• Nenhum resultado encontrado

Os propagandistas do Egito e o massacre de Gaza

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Os propagandistas do Egito e o massacre de Gaza"

Copied!
6
0
0

Texto

(1)

Pelo Socialismo

Questões político-ideológicas com atualidade

http://www.pelosocialismo.net

_____________________________________________

Publicado em 2014/07/29, em: http://electronicintifada.net/content/egypts-propagandists-and-gaza-massacre/13662

Tradução do inglês de PAT Colocado em linha em: 2014/08/04

Os propagandistas do Egito e o

massacre de Gaza

A Intifada eletrónica

Joseph Massad*

Enquanto a máquina assassina de Israel inflige terror e morte ao povo palestino, com a colaboração do governo dos EUA e dos seus principais aliados árabes – o não menos importante dos quais é o clã saudita, formado por 20.000 príncipes e princesas –, lançou-se no Egito, ao nível oficial e não oficial, uma descomunal campanha de ódio.

O regime do Egito é um dos dois principais carcereiros dos palestinos de Gaza, no maior campo de concentração do mundo.

O herdeiro de Hosni Mubarak no trono egípcio, o general Abdulfattah al-Sisi, expressou bem as mentiras que a egípcia classe dirigente de ladrões foi propagando no Egito, desde as campanhas antiárabes e antipalestinas de meados dos anos 1970, sob o presidente Anwar Sadat.

O nada carismático Sisi, cujas habilidades oratórias rivalizam com as de Yasser Arafat, anunciou com muita pompa, no seu discurso de 23 de julho, para marcar o aniversário do derrube da monarquia, em 1952, que o Egito já tinha sacrificado "100.000 mártires egípcios" pela causa palestina.

Embora poucas pessoas duvidem dos sacrifícios que os soldados egípcios fizeram para defender o Egito, nos últimos 67 anos, proclamar que esses sacrifícios foram feitos em nome da Palestina e dos palestinos é o cúmulo da hipocrisia.

É uma linha de argumentação que a egípcia classe dirigente de ladrões foi propagando, para poder proclamar que a terrível economia do Egito e o estado de pobreza não são o produto da descarada pilhagem deste país por parte desta classe, com a ajuda de seus patrocinadores americanos e sauditas, desde a década de 1970, mas que se deve à alegada defesa da Palestina e dos palestinos pelo Egito e ao alegado

(2)

compromisso do presidente Gamal Abdel Nasser de libertar os palestinos da ocupação colonial de Israel.

Classe sórdida e saqueadora

Desde 1970, os palestinos têm estado expostos a estas mentiras e à vacuidade e total baixeza desta classe egípcia de ignorantes e analfabetos. A falta de educação e de multiculturalismo desta classe tornou-se evidente durante os últimos três anos de propaganda contrarrevolucionária e agitação nas suas estações de televisão e imprensa.

A forma e o conteúdo desta produção teórica constrangeria e escandalizaria qualquer comunidade de intelectuais, jornalistas e artistas que se autorrespeitasse, mas não a maioria dos intelectuais, jornalistas e artistas egípcios, quer tenham sido recrutados quer totalmente comprados no exterior para defender os interesses desta classe (embora, mais recentemente, alguns dos recrutados para apoiarem o regime, especialmente académicos, tenham começado a recuar e a reescrever a sua história negando terem-no apoiado).

A degradação das culturas e produtos intelectuais e estéticos egípcios nas últimas quatro décadas é um resultado direto desta classe governante tirânica. Basta sentarmo-nos com estes homens e mulheres de negócios, ou visitar as suas casas, ou atentar na sua representação nos folhetins e filmes egípcios e na cultura que, por seu intermédio, querem impor, ou ouvir as suas conversas nos bares e restaurantes do hotel de cinco estrelas no Cairo, ou assistir às suas entrevistas nas escandalosamente desclassificadas estações de televisão do Egito, para compreender a sua absoluta mediocridade em todos os níveis do pensamento económico e político e do gosto estético, para não mencionar a sua ignorância sobre a literatura e a arte egípcia, árabe e mundial, e, também, o seu total desprezo pelos pobres do Egito, que constituem mais de oitenta por cento da população.

Que esta invejosa e ciumenta classe de super-ricos fique ressentida e cobice aos mais pobres dos pobres os seus escassos bens, especialmente aos palestinos de Gaza, ilustra o tipo de orientação moral que guia as suas ações.

Ainda lembro o horror que senti quando jantei no Cairo, em outubro de 2010, com o bilionário Nassef Sawiris, o homem mais rico do país, quando ele anunciou orgulhosamente ao pequeno grupo de sete pessoas que estavam no jantar, que tem três ecrâs de TV abertos em simultâneo, no seu escritório, em casa e enquanto viaja, e ligados, ao mesmo tempo, a três diferentes canais de notícias dos EUA (se a memória não me falha, ele nomeou a CNN, a CNBC e a Fox news) que funcionam claramente como as suas principais fontes de educação.

Sawiris, que é muito menos exibicionista do que qualquer um dos seus dois irmãos mais velhos, parecia não acreditar quando o informei de que eu me opunha às políticas de direita do presidente dos EUA, Barack Obama, tanto nacionais como estrangeiras, assim como parecia incapaz de conceber uma posição política à esquerda de Obama.

(3)

Numa entrevista recentemente publicada no jornal pró-Sisi Al-Masry Al-Youm, Sawiris elogiou Sisi por suprimir os subsídios aos combustíveis aos pobres (enquanto mantinha baixo para os ricos o preço da gasolina dos carros de luxo), e fez uma série de recomendações neoliberais, incluindo a de desvalorizar ainda mais a libra egípcia; privatizar os transportes públicos; remover impostos sobre os ricos (que, segundo afirma, o governo do deposto presidente Muhammad Morsi tinha imposto ilegalmente na sua empresa); blindar os ministros e funcionários do governo de procedimentos legais e permitir que o carvão seja utilizado nas fábricas de cimento, apesar da oposição massiva de ativistas da saúde e ambientais.

Tais medidas continuarão de certeza a enriquecer os ricos, um por cento, e a empobrecer os pobres (Naguib, o mais extravagante, mais velho, mas mais pobre irmão de Nassef, começou agora a escrever uma coluna semanal para o Al-Akhbar do Egito, na qual ele reitera as recomendações neoliberais de seu irmão. Também apela a Sisi, numa entrevista à TV, para conceder uma amnistia a Mubarak e libertá-lo da prisão).

"

Ficção e fabricação

"

O que Sisi e esta classe com a qual ele está aliado querem afirmar é que todas as guerras do Egito com Israel foram lançadas para defender a Palestina e os palestinos e tiveram um custo enorme para o Egito, tanto financeiro como em vidas de soldados. Mas nada disso é verdade.

Em 1956, Israel invadiu o Egito e ocupou o Sinai e os soldados egípcios que foram mortos estavam empenhados em defender o seu país e a sua terra; em 1967, Israel invadiu de novo o Egito e ocupou o Sinai, e os soldados egípcios foram mortos em defesa do seu país contra a invasão estrangeira; entre 1968 e 1970, Israel e o Egito lutaram na "Guerra de Desgaste", na qual os soldados egípcios foram mortos em defesa do seu país e contra a continuação da agressão israelita e da ocupação permanente do Sinai por Israel – uma guerra que foi travada no solo egípcio; e em 1973, o Egito iniciou uma guerra para libertar o Sinai, não a Palestina, e os soldados egípcios foram de novo mortos a defender o seu país contra a ocupação estrangeira. Isto leva-nos à guerra de 1948, na qual, dependendo das fontes, foram mortos mil ou dois mil soldados e voluntários egípcios. Não foi Nasser, que é responsabilizado pelo seu apoio retórico aos palestinos, mas sim o Rei Farouq, que lançou esta intervenção militar egípcia, para parar a expulsão sionista dos palestinos e o roubo sionista das suas terras.

Como a maioria dos estudos atestam, os motivos que levaram Farouq e o seu governo a intervir na Palestina foram a sua preocupação sobre o papel de liderança regional do Egito e o medo da rivalidade iraquiana, e menos qualquer forma de nacionalismo ou solidariedade árabe.

À margem destes motivos, a maioria dos palestinos não tem dúvidas de que os soldados e combatentes voluntários egípcios que morreram, morreram efetivamente defendendo a Palestina e os palestinos, mesmo que estivessem a combater na base de

(4)

ordens que procuravam defender a hegemonia regional egípcia. Mas esta continua a ser a única guerra em que os soldados e voluntários egípcios morreram defendendo a Palestina, e aos quais o povo palestino e seu movimento nacional expressaram toda a sua gratidão.

Mas a forma como estes mil a dois mil soldados e voluntários se multiplicam com a melodia dos "100.000 mártires", como Sisi falsamente afirmou, é do âmbito da ficção e fabricação, que a egípcia classe dirigente de ladrões e os seus intelectuais a soldo e os propagandistas da imprensa pagos inventaram, no seguimento dos Acordos de Camp David de Sadat, de 1978, que sacrificaram os direitos do povo palestino, incluindo dos palestinos de Gaza, em troca de um controle policial parcial do Sinai que foge da sobernia egípcia.

Isto não é para sugerir que milhões de egípcios, civis e soldados, não queiram ou não quererão apoiar a Palestina e os palestinos, ou que não lutariam pela Palestina e pelos palestinos, como muitas vezes, aliás, o confessam e declaram; isto quer dizer que apesar das batalhas de 1948, nunca lhes foi dada a oportunidade de defender os palestinos no campo de batalha. Isto é precisamente o que irrita a egípcia classe dirigente de ladrões e o que impulsiona a propaganda antipalestina em curso e o discurso de ódio das emissoras de televisão pertencentes a esta classe.

Ouvindo esta propaganda, poderíamos supor que foram os palestinos que ocuparam o Sinai, e não o Egito, que governou Gaza de 1948 a 1967 e que desde então impõe um assédio de

forma

intermitente, sendo que nos últimos oito anos este cerco é imposto completa e continuamente.

Apesar das campanhas massivas dos meios de comunicação social, os egípcios não deixaram de apoiar os palestinos, seja através de manifestações contra a cumplicidade do regime de Sisi nos massacres, como tem vindo a acontecer nas últimas duas semanas, seja através do envio de comboios de ajuda médica para Gaza, os quais os soldados de Sisi obrigam a voltar para trás, recusando-lhes a passagem. Suicídio intelectual em massa

Neste contexto, é fundamental perceber que esta classe dirigente egípcia de ladrões é o inimigo principal, não do povo palestino, mas da maioria dos egípcios que aquela oprime, explora, rouba e humilha diariamente. O papel desempenhado pelos líderes que apoiam o regime de Sissi tem ocultado o fato de os inimigos dos palestinos no Egito serem também os inimigos da maioria dos egípcios.

O suicídio intelectual massivo que a maioria dos intelectuais e artistas egípcios (nasseristas, marxistas, liberais e salafistas) cometeram, ao abdicarem das suas faculdades críticas, apoiando ou mantendo-se em silêncio sobre os massacres e a repressão do novo regime, já para não falar do seu silêncio nas campanhas contra os egípcio pobres e os palestinos, recorda o suicídio cometido pelos comunistas egípcios quando desfizeram o seu partido, em 1964, para se juntarem à União Socialista de Nasser.

(5)

Essa classe estende-se desde o economista marxista e incansável defensor de Sisi, Samir Amin, até figuras muito menos ilustres, como o romancista e crítico de Mubarak, Alaa al-Aswany, e todas aquelas figuras que se situam entre ambos, incluindo o economista Galal Amin, e escritores e poetas como Sonallah Ibrahim, Abd al-Rahman al-Abnudi, Bahaa Taher, e muitos outros.

O suicídio dos comunistas egípcios em 1964 deveu-se, no entanto, à compreensão daqueles de que a repressão de Nasser, apesar de indesejável e lamentável, destinava-se, em última instância, a servir o projeto comum de nacionalização e socialização da propriedade, a fim de erradicar a pobreza egípcia. Ainda não está, contudo, claro por que razão os intelectuais egípcios contemporâneos cometem suicídio, a fim de apoiar a classe dirigente de ladrões egípcia.

O massacre de Gaza é o "plano B"

O facto de Sisi ter superado as políticas de Mubarak, ao ter-se aliado e coordenado com Israel, contra os palestinos sitiados, não é surpreendente, uma vez que ele serve a mesma classe e interesses que Mubarak havia servido. O que difere, porém, é a submissão e conformidade do Hamas ao diktat de Mubarak, que, a partir de então, abandonou.

Torna-se, agora, claro que o massacre dos palestinos encetado por Israel faz parte de um plano B, tendo sido o plano A uma possível invasão terrestre egípcia de Gaza - que o governo de Sisi ameaçou realizar há alguns meses, depois de ter destruído os túneis que servem de tábua de salvação a Gaza (isto foi antes das eleições fraudulentas de Sisi), presumivelmente com a ajuda de Israel, com o propósito ostensivo de reinstalar o caudilhismo de Muhammad Dahlan em Gaza e de se livrar do Hamas e da resistência palestina.

O facto de o chefe da inteligência egípcia ter estado em visita a Israel, alguns dias antes de os massacres de Israel terem sido lançados, e o facto de três funcionários da inteligência israelense terem visitado o Egito, alguns dias depois daqueles, são apenas pequenos indicadores do elevado nível de coordenação entre os dois países.

O sadismo e o narcisismo, que são traços da corrente dominante da cultura colonial judaica israelense, manifestam-se em mobilizações de rua penetrantes que clamam "morte aos árabes" e que levam segmentos da população judaica colonial do país a assistir e a ovacionar, a partir das colinas, o massacre dos palestinos nativos. Isto apenas pode ser comparado com a propaganda sádica e odiosa dos meios de comunicação do regime de Sisi e da classe dirigente de ladrões egípcia.

Com efeito, enquanto a matança dos palestinos de Gaza, por Israel, continua, o exército egípcio anunciou, a 27 de julho, que tinha destruído mais treze túneis entre Gaza e o Egito, presumivelmente como parte da sua contribuição heróica à contínua opressão israelelita dos palestinos.

O "cessar-fogo" que Sisi ofereceu, e que lhe foi ditado pelos seus aliados israelelitas, foi devidamente rejeitado pelo povo palestino, a favor de uma valente resistência

(6)

militar face à criminalidade dos seus captores coloniais, e a favor de uma resistência política e diplomática corajosa face à crueldade dos seus carcereiros egípcios.

* Joseph Massad [jordano de origem palestiniana - NT] é professor de política árabe moderna e história intelectual. É autor do livro a publicar O Islão no Liberalismo (University of Chicago Press).

Referências

Documentos relacionados

Portanto, conclui-se que o princípio do centro da gravidade deve ser interpretado com cautela nas relações de trabalho marítimo, considerando a regra basilar de

Este trabalho buscou, através de pesquisa de campo, estudar o efeito de diferentes alternativas de adubações de cobertura, quanto ao tipo de adubo e época de

No final, os EUA viram a maioria das questões que tinham de ser resolvidas no sentido da criação de um tribunal que lhe fosse aceitável serem estabelecidas em sentido oposto, pelo

Para analisar as Componentes de Gestão foram utilizadas questões referentes à forma como o visitante considera as condições da ilha no momento da realização do

Taking into account the theoretical framework we have presented as relevant for understanding the organization, expression and social impact of these civic movements, grounded on

Neste estudo foram estipulados os seguintes objec- tivos: (a) identifi car as dimensões do desenvolvimento vocacional (convicção vocacional, cooperação vocacio- nal,

de professores, contudo, os resultados encontrados dão conta de que este aspecto constitui-se em preocupação para gestores de escola e da sede da SEduc/AM, em

O caso de gestão estudado discutiu as dificuldades de implementação do Projeto Ensino Médio com Mediação Tecnológica (EMMT) nas escolas jurisdicionadas à Coordenadoria