“El sueño de la razón produce monstruos” Francisco de Goya, 1799
Seminário
Trabalho em Turnos e Condições de Trabalho Promoção
SINDPETRO-RJ CPST – UFRJ
15 de dezembro de 2015
Sílvia Jardim
Médica-Psiquiatra, PhD.
Coordenação de Políticas de Saúde do Trabalhador da UFRJ – CPST
Pró-Reitoria de Pessoal – PR-4
Coordenadora do Programa de Estudos Organização do Trabalho e Saúde Mental – PrOtsam
Instituto de Psiquiatria – IPUB
Trabalho em Turnos e Saúde Mental
A questão da quantidade e da qualidade do tempo de descanso e lazer sempre esteve no coração da luta
operária por melhores condições de trabalho e vida. No entanto, nós tendemos a considerar que é uma questão superada, que a jornada de trabalho é algo estabelecido, que ninguém discute mais a necessidade de sono e de descanso remunerados para o trabalho.
Tendemos a considerar também que discutir trabalho em turnos, sistemas de turnos, em um mundo de cidades que nunca dormem, eivado de empresas off-shore,
serviços online, em tempo real, processos de trabalho contínuos, enfim, seria complexo demais, impossível talvez, e até desnecessário, então, discutir jornada de trabalho. Afinal, a espécie humana se supera de tal forma que já rompeu de vez com a natureza e há quem não quer mais nem dormir quiçá sonhar. Até o fim do trabalho já não foi promulgado?
Mas eis que a natureza humana insiste em fazer aquilo que talvez seja o que melhor a definiria: questionar!
Discutir sistema de turnos nos processos operacionais acende a luz sobre o coração duro da questão do que está em jogo em um contrato de trabalho e na
qualidade do laço social que o trabalho humano produz. Por isso, a iniciativa deste seminário e de seu mote, o questionamento do tipo de sistema de turnos, por parte dos trabalhadores e de seu sindicato é tão corajosa,
demonstrando, no mínimo, a não
acomodação, tratando de coisas aparentemente tão banais:
Francisco de Goya (1746-1828) foi um dos maiores
representantes do projeto Iluminista, sendo por muitos considerado o fundador da arte moderna, da arte como intervenção política na cultura.
Sua produção artística está a serviço da condenação pública da irracionalidade, dos excessos e, em geral, de condutas sociais hipócritas: a ignorância, a falta de educação, a falsidade de religiosos licenciosos, a superstição, a miséria, a perseguição inquisitorial, são alguns dos objetos de suas denúncias.
A série de gravuras “Los Caprichos” publicada no ano de 1799 constitui um paradigma claro de sua força crítica!
Das 80 gravuras que configuram a série, “El sueño de la rázon”, concebida inicialmente como portal ou introdução do conjunto, é a que melhor condensa seu propósito de sua denúncia. Esta é uma de suas obras mais apreciadas pela crítica, mas que
Na cena aparece o autor apoiado sobre sua mesa de desenho enquanto sua cabeça repousa sobre seus braços.
O pintor está dormindo e, durante o sono, é assediado pelos animais de seu pesadelo: um conjunto de corujas, mochos, morcegos, felinos e outros animais da noite perturbam seu descanso ameaçando-o com uma mensagem agourenta...
Há uma dificuldade de alcançar uma leitura definitiva da gravura “El sueño…” que parte da dupla acepção do termo “sueño” que, segundo o Diccionario de Autoridades
(1726-1739) pode significar, em primeiro lugar “o ato de dormir” ou, em segundo lugar, “o sucesso, ou espécies, que em sonhos se representam na imaginação”.
Exatamente por essa duplicidade e ambiguidade de sentidos da palavra “sueño” em espanhol é que escolhi esta gravura para trabalhar o tema do Trabalho em Turnos & Saúde Mental A Saúde Mental guarda íntima relação com a Razão, a
1ª. Acepção
Se nos ativermos à primeira definição, a razão (entendida como capacidade de entendimento) havia caído dormindo ou inativa, deixando espaço para as ideias obscuras e
supersticiosas. Apoiam esta conclusão as anotações que acompanham a gravura em suas versões mais antigas:
-P. La fantasía abandonada de la razón produce monstruos imposibles: unida con ella es madre de las artes y origen de sus marabillas.
-A. La fantasía abandonada de la rázon produce monstruos, y unida con ella es madre de las artes.
- BN. Portada para esta obra: cuando los hombres no oyen el grito de la rázon, todo se vuelve visiones.
2a. Acepção
Na segunda acepção, cabe supor que o termo sonho remete ao empenho, ao ideal dos iluministas em perseguir um ideal
inalcançável: a supremacia da razão sobre a ignorância. Tal obstinação da sociedade se mostrou incapaz de livrar-se de sua própria ignorância e se viu dragada por um retrocesso intelectual que a levou a uma nova crise. No início do século XIX, o Iluminismo era já um sonho fracassado. Mesmo assim, a delicadeza e sofisticação da gravura de Goya mantém a
atualidade passados mais de 200 anos: não podemos abrir mão da Razão e não podemos esquecer dos Sonhos.
Tempo de sono, tempo de sonho: paradoxal O Sono e o Sonho
O sono apresenta 5 fases distintas, segundo a atividade elétrica do córtex cerebral: os estados 1, 2, 3 e 4 (sono de ondas lentas - SOL) e o sono paradoxal (SP), caracterizado pela ocorrência de movimentos oculares rápidos (REM) e pela atonia muscular completa.
Distribuição das fases: o sono paradoxal ocorre ciclicamente a intervalos em que se vai chegando ao final da madrugada. A duração dos estados 3 e 4 é maior no início do sono e vai diminuindo no decorrer da noite.
O SP representa 20% e o SOL 80% (1: 5%; 2: 50%; 3 + 4: aproximadamente 50%).
O Ciclo Sono-Vigília
A sincronização da periodicidade dos ritmos biológicos às 24 horas do dia é conseguida por intermédio de modificações rítmicas no ambiente, os chamados “sincronizadores”.
“Sincronizadores”: alterações nos horários de dormir e acordar, duração dos períodos de luz, temperatura ambiente, ambiente social circundante, atenção à hora do relógio. Nos casos do sono que precede o turno matutino e do sono diurno após o turno noturno, há diminuição do sono paradoxal que é considerado de grande importância para a recuperação do desempenho mental.
Transtorno do Ciclo Sono-Vigília não orgânico CID: F 51.2
Perda de sincronia entre o ciclo vigília-sono do indivíduo e o ciclo vigília-sono socialmente estabelecido como normal, resultando em queixas de insônia, interrupção precoce do sono ou de sonolência excessiva.
É determinado pela jornada de trabalho à noite em regime fixo ou pela alternância de horários diurnos, vespertinos e/ou noturnos, em regime de revezamento de turnos.
Escala de 8 horas 1 Ciclo de 35 DIAS Trabalho de 21 dias Folga de 14 dias Trânsito em média de 1h por trajeto
Em 21 dias de Trabalho = 21 x 2horas (ida + Volta)
Total de horas no Trânsito = 42 horas/dia
Considerando as 8 horas de trabalho 42/8 = 5,25 dias de trabalho perdidos no trânsito. Em 1 ano (corresponde ~ 10 Ciclos de 35 dias): 5,25 x 10 = 52,5 dias de trabalho perdidos no trânsito
Ou ainda: 42 x 10 = 420 / 24 = 17 dias do ano Em trânsito.
Escala de 12 horas 1 Ciclo de 35 DIAS Trabalho de 14 dias Folga de 21 dias Trânsito em média de 1h por trajeto
Em 14 dias de Trabalho = 14 x 2 horas (ida + Volta) Total de horas no Trânsito = 28 horas/dia
Considerando as 12 horas de trabalho 28/12 = 2,3 dias de trabalho perdidos no trânsito.
Em 1 ano (corresponde ~ 10 Ciclos de 35 dias):
2,3 x 10 = 23 dias de trabalho perdidos no trânsito