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Temas, Ressonâncias e Dissonâncias da Pósgraduação na Formação de Docentes/pesquisadores De/para Educação Física da Região Sudeste no Nordeste Brasileiro

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CAPÍTULO IV

Temas, ressonâncias e dissonâncias da

pós-graduação na formação de docentes/pesquisadores

de/para Educação Física da região Sudeste no

Nordeste brasileiro

(2)

P

ara falar em “temas, ressonância e dissonâncias 1 da pós-graduação

na formação de professores de Educação Física da região Sudeste no Nordeste brasileiro” procurei me centrar numa pergunta inicial, que de-flagrou a coleta e sistematização dos dados de diferentes estados desta segunda região, interpretada por mim da seguinte forma: qual o impacto/influência/ importância da pós-graduação na formação de/para professores de educação física do Sudeste no Nordeste? Num primeiro momento fiquei tentada a dar uma resposta simplista, pois os dados, aparentemente, indicam que, embora muito docentes tenham buscado as pós-graduações da região Sudeste, o maior percentual geral de formação efetivamente ocorreu no próprio Nordeste. São 271 títulos obtidos nesta região dos 632 trabalhos pesquisados.

Contudo, proponho aqui uma análise mais pormenorizada e terminar olhando os dados por décadas de formação e problematizando os grupos de pesquisa e referenciais aos quais, cada trabalho, esteve vinculado. Além disso, gostaria de ao olhar para os dados acatar a tese defendida por Carvalho e Jesus (2011) e anunciada em 2004 por Betti et al, de que a pós-graduação em edu-cação física brasileira, com reflexos evidentes na formação inicial, descreve uma “atração (fatal) para a biodinâmica”. Tese esta reforçada em 2015, por um documento produzido por pesquisadores da área sociocultural e pedagógica da Educação Física, denunciando o trato desigual da produção, cuja característica principal é ser polissêmica. Relata o documento que hoje

[...] a subárea biodinâmica detém mais de 70% da dimensão total dos cursos de pós-graduação vinculados à educação física enquanto que às subáreas sociocultural e pedagógica cabem apenas 14,5% e 13,3%, res-pectivamente.

Ou seja, somados chegam a 27,8%. O trato desigual diz respeito à forma assumida pela avaliação do sistema brasileiro de pós-graduação, especialmente na área 21, da qual a Educação Física é parte, que ao adotar critérios advindos das Ciências Naturais, e que tem feito inúmeros pesquisadores ligados ao refe-rencial das Ciências Humanas e Sociais se descredenciarem ou migrarem para outros programas, no qual suas produções são avaliadas com critérios condi-zentes. Paulatinamente a polissemia dá lugar ao discurso do, permitam-me um trocadilho, “pensamento único”.

Desta forma, a exposição está dividida em duas partes: na primeira, faço uma retomada da pós-graduação brasileira e da pós-graduação em Educação Física, situando, sobretudo, as mudanças nas políticas governamentais, que a meu ver induzem a este quadro de dissonâncias.

1. Embora o conceito de ressonância e dissonância provenha da Física, me aproprio deles e os resignifico para este estudo. Como trata-se de no primeiro caso, um fenômeno de produção de sons que reverbera em frequência própria, por resultado de estímulos externos que possuem a mesma frequência a dissonância, seu contrário, ou seja, reunião de sons que causa desarmonia, aqui passo a usá-lo quando da relação entre um estímulo advindo da pós-graduação reverbera, encontra afinidade com outrem e dissonância, quando acontece um descompasso, uma crise, uma incapacidade de gerar conhecimento conjuntamente.

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Na segunda parte, defendo, tomando os conceitos apropriados da física de ressonância e dissonância (conforme explicitado anteriormente), que hou-ve uma ressonância do Sudeste na pós-graduação do Nordeste, especialmente se nos atentarmos aos temas, teorias, referências como também empatia, receptividade e interesses comuns que extrapolam o acadêmico. Assim, tal influência não se dá por imposição, mas sim por “atração e fusão” de interesses. Também será nesta mesma década que a busca por formação em outros países, com destaque para Portugal, ganha força. Penso que foi pelas ressonâncias e dissonâncias que se constitui o campo científico (BOURDIEU, 1983) da Edu-cação Física. Os pesquisadores que detinham um capital simbólico e outros tipos de capital se estabeleceram, enquanto outros procuravam se afirmar, ou como diria Bourdieu, eram novatos/pretendentes deste campo.

Criei um gráfico que mostra por décadas como se comportou a atrativi-dade por alguns temas e por algumas instituições, fruto deste capital presente nas instituições e nos docentes. Tal capital advém dos referenciais que estes defendiam e defendem, bem como da atratividade pessoal que exerciam e exercem e as oportunidades postas em cada momento histórico. Oportunida-des materiais como vaga, bolsas de estudos, condições materiais para cursar a pós-graduação, bem como simbólicas: aproximação com referencial teórico do grupo em que se inseriu, empatia pessoal etc.

1. Pós-graduação brasileira e Pós-graduação em

Educação Física: dissonâncias

A pós-graduação brasileira é jovem, se comparada a outros países com os quais mantemos relações atualmente, data efetivamente da década de 1960. Foi criada “[...] com o objetivo de formar um professorado competente para atender com qualidade à expansão do ensino superior e preparar o cami-nho para o decorrente desenvolvimento da pesquisa científica.” (KUENER; MORAES, 2005, p. 1342).

De lá até os dias de hoje houve mudanças substanciais em sua forma de funcionamento. O primeiro levante esteve relacionado ao milagre econômico brasileiro, época do regime militar, como relata Kuener e Moraes (2005, p.1344).

Chamamos a atenção para o ano em que foi elaborado o Parecer (de regulamentação da pós-graduação): 1965, o segundo do regime militar. Não foi casual. De fato, um dos acontecimentos aparentemente mais contraditó-rios da história recente do Brasil tenha sido talvez o boom experimentado pela pós-graduação brasileira, sobretudo a partir de 1970, quando um número significativo de seus cursos se consolida ou se constitui, com franco apoio do regime, então em seus mais difíceis anos de chumbo (MORAES, 2002). Naquela época, as políticas modernizadoras e de financiamento para as

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insti-tuições brasileiras de ensino superior foram consequência, também, de uma aliança tácita – e quase sempre conflituosa – entre as elites militares de direita e as elites acadêmicas, intelectuais e cientistas de esquerda. Os dois grupos ti-nham em comum o nacionalismo e a crença compartida nos poderes da ciência e da tecnologia (SCHWARTZMAN, 2001).

Foi nestas circunstâncias que a Capes criou, em 1976, um sistema nacional de acompanhamento da pós-graduação brasileira. Assim, de 1975 a 1979 as políticas governamentais tentaram implementar o I Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG). Neste contexto nasceu o primeiro curso de pós--graduação em Educação Física no Brasil, segundo Quadros e Afonso (2011).

O surgimento do primeiro mestrado acadêmico na Escola de Educação Física e Esportes da Universidade de São Paulo (EEFE-USP), em 1977, teve como finalidades a capacitação de docentes para o ensino superior e a pro-moção do desenvolvimento de conhecimentos na área através da pesquisa. (AMADIO, 2007). Esse fato, para Kokubun (2006), originou-se na medida em que foi percebida a necessidade de capacitar profissionais para a atuação no ensino superior para formar profissionais da área com o objetivo de aplicar e conduzir o conhecimento adquirido no curso de graduação.

Em 1979 foi criado o curso da Universidade Federal de Santa Maria e em 1980 o da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que foi seguido pela criação do curso de pós-graduação da Universidade Estadual de Campinas, em 1988 e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1989. Ora, estes da-dos parecem indicar uma clara indução para a criação de cursos na região Sul e Sudeste. Certamente não se pode afirmar que isto não tenha sido proposital, já que um breve olhar para a forma de contratação e o incentivo a realização de mestrados e doutorados destes primeiros professores da pós-graduação em Educação Física fora do Brasil indicarem isto. Tais dados não foram investiga-dos até hoje, mas certamente um olhar sobre os mesmos poderiam revelar os primórdios da constituição do campo científico da Educação Física brasileira. Estes poderiam ser cotejados com o dos egressos e configurar a relevância e as tendências de temas, abordagens metodológicas etc. da pós-graduação em Educação Física em seus primeiros anos e o impacto disto na constituição do campo.

Houve o período de 1982-1985 um II PNPG e o III entre os anos 1986-1990. Porém, foi o IV e V PNPG que introduziram mudança substancial ao sistema de pós-graduação, especialmente na forma de avaliação.

O novo modelo de avaliação, uma vez que valoriza prioritariamente a produção científica e, portanto, a pesquisa, provocará a inversão proposta anos antes pelo III PNPG: o deslocamento da centralidade na docência para a centralidade na pesquisa. Em que pesem as justificadas críticas à sistemática de avaliação, pode-se identificar uma vez mais o papel indutor do Estado no redirecionamento da pós-graduação.

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Reconhece-se o caráter positivo da indução que postulou a centralidade da pesquisa na pós-graduação e o seu caráter de cientificidade. Contudo, são manifestos alguns aspectos negativos e não resolvidos do novo modelo, os quais podem ser resumidos em dois pontos principais. Por um lado, a exacerbação quantitativista que, como de resto ocorre com os modelos econométricos, só avalia o que pode ser mensurado. [...] Por outro lado, as exigências relativas à produção acadêmica geraram o seu contrário: um verdadeiro surto produtivista em que o que conta é publicar, não importa qual versão requentada de um produto, ou várias versões maquiadas de um produto novo. A quantidade institui-se em meta. Deste modo, formas le-gítimas de produção, como co-autorias e organizações de coletâneas – em inúmeros casos produtos de sólidas pesquisas integradas –, banalizaram-se no âmbito de algumas áreas de conhecimento. (KUENER; MORAES, 2005, p.1347).

Destas áreas de conhecimento que parecem ter banalizado a produção está a Educação Física. Houve uma proliferação de artigos, capítulos de livros com autorias coletivas, as vezes de até 10 autores ou mais, de forma exacer-bada. Pesquisas foram parcializadas e dados em andamento publicados, sem um aprofundamento teórico condizente. Além disso, nota-se uma crescente terceirização da docência na graduação, especialmente a partir dos anos 2000, quando muitos professores vinculados a pós-graduação passaram a se dedicar quase que exclusivamente a pesquisa, relegando a docência na graduação aos seus pupilos. Há um agravante nesta ação, porque os alunos de pós-graduação planejam, dão aulas e avaliam, muitas vezes, sem nenhuma participação do docente responsável. Ora, isto entra em choque com a finalidade primordial da pesquisa. Pois, a meu ver, a ciência deveria servir para a transferência do saber técnico-científico para ação e para o cotidiano social, em especial para formação dos futuros profissionais das diferentes áreas.

Foi neste cenário que proliferaram os cursos de pós-graduação em Educação física. Na década de 1990, o aumento dos programas de mestrado na área de Educação Física prosseguiu; em 1991 foi a vez da Universidade Estadual Paulista; em 1993 a Universidade do Estado do Rio de Janeiro; a Uni-versidade Castelo Branco teve seu em mestrado criado em 1995, e a década fecha com dois mestrados em Santa Catarina, um em 1996 na Universidade Federal de Santa Catarina e outro de 1997, na Universidade do Estado de Santa Catarina e um mestrado em Brasília, na Universidade Católica no ano de 1998. (MARTINS; SOUZA; SILVA, 2005). Nos anos 2000, vários outros mestrados foram criados. Segundo a Capes (2011) existem 23 programas de mestrado e 13 de doutorado no Brasil, sendo que apenas quatro programas de mestrado estão localizados fora das regiões Sul e Sudeste e, destes, apenas um tem nível de doutorado. (QUADROS; AFONSO, 2011).

Com estes dados também é possível pensar que houve uma busca de outros programas, em outras áreas, pelos professores de Educação Física que queriam se titular. Isto pode ser notado nos dados sobre a região Nordeste.

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Segundo Sánchez Gamboa, o levantamento sobre as áreas de pós-gra-duação onde os pesquisadores do Nordeste formados em Educação Física, e que atuam nos 123 cursos de formação, buscaram sua titulação indica que os eles defenderam suas pesquisas em diversas áreas.

A área predominante, Educação Física que corresponde a 38% (ver gráfi-co 02) migraram para outras regiões do Brasil ou do exterior para defenderem suas pesquisas. Também migraram para as áreas da Educação (29%), para as áreas das Ciências da Saúde (21%), das Ciências Sociais (6%), das Ciências Biológicas (4%), ou para outras tais como Artes, e Engenharias.

2. Houve uma ressonância do Sudeste na pós-graduação do

Nordeste?

Como argumentei anteriormente, se tomarmos os dados de forma sim-plista, afirmaremos que majoritariamente o próprio Nordeste teve a maior influência na formação de professores de educação física na pós-graduação. Isto pode ser visto no gráfico 1 sobre a quantidade de pesquisas defendidas nos programas de pós-graduação considerando os localizados no exterior e nas diversas regiões do país.

Gráfico 1

Fonte: Elaboração própria.

Contudo, ao olharmos para estes outros gráficos, que mostram em de-talhes as instituições em que os 632 trabalhos foram feitos, podemos verificar que na década de 1980 a 1989 e de 1990 a 1999 houve uma busca maior pelos programas de pós-graduação na região Sul/Sudeste e fora do Brasil (por já expostas neste texto), o que me leva supor que estes professores, ao retorna-rem a seus estados de origem e ao se credenciaretorna-rem em diferentes programas da própria região, proporcionaram um número significativo de vagas para demanda interna da própria região.

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Gráfico 2

Fonte: Elaboração própria.

Gráfico 3

Fonte: Elaboração própria.

Gráfico 4

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No Gráfico 3, comparando-se a região Sudeste com a Nordeste, na déca-da de 1980 a 1989, vemos cinco pós-graduações sendo realizadéca-das na primeira e nenhuma na região Nordeste. Já na década seguinte temos 46 pós-graduações no Sudeste e 31 na região Nordeste. Também chama atenção a influência de Portugal na formação da pós-graduação nas décadas de 1990-1999 e de 2010 em diante (Gráfico 4).

Utilizando do conceito de campo científico, é possível analisar as res-sonâncias e disres-sonâncias ocorridas na pós-graduação em Educação Física. Ou, quem se estabeleceu e quem são os pretendentes de cada período no qual dividi minha análise.

O texto O campo científico, do sociólogo francês Pierre Bourdieu (1983), é um trabalho que se propõe a analisar pormenorizadamente o que é e como funciona o campo científico. O conceito de campo então é entendido “[...] enquanto sistema de relações objetivas entre posições adquiridas (em lutas anteriores), é o lugar, o espaço de jogo de uma luta concorrencial” (p. 1). Contudo, para obter uma compreensão completa do conceito de campo, é necessário estudar detalhadamente a sua estrutura, como se constituem os agentes que dele fazem parte, como funciona sua dinâmica, o que está em disputa e como acontece sua constituição pelo processo de autonomização.

As relações objetivas, mencionadas na citação acima, são ao mesmo tempo os lugares ocupados e herdados de disputas anteriores por cada agente no campo e as relações que se estabelecem a partir da interação entre os agen-tes dispostos de maneira hierarquizada (BOURDIEU, 1983, p. 1). Em outras palavras, as relações objetivas estabelecidas entre os agentes são determinadas pelas posições previamente ocupadas no campo, mas simultaneamente deter-minam as novas reconfigurações produzidas por essa interação

A estrutura do campo é conformada pela disposição dos agentes e instituições nesse espaço; e a posição de cada protagonista, por sua vez, é determinada pela distribuição hierarquizada de seus respectivos capitais específicos. A partir dessa estrutura conformada, a dinâmica do campo se desenvolve por meio das relações de força estabelecidas pela disposição dos agentes e instituições, de seus respectivos capitais específicos e estratégias de ação selecionadas. (BOURDIEU, 1983, p. 12-13). Bourdieu enfatiza o pro-cesso dinâmico ao destacar a constante reorganização da disposição inicial; dessa maneira, a estrutura dinâmica do campo (se é que não se trata de uma contradição de termos) se constitui pela relação dialética entre estrutura e estratégias (sejam elas de conservação ou de subversão) que mantém em in-cessante movimento esse espaço de disputa. (BOURDIEU, 1983, p. 12-13):

A estrutura do campo científico se define, a cada momento, pelo estado das relações de força entre os protagonistas em luta, agentes ou institui-ções, isto é, pela estrutura da distribuição do capital específico, resultado das lutas anteriores que se encontra objetivado nas instituições e nas

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dis-posições e que comanda as estratégias e as chances objetivas dos diferentes agentes ou instituições. Basta perceber, aqui como em qualquer outro lugar, a relação dialética que se estabelece entre as estruturas e as estraté-gias – por meio das disposições – para fazer desaparecer a antinomia entre a sincronia e a diacronia, entre a estrutura e a História. A estrutura da distribuição do capital científico está na base das transformações do campo científico e se manifesta por intermédio das estratégias de conservação ou de subversão da estrutura que ela mesma produz. Por um lado, a posi-ção que cada agente singular ocupa num dado momento na estrutura do campo científico é a resultante, objetivada nas instituições e incorporada nas disposições, do conjunto de estratégias anteriores desse agente e de seus concorrentes (elas próprias dependentes da estrutura do campo, pois resultam das propriedades estruturais da posição a partir das quais são engendradas). Por outro lado, as transformações da estrutura do campo são o produto de estratégias de conservação ou de subversão que têm seu princípio de orientação e eficácia nas propriedades da posição que ocupam aqueles que as produzem no interior da estrutura do campo.

Os protagonistas nesse espaço de disputa, sejam eles agentes ou insti-tuições, são classificados por Bourdieu como dominantes ou pretendentes/ novatos. A diferenciação entre dominantes e pretendentes se dá pela detenção desigual de capital que cada grupo possui no campo e que determina um de-sequilíbrio entre as relações de força entre eles, sendo os primeiros dotados de maior capital de diferentes ordens, mas especialmente o capital simbólico acumulado em relação aos segundos. Devido a isso, os dominantes se valem de estratégias de conservação para manutenção da ordem estabelecida (pautada, no caso do campo científico, pela “ciência oficial” e as instituições corres-pondentes); enquanto os pretendentes (ou novatos) podem optar tanto por “estratégias de sucessão”, quanto por “estratégias de subversão”, sempre no sentido de alcançar uma posição mais elevada na hierarquia.

O que está em disputa é o “monopólio da autoridade” dentro do campo, que consiste na “capacidade de falar e de agir legitimamente (isto é, de maneira autorizada e com autoridade), que é socialmente outorgada a um agente de-terminado”. (BOURDIEU, 1983, p. 1). A autoridade que determinado agente detém em um campo é o seu capital, que assegura a ele determinada posição e determinado poder dentro do campo, podendo converter-se em outros tipos de capital e exercer influência também em outros campos. (BOURDIEU, 1983, p. 6). Quando Bourdieu fala em autoridade, ele se refere à competência reconhecida em determinado agente em determinado campo, resultado do prestígio, do reconhecimento, da celebridade etc., e pelo capital acumulado que o agente adquiriu no campo ou que foi transportado de outro campo. No momento de constituição de um novo campo, durante as “revoluções inau-gurais”, o capital que passará a constituí-lo é importado de outros campos. (BOURDIEU, 1983, p. 22-23).

O que define e dá unidade ao campo, ou seja, aquilo que lhe é específico, é justamente aquilo que não é colocado em discussão, mas é tacitamente aceito

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pelos agentes. (BOURDIEU, 1983, p. 25). Os conteúdos ao redor dos quais se configura um campo (como é o caso exemplificado por meio da ciência no texto O campo científico) não têm um significado intrínseco e imutável; ao con-trário, os campos são formados pela disputa da “significação” legítima do tema ao qual o campo concerne. As lutas entre os agentes em determinado campo vão no sentido de reivindicar a autoridade e a legitimidade sobre determinado conteúdo, de maneira a proporcionar o processo contínuo de configuração e reconfiguração do campo. Portanto, utilizando o campo científico como exemplo, Bourdieu (1983, p. 6 e 7) afirma que,

[...] está sempre em jogo o poder de impor uma definição de ciência [...] que mais esteja de acordo com seus interesses específicos [de cada agente]. A definição mais apropriada será a que lhe permita ocupar legitimamente a posição dominante e a que assegure, aos talentos científicos de que ele é detentor a título pessoal ou institucional, a mais alta posição na hierarquia dos valores científicos [...]. Assim, a definição do que está em jogo na luta científica faz parte do jogo da luta científica: os dominantes são aqueles que conseguem impor uma definição da ciência segundo a qual a realiza.

São justamente as noções de neutralidade, de objetividade e de impar-cialidade que são denunciadas por Bourdieu. Nenhum dos agentes observa de longe, intocável, as disputas que ocorrem no campo; ao contrário, estão todos eles imbricados nessa disputa (BOURDIEU, 1983, p. 9). Não existem instâncias para “mediar” de maneira neutra e objetiva a disputa pelo que é legítimo no campo, visto que a definição da legitimidade é dada pela própria força e o próprio poder dos agentes envolvidos e, por causa disso, eles são sempre parciais (BOURDIEU, 1983, p. 9). Nas palavras de Bourdieu:

Tanto no campo científico, quanto no campo das relações de classe não existem instâncias que legitimam as instâncias de legitimidade; as reivindi-cações de legitimidade tiram sua legitimidade da força relativa dos grupos cujos interesses elas exprimem: à medida que a própria definição dos critérios de julgamento e dos princípios de hierarquização estão em jogo na luta, ninguém é bom juiz porque não há juiz que não seja, ao mesmo tempo, juiz e parte interessada.

Ao definir o campo científico como um lugar de luta, Bourdieu denun-cia a visão pacifista e tecnicista que se tem da ciêndenun-cia, visão construída baseada na concepção de busca pela verdade, e expõe a noção de interesse presente em qualquer campo. Não há valor ou significado em si para os conteúdos sobre os quais se configura um campo; logo, o valor é disputado e determinado dentro do campo. (BOURDIEU, 1983, p. 4). O que está em disputa no cam-po, portanto, é fazer com que o interesse particular de determinado grupo de agentes, nesse caso dominante, seja colocado como interesse universal do campo. (BOURDIEU, 1983, p. 3). Esse interesse não é apresentado

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necessa-riamente sob um viés negativo ou como fruto da racionalidade dos agentes, mas apenas evidencia a parcialidade que envolve a ação dos agentes no campo.

Assim, dotado de capital simbólico é possível notar quem foram os agentes estabe-lecidos das diferentes décadas pelos grupos que formaram os profissionais, pelas temáti-cas recorrentes, bem como a presença constante em diferentes fóruns. Também é possível perceber os pretendentes/novatos a medida que notamos ausências.

Afirmo que não foi só uma escolha individual de cada um dos pesqui-sadores por determinado tema, mas também a oportunidade encontrada em diferentes programas de pós-graduação, disponibilidade e empatia com o orientador, possibilidade de financiamento de sua pesquisa entre outras tantas variáveis que constituíram o campo científico da Educação Física e que me faz afirmar que sim houve uma influência da região Sudeste sobre a região Nordeste.

Por fim, pelas condições materiais dadas, especialmente nas últimas décadas, e o discurso de autoridade de uma subárea sobre a outra, a saber da biodinâmica sobre a área sociocultural e pedagógica, fica evidente também a tendência de atração (fatal) pela biodinâmica, especialmente após a aceleração da produção e a implementação do sistema avaliativo ora vigente.

Isto pode ser notado nos dados por décadas, sistematizados a partir dos títulos de cada trabalho analisado.

Gráfico 5

Fonte: Elaboração própria.

Os dados demonstram que na década de 1990-1999 o maior número de produção esteve vinculado à área de Educação Física e Sociedade. Na década seguinte começa a haver um equilíbrio entre a biodinâmica e a área de Edu-cação Física e Sociedade, mas com o acirramento dos critérios de avaliação provenientes das Ciências Naturais há uma legitimação da primeira área sobre a segunda, o que faz com que haja uma produção quase 100% maior da

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bio-dinâmica em relação à educação física e sociedade, como previa o artigo de Carvalho e Jesus (2011).

Estes são alguns apontamentos que consegui chegar, contudo penso que para confirmação dos mesmos é preciso a análise mais demorada do que foi apontado no decorrer do texto e que, caso seja conveniente e interesse, me proponho a trabalhar e analisar.

Referências bibliográficas

BETTI, M. et al. A avaliação da Educação Física em debate: implicações para a subá-rea pedagógica e sociocultural. R. B. P. G, v. 1, n. 2, p. 183-194, nov. 2004.

BOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (org.). Bourdieu – Sociologia. São Paulo: Ática. Coleção Grandes Cientistas Sociais, vol. 39, 1983. p. 122-155.

CARVALHO, Y.; JESUS, M. E. Pós-graduação na educação física brasileira: a atração (fatal) para a biodinâmica. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 37, n. 2, p. 389-406, mai./ago. 2011.

KUENZER, A.; MORAES, M. C. Temas e Tramas na Pós-graduação em educação.

Educ. Soc., Campinas, vol. 26, n. 93, p. 1341-1362, set./dez. 2005.

QUADROS, H.; AFONSO, M. Trajetória da pós-graduação stricto- sensu na área de Educação Física: um estudo de revisão. EF deportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, n. 16, v 162, nov. 2011.

Anexo

Quadro 1 .Ranking de instituições formadoras (113 IES)

Referências

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