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resenha bibliográfica/book review

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Academic year: 2021

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r e s e n h a b i b l i o g r á f i c a / b o o k r e v i e w

P a u l o R o b e r t o C i m ó Q u e i r o z *

Professor do Mestrado em História da U F G D (Universidade Federal da Grande Dourados)

G R A N D I , Guilherme, Café e expansão ferroviária: a Companhia E. F. R i o Claro (1880-1903), São Paulo: Annablume/Fapesp, 2007,142 p.

Creio ser possível dizer que o estudo das nossas ferrovias ainda não faz j u s à importância que teve esse m e i o de transporte na configuração do Brasil m o d e r n o . E m b o r a nossa historiografia ferroviária tenha sido enriquecida, nos últimos anos, c o m diversos novos trabalhos, m u i t o ainda resta a pesquisar e c o n h e c e r acerca desse fascinante tema.

Nesse sentido é que merece ser saudada a publicação do trabalho do j o v e m pesquisador G u i l h e r m e Grandi, que se reveste de um duplo significado: além de contribuir para avivar, em geral, o interesse pela história ferroviária, o autor escolheu, c o m o t e m a de seu estudo, um aspecto especialmente relevante dessa história.

De fato, a história da Estrada de Ferro R i o C l a r o é tão breve quanto interessante. No curso de u m a década de existência i n d e p e n -dente, c o n d e n s o u alguns dos mais notáveis aspectos relacionados à experiência ferroviária no Brasil, a saber: os planos de expansão para os "sertões interiores" do Brasil, no p e r í o d o imediatamente posterior à Guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai; as oportunidades, os dile-mas e os conflitos colocados pela rápida expansão cafeeira em direção ao interior da província/estado de São Paulo; a presença dos capitais

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estrangeiros no setor ferroviário brasileiro; e, enfim, os desafios opostos às empresas pela confusa e difícil conjuntura e c o n ô m i c a do início do regime republicano.

Lançando m ã o de volumosas fontes documentais e dialogando i n -tensamente c o m a historiografia, o autor examina todos esses aspectos, sendo que, de sua análise, destacam-se três episódios ou questões notáveis e, m e s m o , polêmicas: o p r ó p r i o início da construção da ferrovia, no c o m e ç o da década de 1880; sua venda ao capital inglês, em 1889; e sua subseqüente aquisição por parte da Companhia Paulista, em 1892.

A história da Rio Claro começa, c o n f o r m e mostra Grandi, c o m as discussões sobre c o m o proceder ao p r o l o n g a m e n t o dos trilhos em dire-ção ao interior, depois que, em 1876, a Companhia Paulista estabeleceu em R i o Claro a então estação terminal de sua linha. A própria Paulista detinha o direito de efetuar esse p r o l o n g a m e n t o . A região além de R i o Claro, isto é, o então c h a m a d o Oeste paulista, já. estava ocupada por várias fazendas, cujos proprietários ansiavam pelo advento do novo e revolu-cionário m e i o de transporte, que lhes facilitaria a remessa de seu café ao p o r t o de Santos. A questão era: qual o traçado a ser seguidor

Nesse c o n t e x t o , e n t r a m em um conflituoso j o g o os interesses dos fazendeiros, das empresas ferroviárias e m e s m o do governo imperial. E n q u a n t o a Paulista chegava c o m sua p o n t a - d e - t r i l h o s a R i o Claro, outras empresas estavam t a m b é m avançando para o interior. Partindo de Campinas, havia a linha da Mogiana, que seguia para o n o r t e ; partindo de Jundiaí, a linha da Ituana seguia francamente para noroeste. E para o n d e seguiria a linha estacionada em R i o Claro?

Na visão do governo imperial, os interesses das empresas ferroviárias deveriam conformar-se aos projetos estratégicos oficiais, motivados pela experiência, ainda recente, da invasão paraguaia no sul de M a t o Grosso: a linha de R i o Claro deveria seguir para noroeste, enveredando pelos sertões em direção àquela província fronteiriça. Tratava-se, no caso, do célebre "traçado P i m e n t a B u e n o " , resultante dos estudos realizados por o r d e m do governo. Por esse traçado, a ferrovia seguiria de R i o Claro para Araraquara e, prosseguindo pelo vale do rio Turvo, atravessaria o rio Grande, dirigindo-se então à vila mato-grossense de Santana do Paranaíba.

Na ocasião, a Paulista interessou-se em prolongar sua linha de R i o Claro a Araraquara. O traçado que pretendia seguir, no entanto, não

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apenas se afastava das terras dos maiores fazendeiros estabelecidos nessa região (isto é, o Barão do Pinhal e seu sogro, o Visconde do R i o Claro), c o m o ameaçava "invadir" a zona de expansão " n a t u r a l " da Ituana. C o m isso, teria início, c o m o nota o autor, a primeira de muitas polêmicas que, de certa forma, singularizam a história da ferrovia estudada. De fato, tantas foram as pressões que a Paulista acabou p o r desistir do projeto, de m o d o que a construção da ferrovia de R i o Claro a Araraquara foi assumida p o r u m a nova empresa: a Companhia E. F. Rio Claro que, c o n s -tituída p o r iniciativa dos referidos fazendeiros, definiu, previsivelmente, um traçado que atendia diretamente aos seus interesses.

A respeito dessa polêmica, p a r e c e - m e especialmente curiosa u m a constatação, que se pode deduzir do relato efetuado pelo autor: o "traçado P i m e n t a B u e n o " t o r n o u - s e , malgrado seu, simplesmente u m estandarte brandido pelos diferentes atores, de forma a tentar justificar, de um m o d o social e politicamente mais aceitável, os interesses particulares de cada u m . De fato, tanto os fazendeiros c o m o a Paulista argumentavam que suas respectivas propostas de traçado, no trecho entre R i o Claro e Araraquara, e r a m as que, descontadas as circunstâncias do m e i o físico, se apresentavam mais conformes àquele célebre traçado.

Nesse contexto, o autor mostra que, para a vitória dos fazendeiros acima citados, foram decisivos seu prestígio e suas conexões políticas no âmbito provincial. Mostra t a m b é m que o controle da empresa era fortemente concentrado, estando a maioria das ações em p o d e r de uns poucos personagens ligados à e c o n o m i a cafeeira.

A construção foi rápida (a estação de Araraquara foi inaugurada em 1885 e um ramal dirigido a Jaú foi concluído p o u c o s anos depois) e logo a ferrovia entrou a produzir, na região, seus poderosos efeitos. Ela ampliou o p o v o a m e n t o , estimulando a "mobilidade do trabalho livre" (pp. 4 9 - 5 0 ) . No âmbito da circulação, enfatiza o autor, a ferrovia " a t u o u n u m duplo m o v i m e n t o que reestruturou a e c o n o m i a agrícola local", estimulando "ao m e s m o t e m p o a especialização produtiva de algumas unidades e a diversificação interna da economia de alguns dos municípios do Oeste paulista" (p. 48).

S e g u n d o as informações contidas no livro, pode-se deduzir que a

Companhia E. F. Rio Claro se configurou, quase que de imediato, c o m o

u m a verdadeira m á q u i n a de fazer dinheiro. De fato, o autor demonstra que a empresa gozava de excelente situação econômico-financeira:

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es-trategicamente situada n u m a região cafeeira e x t r e m a m e n t e produtiva, não tinha dívidas, m a n t i n h a suas instalações em b o m estado de conser-vação e distribuía vantajosos dividendos aos seus acionistas. Em resumo, c o m o u m a autêntica "ferrovia cafeeira", a C o m p a n h i a se beneficiava dos elevados volumes dos transportes de café - esse gênero que, conforme esclarece amplamente a bibliografia, foi um dos p o u c o s , senão o ú n i -co, no Brasil, capaz de propiciar às empresas ferroviárias u m a segura e compensadora fonte de renda.

Justamente esse aspecto é o que está p o r trás da segunda notável ques-tão envolvendo a Companhia E. F. Rio Claro, isto é, sua venda, ocorrida em 1889 - o que constitui, c o m o nota o autor, " u m mistério para a historiografia", tendo-se em vista os excelentes índices de rentabilidade da empresa. A esse respeito, as informações contidas no livro p e r m i t e m pensar que, t e n d o atingido seu objetivo prioritário (ou seja, um traçado que os beneficiasse), os fazendeiros não mais t i n h a m necessidade de c o n -tinuar no c o m a n d o da empresa, t e n d o eles, então, preferido concentrar seus investimentos em outros setores.

Inicialmente, c o m o mostra o autor, discutiu-se u m a possível fusão c o m a C o m p a n h i a Paulista, proposta por essa empresa ainda em 1888. Fracassada tal alternativa, foi então a C o m p a n h i a vendida a investidores ingleses, passando a d e n o m i n a r - s e The Rio Claro-São Paulo Railway

Company, c o m sede em Londres. Sob a administração inglesa, a ferrovia

expandiu sua rede, construindo novos ramais e p r o l o n g a n d o sua linha de Araraquara a Jaboticabal. Esse período foi, c o n t u d o , extremamente breve, pois logo em 1892 os estrangeiros revenderam a empresa, precisamente à

Companhia Paulista — configurando-se, assim, a terceira questão notável,

ou polêmica, na breve história da Rio Claro.

Essa questão encontra-se m u i t o b e m trabalhada no livro de Guilher-me Grandi, que se p r o p õ e a responder à seguinte indagação: a c o m p r a da Rio Claro foi ou não vantajosa para a Paulista?. E m b o r a não caiba aqui adiantar os resultados a que c h e g o u o autor, é i m p o r t a n t e dizer que o livro não se limita a u m a conclusão simples, mas sim procura, correta-m e n t e , situar a decisão da cocorreta-mpra, b e correta-m c o correta-m o seus desdobracorreta-mentos, ecorreta-m seu c o n t e x t o concreto. Assim, o que me parece i m p o r t a n t e adiantar é que, dessa análise, pode-se deduzir que as grandes empresas ferroviárias nacionais, c o m o a Paulista, se inseriam no sistema ferroviário paulista de m o d o assaz diferente do assumido pelos investidores estrangeiros. E n

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quanto estes últimos pareciam preocupados sobretudo c o m as condições imediatas da reprodução ampliada dos capitais investidos, as primeiras pareciam propensas a subordinar as avaliações imediatas à consideração de seu p o s i c i o n a m e n t o futuro no c o n t e x t o das empresas ferroviárias paulistas - na m e d i d a em que, c o n f o r m e foi já assinalado p o r Saes, a "constante extensão das linhas" aparecia c o m o u m a das condições para a m a n u t e n ç ã o da prosperidade futura dessas empresas.

Para concluir, cabe assinalar que, em t e r m o s formais, o trabalho se apresenta em um volume simples, mas b e m - c u i d a d o . E m b o r a o encadea-m e n t o dos assuntos pudesse ser, talvez, aperfeiçoado (evitando-se alguencadea-mas "idas e vindas", que p o d e m , em certos m o m e n t o s , confundir o leitor), o texto v e m escrito em u m a l i n g u a g e m clara e direta, e n c o n t r a n d o - s e apenas algumas poucas falhas de revisão.

Enfim, o livro constitui u m a importante contribuição à historiografia ferroviária brasileira e sua publicação alimenta nossa esperança de que outros jovens pesquisadores se sintam estimulados a se dedicarem a esse campo, o n d e os temas de estudo se apresentam tão numerosos quanto inexplorados.

Referências

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