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Sumário. Texto Integral. Tribunal da Relação do Porto Processo nº

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 0615617

Relator: DOMINGOS MORAIS Sessão: 11 Dezembro 2006 Número: RP200611120615617 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: NEGADO PROVIMENTO.

ACIDENTE DE TRABALHO ACIDENTE IN ITINERE

Sumário

I - Considera-se acidente de trabalho o ocorrido no trajecto normalmente utilizado pelo sinistrado entre o local de trabalho e a sua residência habitual ou ocasional e vice-versa, durante o período de tempo ininterrupto

habitualmente gasto para o percorrer.

II - Não tendo o autor provado, em sede de julgamento, qual o “trajecto normalmente utilizado” entre o local da empresa onde trabalha e o local da residência habitual para onde se dirigia, nem o “período de tempo ininterrupto habitualmente gasto” para o percorrer, o acidente por si sofrido não pode considerar-se como de trabalho.

Texto Integral

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I – B………. intentou acção especial emergente de acidente trabalho, sob patrocínio do M. Público, no TT de Matosinhos, contra

C………., alegando, em resumo, que foi vítima de acidente de viação/trabalho, no dia 30 de Junho de 2004, cerca das 22.00 horas, quando se deslocava do seu local de trabalho para a sua residência, após ter parado

momentaneamente a sua viatura para comprar cigarros, o qual consistiu em atropelamento na berma da EN n.º …, em ………., Matosinhos, por um veículo automóvel que se pôs em fuga e que, em consequência, sofreu traumatismo da perna esquerda, que foi causa directa e necessária de Incapacidade

Permanente Parcial de 17,92%.

Conclui, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe: a pensão anual vitalícia, no

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montante de 1.683,15 €, com início em 15.06.2005; a quantia de 9.131,50 €, a título de indemnização pelo período de ITA desde 30.06.2004 até 14.06.2005;

e a quantia de 16,80 €, a título de despesas de transporte.

Citada, a ré contestou, alegando, em resumo, que o acidente em causa não ocorreu no tempo e local de trabalho, uma vez que o atropelamento aconteceu depois de o autor se ter desviado do seu percurso a caminho de casa para ir comprar cigarros, sendo certo que estava a cerca de 700 metros da sua residência.

Conclui pela descaracterização do acidente como de trabalho e pela consequente improcedência da acção.

Proferido o despacho saneador, fixados os factos assentes e elaborada a base instrutória; realizado o julgamento e respondidos os quesitos, o Mmo Juiz da 1.ª instância proferiu sentença e julgando a acção improcedente, absolveu a ré do pedido.

O autor, inconformado, apelou, concluindo, em síntese, que o acidente descrito nos autos deve ser caracterizado como de trabalho, já que a interrupção no percurso normal do trabalho para casa, para comprar tabaco, é uma

necessidade atendível.

A ré respondeu no sentido da improcedência do recurso.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II - Os factos

Na 1.ª instância foram dados como provados os seguintes factos:

1 - No dia 30 de Junho de 2004, cerca das 22.00 horas, quando seguia do local de trabalho, em Matosinhos, para a sua residência em ………., e após ter

parado a sua viatura para comprar cigarros, o A. foi atropelado na berma da Estrada Nacional n.º …, em ………., por um veículo automóvel, que se pôs em fuga.

2 - O café para onde o sinistrado se dirigiu para comprar cigarros, ficava situado junto à via, do lado oposto ao local onde estacionou, e distava de sua casa cerca de 700 metros.

3 - Como consequência directa e necessária do atropelamento, o A. sofreu traumatismo da perna esquerda, lesões descritas no auto de exame médico e parecer de fls. 55 e 59.

4 - Por causa dos ferimentos e lesões decorrentes da factualidade supra referidas, o A. ficou na situação de incapacidade temporária e absoluta de 30/06/2004 a 14/06/2005, altura em que lhe foi dada alta.

5 - No exame médico realizado, foi-lhe atribuída uma incapacidade permanente parcial de 17,92%.

6 - À data dos factos, o A. trabalhava como motorista, sob autoridade, direcção

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e fiscalização da sociedade “D………., S.A.”, mediante a remuneração anual de 13.418,12 €.

7 - O A. gastou 16,80 €, em transportes, nas deslocações a este Tribunal.

8 - A entidade patronal do A, supra identificada, tinha a sua responsabilidade infortunística por acidente de trabalho transferida para a Ré, através da apólice n.º 15, pelo salário anual supra referido.

II – O Direito

Atento o disposto nos artigos 684.º, n.º 3 e 690.º, n.ºs 1 e 3, do CPC, aplicáveis por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) e artigo 87.º do CPT, o objecto do

recurso está delimitado pelas conclusões alegatórias do recorrente, salvo quanto a questões de conhecimento oficioso.

E a única questão que importa apreciar é a de saber se o acidente descrito nos autos deve ser ou não caracterizado como acidente de trabalho.

O conceito de acidente de trabalho está descrito nos artigos 6.º da Lei n.º 100/97, de 13.09, e da Lei n.º 143/99, de 30.04, dispondo o n.º 2, do artigo 6.º, da primeira, que “Considera-se também acidente de trabalho o ocorrido:

a) No trajecto de ida e de regresso para o local de trabalho, nos termos em que vier a ser definido em regulamentação posterior”.

Por sua vez, o n.º 2, do artigo 6.º, da segunda, estipula que “Na alínea a) do n.º 2 da lei estão compreendidos os acidentes que se verifiquem no trajecto normalmente utilizado e durante o período de tempo ininterrupto

habitualmente gasto pelo trabalhador:

a) Entre a sua residência habitual ou ocasional, [...], até às instalações que constituem o seu local de trabalho” e vice-versa.

E o n.º 3 acrescenta: “Não deixa de se considerar acidente de trabalho o que ocorrer quando o trajecto normal tenha sofrido interrupções ou desvios

determinados pela satisfação de necessidades atendíveis do trabalhador, bem como por motivo de força maior ou por caso fortuito”.

No caso dos autos, o Mmo Juiz da 1.ª instância considerou que se trata “de um acidente de percurso, no trajecto do local de trabalho para a residência do trabalhador. Mas, não sabemos sequer se é o percurso normal ou mesmo o habitual entre o local de trabalho e a residência do A., porque nada foi alegado nesse sentido” e que a interrupção do trajecto “para simplesmente comprar cigarros... quando se encontrava a escassos 700 metros de casa” não se enquadra na previsão do n.º 3, do artigo 6.º, da Lei n.º 143/99.

Por sua vez, o M. Público, na qualidade de patrono do sinistrado, diz nas alegações de recurso que “No auto de conciliação de fls. 70 a 71 a entidade seguradora só não aceitou o acidente dos autos como de trabalho “por

considerar que o facto do sinistrado ter abandonado o seu veículo e ir comprar

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tabaco não integra um acidente de trabalho”, pelo que o percurso normal, expresso pelo sinistrado naquele auto, quando refere que ao sair do local de trabalho, pelas 22h e 30m, a caminho de casa na estrada Nacional … em

………., [...], deve ser considerado assente”.

E a ré questiona nas alegações de recurso, como questionara no artigo 4.º da contestação, que esteja alegado e provado qual era o “trajecto normalmente utilizado” pelo sinistrado, entre o local de trabalho e a sua residência.

E, desde já adiantamos, com inteira razão.

Com todo o respeito o dizemos, mas a expressão “ao sair do local de trabalho pelas 22h30 a caminho de casa na estrada Nacional … em ……….” (cfr. Auto de Não Conciliação a fls. 170) não identifica minimamente o “trajecto

normalmente utilizado” pelo sinistrado entre o local de trabalho e a sua residência. E muito menos se deve considerar como assente, por acordo, o trajecto normal do sinistrado, ao abrigo do disposto no artigo 112.º do CPT, pela simples razão de que sobre a matéria do trajecto normal nada ficou consignada no Auto de Tentativa de Conciliação, já que pelo representante da seguradora foi apenas dito que: “Aceita a transferência da responsabilidade por acidentes de trabalho através da apólice n.º 15, aceita o vencimento reclamado pelo sinistrado, não aceita o acidente dos autos como de trabalho, motivo pelo qual recusou a participação enviada pela patronal, por considerar que o facto do sinistrado ter abandonado o seu veículo e ir comprar tabaco não integra um acidente “in itinere”. Pelo exposto não aceita pagar ao sinistrado a pensão anual e vitalícia por ele reclamada, nem as despesas de transportes e as indemnizações pelas Incapacidades Temporárias”.

Deste modo, competia ao autor alegar na petição inicial todos os factos identificadores do “trajecto normalmente utilizado”, ou seja, o local da

empresa onde trabalha, o local da residência habitual para onde se dirigia, a via ou vias de comunicação que ligam esses dois locais e quais as que

regularmente utilizava, o horário de trabalho que praticava na empresa e o período de tempo ininterrupto habitualmente gasto para o percorrer, desde o fim da jornada de trabalho até à chegada a casa.

E estando provados estes factos é que o Tribunal poderia concluir que estava preenchido o requisito do trajecto normal, para passar a analisar a verificação ou não do segundo requisito, isto é, se a interrupção verificada, para comprar tabaco, se enquadraria ou não na previsão do n.º 3, do artigo 6.º, da Lei n.º 143/99.

Mas não tendo o autor alegado tal factualidade na petição inicial e tendo a ré seguradora aludido expressamente a essa omissão no artigo 4.º da

contestação, era obrigação do Mmo Juiz da 1.ª instância convidar o autor a completar a petição inicial nesse sentido, como impõe o artigo 27.º, alínea b),

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do C P Trabalho, já que tais factos interessavam à decisão da causa, como reconheceu na sentença recorrida, tanto mais que a hora do acidente, alegada na petição inicial, não coincide com a hora que consta do Auto de Não

Conciliação, nem com a hora que está assinalada na fotocópia da Participação de Acidente de Viação, junta na Audiência de Julgamento a requerimento, não fundamentado (cfr. artigo 523.º do CPC), do M. Público e admitida a junção pelo Mmo Juiz (despacho: “Admito a junção do documento aos autos”), sem justificar a utilidade dessa junção face à matéria quesitada na base instrutória (1.º “O A. desviou-se do seu percurso a caminho de sua casa para comprar cigarros?” 2.º: “Quando já estava a cerca de 700 metros?”), tanto mais que consta dessa Participação a seguinte Descrição do Acidente:

“Pelas declarações verbais do peão o acidente terá ocorrido conforme passo a descrever.

O peão (referindo-se ao sinistrado) encontrava-se na EN-… conjuntamente com outras pessoas a festejar a vitória de Portugal quando foi colhido por um veículo que não parou.

(...)”.

De duas uma: ou o Mmo Juiz não admitia a junção desse documento por

manifesta falta de interesse face ao conteúdo dos quesitos da base instrutória ou, admitindo-o, devia ter tirado todas as consequências dessa junção, sob pena de prática de acto inútil, prática essa proibida pelo artigo 137.º do C P Civil.

E a consequência imediata era ter desencadeado o mecanismo processual previsto no artigo 72.º do CPT, para procurar saber qual a verdadeira razão da paragem do sinistrado quando se dirigia do seu local de trabalho para casa, pois, “incumbe ao juiz” o dever de realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa

composição do litígio” (cfr. artigo 265.º, n.º 3, do CPC), quanto aos factos surgidos no decurso da produção da prova, mesmo que não articulados, relevantes para a boa decisão da causa (cfr. artigo 72.º, n.º 1 do CPT), como era o caso, já que o próprio autor juntava um documento com a descrição de um motivo aparentemente diferente daquele que alegou na petição inicial, para justificar a paragem no percurso de regresso a casa.

Em resumo: O autor não só não alegou e não provou, em sede de julgamento, qual o “trajecto normalmente utilizado” no regresso do trabalho a casa e qual

“o período de tempo ininterrupto habitualmente gasto” para o percorrer, como aduziu razões aparentemente diferentes para justificar a interrupção no

regresso a casa, já que uma coisa seria uma interrupção pelo tempo

estritamente necessário para comprar tabaco, outra seria uma interrupção para comprar tabaco e aproveitar a circunstância para o festejo, com pessoas

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presentes no local, de um qualquer acontecimento público ou privado.

E se já o simples acto da compra do tabaco era duvidoso que fosse uma

necessidade atendível no contexto do n.º 3, do artigo 6.º, da Lei n.º 143/99, já que o autor não alegou nem provou uma situação ou estado de necessidade que, no âmbito de um comportamento humano razoável, justificasse esse acto naquele momento (em tempo actual), muito menos o seria num contexto

festivo na via pública.

Assim sendo, consideramos não verificados os requisitos legais para a caracterização do acidente descrito nos autos como acidente de trabalho.

IV – A Decisão

Atento o exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.

Sem custas por isenção do sinistrado (artigo 2.º, alínea e), do CCJ).

Porto, 6 de Dezembro de 2006 Domingos José de Morais

António José Fernandes Isidoro

Albertina das Dores Nunes Aveiro Pereira

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