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TRABALHOS TÉCNICOS Divisão Jurídica LEI Nº , DE 20 DE JULHO DE 2010 ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL. Tatiana Machado Dunshee de Abranches Advogada

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LEI Nº 12.288, DE 20 DE JULHO DE 2010 ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL

Tatiana Machado Dunshee de Abranches Advogada

A Lei nº 12.288/2010 institui o Estatuto da Igualdade Racial, que se destina a garantir à população negra a igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos e o combate à discriminação.

Na forma do disposto no artigo 2º desta lei, é dever do Estado e da sociedade garantir a igualdade de oportunidades. O artigo 3º dispõe que o Estatuto da Igualdade Racial adota como diretriz político-jurídica a inclusão das vítimas de desigualdade étnico-racial, a valori- zação da igualdade étnica e o fortalecimento da identidade nacional brasileira.

O artigo 4º estabelece os meios para a promoção da igualdade de oportunidades para a população negra, dentre os quais está a adoção de medidas e políticas de ação afirmativa; a promoção de ajustes normativos para aperfeiçoar o combate à discriminação; o estímulo e o apoio às iniciativas da sociedade civil que tenham por fim a promoção da igualdade de opor- tunidades.

Os programas de ação afirmativa são definidos no parágrafo único do artigo 4º como políticas públicas destinadas a reparar as distorções e desigualdades raciais e demais práticas discriminatórias, tanto na esfera pública como na privada. Para a consecução de tais objetivos, a Lei institui o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (SISNAPIR).

O Capítulo I da Lei nº 12.288/2010 trata do direito fundamental à saúde da população negra, que deverá ser garantido pelo poder público através de políticas destinadas à redução do risco de doenças.

Nesse sentido, o artigo 7º dispõe que o conjunto de ações constitui a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, cujas diretrizes e objetivos estão descritos neste dispo- sitivo e no artigo 8º.

O Capítulo II trata do direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer. O artigo 11 determina ser obrigatório o estudo da história geral da África e da população negra no Brasil nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados.

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Dessa forma, o Poder Executivo Federal incentivará as instituições de ensino superior, públicas e privadas, a desenvolverem, entre outras medidas, programas de extensão universi- tária destinados a aproximar jovens negros de tecnologias avançadas.

Na Seção relativa à Cultura, o artigo 17 estabelece como obrigações do poder público a garantia do reconhecimento das manifestações coletivas da população negra com trajetória histórica comprovada, bem como o incentivo de celebração das personalidades e datas come- morativas.

Na Seção que trata do Esporte e Lazer, o artigo 21 dispõe que o poder público fomen- tará o pleno acesso da população negra às práticas desportivas e reconhece a capoeira como um desporto de criação nacional.

O Capítulo III trata do direito à liberdade de consciência e de crença e ao livre exercí- cio dos cultos religiosos. O artigo 23 dispõe ser inviolável tal liberdade, e o artigo 26 afirma que o poder público adotará as medidas necessárias para o combate à intolerância com as reli- giões de matrizes africanas.

O Capítulo IV disciplina o acesso à terra e à moradia adequada, dispondo, no artigo 27, que o poder público elaborará políticas públicas capazes de promover o acesso da popula- ção negra à terra e às atividades produtivas, através da promoção do acesso ao financiamento agrícola. Além disso, reconhece aos remanescentes das comunidades dos quilombos que este- jam ocupando suas terras a propriedade definitiva, estabelecendo para o Estado a obrigação de emitir os títulos respectivos.

O Capítulo V estabelece as políticas voltadas para a inclusão da população negra no mercado de trabalho, com o fim de assegurar a igualdade de oportunidades, inclusive median- te a implementação de medidas visando à promoção da igualdade nas contratações do setor público e à adoção de medidas similares nas empresas privadas.

O art. 39, §1º, prevê a adoção de políticas e programas de formação profissional, de emprego e de geração de renda voltados para a população negra, inclusive através da conces- são de incentivos fiscais. Nesse sentido, o artigo 40 dispõe que o Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT) formulará políticas e projetos voltados para a inclusão da população negra no mercado de trabalho e orientará a destinação de recursos para seu financiamento.

O art. 41 afirma que as ações de emprego e renda promovidas por meio de financia- mento para constituição e ampliação de pequenas e médias empresas contemplarão o estímu- lo à promoção de empresários negros.

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O Título III da Lei nº 12.288/2010 institui o Sistema Nacional de Promoção da Igual- dade Racial (SINAPIR) como forma de organização e articulação voltadas à implementação do conjunto de políticas destinadas a superar as desigualdades étnicas existentes no País. A participação da iniciativa privada no Sisnapir será incentivada pelo poder público federal.

O artigo 56 prevê as formas de financiamento das iniciativas de promoção da igualda- de racial, dentre as quais se elenca o incentivo à criação e à manutenção de microempresas administradas por pessoas autodeclaradas negras.

DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE

O artigo 5º, caput e inciso I, da Constituição da República trata do princípio da igual- dade, do qual decorrem outros, tais como a proibição ao racismo (art. 5º, XLII), a proibição de diferença de salários e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil (art. 7º, XXX).

O princípio da igualdade preconiza que se dê tratamento igual aos que se encontram em situação equivalente e que se trate de maneira desigual os desiguais, na medida de suas desigualdades. Tal princípio obriga tanto o legislador como o aplicador da lei. A doutrina tra- duz isso na expressão “igualdade na lei e igualdade perante a lei”.

A despeito disso, cabe ressaltar que o princípio da igualdade não veda que a lei estabe- leça tratamento diferenciado entre pessoas que possuam, entre outras, distinções de sexo, pro- fissão, condição econômica e idade. O que não se admite é que o parâmetro da diferenciação seja desprovido de razoabilidade ou deixe de atender a relevante razão de interesse público.

No livro Direito Constitucional Esquematizado, Pedro Lenza trata do princípio da igualdade da seguinte forma: ”(...) a grande dificuldade consiste em saber até que ponto a de- sigualdade não gera inconstitucionalidades.”

Celso Antônio Bandeira de Mello parece ter encontrado parâmetros sólidos e coeren- tes em sua clássica monografia sobre o tema do princípio da igualdade, na qual estabelece três questões a serem observadas, a fim de se verificar o respeito ou desrespeito ao aludido princípio. O desrespeito a quaisquer delas leva à inexorável ofensa à isonomia. Resta, então, enumerá-las:

“a) a primeira diz com o elemento tomado como fatos de desigualação; b) a segunda reporta-se à correlação lógica abstrata existente entre o fator erigido em critério dis- crímen e a disparidade estabelecida no tratamento jurídico diversificado; c) a terceira atina à consonância dessa correlação lógica com os interesses absorvidos no sistema

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constitucional e destarte juridicizados.” (Celso Antônio Bandeira de Mello, Conteúdo jurídico do princípio da igualdade, p. 21, e desenvolvimento, pp. 23-43)

Esses critérios podem servir de parâmetros para a aplicação das denominadas discri- minações positivas, ou affirmatives actions, na medida em que, segundo David Araújo e Nu- nes Júnior,

“... o constituinte tratou de proteger certos grupos que, a seu entender, mereciam tra- tamento diverso. Enfocando-os a partir de uma realidade histórica de marginalização social ou hipossuficiência decorrente de outros fatores, cuidou de estabelecer medidas de compensação, buscando concretizar, ao menos em parte, uma igualdade de oportu- nidades com os demais indivíduos, que não sofreram as mesmas espécies de restri- ções”. (Grifei.)

Destacamos, antes das ações afirmativas, a teoria dos Separate but equal, que vigorou durante muito tempo nos Estados Unidos e consistia na separação (separate) de brancos e negros, porém, assegurando uma prestação de serviços idênticos (equal). Assim, por exemplo, existiam escolas para negros e escolas para brancos. Separados, a qualidade de ensino deveria ser igual. O mesmo acontecia em relação ao transporte, ou seja, vagões para brancos e vagões para negros.

Esta teoria veio a ser superada pela do Treatment as an equal e precisou, em muitos casos, das ações afirmativas para afastar o sentimento de discriminação que vigorou por mui- tos anos. Atualmente, as próprias ações afirmativas estão sendo revistas, no sentido de que a igualdade já está assegurada de modo substancial, não havendo mais necessidade de interfe- rência do Estado.

De qualquer forma, no Brasil, segundo a ideia das ações afirmativas, apenas a título de ilustração, destacamos a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 2.858, interposta em 19.03.2003 pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (CONFENEM), com o objetivo de declarar inconstitucionais alguns dispositivos das Leis Estaduais nºs. 3.524/2000, 3.708/2001 e 4.061/2003, que reservaram, do total das vagas em todos os cursos das universidades públicas fluminenses no mínimo 50% para alunos candidatos ao vestibular que cursaram o ensino fundamental e médio em escolas públicas municipais ou estaduais e, desse percentual, 40% das vagas, no mínimo, a candidatos que se declararem, no ato da inscrição para o vestibular, negros ou pardos e 10% aos vestibulandos portadores de deficiência.

De acordo com os argumentos da entidade,

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“com a aplicação das três leis aos vestibulares de acesso às universidades públicas do Rio de Janeiro, os candidatos que não se declararem negros ou pardos e que não te- nham estudado em escola pública municipal ou estadual só poderão concorrer a 30%

das vagas oferecidas”. (cf. Notícias STF, 20.03.2003 – 16h27, in <www.stg.gov.br>)

"Pelo quadro exposto, contudo, aparentemente os dispositivos legais estaduais estari- am violando o princípio da isonomia, já que, embora legítima a discriminação positiva, desti- tuída de razoabilidade e proporcionalidade”. (Direito Constitucional Esquematizado/Pedro Lenza – 12. Ed. ver., atual. e ampl. São Paulo : Saraiva, 2008 )

Pode-se dizer, portanto, que a igualdade passou por três fases principais: a igualdade formal, a igualdade material e as chamadas políticas de ação afirmativa.

A primeira fase, que é a igualdade formal, foi uma conquista do constitucionalismo liberal, já que a partir do constitucionalismo moderno a lei passa a ser a mesma para todos, independentemente de raça, sexo, cor e idade.

A segunda fase foi a da igualdade material, também chamada de igualdade na lei, desenvolvida por Aristóteles e citada por Rui Barbosa, que diz que a igualdade não está em tratar igualmente a todos, mas em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam. Esse conceito de igualdade material teve uma grande relevân- cia, na medida em que autorizou o direito a proteger as partes economicamente mais fracas. O exemplo maior disso é o direito do trabalho.

Contudo, a lógica dessa segunda fase é completamente diferente, pois a ideia não é igualar todos, mas desigualar, a fim de proteger a parte mais fraca. Portanto, se nós partirmos de um princípio formal de igualdade, as políticas de ação afirmativa são inconstitucionais.

Entretanto, a partir do conceito material de igualdade, pelo qual o Estado deve agir para tornar mais igual a sociedade, o rumo da análise muda.

Por fim, a última fase da igualdade é a chamada política de ação afirmativa, cujo e- xemplo mais comum é o das cotas. Para os defensores da política de cotas, as razões que as justificam são: primeiro, por promover uma reparação a grupos que foram historicamente dis- criminados; segundo, por promover uma igualdade de acesso, de oportunidades. Então, as cotas promoveriam igualdade de oportunidades a pessoas que não tiveram, por exemplo, a mesma formação.

Em face do exposto, as políticas de ação afirmativa são instrumentos voltados a prote- ger grupos que estão numa posição de desvantagem na sociedade. Assim sendo, a Lei nº 12.288/10, ao dispor sobre políticas públicas destinadas a reparar desigualdades sociais, adota critérios de discriminação positivos, com a única finalidade de garantir à população negra a igualdade de oportunidades. No entanto, o efeito positivo ou não de sua aplicabilidade só será possível se feita à luz do caso concreto, através da análise do vínculo entre o critério adotado e o tratamento legal e diferenciado.

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