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A nova lei de combate ao crime organizado e suas disposições acerca dos institutos da colaboração premiada e da infiltração de agentes

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PEDRO MOREIRA DA SILVA JUNIOR

A NOVA LEI DE COMBATE AO CRIME ORGANIZADO E SUAS DISPOSIÇÕES ACERCA DOS INSTITUTOS DA COLABORAÇÃO PREMIADA E DA

INFILTRAÇÃO DE AGENTES

Santa Rosa (RS) (2017)

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A NOVA LEI DE COMBATE AO CRIME ORGANIZADO E SUAS DISPOSIÇÕES ACERCA DOS INSTITUTOS DA COLABORAÇÃO PREMIADA E DA

INFILTRAÇÃO DE AGENTES

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso – TCC.

UNIJUI - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Orientadora: Msc. Lurdes Aparecida Grossmann

Santa Rosa (2017)

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Dedico este trabalho à minha família, pois sem o incentivo e ajuda dela esse objetivo não seria alcançado.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, em primeiro lugar, pois Dele tudo provem. Em segundo, a minha família, fonte de apoio e incentivo.

A minha orientadora Lurdes Aparecida Grossmann, pela sua dedicação e disponibilidade, auxiliando-me nesta tarefa.

A minha examinadora Patrícia Borges Moura, pois, de imediato, aceitou o convite em avaliar meu trabalho de conclusão de curso, bem como pelos ensinamentos transmitidos durante o período acadêmico.

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“Ainda que agrade a traição, ao traidor tem-se aversão” (Dom Quixote, Miguel de Cervantes).

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise de dois institutos trazidos pela nova legislação de combate às organizações criminosas, Lei n. 12.850/2013, que, embora não estejam intimamente ligados, foram alvo de sensíveis modificações pelo legislador pátrio, especialmente no que se refere a questões de cunho processual. Aborda as principais características teóricas e procedimentais de ambos os institutos, fazendo um paralelo com o entendimento doutrinário e jurisprudencial. Analisa, quando existente, pensamentos doutrinários divergentes sobre o mesmo tópico, posicionando-se, ao final, à qual linha entende seguir. Nessa perspectiva, estuda em que medida as inovações trazidas pela novel legislação, no processo penal brasileiro, podem contribuir para que se tenha uma efetiva investigação criminal em relação às organizações criminosas. Por fim, quanto ao método de pesquisa, esta será hipotético, o qual utiliza no seu delineamento a coleta de dados em fontes bibliográficas disponíveis em meios físicos e na rede de computadores, como objetivo de construir uma reflexão crítica sobre o presente tema.

Palavras-Chave: Colaboração premiada. Infiltração de agentes. Lei 12.850/2013. Organizações criminosas.

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ABSTRACT

The final paper analyzes of two institutes brought by the new legislation to combat to criminal organizations, Law n. 12,850 / 2013. It addresses the main theoretical and procedural characteristics of both institutes, paralleling the doctrinal and jurisprudential understanding. It analyzes, when possible, two divergent doctrinal thoughts on the same topic, positioning, in the end, to which line it means to follow. In this perspective, it studies to what extent the innovations brought by the novel legislation, in the Brazilian penal process, can contribute to an effective criminal investigation in relation to the criminal organizations. Finally, as for the research method, this will be hypothetical deductive, which uses in its outline the collection of data in bibliographic sources available in physical media and in the computer network, in order to construct a critical reflection on the present theme.

Keywords: Plea bargaining. Infiltration of agents. Law 12.850/2013. Criminal organizations.

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ... 9 1 COLABORAÇÃO PREMIADA ... 11 1.1 Conceito e legislação ... 13 1.2 Histórico ... 14 1.3 Constitucionalidade ... 16 1.4 Colaboração e delação ... 19 1.5 Natureza jurídica... 21 1.6 Requisitos de admissibilidade ... 22 1.7 Prêmios Legais ... 25 2 INFILTRAÇÃO DE AGENTES ... 27

2.1 Aspecto legislativo e histórico ... 28

2.2 Conceito ... 29

2.3 Agente provocador ... 30

2.4 Requisitos ... 32

2.5 Procedimento e duração... 34

2.6 Fases ... 37

2.7 Espécies e limites à atuação do agente infiltrado ... 40

2.8 Direitos e responsabilidades do agente infiltrado ... 41

2.9 Proporcionalidade e inexigibilidade de conduta diversa ... 44

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo acerca das características teóricas da colaboração premiada e da infiltração de agentes, tendo como base a nova lei de combate ao crime organizado, Lei n. 12.850/2013.

Desde a sua incorporação no ordenamento jurídico pátrio na década de 90, pela Lei n. 8.072/1990 (Lei dos crimes hediondos), a colaboração premiada é alvo de críticas e elogios e somente com a promulgação da nova lei de combate ao crime organizado (Lei n. 12.850/2013), é que houve um trato especial acerca de suas características, como por exemplo, direitos e deveres do colaborador, os quais devem ser observados pelos atores envolvidos, desde o colaborador até a autoridade judicial.

Como objetivos específicos, a presente pesquisa busca: a) analisar a novel legislação de combate às organizações criminosas, a fim de identificar os principais pontos teórico-procedimentais da colaboração premiada e da infiltração de agentes; b) verificar quais as controvérsias doutrinárias existentes, colacionando ambos os entendimentos; e c) mostrar a importância dos referidos institutos na investigação criminal, especialmente quando se está diante de organizações criminosas.

Quanto à estrutura, o trabalho encontra-se divido em dois capítulos. No primeiro, faz-se uma abordagem das peculiaridades da colaboração premiada, faz-seu conceito e o novel diploma legal, bem como questões históricas. Segue com abordagem acerca da constitucionalidade, trazendo posicionamento firmado pelo Supremo Tribunal Federal. Também é analisada a diferenciação nomenclatural entre colaboração e delação premiada, ponto no qual é encontrada divergência doutrinária. Ao fim, é estudada a natureza jurídica, os

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requisitos de admissibilidade e os prêmios legais aplicáveis aos que colaborarem de forma efetiva com as autoridades responsáveis pela persecução penal.

Por sua vez, no segundo capítulo, estudam-se as questões atinentes à infiltração de agentes, iniciando-se pelo aspecto legislativo e histórico, seu conceito e aspectos da figura do agente provocador, colacionando-se, quanto a este último, precedente exarado pelo E. Tribunal de Justiça do RS. Adentra, também, nos requisitos, questões procedimentais, duração, fases, espécies e limitações. Conclui, então, explorando os direitos e responsabilidades do agente infiltrado, bem como tecendo considerações acerca da proporcionalidade e da inexigibilidade de conduta diversa.

O método empregado na pesquisa foi o de abordagem hipotético-dedutivo, observando os seguintes procedimentos: a) seleção de bibliografia e documentos afins à temática e em meios físicos e na rede mundial de computadores, interdisciplinares, capazes de corroborar ou refutar as hipóteses levantadas e que atinja os objetivos propostos na pesquisa; b) leitura e fichamento do material selecionado; c) reflexão crítica sobre o material selecionado; e d) exposição dos resultados obtidos nesta pesquisa.

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1 COLABORAÇÃO PREMIADA

É o instituto por meio do qual o Estado busca obter a colaboração voluntária e eficaz do agente que participa de organização criminosa, com o intuito de angariar informações ainda não conhecidas das autoridades, as quais devem levar, inexoravelmente, dentre outras, ao desmantelamento do conluio criminoso.

Em que pese seja longa a citação a seguir transcrita, ela se justifica, na medida em que mescla aspectos introdutórios, históricos e, até certo ponto, críticos. Então, nas palavras de Santos (2016, p. 27):

A colaboração premiada é um instituto que, ideologicamente, afina-se ao movimento de política criminal Lei e Ordem (Law and Order), de inspiração norte-americana. Foi introduzida maciçamente, no Brasil, na década de 1990, época em que essa ideologia teve o maior apogeu no País, sobretudo com o advento da Lei de Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/1990). É uma das ferramentas da plea bargaining, própria a um sistema processual penal inteiramente pautado na barganha, em que a reprimenda aplicada ao agente espelha não necessariamente a efetiva reprovabilidade da conduta, e sim a maior ou menor capacidade de negociação com o Estado. No final das contas, a pena imposta ao delator torna-se menor do que a fixada aos demais réus, ainda que a censurabilidade destes últimos seja menor.

Ademais, a colaboração não se restringe tão somente à indicação de comparsas ou ao descobrimento do organograma da organização criminosa, pois, buscam-se, também, informações quanto ao objeto alvo de crime, com o intuito de recuperá-lo; da pessoa vítima do delito (com sua integridade física preservada), ou, ainda, com o objetivo de se prevenir a ocorrência de futuros delitos, o que traz, por conseguinte, economicidade e celeridade na investigação policial, e num possível ajuizamento da ação penal.

Já o colaborador, por sua vez, tem o intuito de conseguir um “prêmio” por meio da colaboração prestada às autoridades públicas, e. g., a redução de até 2/3 de sua pena privativa de liberdade.

Oportuno gizar, ainda, que a colaboração premiada tem previsão expressa no art. 26 da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo, 2000). Veja-se, em parte, a literalidade do artigo.

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Artigo 26

Medidas para intensificar a cooperação com as autoridades competentes para a aplicação da lei

1. Cada Estado Parte tomará as medidas adequadas para encorajar as pessoas que participem ou tenham participado em grupos criminosos organizados:

a) A fornecerem informações úteis às autoridades competentes para efeitos de investigação e produção de provas, nomeadamente

i) A identidade, natureza, composição, estrutura, localização ou atividades dos grupos criminosos organizados;

ii) As conexões, inclusive conexões internacionais, com outros grupos criminosos organizados;

iii) As infrações que os grupos criminosos organizados praticaram ou poderão vir a praticar;

b) A prestarem ajuda efetiva e concreta às autoridades competentes, susceptível de contribuir para privar os grupos criminosos organizados dos seus recursos ou do produto do crime [...]

Relegando as críticas quanto à falta de ética e assimetria com o postulado constitucional da individualização da pena, Avena (2011, p. 586), entende o instituto ora em apreço como “um mecanismo de combate à criminalidade organizada e que, bem empregada, servirá de instrumento importante na busca da verdade real.”

Ou seja, vê-se que a colaboração premiada traz, em seu âmago, importantes diretrizes a serem observadas para que produza efeitos na “vida” do colaborador, tais como a voluntariedade e eficácia, o que, não sendo observado, trará, sem dúvida, sua nulidade, bem como de todas as provas dela decorrente.

Mendonça (2013, p. 1) refere que “a colaboração premiada apresenta importância premente quando se enfrenta o crime organizado. Em razão de suas características [...] os instrumentos tradicionais não dão respostas eficazes.”

Prosseguindo no raciocínio do mesmo doutrinador, veja-se as principais características do crime organizado, a saber:

Segundo este mesmo autor, as principais características do crime organizado (embora sejam variáveis no tempo e no espaço) são: a) acumulação de poder econômico; b) alto poder de corrupção; c) necessidade de “legalizar” o lucro obtido ilicitamente; d) alto poder de intimidação, pela prevalência da lei do silêncio (omertá das organizações mafiosas), com emprego de meios cruéis; e) conexões locais e internacionais e divisão de territórios para atuação; f) estrutura piramidal das organizações criminosas e sua relação com a comunidade; g) cultura de supressão da prova. DA SILVA (apud Mendonça, 2014, p. 1).

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Desta forma, constata-se a necessidade de ter a colaboração premiada como meio de obtenção de prova, especialmente quando se quer desmantelar organizações criminosas, as quais possuem características que destoam da normalidade do cotidiano criminoso, o que requer a existência de novos métodos para investigá-las, já que impróprios os meios convencionais.

1.1 Conceito e legislação

Inicialmente, conceitua-se colaboração premiada por intermédio do entendimento de Gomes e Silva (2015, p. 209), que assim lecionam acerca da temática:

Analisando-se seu estatuto jurídico verifica-se que se cuida de meio de obtenção de prova [ou técnica especial de investigação], de caráter utilitarista e eficientista, formalizada, na presença de seu defensor, em acordo escrito entre o investigado (ou acusado) e o Ministério Público (conjuntamente ou não com a Autoridade Policial), ou em situações muito peculiares entre investigado e a autoridade policial com posterior manifestação ministerial, e a posteriori homologada pelo juiz mediante estrita análise de regularidade, legalidade e voluntariedade [...]

No mesmo sentido é o entendimento de Vladimir Aras (2015, p. 01), ao referir que a “colaboração premiada é um meio de obtenção de prova, regulado em lei. É uma técnica especial de investigação, cuja aplicação deve observar os princípios da legalidade e da proporcionalidade.”

Por fim, quanto à conceituação, colaciona-se recente entendimento da 5ª turma do E. Superior Tribunal de Justiça, expresso no seguinte acórdão.

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO CARCINOMA. CORRUPÇÃO PASSIVA E PECULATO. CRIME

MILITAR. COLABORAÇÃO PREMIADA. JUSTIÇA CASTRENSE.

IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO INSTITUTO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NATUREZA JURÍDICA. MEIO DE OBTENÇÃO DE PROVA E NEGÓCIO JURÍDICO PERSONALÍSSIMO. VALIDADE. QUESTIONAMENTO POR CORRÉUS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.

1. A matéria referente à suposta impossibilidade de utilização do instituto da colaboração premiada no âmbito da Justiça Castrense não foi apreciada pela Corte local, razão pela qual inviável o seu exame direto por este Tribunal Superior sob pena de indevida supressão de instância. Precedentes.

2. A colaboração premiada é uma técnica especial de investigação, meio de obtenção de prova advindo de um negócio jurídico processual personalíssimo, que gera obrigações e direitos entre as partes celebrantes (Ministério Público e colaborador), não possuindo o condão de, por si só, interferir na esfera jurídica de terceiros, ainda que citados quando das declarações prestadas, faltando, pois, interesse dos delatados no questionamento quanto à validade do acordo de colaboração premiada celebrado por outrem. Precedentes do STF e STJ.

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3. Recurso Ordinário em habeas corpus a que se nega provimento.

(RHC 69.988/RJ, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 25/10/2016, DJe 07/11/2016) (grifo nosso).

Por outro lado, em relação à legislação alvo do presente estudo, Renato Brasileiro de Lima (2015, p. 534), destaca a sua relevância:

Daí a importância da nova Lei das Organizações Criminosas: sem descuidar da proteção dos direitos e garantias fundamentais do colaborador – a título de exemplo, seu art. 4º, § 15, demanda a presença de defensor em todos os atos de negociação, confirmação e execução da colaboração [...], a lei nº 12.850/2013 passa a conferir mais eficácia à medida sob comento, seja por regulamentar expressamente a celebração do acordo de colaboração premiada, dispondo sobre a legitimidade para a proposta, conteúdo do acordo e necessária homologação judicial, seja por prever expressamente que nenhuma sentença condenatória poderá ser proferida com fundamento apenas nas declarações do colaborador.

Neste diapasão, corroborando com o entendimento supramencionado, lecionam Cunha e Pinto (2015, p. 17) ao narrarem que “com a nova Lei, a figura da organização criminosa deixou de ser ‘apenas’ uma forma de se praticar crimes para se tornar delito autônomo, punido com reclusão de 3 a 8 anos.”

Seguindo os entendimentos anteriores, Mendonça (2013, p. 1), entende que “a nova legislação aperfeiçoou o sistema nacional, tanto no aspecto penal quanto processual.”

Por fim, o que se visualiza, de forma sucinta, é que a nova legislação de combate ao crime organizado traz em seu âmago regulamentações acerca do procedimento da colaboração premiada, os quais não foram devidamente abordados na antiga lei de combate ao crime organizado, Lei n. 9.034/1995.

1.2 Histórico

O instituto da colaboração premiada, embora de aplicação novel nas searas judicial e policial brasileiras, vem sendo utilizado há muito tempo, sob diferentes vieses, por vários países, modelando-se, é claro, pelas peculiaridades de cada nação no que tange à cultura, aos costumes, às leis processuais e penais vigentes à época, bem como à forma de Estado e de Governo adotada no período histórico em que foi aplicado, tendo, inclusive, aplicação no decorrer da história do Brasil.

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Interessante demonstrar um exemplo, sob conotação histórica, de aplicação do instituto que ora se estuda. Conforme apresenta Baltazar Junior (apud Gomes e Silva, 2015) o fato ocorreu na Holanda, em 1698, quando um ladrão chamado Peer De Bradander, condenado a uma pena de 20 anos de prisão, seguida de 20 anos de banimento, foi solto após dois anos, por ter colaborado com as autoridades.

Outro exemplo de importante valia vem da Itália, pois relacionado com um dos casos mais emblemáticos da história, podendo ser visto por meio do que narram Gomes e Silva (2015, p. 213):

Na Itália, Leonardo Vitale (Palermo, junho 27, 1941 – Palermo, 2 de dezembro de 1984) foi um membro da máfia siciliana Cosa Nostra, tendo sido um dos primeiros a se tornar colaborador, ou pentito, embora originalmente suas confissões não tenham sido levadas a sério. Foi considerado mentalmente insano. Após delações de outro membro da máfia siciliana chamado Tommaso Buscetta, veio a ser morto. Tommaso Buscetta revelou ao juiz italiano Giovanni Falcone (especializado em processos contra mafiosos) a estrutura interna da organização, desmantelando a máfia siciliana Cosa Nostra (da qual Tommaso era membro). Após isso, o juiz Falcone foi assassinado pelo mafioso Giovanni Brusca, quando estava passando por uma estrada que foi dinamitada com explosivos instalados criminosamente.

Em relação ao ordenamento jurídico pátrio, observamos que a legislação que inaugurou a aplicação do instituto da delação premiada foi a Lei nº 8072/1990 (Lei dos Crimes Hediondos), conferindo-se o prêmio legal do parágrafo único do art. 8º da referida lei (redução de um a dois terços na pena), ao delator que denunciasse os integrantes da empreitada criminosa às autoridades públicas integrantes da persecução penal.

Em que pese o instituto tenha sido positivado, no Brasil, somente no início da década de 90, “suas reminiscências reportam-se às Ordenações Filipinas de 1603, que perduraram até o Código Criminal de 1830 [...]” (SANTOS, 2016, p. 67).

Assim, constata-se que a colaboração premiada vem, há muito tempo, sendo considerada como elemento de combate ao crime, aplicada de acordo com as regras ou costumes que a circundam.

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1.3 Constitucionalidade

“A constitucionalidade da colaboração premiada é tema por demais espinhoso, a despertar profunda polêmica doutrinária [...]” (SANTOS, 2016, P. 67).

Estando de acordo com o acima transcrito, Alfredo Carlos Gonzaga Falcão Júnior (2011, p. 2), em sua dicção, refere que “em que falem os longos anos de existência do referido instituto, a divergência sobre sua legitimidade ainda perdura.”

Ou seja, já de antemão, constata-se que trabalhar com a constitucionalidade da colaboração premiada não é tarefa da mais simples. Diante disso, tratar-se-á a questão de forma breve, buscando não esgotar o assunto.

As críticas à colaboração premiada podem ser de diversas ordens, podendo ser elencadas, conforme explanação de Dino (2015, p. 442), na “ausência de ética, excessivo utilitarismo, exposição da debilidade estatal no combate ao crime, contradição com o modelo acusatório, violação ao direito à não autoincriminação.”

Contrário à ideia de recompensar o delator, Beccaria (2005, p. 124), já em sua época, expressava seu desgosto com tal desdobramento em seara penal, porém, não deixava de reconhecer a estratégia, inclusive com algumas vantagens na prevenção de crimes.

Alguns tribunais oferecem a impunidade àquele cúmplice de delito grave que denuncie seus companheiros. Tal expediente tem seus inconvenientes e suas vantagens. Os inconvenientes são que a nação autoriza a traição, detestável mesmo entre os celerados [...] Ademais, o tribunal revela a sua própria incerteza, a fraqueza da lei, que implora a ajuda de quem a ofende. As vantagens consistem na prevenção dos delitos importantes que, por terem efeitos evidentes e autores ocultos, atemorizam o povo [...] Uma tal lei, portanto, deveria unir a impunidade ao banimento do delator... Mas em vão me atormento para destruir o remoso que sinto autorizando as leis sacrossantas, monumentos da confiança pública, base da moral humana, à traição e à dissimulação.

Em seu trabalho, Santos (2016), faz um paralelo entre as posições que criticam e defendem a constitucionalidade da colaboração premiada. Inicia demonstrando a existência de um descompasso entre o instituto e os postulados constitucionais da individualização da pena, do devido processo legal substancial e da dignidade da pessoa humana, trazendo, quanto ao primeiro, o entendimento de Luigi Ferrajoli (apud Santos, 2016, os. 68-98).

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“a devastação do completo sistema de garantias: o nexo causal e proporcional entre a pena e o crime, dado que a medida da primeira dependerá, muito mais do que da gravidade do segundo, da habilidade negociadora da defesa, do espírito de aventura do imputado e da discricionariedade da acusação; os princípios da igualdade, da certeza e da legalidade penais, não existindo qualquer critério legal que condicione a severidade ou a indulgência do Ministério Público, e que discipline o seu engajamento com o imputado...”

Por outro lado, no que tange à constitucionalidade da colaboração premiada, Santos (2016), refere que o instituto está de acordo com o texto constitucional, tanto por respeitar o princípio da individualização da pena quanto o devido processo legal. Nesse ponto, argumenta que as circunstâncias pessoais do agente e o seu comportamento sempre foram levados em consideração, enumerando, como exemplos, a fase de fixação da pena e institutos como a desistência voluntária e arrependimento eficaz e posterior.

Referindo a eficiência que a colaboração pode trazer para o deslinde de um processo criminal, Dino (2015, p. 442), faz alusão à operação ocorrida na Itália na década de oitenta, intitulada de “Mãos Limpas”:

Vale relembrar o caso mundialmente conhecido como “operação mãos limpas”, no qual o mafioso Tommaso Buscetta, preso no Brasil, e daqui extraditado para a Itália, na década de oitenta. Buscetta, quebrando o pacto de silêncio em troca de proteção para si e sua família, desvelou dados importantes acerca da estruturação e do funcionamento da máfia italiana [...] Ao todo, 475 (quatrocentos e setenta e cinco) criminosos foram levados ao banco dos réus, sendo que a Justiça Italiana, à frente da instrução o magistrado Giovanni Falcone (posteriormente assassinado por mafiosos), condenou 331 criminosos no chamado maxiprocesso.

Por fim, destaca-se entendimento do E. Supremo Tribunal Federal, exarado no Habeas Corpus nº 127.483/PR, cujo posicionamento vai ao sentido de reconhecer a constitucionalidade do instituto da colaboração.

Habeas corpus. Impetração contra ato de Ministro do Supremo Tribunal Federal. Conhecimento. Empate na votação. Prevalência da decisão mais favorável ao paciente (art. 146, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Inteligência do art. 102, I, i, da Constituição Federal. Mérito. Acordo de colaboração premiada. Homologação judicial (art. 4º, § 7º, da Lei nº 12.850/13). Competência do relator (art. 21, I e II, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Decisão que, no exercício de atividade de delibação, se limita a aferir a

regularidade, a voluntariedade e a legalidade do acordo. Ausência de emissão de qualquer juízo de valor sobre as declarações do colaborador. Negócio

jurídico processual personalíssimo. Impugnação por coautores ou partícipes do colaborador. Inadmissibilidade. Possibilidade de, em juízo, os partícipes ou os coautores confrontarem as declarações do colaborador e de impugnarem, a qualquer tempo, medidas restritivas de direitos fundamentais adotadas em seu desfavor.

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Personalidade do colaborador. Pretendida valoração como requisito de validade do acordo de colaboração. Descabimento. Vetor a ser considerado no estabelecimento das cláusulas do acordo de colaboração - notadamente na escolha da sanção premial a que fará jus o colaborador -, bem como no momento da aplicação dessa sanção pelo juiz na sentença (art. 4º, § 11, da Lei nº 12.850/13). Descumprimento de

anterior acordo de colaboração. Irrelevância. Inadimplemento que se restringiu ao negócio jurídico pretérito, sem o condão de contaminar, a priori, futuros acordos de mesma natureza. Confisco. Disposição, no acordo de colaboração,

sobre os efeitos extrapenais de natureza patrimonial da condenação. Admissibilidade. Interpretação do art. 26.1 da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo), e do art. 37.2 da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção (Convenção de Mérida). Sanção premial. Direito subjetivo do colaborador caso sua colaboração seja efetiva e produza os resultados almejados. Incidência dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança. Precedente. Habeas corpus do qual se conhece. Ordem denegada. [...] 4. A colaboração premiada é um negócio jurídico processual, uma vez que, além de ser qualificada expressamente pela lei como “meio de obtenção de prova”, seu objeto é a cooperação do imputado para a investigação e para o processo criminal, atividade de natureza processual, ainda que se agregue a esse negócio jurídico o efeito substancial (de direito material) concernente à sanção premial a ser atribuída a essa colaboração. 5. A homologação judicial do acordo de colaboração, por consistir em exercício de atividade de delibação, limita-se a aferir a regularidade, a voluntariedade e a legalidade do acordo, não havendo qualquer juízo de valor a respeito das declarações do colaborador. 6. Por se tratar de negócio

jurídico personalíssimo, o acordo de colaboração premiada não pode ser impugnado por coautores ou partícipes do colaborador na organização criminosa e nas infrações penais por ela praticadas, ainda que venham a ser expressamente nominados no respectivo instrumento no “relato da colaboração e seus possíveis resultados” (art. 6º, I, da Lei nº 12.850/13). 7. De todo modo, nos procedimentos em que figurarem como imputados, os coautores ou partícipes delatados - no exercício do contraditório - poderão confrontar, em juízo, as declarações do colaborador e as provas por ele indicadas, bem como impugnar, a qualquer tempo, as medidas restritivas de direitos fundamentais eventualmente adotadas em seu desfavor. 8. A personalidade do colaborador não

constitui requisito de validade do acordo de colaboração, mas sim vetor a ser considerado no estabelecimento de suas cláusulas, notadamente na escolha da sanção premial a que fará jus o colaborador, bem como no momento da aplicação dessa sanção pelo juiz na sentença (art. 4º, § 11, da Lei nº 12.850/13). 9. A confiança no agente colaborador não constitui elemento de existência ou requisito de validade do acordo de colaboração. 10. Havendo previsão em Convenções firmadas pelo Brasil para que sejam adotadas “as medidas adequadas para encorajar” formas de colaboração premiada (art. 26.1 da Convenção de Palermo) e para “mitigação da pena” (art. 37.2 da Convenção de Mérida), no sentido de abrandamento das consequências do crime, o acordo de colaboração, ao estabelecer as sanções premiais a que fará jus o colaborador, pode dispor sobre questões de caráter patrimonial, como o destino de bens adquiridos com o produto da infração pelo agente colaborador. 11. Os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança tornam indeclinável o dever estatal de honrar o compromisso assumido no acordo de colaboração, concedendo a sanção premial estipulada, legítima contraprestação ao adimplemento da obrigação por parte do colaborador. 12. Habeas

corpus do qual se conhece. Ordem denegada.

(HC 127483, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 27/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 03-02-2016 PUBLIC 04-02-2016). (grifo nosso).

Para chegar à conclusão de que a colaboração premiada está revestida de constitucionalidade, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do writ supramencionado, fez um apanhado acerca da obediência aos preceitos constitucionais. Inicia tratando da

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homologação judicial destacando que o Juízo não deve, nesse primeiro momento, ater-se ao conteúdo do acordo, mas tão somente a verificação da presença de requisitos como a voluntariedade, regularidade e legalidade.

E continua, a E. Suprema Corte, se posicionado, dentre outras questões, acerca da irrelevância de descumprimento, pelo colaborador, ao entabulado em acordo anterior, bem como à impossibilidade de coautores ou partícipes impugnarem o acordo, já que lhes é reservado o direito de, em juízo, confrontar quaisquer provas e declarações advindas ou constantes no acordo.

Assim, de todo exposto, vê-se que o instituto da colaboração premiada, apesar de envolto em críticas, está de acordo com os preceitos constitucionais, acolhido, inclusive, pelo STF.

1.4 Colaboração e delação

Para melhor compreensão do instituto ora objeto de estudo, mister se faz verificar se há distinção entre os termos colaboração e delação premiada.

Inicialmente, Gomes e Silva (2015, p. 211), ensinam que “de fato a Lei 12.850/2013 adotou a locução ‘colaboração premiada’ como gênero, por ser mais amplo. Em razão desta amplitude, trata-se de nomenclatura mais adequada que delação premiada, portanto.”

Corroborando com este entendimento, verifica-se o que preceitua Lima (apud Gomes e Silva, 2015, p. 211) “a colaboração premiada (gênero) subdivide-se em 5 (cinco) espécies, que variam a depender do resultado alcançado [...]”

Assim, segundo Lima (apud Gomes e Silva, 2015, p. 211) tem-se que a delação premiada é identificada, apenas, no contexto do inciso I do art. 4º da Lei 12.850/2013. Já no caso dos incisos II, III, IV e V verifica-se a aplicação da nomenclatura “colaboração”, abrangendo-se, respectivamente, a colaboração reveladora da estrutura e do funcionamento da organização, a colaboração preventiva, a colaboração para localização e recuperação de ativos e a colaboração para libertação.

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Neste sentido é o entendimento de Távora e Alencar (2015, p. 635):

Conquanto sejam, em regra, tratadas como expressões sinônimas, delação premiada e colaboração podem assumir contornos distintos:

1) a colaboração premiada é mais ampla, porque não requer, necessariamente, que o sujeito ativo do delito aponte coautores ou partícipes [...]

2) a delação premiada exige, além da colaboração para a elucidação de uma infração penal, que o agente aponte outros comparsas [...]

Ou seja, conforme entendimentos acima mencionados, a colaboração premiada pode ser vista sob diferentes ângulos de aplicação, como por exemplo, quando o colaborador traz à tona a estrutura da organização criminosa ou indica a localização de bens que foram proveito do crime. Por sua vez, a delação é una, no sentido de que está adstrita a um ato do delator consubstanciado na indicação de outros integrantes da organização criminosa que outrora fazia parte, revelando, assim, a estrutura da organização.

Por outro lado, crítico ao sistema classificatório, Santos (2016, p. 79-80) pontua seu posicionamento, referindo:

[...] apesar da pronta adesão de alguns autores a esse critério de classificação, não estamos minimamente convencidos de sua cientificidade. Preferir vocábulos como “colaboração” ou “cooperação processual” à delação só revela o incômodo as críticas dirigidas à constitucionalidade do instituto, buscando neutralizar a pecha traiçoeira, desleal a qual comumente está associada [...]

A delação é uma espécie de traição? Lógico que sim! Mas é uma das alternativas, legais e legítimas, à disposição do réu, consectário lógico da autodefesa. Vedá-la, sim, seria inconstitucional, ante o art. 5º, LV, da CRFB/88, por cercear o direito de defesa (grifo do autor).

E finaliza: “Colaboração, cooperação e delação premiadas são expressões sinônimas, sim, e assim vêm sendo empregadas academicamente e pela jurisprudência.” (SANTOS, 2016, p. 81).

Nesse ponto, filiamo-nos ao entendimento de que o termo apropriado é colaboração premiada, pois espelha a letra da lei, em claro respeito ao legislador, tendo este expressado sua vontade no sentido de ver tal instituto assim chamado.

Note-se que o legislador demonstra sua escolha por colaboração quando intitula a seção I da Lei n. 12.850/2013, o que deixa claro sua vontade, não persistindo motivos em querer modificar o que a lei deixa tão evidente.

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1.5 Natureza jurídica

A colaboração premiada está prevista como meio de obtenção de prova no art. 3º, I da Lei 12.850/2013, “materializado em um ‘acordo’ reduzido a ‘termo’ para devida homologação judicial (art. 4º, §§ 6º e 7º, da LCO.)” (MASSON; MARÇAL, 2015, p. 102-103).

Ademais, pode-se vislumbrar que a colaboração premiada é uma norma de conteúdo misto, já que do ponto de vista material, ela influencia diretamente no jus puniendi do Estado, quando, por exemplo, o juiz concede o perdão judicial, reduz em até 2/3 a pena privativa de liberdade - isso somente nos crimes realizados por organização criminosa -, substitui a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, não ocorre o oferecimento da denúncia por parte do Ministério Público, caso o colaborador não seja o líder da organização e for o primeiro a prestar colaboração, e por último, quando a colaboração for posterior à sentença, reduzindo-se a pena privativa de liberdade em até a metade ou realizando-se a progressão de regime1.

No tocante ao aspecto processual, verifica-se a realização de todo o procedimento do acordo, bem como sua celebração.

Neste sentido é o entendimento de Gomes e Silva (2015, p. 214-215), que assim ensinam:

Do ponto de vista material, a colaboração premiada é:

a) em todas as situações, uma causa de diminuição de pena, e sempre na escala de 1/3 a 2/3, exceto com relação ao Crime Organizado, que vai até 2/3 [...]

b) causa extintiva da punibilidade na lei geral (art. 13, Lei 9.807); lavagem de dinheiro (art. 1º, §5º, Lei 9.613) [...]

Do ponto de vista processual, a celebração do “acordo de colaboração premiada” em si não é direito subjetivo do acusado, pois o Ministério Público deve verificar a “adequação da colaboração àquele caso concreto, à luz da estratégia investigativa e da persecução penal [...]

Reforçando tal posicionamento, transcreve-se parte do voto do Rel. Min. Dias Toffoli (27.08.2015), que, proferindo voto no HC 127.483/PR, assim entendeu:

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A colaboração premiada é um negócio jurídico processual, uma vez que, além de ser qualificada expressamente pela lei como “meio de obtenção de prova”, seu objeto é

a cooperação do imputado para a investigação e para o processo criminal,

atividade de natureza processual, ainda que se agregue a esse negócio jurídico o efeito substancial (de direito material) concernente à sanção premial a ser atribuída a essa colaboração (grifo do autor).

Assim, verifica-se que a colaboração premiada possui natureza jurídica de norma de conteúdo misto, já que mescla aspectos processuais e consequências evidentemente materiais.

1.6 Requisitos de admissibilidade

No que tange a este tópico, tem-se que são quatro os requisitos que devem estar presentes de forma concomitante para que a celebração do acordo tenha validade jurídica, a saber: i) confissão; ii) voluntariedade, iii) aptidão eficacial, e iv) circunstâncias objetivas e subjetivas (GOMES; SILVA, 2015).

Távora e Alencar (2015, p. 650), quanto aos requisitos, assim lecionam:

1) Pressupostos necessários à homologação da colaboração premiada pelo juiz: a) formulação do requerimento das partes ao magistrado competente;

b) o indiciado ou acusado deve ter colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal (não se exige espontaneidade, bastando a voluntariedade);

c) A colaboração do indiciado ou do acusado deve ser causa de obtenção de resultado útil, de forma isolada ou cumulativa [...]

2) Sujeitos da relação jurídica da colaboração premiada [...]

3) Consequências decorrentes da decisão homologatória da colaboração premiada [...]

Primeiramente, então, necessária a confissão do agente, que é a declaração que ele presta a respeito do fato criminoso perante a autoridade pública, declarando-se culpado, admitindo sua participação na empreitada criminosa.

Em segundo, verifica-se a voluntariedade, e frise-se, neste ponto, que o colaborador ou delator não pode sofrer coações, ameaças ou quaisquer meios violentos ou ilegais para que venha a prestar informações perante as autoridades públicas, podendo, no entanto, ser influenciado pelo Delegado de Polícia, Ministério Público ou pelo seu defensor a colaborar com a investigação ou com o processo (GOMES; SILVA, 2015).

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Nesse mesmo sentido, Cunha e Pinto (2015, p. 42), aduzem que “a lei é clara em se satisfazer apenas com o ato voluntário do colaborador, a saber aquele que nasceu de sua livre vontade, desprovido de qualquer espécie de coação [...]”

Em terceiro, há a chamada aptidão eficacial, que é, sem sombra de dúvidas, importantíssimo requisito do instituto em tela, pois traz o dever de se verificar se o dito pelo colaborador realmente se concretiza no plano fático, alcançando-se ou não os objetivos da investigação, sem os quais não haverá se falar em prêmio legal.

Acerca desse terceiro ponto, Vladimir Aras (2015), explica:

Para uma colaboração eficaz, é preciso obter provas documentais, periciais e técnicas, bem como outros depoimentos de fontes desinteressadas ou independentes. Daí a importância da negociação dos termos do acordo de colaboração entre o Ministério Público e o advogado ou defensor, de modo que ao longo de sucessivos encontros entre as partes sejam identificados os elementos indiciários e de prova que confirmarão o depoimento do colaborador. Não basta que o colaborador

compareça em juízo e lance acusações a esmo contra os corréus ou contra os autores de outro crime. As negociações do acordo, coordenadas pelo Ministério

Público, com ou sem a participação da autoridade policial, devem sempre ocorrer na presença do acusado e de seu defensor. O acordo de colaboração é uma

construção das partes e vai sendo lapidado à medida que os fatos são reconhecidos, checados e corroborados [...] (grifo do autor).

Em quarto lugar, verificam-se as circunstâncias subjetivas e objetivas, que são trazidas pelo §1º do art. 4º da Lei 12.850/2013.

Nesse ponto, destaca-se o que diz o Manual da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Ativos (2014), ao referir que “a autoridade policial e o Ministério Público não são obrigados a propor ou aceitar a oferta de colaboração quando julgarem, pela circunstância do caso, que ela não é necessária.”

Vale dizer, então, que o Ministério Público e o Delegado de Polícia devem atuar com parcimônia quando visualizarem possibilidade de acordo com um criminoso disposto a colaborar, pois a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade, a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração serão consideradas em qualquer caso levado ao Juízo.

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Ademais, importante o anteriormente dito, pois o magistrado poderá recusar homologação ao termo celebrado entre o colaborador e o MP ou entre aquele e a autoridade policial, nesse caso ouvido o MP. Tal recusa vem expressa no art. 4º, § 8º, da Lei n. 12.850/2013.

Caso opte pela homologação, não estará impedido de atuar na fase processual, pois no momento em que homologou o acordo, como já anteriormente explanado, sua atividade ficou restringida à análise da regularidade da tratativa, sem adentrar em questões meritórias. Tanto o é que em recente decisão o Superior Tribunal de Justiça entendeu que o Juiz que homologa acordo não está impedido de atuar na ação penal.

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. ARTIGOS 4º DA LEI N.7.492/1986 E 1º, VI, DA LEI N. 9.613/1998. MAGISTRADO QUE HOMOLOGA ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA. IMPEDIMENTO. INEXISTÊNCIA. ARTIGO 252 DO CPP. HIPÓTESES TAXATIVAS. JUNTADA DE DOCUMENTOS NO CURSO DA AÇÃO PENAL. DETERMINAÇÃO JUDICIAL EX OFFICIO. POSSIBILIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

1. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. Esse entendimento objetivou preservar a utilidade e a eficácia do mandamus, que é o instrumento constitucional mais importante de proteção à liberdade individual do cidadão ameaçada por ato ilegal ou abuso de poder, garantindo a celeridade que o seu julgamento requer. 2. As causas de impedimento do Magistrado para o

processamento e julgamento da causa são circunstâncias objetivas relacionadas a fatos internos ao processo, previstas, taxativamente, no artigo 252 do Código de Processo Penal. 3. Nesse diapasão: a) não é possível interpretar-se extensivamente os seus incisos I e II de modo a entender que o juiz que atua em fase pré-processual desempenha funções equivalentes ao de um delegado de polícia ou membro do Ministério Público ( HC 92893, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 02/10/2008, DJe de 11/12/2008); b) não se pode ampliar o sentido do inciso III de modo a entender que o juiz que atua em fase pré-processual ou em sede de procedimento de delação premiada em ação conexa desempenha funções em outra instância (o desempenhar funções em outra instância é entendido aqui como a atuação do mesmo magistrado, em uma mesma ação penal, em diversos graus de jurisdição) - HC 97553, Relator Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 16/06/2010, DJe de 09/09/2010. 4. Na hipótese vertente, não houve exteriorização de qualquer juízo de valor acerca dos fatos ou das questões de direito emergentes na fase preliminar que impeça o Juiz oficiante de atuar com imparcialidade no curso da ação penal. O acórdão impugnado considerou que a participação do magistrado restringiu-se à homologação do acordo de delação premiada e a sentença consignou que os depoimentos dos delatores não haviam sido isoladamente considerados para embasar a condenação. 5. Em resumo, a homologação do acordo de colaboração premiada pelo Magistrado não implica seu impedimento para o processo e julgamento da ação penal ajuizada contra os prejudicados pelas declarações prestadas pelos colaboradores, não sendo cabível interpretação extensiva do artigo 252 do CPP. Precedentes. 6. Em obediência ao princípio da

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busca da verdade real e pela adoção do sistema de persuasão racional do juiz, é possível que o magistrado, na fase processual, determine a produção de provas ex officio, desde que de forma complementar à atividade probatória das partes. No caso, o juiz, conhecedor de elementos probatórios constantes de outras ações penais conexas à presente, e que poderiam suprir dúvidas existentes nos autos sobre pontos relevantes para o julgamento da causa, determinou a sua juntada ao procedimento criminal, com a reabertura de prazo às partes para manifestação. Inteligência dos arts. 156, II e 502 da Lei Adjetiva Penal.

7. Habeas corpus não conhecido. (HC 221.231/PR, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 21/03/2017, DJe 29/03/2017) (grifo nosso).

O referido acórdão pontua que há requisitos a serem observados por todas as partes atuantes na confecção do acordo, bem como são de suma importância para o bom andamento da possível ação penal que o sucederá, pois balizam o atuar dos diferentes agentes envolvidos.

1.7 Prêmios Legais

Neste último tópico, serão estudados os prêmios legais, sendo abordados aqueles elencados na Lei nº 12.850/2013 (Lei do Crime Organizado).

Antes de adentrar nos prêmios propriamente ditos, cabe destacar lição de Aras (2015):

Recompensas em troca de colaboração do acusado ou de seu arrependimento ativo não são estranhas ao direito penal. Estão, por exemplo, no já mencionado instituto da confissão espontânea, tratada como atenuante, e no arrependimento eficaz e no arrependimento posterior (arts. 15 e 16 do CP).

Por outro lado, expressando opinião diversa, Santos (2016) afirma que a colaboração vai de encontro aos preceitos de um devido processo legal justo, na medida em que é o Estado usando de artimanha para demonstrar o acerto de sua pretensão condenatória. Refere, ainda, que a atitude do colaborador seria de dupla traição, pois além de não respeitar a sociedade (tendo em vista o crime cometido), volta-se, também, contra os comparsas, quebrando o pacto criminoso, e justamente é este quem recebe o prêmio.

Adentrando especificamente aos tipos de prêmios legais, inicialmente se verifica o perdão judicial, cujo conteúdo está inserido no caput do art. 4º do novo diploma de combate ao crime organizado e, segundo o entendimento de Gomes e Silva (2015, p. 250), “[...] consiste na possibilidade de o juiz deixar de aplicar a pena cominada, eis que é judicial. Ademais, só se perdoa quem teve reconhecida a culpabilidade [...]”

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Em relação ao prêmio de redução da pena em até 2/3 (dois terços) que está insculpido no art. 4º, caput da Lei nº 12.850/2013, ensinam Gomes e Silva (2015) que a redução de até 2/3 (dois terços) recai na colaboração prestada nas fases pré-processual e processual. Na fase pós-processual a redução aplicável é de até a ½ (metade) ou a progressão do regime.

No que tange à substituição por pena restritiva de direitos e seus requisitos, aborda-se o que estabelecem Gomes e Silva (2015, p. 262) “[...] estão previstos, [...] nos artigos 43 e 44 do Código Penal, devendo-se observar ao número de medidas restritivas aplicáveis em face da quantidade de pena privativa de liberdade.”

Em se tratando do prêmio de não oferecimento da denúncia (imunidade) (art. 4º, § 4º da LCO), vê-se que não se trata de mero arquivamento, mas sim, de acordo de imunidade, sendo verdadeira exceção ao princípio da obrigatoriedade da ação penal pública, em que o Parquet poderá optar em não processar o colaborador em relação aos fatos criminosos específicos que este relatar. Destaque-se que essa imunidade não é direito subjetivo do acusado, mas mera faculdade do Ministério Público (GOMES; SILVA, 2015).

Como já referido acima, de forma sucinta, configurar-se-á o prêmio de redução da pena até a metade ou progressão de regime (art. 4º, § 5º da LCO), “se a colaboração for posterior à sentença transitada em julgado (denominada pela doutrina de colaboração tardia ou pós-processual)” (GOMES; SILVA, 2015, p. 270).

Assim, deve-se ater ao fato de que a diminuição da pena do colaborador é personalíssima, ou seja, somente pode desfrutar de tal benesse aquele que efetivamente colaborou para o deslinde da persecução criminal, não se admitindo quaisquer prêmios a terceiros não participantes do acordo de colaboração.

Após analisados os aspectos conceituais, legislativos, históricos, a constitucionalidade, a diferenciação entre colaboração e delação, natureza jurídica, requisitos de admissibilidade e os prêmios legais, no próximo capítulo será abordado outro instituto da Lei n. 12.850/2013, que trata acerca da infiltração de agentes policiais.

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2 INFILTRAÇÃO DE AGENTES

Inicialmente, pode se registrar que a técnica especial de investigação agora debatida é uma medida que deverá ser realizada de modo subsidiário aos demais meios de obtenção de prova, pois, além de trazer perigo à integridade física do policial que a exerce, estará, assim, de acordo com o disposto pelo novo diploma legal de combate ao crime organizado, especificamente ao § 2º do art. 10 da Lei 12.850/2013.

“A infiltração de agentes é medida a ser adotada em ultima ratio, e a periculosidade inerente a toda Organização Criminosa justifica o emprego de procedimentos investigatórios mais invasivos.” (GOMES; SILVA, 2015, p. 394).

E por que, para o autor acima, a infiltração é considerada a última razão? Em primeiro, pelo simples motivo de ser uma técnica investigativa altamente invasiva, pois vai de encontro aos ideais de direitos fundamentais preconizados no texto constitucional, tais como a intimidade, a vida privada e à inviolabilidade do domicílio. E, em segundo, tal fato é preconizado pelo legislador, mais especificamente ao § 2º do art. 10 da Lei 12.850/2013, quando determina que somente possa ser utilizada quando não houver outros meios disponíveis.

Nos dizeres de Saraiva (2015, p. 205):

Agente infiltrado ou agente encoberto é o investigador (na maioria dos casos, policial) que, com a autorização competente, assume identidade fictícia no curso de investigação criminal e se incorpora, de forma mais ou menos próxima, a atividade criminal em andamento, por maior ou menor período, para conquistar confiançados investigados, com a finalidade de obter elementos que de outro modo dificilmente se conseguiriam. Consiste em uma das chamadas técnicas especiais de investigação (TEI).

Ou seja, já de início se vê que a infiltração de agentes é técnica invasiva, bem como de caráter um tanto perigoso para aquele que se dispõe a fazê-la, características estas que, só por si, indicam o quanto sua execução deve ser planejada pela autoridade policial e quanto deve usar de parcimônia o Juízo que a autoriza.

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2.1 Aspecto legislativo e histórico

Inicialmente é necessário frisar, no concernente ao ordenamento jurídico pátrio, que a infiltração de agentes já era tratada na Lei 9.034/1995 (antiga lei do crime organizado e revogada pela Lei 12.850/2013), porém, de maneira deveras singela. Referido diploma legal, em seu art. 2º, inc. V, mencionava que a infiltração poderia ser realizada por agentes de polícia ou agentes de inteligência, abrindo, assim, o leque de corporações que poderiam ter agentes infiltrados em suas operações, pois permitia que agentes de inteligência desempenhassem tal papel investigativo, o que não ocorre na Lei 12.850/2013 (CUNHA; PINTO, 2015).

A nova lei de combate ao crime organizado, além de não fazer referência aos agentes de inteligência, traz a tona uma mudança de paradigma quando de sua entrada em vigor, o que se estuda por intermédio do entendimento de LIMA (2015, p. 571).

Se, até bem pouco tempo atrás, a infiltração policial era tratada de forma omissa e lacunosa, a nova Lei das Organizações Criminosas passa a dispensar maior atenção à matéria, tratando de regulamentar este importante procedimento investigatório ao prever, por exemplo, seus requisitos, prazo de duração, legitimidade para o requerimento, necessidade de oitiva do órgão ministerial, controle jurisdicional prévio, tramitação sigilosa do pedido de infiltração, outorgando, ademais, diversos direitos ao agente infiltrado.

Outro diploma legal que tratou do tema foi a lei 11.343/2006 (Lei de drogas), que a prevê em seu art. 53, inciso I. Entretanto, esta também não adentra em detalhes relativos ao procedimento, prevendo, apenas, a possibilidade de infiltração de agentes de polícia em qualquer fase da persecução criminal, mediante autorização judicial e oitiva do representante do Ministério Público (MASSON; MARÇAL, 2015).

Superada a questão legislativa interna, necessário mencionar que a infiltração de agentes, assim como a colaboração premiada, também está inserida no corpo da Convenção de Palermo, cuja internalização se deu pelo Decreto 5.015/2004.

No que tange à origem histórica, pode-se dizer que é francesa, pois Eugène François Vidocq, no século XVIII, criou uma unidade à paisana informal chamada “Braigada de la Sûreté” (Brigada de Segurança) (MASSON; MARÇAL, 2015).

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Segundo Mitchel P. Roth e James Stuart Olson (apud Gomes e Silva, 2015, p. 390) verifica-se que na Inglaterra, desde a criação da primeira força policial moderna, em 1829, por Sir Robert Peel, infiltravam-se detetives disfarçados, porém, nesta época, a opinião pública não era muito favorável a tais medidas, pois havia a desconfiança de que as estavam usando para fins de repressão política. Então, somente em 1869 foi criada formalmente a divisão à paisana de detetives pelo comissário de polícia Edmund Henderson.

Por sua vez, “o marco regulatório da [...] infiltração de agentes no campo da investigação criminal surge em meados da década de 80 do século XX, tanto nos ordenamentos jurídicos europeus, bem como os latino-americanos.” (GOMES; SILVA, 2015, p. 390).

Portanto, vê-se que o ordenamento jurídico pátrio é um tanto quanto incipiente quanto ao tema, porém, o advento da nova lei do crime organizado trouxe consideráveis avanços, os quais serão oportunamente estudados nos tópicos que seguem.

2.2 Conceito

Inicialmente, Gomes e Silva (2015, p. 392-393), lecionam que cabe a doutrina conceituar infiltração de agentes, já que a legislador não o fez. Deste modo, assim conceituam.

A infiltração de agentes trata-se de técnica especial de investigação excepcional e sigilosa em que, após prévia autorização judicial (guardada a devida proporcionalidade com a medida), um ou mais policiais, que sem revelar suas respectivas identidades ou condições de policiais, são inseridos de maneira dissimulada no bojo da engrenagem delitiva da Organização Criminosa com vistas a escaneá-la e colher provas ou fontes de provas suficientes a permitir a desarticulação da referida Organização, encontrando assim os seus mandantes (ou homem de trás ou Hintermann), ou aqueles que controlam os fios (drahtzieher), bem como seus executores ou figuras periféricas (Randfiguren).

Por outro lado, na visão de Masson e Marçal (2015, p. 208) a conceituação pode ser vista da seguinte maneira.

A infiltração de agentes consiste em um meio especial de obtenção da prova – verdadeira técnica de investigação criminal -, por meio do qual um agente de polícia, judicialmente autorizado, ingressa em determinada organização criminosa, forjando a condição de integrante, com o escopo de alcançar informações a respeito de seu funcionamento e de seus membros.

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Para melhor compreensão do instituto alvo de estudo, interessante demonstrar, segundo Eduardo Araujo da Silva (apud Masson e Marçal, 2015) três características que são inerentes à infiltração, a saber: a) a dissimulação, que se refere tanto ao ato do agente infiltrado em não revelar suas reais intenções, bem como omitir sua verdadeira condição de agente policial; b) o engano, que nada mais é do que o fingimento ou a simulação das atitudes do agente, com as quais ele consegue obter a confiança dos membros da empreitada criminosa; e, por último, a interação, ou seja, as relações intersubjetivas entre o agente infiltrado e o(s) autor(es) da organização criminosa.

Já no entendimento de Gomes e Silva (2015, p. 392), a infiltração de agentes possui duas características de suma importância, a primeira é que se trata de medida excepcional, devendo ser usada somente se não houver outro meio capaz de alcançar os objetivos da investigação, e a segunda é a sigilosidade que a medida deve resguardar para o seu bom andamento.

2.3 Agente provocador

O agente provocador, como o próprio nome sugere, é aquele que “tem como objetivo induzir ou instigar o cometimento de delito e, no caso brasileiro e de diversos países, não é admitido pela lei.” (SARAIVA, 2015, p. 206).

E acrescenta o referido autor “delitos (aparentes) derivados dessa ação tenderiam a ser considerados como crimes de flagrante preparado, de flagrante provocado, crimes putativos ou de ensaio, que doutrina e jurisprudência rechaçam.” (SARAIVA, 2015, p. 206).

Nesse mesmo sentido é o entendimento de Masson e Marçal (2015, p. 213) quando lecionam que “a atuação do agente provocador (teoria da armadilha ou doutrina do entrapment defense) redundará na formação da prova viciada [...] (grifo do autor).

Para exemplificar, Lima (2015), traz em seu livro a suposição de como policiais poderiam preparar um flagrante. Refere, então, que os agentes estatais, após prenderem um traficante, usaram de informações obtidas no computador pessoal dele para ligar a usuários e simular a venda de drogas. Fato contínuo, os policiais efetuam a prisão dos compradores da

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droga, depois destes terem adquirido o entorpecente no ponto marcado, imputando-lhes a prática do art. 28, da Lei 11.340/06.

Cunha e Pinto (2015, p. 115) também exemplificam o tema, referindo que:

Se imaginássemos uma linha férrea, o agente provocador é aquele que, pilotando a locomotiva, a retira da inércia, dando início à viagem. Já o agente infiltrado adentra a composição quando ela já se encontrava em movimento, não sendo ele quem dá origem à ação, ainda que, nesse meio tempo, venha a assumir a função de condutor do trem.

Por outro lado, insta destacar o entendimento jurisprudencial acerca do tema, o qual entende não ser válido o flagrante preparado. Nessa perspectiva, colaciona-se recente precedente do Tribunal de Justiça do RS, que assim se posiciona em relação ao tema.

APELAÇÃO. TRÁFICO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PORTE ILEGAL DE ARMA. 1. Da preliminar de nulidade. Não se mostra necessária a realização de prova técnica de toda a substância apreendida, sendo possível a elaboração do auto de constatação da natureza da substância com apenas parte da droga. Por outro lado, o auto de apreensão bem descreve com quem foram apreendidas as substâncias entorpecentes. Preliminar defensiva afastada. 2. As provas produzidas sob contraditório judicial são frágeis a embasar o juízo condenatório por tráfico imputado ao réu A. A. S. N. Apreensão de quantidade não expressiva de drogas. Ausência de circunstâncias indicativas da destinação da droga a terceiros, uma vez que não foram apreendidos quaisquer outros elementos destinados à fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas, bem como armas ou demais objetos comumente ligados à traficância. Por outro lado, inegável a situação de flagrância do réu, com quem foram apreendidas as drogas. No caso, portanto, entende-se que o réu mantinha a droga para consumo próprio, de maneira que, no referido ponto, a sentença merece ser reformada, a fim de desclassificar a conduta para o artigo 28, caput, da Lei n.º 11.343/2006. A desclassificação, no caso concreto, ocorre em razão do pedido expresso formulado pela defesa do acusado em sede de memoriais escritos oferecidos na origem, circunstância que não afronta o disposto na Súmula n.º 453 do Supremo Tribunal Federal. Operada a desclassificação, extinta está a punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva. 3. A hipótese de flagrante preparado, ainda que omitida por

ocasião da lavratura dos autos de prisão em flagrante, está claramente confirmada pelos policiais militares responsáveis pelas prisões, reforçada pelo testemunho do Delegado de Polícia responsável pela elaboração do relatório final das investigações. Em momento algum, os condutores das prisões, durante a fase inquisitorial, revelaram a existência de telefonemas relacionando os acusados, o que fez crer, num primeiro momento, que as prisões teriam sido realizadas ao acaso, em especial as dos acusados T. C. T., A. G. R., E. G. e J. G. H., pois afirmaram que a abordagem ocorreu pelo fato de que, mediante patrulhamento de rotina, suspeitaram do veículo Fiat/UNO. Em juízo, todavia, os policiais confirmaram as suspeitas levantadas pelo Delegado de Polícia durante a conclusão dos inquéritos policiais, no sentido de que, de fato, a partir dos aparelhos telefônicos celulares apreendidos, conseguiram manter contato com os supostos fornecedores do réu A. A. S. N. e, subsequente, com os demais flagrados, em verdadeiro efeito cascata. 4. Afastada a licitude do meio probatório originário da operação que ensejou a denúncia dos acusados pelo cometimento dos crimes narrados na denúncia, os depoimentos colhidos não se

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prestam a oferecerem supedâneo probatório hábil a ensejar um juízo condenatório. Disso resulta flagrante preparado, igualmente, devem ser reputadas ilícitas por derivação. Assim, não havendo nenhuma outra prova a

corroborar a condenação, impositivo sejam os réus absolvidos dos crimes descritos na denúncia. Absolvição dos réus decretada. PRELIMINAR REJEITADA. UNÂNNIME. RECURSO DEFENSIVO DE A. A. S N. PROVIDO EM PARTE. EXTINTA A PUNIBILIDADE EM RELAÇÃO AO CRIME DE POSSE DE DROGAS PELA PRESCRIÇÃO. UNÂNNIME. RECURSOS DOS RÉUS A.G.R., T.C.T., E E.G. PROVIDOS, POR MAIORIA. RESTITUIÇÃO DE BENS. UNÂNIME. (Apelação Crime Nº 70064847874, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Miguel Achutti Blattes, Julgado em 14/12/2016) (grifo nosso).

Veja-se, então, que no precedente acima mencionado, o Juízo logrou êxito em descobrir, diante da assimetria dos depoimentos dos policiais atuantes na diligência, a ocorrência de flagrante preparado, o que, só por si, tornou ilícitas as provas dela derivadas, sendo, ao final, decretada a absolvição dos réus, já que não havia outra prova juntada aos autos.

Também este é o entendimento do Supremo Tribunal Federal, o qual, diante de reiterados julgados no mesmo sentido, consolida o entendimento acerca da matéria por meio da edição da Súmula nº 145, que estabelece: “não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.”

Diante disso, verifica-se que o agente provocador não está em consonância com os preceitos doutrinários e jurisprudenciais pátrios e que, caso venha a ser utilizado, desaguará, inevitavelmente, em nulidade das provas derivadas de seu uso.

2.4 Requisitos

Neste momento serão abordados os requisitos que deverão estar presentes para que esta técnica especial de obtenção de prova possa ser corretamente aplicada pelos integrantes da persecução penal.

Em primeiro, há que se considerar que deverão estar presentes os indícios de crime de participação em organização criminosa nos termos da Lei 12.850/2013, ou de tráfico de drogas conforme a Lei 11.343/2006. Neste primeiro requisito, constata-se não ser necessário ter uma prova efetiva de cometimento de crime por uma organização criminosa, mas sim, somente indícios da materialidade, não se exigindo prova, nem indícios de autoria da prática

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de conduta ilícita. Verifica-se também que a técnica de infiltração de agentes policiais não poderá ser colocada em prática quando os sujeitos ativos participam de associação criminosa (art. 288, Código Penal), ou de milícia privada (art. 288-A, Código Penal) (GOMES; SILVA, 2015) (grifo nosso).

Masson e Marçal (2015, p. 220), trazem duas condicionantes para o deferimento da infiltração policial: “pela primeira (fragmentariedade), exige-se a existência de indícios do crime de organização criminosa; pela segunda (subsidiariedade), impõe que a prova não possa ser produzida por outros meios disponíveis.”

Por sua vez, Lima (2015), entende que devem estar presentes o fumus comissi delicti e o periculum in mora. No que tange ao primeiro, diz respeito à existência de elementos indiciários que indiquem a prática de infração penal. Quanto ao segundo, refere-se ao perigo que a não realização imediata da medida pode trazer a toda persecução penal.

Pondo fim a este primeiro requisito, traz-se o magistério de Cunha e Pinto (2015, p. 102), os quais destacam “que o legislador não exigiu, para o deferimento da medida, a presença de “indícios de autoria [...] Contentou-se, apenas, com ‘indícios de infração penal.’”

Em segundo, há a prévia, circunstanciada, motivada e sigilosa autorização

judicial2: Nesse ponto, verificam-se os requisitos que devem ser observados pelo magistrado no momento em que ele aprecia a representação ou o requerimento de infiltração, tendo o dever de motivar e circunstanciar a sua decisão de forma pormenorizada, bem como, e de suma importância para o sucesso do instituto, que observe a sua natureza sigilosa (GOMES; SILVA, 2015) (grifo nosso).

Para corroborar o entendimento supramencionado, verificam-se quatro questionamentos que o juiz deverá responder no momento em que aprecia o pedido de infiltração, são eles:

a) O meio de investigação (infiltração policial) é adequado a obtenção do fim perseguido na operação encoberta? b) Foram demonstrados os indícios mínimos da prática do crime de organização criminosa (fragmentariedade)? c) Foram previamente esgotadas outras medidas investigativas (subsidiariedade) menos

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