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FONTE ORIGINÁRIA DO CASAMENTO. UNIÃO DE FACTO 1 E UNIÃO ESTÁVEL? Palavras-chave: Casamento. União de fato. União Estável. Família.

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FONTE ORIGINÁRIA DO CASAMENTO. UNIÃO DE FACTO1 E UNIÃO ESTÁVEL?

Roberta Flávia Fidalgo2 RESUMO

O artigo científico faz uma breve explanação sobre a origem do casamento, a fim de demonstrar que a situação fática antecedente ao mesmo, ou seja, a sua fonte originária, é a atual união de fato em Portugal bem como a união estável no Brasil, denominado antigo Concubinato Puro, não obviamente com os contornos e requisitos existentes na atualidade. No entanto, através de uma criteriosa análise de revisão de literatura, as figuras tidas como modalidades, formas ou espécies de casamento existentes na Sociedade Babilônica, Código de Hamurabi, Direito Romano, Direito Germânico, Direito Canônico, Portugal e Brasil, pode-se concluir que tais modalidades não passam de verdadeiras uniões de fato e estáveis, constituindo verdadeiros “casamentos de fato” bem como novas formas de constituição de família.

Palavras-chave: Casamento. União de fato. União Estável. Família. ABSTRACT

The paper gives a brief explanation of the origin of marriage in order to demonstrate that the factual situation antecedent to it, its original source, is the current de fato union in Portugal as well as the stable union called in Brazil, Pure Concubinage old, obviously not with the contours and requirements existing at present. However, through a careful analysis of the literature review, the figures taken as modalities, forms or species existing in society wedding Babylonian Code of Hamurabi, Roman Law, German Law, Canon Law, Portugal 1 Facto, em Portugal, refere-se única e exclusivamente à união de facto, com significado diverso da definição de fato, tal como adotada no Brasil. O presente trabalho se baseia numa dissertação de mestrado desenvolvida pela autora na Universidade de Lisboa. No decorrer deste artigo, será adotada a grafia utilizada no Brasil, mas com o sentido adotado em Portugal.

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and Brazil, it can be concluded that such arrangements are only true and stable unmarried couples, representing real "marriages of fact" as well as new forms of family building.

Keywords: Marriage. Fact Union. Stable Union. Family.

INTRODUÇÃO

A análise e o estudo do tema em questão, exige–se que se faça uma rápida incursão sobre a origem do casamento em Portugal e no Brasil.

Porque referir-se ao Brasil e Portugal? Pela ligação histórica, sócio econômica e laços de irmandade e também conflitos existentes entre ambos desde o descobrimento da nossa Pátria.

O casamento, tanto em Portugal, como no Brasil, possui, um corolário lógico - uma situação fática comum que o antecedeu, em ambos, qual seja, a União de fato lá e a União Estável cá, antigamente conhecido como Concubinato Puro apto a constituir família, diferentemente, do concubinato impuro3.

Ao longo da explanação, que não tem o condão de esgotar o assunto, traça-se um paralelo entre a origem do casamento, ao analisar, através das diversas modalidades do mesmo, outrora existentes, demonstrar que a união de fato/estável é fonte originária do casamento, via uma criteriosa revisão de literatura.

A Igreja, como se verá adiante, deu os contornos do casamento e o Estado, seguindo suas concepções, o regulamentou. E mais uma vez o Estado, diante de uma realidade social, paralela ao casamento (já regulamentado outrora), também regulamentou uma situação já há muito existente, qual seja, a

3Concubinato puro é aquele apto a constituir uma família de fato. Se apresentam como uma união duradoura, sem casamento civil, entre homem e mulher livres e desimpedidos, isto é, não comprometidos por deveres matrimoniais ou por outra ligação concubinaria. Ter-se-à o concubinato impuro ou simplesmente concubinato, relações não eventuais em que um dos amantes ou ambos estão comprometidos ou impedidos legalmente de se casar, isso é válido tanto no Brasil como em Portugal. No concubinato, há um panorama de clandestinidade. Apresenta-se como adulterino - se fundar-se no estado de cônjuge de um ou ambos os concubinos e incestuoso - se houver parentesco próximo entre os amantes.

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união de fato em Portugal e a união estável no Brasil, obviamente, cada qual no seu Estado Soberano e cada qual com seus requisitos próprios.

Verificar-se-á no transcorrer do artigo, que a problemática da união de fato/estável como fonte originária do casamento, iniciou-se há muitos séculos atrás, há referências relacionadas ao tema em questão, na sociedade babilónica, código de Hamurabi,direito romano, direito germânico, no direito canônico e por fim chega-se à Portugal e ao Brasil.

A relevância do tema em comento é demonstrar que a união de fato em Portugal e a união estável no Brasil são fontes originárias do casamento e mais ainda as eleva à categoria de novas formas de constituição da família.

1- SOCIEDADE BABILÔNICA E CÓDIGO DE HAMURABI

Na sociedade babilônica, a união de fato/estável foi objeto de atenção no Código de Hamurabi (2285 a 2242 depois de Cristo). A família babilônica tinha o casamento monogâmico como base, mas era permitido o concubinato ou poligamia4.

O Código Hamurabi diz-nos que se um cidadão livre (awílum) casar com uma sacerdotisa (naditum), esta poderá oferecer ao marido uma escrava sua para procriação e os filhos daí resultantes tinham direitos sucessórios, desde que reconhecidos pelo pai. Após a sua morte, a escrava concubina e os seus filhos seriam libertados. O progenitor poderia ainda legitimar formalmente, perante testemunhas, a relação de concubinato com a escrava, tornando-a sua esposa, e dando direitos sucessórios aos filhos da concubina. Outras relações de concubinato estão previstas neste código com o intuito de as sancionar, em particular se forem de índole incestuosa (entre pai e filha, sogro e futura nora, mãe e filho, enteado e madrasta).

2 – DIREITO ROMANO – REPÚBLICA ROMANA E IMPÉRIO ROMANO

4 Geraldo da Cruz Almeida: Da União de fato: Convivência More Uxorio em Direito Internacional Privado. Lisboa, Editora Pedro Ferreira, 1999 p.112.

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No Direito Romano, paelex é a palavra mais antiga que designa as relações conjugais fora do casamento, assumindo outras formas, sinônimas, como palex e pallaca. O seu significado tem, essencialmente, dois sentidos: lato e restrito. No sentido lato, paelex equivale às relações fora do casamento, incluindo a homossexualidade. No sentido restrito, refere-se à relação conjugal entre homens casados e uma mulher solteira5

Na República Romana entraram em uso as palavras concubina e concubinatus, esta última utilizada para definir qualquer relação não matrimonial. Mais tarde, os imperadores cristãos, por ocasião do Império Romano, tentaram extinguir as relações conjugais fora do casamento, pelo que, o concubinato passou a designar um matrimônio de grau inferior6.

A palavra concubina tinha inicialmente um sentido pejorativo perante a opinião pública, mais tarde condescendente para com os casos de concubinato durável e exclusivo, à maneira de um casamento, e em que apenas a inferioridade social da mulher impedia o homem de transformar tal ligação em núpcias legítimas. Além disso, a concubina devia ser uma mulher livre (os escravos não podiam casar) e a união monogâmica (o homem não podia ser casado, nem ter duas concubinas ao mesmo tempo), razão pela qual, o concubinato parecia-se em tudo com um casamento, e só assim considerado digno, mas ainda assim um, casamento impossível. Era tido como uma comunidade permanente de vida e de sexo entre homem e mulher, não reconhecida como matrimônio.

O casamento, na época romana clássica era um estado ou situação existente entre homem e mulher, com a presença do “ius conubii” (convivência entre ambos com a efetiva intenção de serem marido e mulher) sem a presença de impedimentos. Para além dos requisitos de capacidade, era necessário tão somente a presença de dois elementos: elemento matéria – convivência e elemento espiritual – “affectio maritalis”, efetiva intenção de serem marido e mulher (cuja prova se da pela existência da presunção e por certas práticas sociais).

5ALMEIDA, op. cit., p. 47. 6Ibidem, p.48.

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Já na época romana, post-clássica, para existência do casamento não bastava apenas o “affectio maritalis”, começava a ser necessário um ato jurídico que contivesse a manifestação de vontade das pessoas nesse sentido.

No final do Império Romano, já no século IV, com o advento do cristianismo e sob o jugo dos imperadores cristãos, estabeleceram-se proibições de uniões entre pessoas de estatutos diferentes. Uma mulher livre que se unisse ao seu escravo seria condenada à morte pelo fogo ou receberia vergastadas. Se um cristão se unisse com uma judia ou vice-versa, e os que se unissem a bárbaros sofreriam as mesmas sanções penais. Do que era não mais que uma impossibilidade de casamento legítimo e que tornava os esposos concubinos, tornou-se passível de sanções. A Igreja Cristã não provocou isto, apenas fixava regras de pureza das uniões, por exemplo, através de recomendações em sermões. O Cristianismo dava importância à pureza das mulheres e admitia o direito romano do casamento. As concubinas eram aceites desde que tivessem tido apenas um homem e de terem guardado todos os filhos. Os homens deviam mandar embora a sua concubina e tomar uma esposa legítima O direito do império, ratificou assim a idéia de que, o concubinato não era honrado e lesava os direitos da esposa sobre o marido. Simbolizava uma vitória do amor exclusivo e derrota da protecção das mulheres de condição superior. Mais tarde, verificou-se uma supressão do concubinato legal. Admitia-se a legitimação dos filhos nascidos de uma concubina desde que o pai não fosse casado, e durante a governação do Imperador Constantino proibiu-se a manutenção de uma concubina por parte de homens casados, a adopção do filho de uma concubina sem autorização e assistiu-se ainda à restrição de liberalidades às concubinas e aos seus filhos. Os maridos, desta forma, viram-se obrigados a terem relações extra matrimoniais muito passageiras (o que não é concubinato) e a terem relações mais frequentes com as suas esposas.

Vale mencionar que, segundo Caio Mario da Silva Pereira7, em Roma coexistiam a gens, que tinha como chefe o pater gentis, e a família propriamente dita, composta pela mulher, pelos filhos, netos e bisnetos, bem

7Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. 11ª edição, volume 4, revista e atualizada. Rio de Janeiro, Editora Forense, 1998.

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como pelos respectivos bens, sujeito ao poder do pater familias, o ascendente comum mais idoso. Esta organização romana é fundamental para a compreensão da família descrita em praticamente todos os Códigos modernos, desde o Alemão de 1896, ao de Napoleão de 1804, como ao Brasileiro de 1916.

É a partir de Roma que, a união entre um homem e uma mulher passa a interessar ao mundo jurídico, gerando nele seus efeitos.

Segundo Maria Helena Diniz8, existia ainda a conventio sine manus, em que a mulher continuava ligada à família de seu pai, não pertencendo ao marido, muito comum após o século IV Depois de Cristo.

Para Jefferson Daibert9, a intenção dos Imperadores Cristãos era a de extinguir o instituto do concubinato, ou transformando em casamento propriamente dito, ou incentivando a sua legitimação. Foi Justiniano, o primeiro a eliminar todos os impedimentos que, indiretamente, fomentavam este tipo de união que perdurou até o século XIII.

3. DIREITO GERMÂNICO

No direito germânico, há a figura do “Entfuhrungsehe”, o chamado casamento de rapto, que em sentido lato, nada mais é que, o rapto efetuado com o consentimento da raptada e em sentido estrito seria o caso da mulher que sai da casa dos pais para ir se juntar a um homem.

4. DIREITO CANÔNICO

4.1 Direito Canônico Pré – Tridentino

4.2 Direito Canônico – Concílio de Trento

8Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito de Família, volume 5, 23ª edição revista, ampliada e atualizada, São Paulo, Editora Saraiva, 2008.

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O direito canônico, desde sua origem, reconhecia o concubinato, aceitando-o como realidade social. Nos primeiros tempos do Direito Canônico, aceitava-se o casamento clandestino ou presumido, que não era mais do que a união de um homem e uma mulher que se tinham como cônjuges. Aplicava-se, nesses casos, a primitiva doutrina canônica, segundo a qual eram celebrantes do matrimônio os próprios contraentes.

Mesmo dentro do direito canônico havia aqueles que eram contra o concubinato, como Santo Agostinho e Santo Ambrósio, mas consta que Santo Agostinho admitiu o batismo da concubina desde que a mesma se obrigasse a não deixar o companheiro.

Tal reprovação se fortalece com o advento dos Concílios de Toledo, em 400 depois de Cristo, da Basiléia, em 431 depois de Cristo. e de Latrão, no ano de 1516 e ao ser imposta a forma pública de celebração (dogma do matrimônio-sacramento), a Igreja mudou de posição e o Concílio de Trento impôs excomunhão aos concubinos que não se separassem após a terceira advertência.

Vale mencionar alguns aspectos do casamento, no direito canônico (onde encontram-se fundidos elementos do direito romano, bem como, do direito germânico), primeiro dada a forte influência no sistema jurídico português e brasileiro e segundo porque no tempo em que Portugal se formou como estado independente, ter já passado para a Igreja, com caráter de exclusividade, a princípio, o poder legislativo e jurisdicional quanto ao casamento. O mesmo se deu no Brasil, onde a Igreja estabeleceu os contornos do casamento.

Todavia, essa tarefa de unificação legislativa, de tendência universal, que a Igreja visava, não foi de fácil realização, e não o foi, porque a Igreja legislou para os povos de formação jurídica diversa nos quais é, principalmente, dominante, ora o elemento germânico, ora o romano que, nem sempre, manifestavam concordância, não o é, ainda, porque a própria doutrina teológica do casamento (que poderia constituir seguro ponto de apoio para o direito canônico) se encontra eivada de imprecisão. Deste modo, até o momento em que a Igreja concretizou a sua doutrina, criando um regime

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jurídico único referente ao casamento, pode se dizer que nela se debatiam varias tendências, nem sempre harmônicas.

Nada de formalidades essenciais, civis ou religiosas, na celebração do matrimônio: matrimônio, puro acto privado, pacto livre entre duas pessoas animadas da mesma “affectio maritalis”, a vontade das partes como fundo; a ausência de quaisquer impedimentos legais como condição, a benção do sacerdote como mera solenidade de prova10

Esta foi a noção de casamento, adotada pelo Estado, pois como este não tinha uma doutrina expressa a tal respeito, usou as concepções da Igreja para regulamentar e sancionar tal instituto criando, dessa forma, um regime jurídico único.

No direito canônico, Pré-Tridentino, aparecem a figura do casamento clandestino, bem como, do casamento de pública fama.

O casamento clandestino é entendido, por uns, como todo aquele que não fosse contraído in facie Ecclesiae, enquanto outros entendem que, não devia ser considerado como clandestino, o matrimônio que, publicamente, embora sem ser celebrado na Igreja, se concluísse perante uma assembleia de fieis, de acordo com os costumes locais.

Já o casamento de pública fama é aquele cuja qualificação de casamento deriva do fato de um homem e uma mulher serem, pelo público, considerados como cônjuges. É conveniente, apontar duas leis fundamentais em que tal tipo de casamento é contemplado a Lei de Afonso III e a Lei de D. Dinis de maio de 1311.

No entanto, segundo o Professor Cabral de Moncada, o casamento de pública fama não refere-se ao casamento propriamente dito, mas sim, apenas, uma condição de fato de alguns casados, servindo para designar nos documentos em que apareciam um certo e determinado meio de prova dos seus consórcios, toda vez que estes não tivessem recebido a consagração solene da Igreja. Trata-se, portanto, o casamento de pública fama, segundo a

10 Luis Cabral de Moncada. O Casamento em Portugal na Idade Média citado na obra História do Direito Português. Apontamentos das lições dadas ao 1º ano de 1965-1966 pelo Doutor Nuno Espinosa Gomes da Silva, 1º Assistente encarregado da cadeira em Lisboa. Associação Acadêmica da Faculdade de Direito de Lisboa. 1965.

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concepção do mencionado professor e da doutrina dominante, de matéria de prova,cuja comprovação se da pela posse do estado.

As leis de Afonso III e D. Dinis apenas regulamentam meios de prova e não formas autónomas de casamento. A prova da posse do estado de casado se dá quando houver, no fato em apreço, a presença simultânea de 3 (três) requisitos, quais sejam, nomem (ambos nomearam-se como marido e mulher), cohabitatio et tractatus (é a coabitação acompanhada de tratamento que faz supor a existência de vinculo matrimonial) e fama (ter essa união gerado em terceiros a convicção de que se tratava de matrimônio). É importante mencionar que, na Lei de D. Dinis de 1311 estão contemplados os 3 (três) elementos da posse de estado. Um elemento curioso dessa Lei, é a cohabitatio que, para se fazer prova da posse de estado, exige-se um lapso temporal de 7 (sete) anos. Esse tempo exigido para apreciação de casa caso, só interessa aos canonistas, na hipótese de não concorrer os três mencionados requisitos.

Na Idade Média, a Igreja passou a se interessar pelo conceito família, e partir de então passa a cobrar o casamento de seus fiéis.

Os primeiros casamentos haviam sido realizados apenas com o consentimento dos nubentes e esta simplificação na celebração, fez com que surgissem dentro da sociedade, relações clandestinas; no qual a Igreja sentiu-se obrigada a exigir, para convalidar o ato nupcial, a presentiu-sença de um de sentiu-seus representantes. Do século X ao século XV a única forma de casamento que se tornou aceita foi à eclesiástica, ordenando assim as paixões humanas e a concupiscência pecaminosa11

Consistiu-se então um dogma na Igreja Católica que, uma vez casado, nada poderia separar o casal e o casamento passou a ser considerado um Pacto Eterno e a base de uma vida. A mulher, principalmente, era mal vista quando não se casava cedo e permanecia ao lado de seu esposo.

De 1542 a 1563, os católicos reuniram-se em Trento, conforme já foi mencionado anteriormente, e publicaram as normas do Concílio referentes ao casamento, reafirmando o seu caráter sacramental e reconhecendo a

11 Rafael Mendes dos Santos. "A situação jurídica dos conviventes no direito sucessório". Monografia apresentada para obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Disponível em: http://leopre.vilabol.uol.com.br/mono.htm. Acesso em abril de 2009

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competência exclusiva da Igreja Católica para a sua celebração e validação. Ainda cuidaram de consolidar o casamento como um ato formal e público exigindo-se a expedição de proclamas no domicílio dos contraentes.

O Concílio de Trento, por fim, em 1563, estabelecendo a obrigatória e formal celebração do casamento, com a exigência também do seu assento em registros paroquiais, extinguiu o casamento presumido e vulnerou de morte o concubinato. Criaram-se penas severas contra os concubinos recalcitrante, que poderiam ser excomungados e até declarados hereges.

Embora tendo reprovado o concubinato, como forma de constituição da família, a Igreja Católica tolerou-o, quando não se cuidasse de união comprometedora do casamento ou quando incestuosa, ate a sua proibição pelo Concílio de Trento em 1563. Nessa altura, a Igreja toma consciência de que não pode, protelar o ataque frontal ao casamento tido como clandestino

O Concílio de Trento, a grosso modo, resultou na afirmação do casamento como um contrato indissolúvel e no reconhecimento do princípio monogâmico na determinação do livre consentimento dos nubentes para contrair o matrimônio na obrigatória presença do ministro eclesiástico e testemunhas, com a benção do sacerdote. O casamento significava a celebração de um contrato entre os nubentes, estipulando os direitos de cada um. Naquela época, havia motivos pelos quais se realizavam casamentos, muitas vezes baseados em interesses puramente pessoais, nos quais predominavam a herança e a propriedade. No entanto, também havia casamento baseado no amor, e isto era verificado entre as pessoas de classe social inferior. Havia também a permissão para a separação, muito embora á figura do divórcio não existisse a esta altura, dependendo das circunstâncias, anulava-se o casamento.

5. PORTUGAL – BRASIL

No que toca ao Brasil, vale ressaltar que, resquícios destas situações, tidas como “ modalidades, formas ou espécies de casamento” já mencionadas anteriormente (que são, ao meu ver, Uniões de fato/Estáveis -

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fonte originária do casamento), chegaram até a Idade Média, alcançando o Brasil, sobretudo a lei brasileira, pelas Ordenações do Reino de Portugal.

As Ordenações do Reino são coletâneas do direito vigente na época correspondente, e que pretendiam evitar não só as incertezas derivadas da grande dispersão das normas, mas também o prejuízo para a vida jurídica e a administração da justiça daí resultante. Existem Ordenações Afonsinas, Manuelinas, Filipinas

As Ordenações Afonsinas foram publicadas em 1446 ou 1447, sob o título de Ordenações, em nome de D. Afonso V. São as mais importantes, pois as restantes essencialmente atualizaram as Ordenações Afonsinas .

Encontram-se alusões à união de fato/estável nas Ordenações Afonsinas. Um casal podia ainda viver em comunhão de cama e mesa, sem serem casados “de feito nem de direito”, mas com fama de marido e mulher, portanto, em situação similar a essas mencionadas uniões.

Nas Ordenações Afonsinas, havia uma espécie de casamento tido por feito – casamento de feito - era aquele casamento onde havia uma situação aparentemente matrimonial em que homem e mulher viviam, como se casados fossem, sem o serem. Neste tipo de casamento, resta salientar que, houve troca de consenso nupcial, mas que não produziu casamento válido dada a presença de impedimentos matrimoniais. Cumpre frisar que, nas Ordenações Afonsinas, há regulamentação de situações que são tidas, por aparência, de matrimoniais, em que homem e mulher vivem sem o serem, como se casados fossem; como no casamento de feito explicado acima, bem como, contempla também, aquela situação aparentemente matrimonial, onde não há casamento de feito, nem de direito, trata-se da situação, onde homem e mulher vivem como cônjuges, em posse de estado, sem nunca terem trocado consenso nupcial, prevista no parágrafo 3º do Título XXIII, do livro V das Ordenações Afonsinas. Figura essa que se assemelha com a figura do casamento de fama pública do direito canônico, cuja prova, se dá pela posse de estado.

Todas essas formas, modalidades ou espécies de casamento, analisadas acima, são situações que se assemelham em muito a União de fato e a União Estável existentes atualmente, pois as pessoas vivem como se casadas fossem, sem o serem, razão pela qual, sustenta-se a posição de que o

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instituto, objeto de análise, é fonte originária do casamento, antes de serem regulamentadas pela Igreja e posteriormente pelo Estado.

Como já foi dito, no ano de 1564, Portugal, como país católico, tornou obrigatórias em todas as suas terras, incluindo as colônias, as Normas do Concílio de Trento relativas ao casamento, que foram introduzidas mais tarde no Brasil pelas Ordenações Filipinas e que vigoraram entre nós até a promulgação do Código Civil de 1916. Como o casamento civil era desconhecido do mundo, o que tornava válida a união entre um homem e uma mulher era o casamento religioso realizado Igreja Católica12.

Antes do Concílio, vigoravam no Direito Português três tipos de casamento: o realizado perante a Igreja; o do "marido conhecido" e o "casamento de consciência". Somente o casamento realizado perante o representante eclesiástico era aceito, não cabendo aos demais os favores legais.

Até o ano de 1861, a Igreja foi à detentora e a disciplinadora exclusiva dos direitos matrimoniais, mas com o aumento dos cidadãos não católicos e com as influências dos países protestantes e de seus imigrantes em terras brasileiras, foi publicada no ano de 1861 a Lei nº 1.144 que conferia direitos civis ao casamento religioso realizado por outras religiões que não a católica, o Decreto nº 3.069, do ano de 1863, regulamentou a Lei de 1861 e permitiu as formas de casamento acatólico e misto; um avanço que permitiu a abertura para a introdução do casamento civil.

A contribuição do Direito Canônico no processo de formação e de desenvolvimento do Direito Civil é visível ainda hoje em nossos códigos e em matéria de Direito de Família podemos citar como exemplo os impedimentos matrimoniais descritos no artigo 183 do Código Civil de 1916, atual artigo 1521 do novo Código Civil vigente no Brasil, classificados como dirimente públicos ou absolutos, privados ou relativos, e impedientes ou proibitivos 13.

12Orlando Gomes. Direito de Família. 11ª edição, revista e atualizada, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1999.

13Claudia Grieco Tabosa Pessoa. Efeitos patrimoniais do concubinato – analisados à Lei nº 8.971/94 (referente aos direitos de alimentos e sucessão ) e à Lei n. 9.278/96 (Estatuto dos concubinos) e o recente subprojeto de lei (Estatuto da União Estável). São Paulo, Editora Saraiva, 1997.

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Profundamente alterados, só a título de ilustração os primeiros impedimentos distinguiam-se em Direito Divino, Direito Natural e Direito Eclesiástico.

Os impedimentos eclesiásticos poderiam ser dispensados em casos julgados pelo Tribunal do Santo Ofício ou dos Bispos que possuíam poderes jurisdicionais. Vedavam assim o casamento entre a mulher menor de quatorze anos e o homem menor de dezesseis anos; a celebração entre noivos de religiões diversas; o casamento entre parentes de batismo, ou seja, entre padrinhos e madrinhas e seus afilhados; e, o casamento com a mulher violada, exigindo-se a castidade feminina antes da celebração religiosa.

Por fim, “as espécies, modalidades ou formas” de casamentos existentes no passado com os contornos e nuances já explicados, nada mais são que União de fato/Estável, obviamente, como já foi dito também, não possuidores dos requisitos hoje existentes, mas assemelhados, advindo daí a ideia de que são situações originárias do casamento, antes de serem regulamentadas pela Igreja e posteriormente pelo Estado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A União de fato em Portugal e a União Estável no Brasil são uniões verdadeiramente de fato, na acertada acepção da palavra, pois se fossem de direito seriam casamento, daí a razão de mencionar que ambas são fontes originárias do casamento nos moldes existentes no passado e hoje novas formas de contituição de família , assim como o casamento.

Hoje o conceito de família representa a plurivalência semântica, que é um fenômeno normal do vocabulário jurídico, ou seja, vários juristas, de diferentes épocas e lugares, apresentaram diferentes definições sobre família.

Estabelecer como critério para a configuração de uma família a verificação, única e exclusiva, de elementos como a consangüinidade e casamento formal e solene, não mais correspondem à realidade social vivida.

O processo de urbanização acelerada, a globalização, os movimentos de emancipação das

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mulheres e dos jovens, a industrialização, as revoluções tecnológicas, as profundas modificações econômicas e sociais ocorridas na realidade, as imensas transformações comportamentais puseram fim à instituição familiar nos moldes anteriores14. Surgiram, diante do exposto, novos arranjos familiares, desvinculados da união legal, mas baseados nos mesmos princípios norteadores desta.

Com todos esses avanços, a realidade nos mostra uma outra noção de família. Não significa que crise ou abolição da antiga noção, mas sim uma pluralidade de instituições, onde são reconhecidos outros arranjos familiares.

O casamento não deixou de ser a forma clássica para se constituir família, mas não é a única forma de vida familiar, existem fora do casamento, famílias cuja convivência gera conseqüências que não podem ser alijadas do Direito de Família.

Deve se destacar que a questão da família vai além de sua positivação nos ordenamentos jurídicos. Tanto é, que ela sempre existiu e continuará existindo, desta ou daquela forma, em qualquer tempo ou espaço. O que muda são apenas as formas de sua constituição15.

A explicação fornecida pelo psicanalista francês Jaques Lacan para essas transformações diz ser a família um fenômeno cultural e não natural e por isso é que ela se apresenta das mais variadas formas, de acordo com as diferentes culturas.(PEREIRA, 1995)

A família é, primordialmente, uma estruturação psíquica, onde cada um de seus membros ocupa um lugar definido. Lugar do marido, da mulher, do pai, da mãe, dos filhos, sem, entretanto, estarem necessariamente ligados biologicamente ou por qualquer ato formal, como o casamento por exemplo.

Para se ocupar tais lugares basta a vontade, um passo simbólico, que só o gênero humano é capaz 14 <www.jurisway.org.br> Acesso em 10 de setembro de 2012.

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de dar e que nos permite constituir uma família, ou melhor, compor uma estruturação familiar.

A estrutura familiar é algo complexo que precede o Direito e que este procura legislar no sentido de proteger esse instituto, que é, assumidamente, a célula básica da sociedade.

Todavia, não há como se negar que a família é fonte de companheirismo e afeto, com valorização de cada membro, para permitir o desenvolvimento da personalidade de todos. É na família que se estrutura o sujeito em todos os aspectos da vida16. E constituir família não significa, como outrora, casar diante da Lei ou da Igreja, pois família não é sinônimo de matrimônio, mas apenas uma das opções para formação da entidade familiar, que também se constitui inegavelmente pela união de fato/união estável.

O afeto, o amor e o companheirismo com a valorização de cada membro, nada disso vem da lei, da norma posta, mas surge da vontade de cada membro que da família participa, vontade esta que pode estar presente não só no casamento, mas também na união de fato em Portugal e na união estável no Brasil, reconhecendo-se nestas uma entidade familiar, pois a partir do ciclo que foi exposto através da análise das espécies, modalidades de casamento outrora existentes, extrai-se a idéia de que essas espécies, modalidades nada mais são que verdadeiras uniões de fato, fonte originária do casamento e novas formas de constituição da família.

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Referências

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