University Press, 1995.

63 Neste ponto em específico, Elias baseou-se mormente nas Memórias de Saint-Simon, filho de um favorito

de Luís XIII que viu todas as suas pretensões e objetivos saírem frustrados. Partindo destas, naturalmente amarguradas, anotações sobre a Corte e o rei, Elias concebeu a ideia da Corte como local onde monarca e nobres se encontravam em lados opostos, quase como inimigos.

64 Las Siete Partidas del Rey Don Afonso el sabio, cotejadas con varios códices antiguos por la Real

(27)

A Corte era igualmente espaço onde se produzia e consumia cultura. Esta tem sido uma das correntes historiográficas mais privilegiada nos últimos anos, em especial os trabalhos de cultura política, dando-se particular atenção às manifestações artísticas. Estas representavam, de forma singular, uma imagem da monarquia e dos seus comportamentos, linha de investigação que tem vindo a ser desenvolvida, por exemplo, por Malcolm Smuts65.

Lugar onde o rei vivia e governava, a Corte era, portanto, um local doméstico, mas também de atuação política. Não era, porém, o único centro de poder no Antigo Regime. Neste âmbito, a historiografia mais recente tem vindo a salientar a importância da dimensão policêntrica da Corte.

As casas das rainhas, dos príncipes e dos infantes, seguindo uma matriz idêntica à da casa do rei, tinham administração, oficiais e Corte, em torno das quais as suas próprias redes cortesãs se formavam. Mas também as Cortes senhoriais66 e as vice-reinais eram

configurações que geravam importantes oportunidades a nível político e cortesão.

A vertente económica da Corte parece ser o campo menos explorado pelos historiadores. Na obra publicada em 1998, resultante do 12º Congresso de História Económica realizado nesse ano em Espanha, Aymard e Romani67 procuraram dar um

impulso significativo neste sentido, relevando o papel económico de grande relevância que esta instituição alcançou. Receitas e despesas da coroa, padrões de consumo cortesãos,

65 SMUTS, Malcolm – Art and the material culture of majesty in early Stuart England. In The Stuart court

and Europe: essays in politics and political culture. Cambridge: Cambridge University Press, 1996; IDEM – Court culture and the origins of a royalist tradition in early Stuart England. Philadelphia: University of

Pennsylvania Press, 1999; IDEM – Culture and power in England, 1585-1685. Basingstoke: Macmillan, 1999. Ver também GENDZEL, Glen – Political Culture: Genealogy of a Concept. In The Journal of Interdisciplinary

History. Vol. 28, No. 2 (Autumn, 1997), pp. 225-250.

66 A título de exemplo, ver CUNHA, Mafalda Soares da – Cortes Señoriales, Corte Regia y Clientelismo. El

caso de la Corte de los Duques de Braganza. In Espacios de Poder: cortes, ciudades y villas (S. XVI-XVIII). Madrid: Universidad Autónoma de Madrid. Vol. 1, 2002, pp. 51-68. IDEM – Nobreza, Rivalidade e Clientelismo na primeira metade do século XVI. In Penélope, nº 29, 2003, pp. 33-48. A autora chama a atenção de para o caso português no século XVI as casas senhoriais serem estruturas de poder que intermediavam periferias sociais e territoriais com o centro político, a Corte. Ou seja, acabavam por ser polos autónomos de redes sociais e criadores de espaços sociais alternativos.

67 AYMARD, M. e ROMANI, M. A. (dirs.) – La cour comme institution économique. Paris: Éditions de la

(28)

mobilização de exércitos pelo rei, entre outros aspetos, originavam importantes circuitos económicos promovidos pela própria orgânica da Corte e que urgem ser estudados68.

Na historiografia francesa69, as investigações no domínio áulico ganharam um novo fôlego, mesmo para períodos cronologicamente mais recuados 71. Em 2006, tomou forma o

Centre de Recherche du Château de Versailles, reunindo uma variedade de especialistas no

estudo da Corte europeia dos séculos XVII e XVIII. Para lá do Boletim que publica com regularidade, o Centro organiza também seminários subordinados a esta temática sob perspetivas variadas.

Neste sentido, não se pode deixar de lembrar o trabalho que em Espanha tem vindo a ser desenvolvido pelo Instituto La Corte en Europa, criado em 2006, e pela rede de investigação Solo Madrid es Corte72, principalmente no que respeita às Casas de Carlos V73,

Filipe II e Filipe III.

Para outras zonas geográficas têm, de igual modo, surgido diversos contributos, nomeadamente para a Suécia74, para o Sacro-Império Romano Germânico75, para Bruxelas e

para a Corte Papal76.

68 Como assinala CHAVINEAU, Hélène – Entre le prince et la cour. L’administration financière sous les

grands-ducs de Toscane (XVIe-XVIIe siècle). In Hypothèses, 2000/1, pp. 221-230 : «Il est vrai que cette association courtisan-argent étonne, à cause d’un lourd historiographique qui condamne l’entité curiale à ne pas être un espace économique digne d’intérêt. […] D’où une vision assez paradoxale de la cour : l’espace aulique serait à la fois lieu de contrôle des élites à l’attraction financière certaine, Norbert Elias oblige, et lieu de dépenses irrationnelles s’opposant à un État moderne en voie de construction», p. 221.

69 LE ROUX, Nicolas – La faveur du roi: mignons et courtisans au temps des derniers Valois (vers 1547-vers

1589). Seyssel: Éditions Champ-Vallon, 2000 ; Les cours d’Espagne et de France au XVIIe siècle. Études réunies

et présentées par Chantall Grell e Benoît Pellistrandi. Madrid : Casa de Velázquez, 2007, em que se reúnem artigos de Nicolas Le Roux, Bartolomé Bennassar, Fanny Cosandey, entre outros.

71 GAUDE-FERRAGU, Muriel, LAURIOUX, Bruno e PAVIOT, Jacques – La cour du prince. Cour de France,

cours d’Europe, XII-XVe siècle. Paris: Champion, 2011.

72 Para sermos justos, teríamos que mencionar toda equipa de historiadores que tem vindo a trabalhar com

Martínez Millán em obras como La monarquía de Felipe II: la Casa del Rey, que já citámos, e que, na sua maioria, integram estas redes de investigação. Ao longo do trabalho faremos essas referências.

73 Sem esquecer o trabalho desenvolvido pela extinta Sociedad Estatal para la Conmemoración de los

Centenarios de Felipe II y Carlos V, como o de RIBOT, L. (comissário) – Felipe II: un monarca y su época. Las

tierras y los hombres del rey. Madrid: 1998; IGLESIAS, C. (comissário) – Felipe II: un monarca y su época. La monarquía Hispánica. Madrid: 1998; CHECA CREMADES, F. (comissário) – Felipe II: un monarca y su época. Un príncipe del Renacimiento. Madrid: 1998.

74 Para o caso sueco, ver PERSSON, Fabian – Servants of Fortune. The Swedish court between 1598 and

(29)

Apesar da valorização historiográfica dos estudos relacionados com o mundo áulico faltam, ainda hoje, no caso português, trabalhos monográficos neste âmbito, em especial, no que respeita à Casa Real Portuguesa no período moderno.

Se é certo que para a época em estudo, a da dinastia de Bragança, não existem análises sistemáticas, há, contudo, alguns contributos fundamentais dentro da área de história político-institucional que se devem salientar, nomeadamente para a Época Medieval. Neste contexto, destaque-se a obra de Rita Costa Gomes, A Corte dos Reis de

Portugal na Idade Média77, assim como o trabalho de Leontina Ventura sobre A nobreza de

Corte de D. Afonso III78 e os estudos de Ivo Carneiro de Sousa sobre o património, a casa e a

Corte da rainha D. Leonor79. Mais recentes são o livro de Humberto Baquero Moreno e de

Isabel Vaz de Freitas para a Corte ao tempo de D. Afonso V80 e o de Maria Alegria Marques e

75 DUINDAM, Jeroen – Vienna and Versailles. The Courts of Europe’s Dynastic Rivals, 1550-1780.

Cambridge: Cambridge University Press, 2007.

76 Para a época medieval, GUILLEMAIN, Bernard – La cour pontificale d’Avignon: (1309–1376). Étude d’une

société. Paris: De Boccard, 1962. Para a época moderna, HURTUBISE, Pierre – Familiarité et fidelité à Rome au

XVIe siècle: les ‘familles’ des cardinaux Giovanni, Bernardo et Antonio Maria Salvati. In DURAND, Y. (ed.) –

Hommage à Roland Mousnier. Clientèles et fidelité en Europe à l’époque moderne. Paris : PUF, 1981; IDEM –

La “familia” del cardinale Giovanni Salviati (1517–1553). In MOZZARELLI, Cesare (ed.) – “Familia” del Principe e

famiglia aristocratica. Roma: Bulzoni, 1988; FRAGNITO, Gigliola – “Parenti” e “familiari” nelle corti cardinalizie

del Rinascimento. In ibidem; FERNÁNDEZ, Henry Dietrich – The Patrimony of St. Peter. The Papal court at Rome c. 1450-1700. In ADAMSON, J. (ed) – The princely courts of Europe: Ritual, politics and culture under the

Ancien Régime, 1500-1700. London: Weidenfeld & Nicolson, 1999, pp. 141-163.

Mais recente, VISCEGLIA, Maria Antonietta – The Pope’s household and Court in the Modern Age. In DUINDAM, Jeroen – Royal Courts in Dynastic States and Empires. A global perspective. Leiden: Brill, 2011, pp. 239-264.

77 GOMES, Rita Costa – A Corte dos Reis de Portugal na Idade Média. Lisboa: Difel, 1995.

Recorde-se também PAPAGNO, Giuseppe – La Virtuosa Bemfeitoria. In MOZZARELLI, Cesare (dir.) –

“Familia” del Principe e famiglia aristocratica. Roma: Bulzoni, 1988, vol. 1, pp. 181-211.

78 VENTURA, Leontina – A Nobreza de Corte de Afonso III. 2 volumes. Coimbra: Universidade de Coimbra,

1992. Dissertação de Doutoramento.

79 SOUSA, Ivo Carneiro de – Introdução ao Estudo do Património, da Casa e da Corte de D. Leonor. In

Espiritualidade e Corte em Portugal, séculos XVI-XVIII. Porto: Revista da Faculdade de Letras da Universidade

do Porto, 1993, pp. 23-52; IDEM – A Rainha D. Leonor (1458-1525): poder, misericórdia e espiritualidade no

Portugal do Renascimento. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação para a Ciência e a Tecnologia,

2002.

80 MORENO, Humberto Baquero e FREITAS, Isabel Vaz de – A Corte de Afonso V: o tempo e os homens.

(30)

de João Soalheiro para a Corte dos primeiros reis de Portugal81, ambos inseridos numa coleção espanhola.

Para a idade Moderna, referências obrigatórias são os trabalhos de Nuno Gonçalo Monteiro sobre a aristocracia no Antigo Regime português82, os de Mafalda Soares da Cunha sobre a Casa de Bragança83 e os de Maria Paula Marçal Lourenço84 sobre a Casa do Infantado e a Casa das Rainhas de Portugal entre 1640 e 1754.

Neste âmbito, se excetuarmos o trabalho preliminar de Pedro Cardim85 sobre a Casa

Real no período considerado, ou o incontornável estudo de Félix Labrador Arroyo para a época da monarquia dual86, e algumas análises parcelares e de circunstância87, a nossa

historiografia carece de um estudo aprofundado sobre esta temática crucial para a compreensão do funcionamento institucional da Monarquia em Portugal, após a Restauração de 1640.

81 MARQUES, Maria Alegria e SOALHEIRO, João – A Corte dos primeiros reis de Portugal: Afonso Henriques,

Sancho I, Afonso II. Gijón: Trea, 2009.

82 MONTEIRO, Nuno Gonçalo – O Crepúsculo dos Grandes. A Casa e o Património da Aristocracia em

Portugal (1750-1850). 2ª ed. revista. Lisboa: Imprensa Nacional, 2003 (dissertação de 1995); Elites e Poder. Entre o Antigo Regime e o Liberalismo. Lisboa: Imprensa das Ciências Sociais, 2003 (obra em que autor reúne

alguns dos principais artigos).

83 CUNHA, Mafalda Soares da – A Casa de Bragança 1560-1640. Práticas senhoriais e redes clientelares.

Lisboa: Editorial Estampa, 2000 (dissertação de 1988).

84 LOURENÇO, Maria Paula Marçal – A Casa e o Estado do Infantado (1654-1706). Formas e práticas

administrativas de um património senhorial. Lisboa: JNICT, Centro de História da Universidade de Lisboa,

Lisboa, 1995 (dissertação de 1988); IDEM – Casa, Corte e Património das Rainhas de Portugal (1640-1754).

Poderes, Instituições e Relações Sociais. 2 volumes. Lisboa: Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa,

Lisboa, 1999. Dissertação de doutoramento.

85 CARDIM, Pedro – A Casa Real e os órgãos centrais de governo no Portugal da segunda metade de

Seiscentos. In Tempo. Rio de janeiro. nº 13, Julho de 2002, pp. 13-57; IDEM – O Poder dos Afetos. Ordem

amorosa e dinâmica política no Portugal do Antigo Regime. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa, 2000.

Dissertação de Doutoramento. Em especial o capítulo intitulado A Corte régia e o sistema político do Antigo Regime, pp. 477-565.

86 Consideramos o trabalho de Félix Labrador Arroyo uma verdadeira exceção no panorama historiográfico

nacional, ainda que para anos anteriores aos que tratamos, já que se trata verdadeiramente de um trabalho aprofundado e de grande fôlego. LABRADOR ARROYO, Félix – La Casa Real Portuguesa de Felipe II y Felipe III:

la articulación del reino a través de la integración de las elites de poder (1580-1621). Madrid: Universidad

Autónoma, 2006. Dissertação de Doutoramento [publicado com o título Corte y casa real en Portugal durante

los reinados de Felipe II y Felipe III (1580-1621). Madrid: Polifemo, 2009].

87 HESPANHA, António Manuel – Poder e Instituições na Europa do Antigo Regime. Lisboa: 1984; IDEM –

Un autre paradigme d’administration: la Cour en Europe du Sud à l’époque modern. In Annuaire d’Histoire

Administrative Européene. nº 4, Baden Baden, 1992, pp. 1-21; PIMENTEL, António Filipe – Absolutismo, Corte

(31)

Em todo o caso, é de assinalar a criação de um seminário de Mestrado em História Moderna e Contemporânea na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa dedicado à «Monarquia e Casa Real», no ano letivo de 2008/2009.

Ora, ao escolher a Casa Real portuguesa ao tempo de D. Pedro II como tema central da minha investigação no Doutoramento em História Moderna, mais não fiz do que partilhar do interesse pela redescoberta historiográfica destas áreas de estudo.

Já em 2004, aquando da inscrição no Mestrado em História Moderna na Faculdade de Letras, esta temática aliciava-me. Nessa altura estudei a figura de D. Catarina de Bragança102, filha de D. João IV e de D. Luísa de Gusmão, procurando salientar e

contextualizar o seu contributo político, social e económico no contexto da emergência e afirmação da dinastia brigantina.

Ao analisar os apoios e as resistências que se constituíram face à participação política de D. Catarina enquanto regente de Portugal (1704-1705), substituindo no poder, por duas vezes o seu irmão, D. Pedro II, fiquei com vontade de prosseguir os estudos sobre este reinado.

A esta escolha não foram alheias as enriquecedoras conversas com a minha orientadora científica, a Profª Dr.ª Maria Paula Marçal Lourenço, que em 2006 se encontrava a concluir uma biografia sobre o rei Pacífico, estando particularmente sensibilizada para a importância que a Corte e a Casa Real tinham alcançado neste período. Incentivou-me, pois, a trilhar este caminho que, como já acima apontado, se encontrava ainda por explorar, com um estímulo que confesso ter sido contagiante.

Um projeto inicial de um trabalho de investigação dificilmente corresponderá ao produto final. O texto que se apresenta não é exceção. À medida que a pesquisa avançava, novas pistas, ideias e diferentes interrogações foram surgindo, tornando-se por vezes necessário reorientá-la, assim como a análise e a forma de trabalhar a informação. Noutros casos, a documentação revelou-se estéril quanto aos dados que eu esperava encontrar, o que me obrigou a adequar o plano traçado originalmente.

102 TRONI, Joana Pinheiro de Almeida – Catarina de Bragança (1638-1705). Lisboa: Edições Colibri, 2008.

Imagem

Tabela  1  –  Comparação das notas à margem do documento do reposteiro-mor  (ANTT) com o texto do Regimento de 1641 (BGUC)
Tabela 2 – Lista dos textos produzidos pós-Restauração com vista à disposição do  serviço da Casa e Ofícios Régios
Tabela 3 – Da constituição da Casa do Infante às primeiras modificações
Tabela 4 – Das primeiras alterações à Casa do Infante até à nomeação de D. Simão de  Vasconcelos e Sousa como governador da Casa de D
+2

Referências

Documentos relacionados

F REQUÊNCIAS PRÓPRIAS E MODOS DE VIBRAÇÃO ( MÉTODO ANALÍTICO ) ... O RIENTAÇÃO PELAS EQUAÇÕES DE PROPAGAÇÃO DE VIBRAÇÕES ... P REVISÃO DOS VALORES MÁXIMOS DE PPV ...

patula inibe a multiplicação do DENV-3 nas células, (Figura 4), além disso, nas análises microscópicas não foi observado efeito citotóxico do extrato sobre as

Contemplando 6 estágios com índole profissionalizante, assentes num modelo de ensino tutelado, visando a aquisição progressiva de competências e autonomia no que concerne

de professores, contudo, os resultados encontrados dão conta de que este aspecto constitui-se em preocupação para gestores de escola e da sede da SEduc/AM, em

O esforço se desdobra em ações de alcance das projeções estabelecidas pelo MEC para o índice de desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) Dentre os 10

O construto estilo e qualidade de vida é explicado pelos seguintes indicadores: estilo de vida corrido realizando cada vez mais trabalho em menos tempo, realização

Acrescenta que “a ‘fonte do direito’ é o próprio direito em sua passagem de um estado de fluidez e invisibilidade subterrânea ao estado de segurança e clareza” (Montoro, 2016,

O objetivo do presente trabalho foi entender quais os benefícios alcançados por meio da parceria entre a COPASUL, uma empresa com esforços direcionados à comercialização