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Enterografia por RM em Idade Pediátrica Avaliação na Doença de Crohn

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Acta Radiológica Portuguesa, Vol.XXIV, nº 95, pág. 47-51, Jul.-Set., 2012

Recebido a 09/01/2012 Aceite a 05/04/2012

Enterografia por RM em Idade Pediátrica – Avaliação na

Doença de Crohn

MR Enterography in Pediatric Age – Evaluation of Crohn Disease

Hugo Matos, Maria José Noruegas, Henrique Patrício, Susana Basso, Rui Catarino, Paulo Coelho

Hospital Pediátrico de Coimbra

Serviço de Radiologia - Centro Hospitalar Universitário de Coimbra

Resumo

A doença de Crohn (DC) é uma patologia inflamatória crónica, recidivante, multifactorial, que pode envolver qualquer parte do tracto gastro-intestinal, maioritariamente o intestino delgado e o cólon.

Com os recentes desenvolvimentos, a ressonância magnética (RM) tornou-se num meio imagiológico importante no diagnóstico e follow-up desta patologia, permitindo a caracterização e avaliação da extensão da doença.

Com base na análise retrospectiva dos estudos de enterografia por RM realizados, pretende-se referir as vantagens e desvantagens desta técnica no diagnóstico e follow-up da DC em idade pediátrica; descrever a forma como se procede à sua execução e preparação; demonstrar os achados que obtivemos mais frequentemente e que permitem a caracterização das alterações inflamatórias quer a nível intestinal quer extraintestinais.

Na realização destes estudos torna-se necessária a distensão das ansas intestinais. Esse objectivo pode ser conseguido recorrendo a intubação nasoduodenal (enteroclise) ou por ingestão oral (enterografia) de produto de contraste. Os contrastes utilizados podem ser classificados em positivos, negativos ou bifásicos consoante o efeito que obtêm na intensidade de sinal no lúmen das ansas de intestino delgado nas diferentes sequências de imagem.

Os estudos foram realizados numa ressonância magnética de 1,5T, com antena de corpo, com o doente em decúbito ventral, após ingestão de produto de contraste oral bifásico.

Realizaram-se sequências T2 “half-Fourier single-shot”, sequências “fast imaging with steady-state precession” e sequências ponderadas em T1 “fast spoiled-gradient-echo sequences”, estas últimas antes e após administração intravenosa de gadolínio. As características visualizadas nas diferentes sequências permitem a classificação do estádio da doença de Crohn, nomeadamente em doença inflamatória activa, doença fibroestenótica ou doença fistulizante.

Em conclusão, a entero-RM permite a avaliação e caracterização das alterações inflamatórias existentes na doença de Crohn, bem como as possíveis complicações, de uma forma segura e não invasiva, sem recurso a radiação ionizante, factor relevante em idade pediátrica.

Palavras-chave

Ressonância Magnética; Doença de Crohn; Idade Pediatrica.

Abstract

Crohn disease (CD) is a chronic, relapsing inflamatory condition that can involve in a segment way any part of the gastrointestinal tract, most commonly small bowel and colon.

With recent developments, magnetic resonance imaging (MRI) became an extremely useful tool in the diagnosis and follow-up of CD, allowing adequate characterization of inflammatory changes and extension.

Based on retrospective analysis of studies performed, our aims are to discuss advantages and disadvantages of this technique in the diagnosis and follow-up of CD; to describe how we prepare these procedures; to present the most common findings obtained allowing the characterization of the extent of inflammatory changes within and beyond the bowel.

To perform these studies it is necessary to adequately distend the small bowel, which can be achieved by nasoduodenal intubation or with oral ingestion of contrast agent. The contrast agents used can be classified in positive, negative or biphasic due to the effect induced in the signal intensity of bowel lumen.

Examinations were performed in a 1.5T MR, using a body receiver coil with the patient in prone position after the administration of biphasic oral contrast. The sequences obtained were T2-weighted “half-Fourier single-shot”, “fast imaging with steady-state precession” and T1-weighted “fast spoiled-gradient-echo sequences”, before and after intravenous administration of gadolinium. The different findings in these sequences allow us to classify CD as active inflammatory disease, fistulazing disease and fibrostenotic disease.

In conclusion, entero-MRI is able to evaluate and characterize the extent of inflammatory changes in CD, as well as extraenteric, in a safe and non-invasive way, without the use of ionizing radiation.

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Introdução

A doença de Crohn é uma patologia inflamatória crónica, recidivante, multifactorial, que pode envolver qualquer parte do tracto gastro-intestinal, acometendo maioritariamente o intestino delgado e o cólon [1]. Os estudos epidemiológicos realizados apresentam uma prevalência estimada entre 26 a 198,5 casos por 100 000 [1] com uma incidência aproximada de 3,1 a 14,6 casos por 100 0000 por ano [1], estimando-se que cerca de 20 a 30% dos doentes apresentem sintomatologia antes dos 20 anos de idade [2]. Nas crianças apresenta uma incidência anual aproximada de 4,5 a 5,8 casos por 100 000 [2,3]. Clinicamente a doença inflamatória intestinal manifesta-se [4] por dor abdominal, diarreia e/ou lesões perianais. As manifestações extraintestinais poderão englobar febre, perda de peso, atraso de crescimento, artralgia/artrite, lesões orocutâneas e/ou doença hepatobiliar.

A doença de Crohn nesta faixa etária pode envolver apenas o íleon terminal em cerca de 20 a 30 % dos casos, apenas o cólon em 20% dos casos ou ambos em 40 a 50% [5]. Trata-se de uma doença inflamatória crónica, que histologicamente se inicia por um infiltrado inflamatório local que é seguido por ulceração superficial da mucosa. Estas ulcerações podem ser profundas, em orientação transversal ou longitudinal, sobre uma mucosa hiperemiada, dando origem a um aspecto em “pedra de calçada”. Com a progressão da doença as células inflamatórias envolvem toda a espessura da parede, com formação de granulomas não caseosos.

As lesões são frequentemente segmentares, separadas por áreas sem alterações.

Imagiologia

A caracterização das lesões e da sua extensão assenta também na avaliação imagiológica. Esta caracterização envolvia num passado recente a realização de estudos baritados por enterografia/enteroclise orientados por fluoroscopia. Hoje em dia, atendendo ao desenvolvimento das técnicas de imagem, a tomografia computorizada (TC) e mais recentemente a ressonância magnética (RM) assumiram um papel crucial nessa caracterização. Estas técnicas permitem a visualização de toda a espessura da parede intestinal, sem os inconvenientes de sobreposição de ansas verificada nas técnicas de fluoroscopia, permitindo igualmente a caracterização de achados extraintestinais.

Pela sua maior acessibilidade e menor custo, a TC tem sido mais frequentemente utilizada para este objectivo, no entanto, devido à utilização de radiação ionizante e ao número de exames realizados em contexto de follow-up, a RM, graças aos recentes desenvolvimentos em termos de resolução espacial e rapidez de aquisição, tem vindo a proporcionar, uma nova forma de avaliar estes doentes, especialmente em idade pediátrica.

Comparativamente com a TC, a RM apresenta melhor contraste de tecidual, uma aquisição multiplanar sem a utilização de radiação ionizante, permitindo igualmente a realização de estudos funcionais para visualização da motilidade intestinal. Como contrapartida, a RM é um exame mais moroso e dispendioso, bem como com menor acessibilidade.

Técnica

Preparação

Para a realização de um estudo do intestino delgado, torna-se um requisito fundamental, qualquer que torna-seja o método, a obtenção de adequada distensão das ansas. Essa distensão pode ser obtida por duas formas: ingestão oral, denominada por enterografia ou entubação entérica, referida como enteroclise.

A entubação entérica consiste na colocação de uma sonda por via nasal cuja extremidade distal se pretende colocar a nível dos segmentos duodenais distais. Permite atingir um maior grau de distensão das ansas comparativamente com a ingestão oral, no entanto à custa de menor tolerabilidade dos doentes. Do ponto de vista da caracterização de doenças inflamatórias, essa maior distensão nem sempre se correlaciona com melhor acuidade diagnóstica na avaliação do envolvimento e extensão das ansas intestinais [6-8]. Por essa razão, no nosso Serviço, os estudos realizados em doentes de idade pediátrica com esta finalidade, são realizados por enterografia, com administração oral de produto de contraste.

Vários tipos de contraste oral podem ser usados, sendo divididos em: produtos de contraste positivo, negativo ou bifásico, consoante o efeito que obtêm na intensidade de sinal no lúmen das ansas de intestino delgado nas diferentes sequências de imagem obtidas durante a realização do exame.

Os produtos de contraste utilizados no nosso Serviço são bifásicos, que induzem hipointensidade de sinal do lúmen das ansas nas sequências ponderadas em T1 e hiperintensidade de sinal nas sequências T2. Estes contrastes permitem por um lado uma avaliação morfológica detalhada nas sequências T2 pela melhor delineação do contorno mucoso e por outro, pelo sinal hipointenso existente no lúmen nas sequências T1, combinado com a realização de imagens em que o sinal da gordura envolvente é suprimido, obtem-se uma adequada avaliação transmural da parede intestinal. Os produtos de contraste orais bifásicos incluem uma grande variedade de soluções ou mesmo a água. No nosso Serviço utiliza-se uma solução de polietilenoglicol, que permite, para além da distensão luminal pelo volume administrado, um maior aporte de líquidos ao conteúdo luminal pela sua maior osmolalidade.

Pretende-se a ingestão de um volume aproximado de 1000 a 1500ml, tendo em conta a idade da criança, fraccionado

Key-words

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em cerca de 4 doses que são ingeridas a cada 15-20 minutos, começando 1 hora antes do início do exame.

Aquisição

Para a realização do exame por RM, no nosso Serviço, utiliza-se uma antena de corpo, colocando-se a criança em decúbito ventral após terminar a ingestão do produto de contraste. São obtidas sequências ponderadas em T2 “half-Fourier single-shot” (Fig.1), sequências “fast imaging with steady-state precession” (Fig.2) e sequências ponderadas em T1 “fast spoiled-gradient-echo sequences” (Fig.3), estas últimas antes e após administração intravenosa de gadolínio. São obtidas nos planos axiais e coronais. Realizam-se ainda sequências dinâmicas orientadas às regiões de interesse, para avaliação da motilidade do intestino, importante para a caracterização de segmentos estenóticos.

Resultados

A RM permite a classificação do estadio da doença de Crohn: doença inflamatória activa; doença fibroestenótica; ou doença fistulizante.

Doença inflamatória activa

A inflamação activa pode apresentar diferentes graus de severidade, iniciando-se por um infiltrado inflamatório envolvendo as criptas intestinais, seguido pelo desenvolvimento de ulcerações superficiais [9]. Com a progressão da doença, as células inflamatórias estendem-se às camadas mais profundas da parede intestinal, podendo dar origem a ulcerações mais profundas, bem como à formação de granulomas [9].

As alterações descritas traduzem-se pela presença de hiperemia da mucosa, com edema intramural e espessamento parietal.

Em RM observa-se a presença de sinal intenso nas sequências ponderadas em T2 (Fig.4) e marcado realce parietal após administração de gadolinio nas sequências ponderadas em T1 com supressão de gordura (Fig.5). As referidas ulcerações são também por vezes identificadas, visualizando-se pequenos segmentos de descontinuidade da linha da mucosa (Fig.6).

As alterações inflamatórias parietais são acompanhadas

a b

d c

Fig. 1 – Sequências T2 “half-Fourier single-shot” nos planos (a,b) coronal

e axial (c,d).

Fig. 2 – Sequências “fast

imaging with steady-state precession” nos planos coronal (a,b) e axial (c).

a b

c

Fig. 3 – Sequência T1 “fast

spoiled-gradient-echo” após administração de gadolínio no plano coronal.

a b

Fig. 4 - Sequências T2 “half-Fourier single-shot” nos planos axial (a) e

coronal (b) demonstrando espessamento parietal, com intensidade de sinal elevada (setas).

a b

Fig. 5 - Sequências T1 “fast spoiled-gradient-echo” após administração

(4)

por alterações do mesentério circundante, nomeadamente com ingurgitamento vascular (“sinal do pente”) (Fig.7), visualizando-se também a presença de adenopatias [7-11].

a b

Fig. 7 - Sequências T1 “fast spoiled-gradient-echo” após administração

de gadolínio, no plano coronal (a) e axial (b), com ingurgitamento vascular (setas).

a

Fig. 8 - Sequências “fast imaging with steady-state precession” nos

planos axial (a) e coronal (b) evidenciando espessamento parietal com presença de distensão de ansa a montante (setas).

Fig. 9 - Sequências T2

“half-Fourier single-shot” no plano axial demonstrando fístula ileo-ileal (seta).

Fig. 10 - Sequência

“fast imaging with s t e a d y - s t a t e precession” no plano coronal evidenciando fístula ileo-cólica (seta curta) com colecção associada (seta longa).

intestino delgado ou ansas de intestino delgado e órgãos circundantes como o cólon, a bexiga ou a pele [7-11]. A avaliação destas alterações permite igualmente um adequado planeamento cirúrgico.

Conclusões

A RM permite a detecção de doença activa e das complicações em doentes sintomáticos com DC [9]. Pode igualmente ser utilizada para monitorizar o grau de actividade da doença e a resposta à terapêutica instituída. A administração de contraste por via oral em idade pediátrica é bem tolerada e permite uma adequada repleção das ansas intestinais, possibilitando, na grande maioria dos casos, a caracterização das alterações inflamatórias intestinais.

Em conclusão, a entero-RM é uma forma segura e não invasiva, sem recurso a radiação ionizante permitindo a avaliação imagiológica da DC e importante também no follow-up desta patologia.

Bibliografia

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Fig. 6 - Sequências T2 “half-Fourier single-shot” nos planos axial (a) e

coronal (b) com espessamento parietal e áreas de descontinuidade (setas) traduzindo ulcerações.

a b

b

Doença fibroestenótica

As continuas alterações inflamatórias levam ao desenvolvimento de fibrose parietal [9]. Essas alterações fibróticas induzem a formação de segmentos estenóticos, que resultam com a progressão em situações de obstrução intestinal.

A RM permite a identificação destes segmentos, por oposição às áreas de espessamento com inflamação activa, permitindo assim monitorizar e orientar as estratégias terapêuticas.

Na doença fibroestenótica, os segmentos intestinais envolvidos apresentam espessamento parietal sem aumento da intensidade de sinal nas sequencias ponderadas em T2 (Fig.8), contrariamente ao que se verifica na fase activa. Por outro lado, as aquisições dinâmicas são importantes porque permitem comprovar a ausência de motilidade e distensão destes segmentos (Fig.8) [7-11].

Doença fistulizante

Com a progressão da inflamação e o envolvimento transmural, pode-se assistir ao desenvolvimento de trajectos fistulosos (Fig.9) e/ou colecções abcedadas (Fig.10) . Estes podem envolver ansas adjacentes do

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Correspondência

Hugo Matos Hospital Pediátrico

Serviço de Radiologia - Centro Hospitalar Universitário de Coimbra Av. Afonso Romão

Santo António dos Olivais 3000-602 Coimbra

Referências

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