Diretoria do Biênio 2011/2012 Presidente: Daniel Rinaldi dos Santos Vice-Presidente: Roberto Flávio Silva Pécoits-Filho
Secretário Geral: Rodrigo Bueno de Oliveira 1o Secretário: Lúcio Roberto Requião Moura
Tesoureira: Maria Almerinda Vieira Fernandes Ribeiro Alves
SBN
Conselho FisCal Presidente: Nestor Schor
Titular: Valter Duro Garcia
Titular: João Cezar Mendes Moreira
Suplente: Maria Ermecilia Almeida Melo
Suplente: Cibele Isaac Saad Rodrigues
Suplente: João Milton Martins Oliveira Penido
DepartamentoDe DeFesa proFissional Coordenador: Alan Castro Azevedo e Silva Suplente: Ruy Antonio Barata
Altair Oliveira Lima Antonio Américo Alves Ana Maria Misael
Andréa Olivares Magalhães
DepartamentoDe Diálise
Coordenadora: Patrícia Ferreira Abreu
Suplente: Mauricio Younes Ibrahim Ronaldo D’Avila
Ronaldo Roberto Bérgamo Pasqual Barretti
Fernando Saldanha Thomé Sônia Maria Holanda A. Araújo DepartamentoDe transplante Coordenador: José Medina Pestana
Suplente: Roberto Ceratti Manfro Luiz Estevam Ianhez
Irene de Lourdes Noronha Abrahão Salomão Filho Eduardo Rocha
Maria Cristina Ribeiro de Castro
DepartamentoDe ensino reciclageme titulação Coordenador: Pedro A. Gordan
Suplente: Luis Yu Hugo Abensur
João Egidio Romão Junior Emmanuel de Almeida Burdmann Jocemir Ronaldo Lugon
Elvino Barros
DepartamentoDe Fisiologiae Fisiopatologia renal Coordenador: Niels Olsen Saraiva Câmara
Suplente: Claudia Maria de Barros Helou Roberto Zatz
Antonio Carlos Seguro Mirian Aparecida Boim Eliza Mieko Suemitsu Higa Valério Ladeira Rodrigues
DepartamentoDe hipertensão arterial Coordenadora: Cibele Isaac Saad Rodrigues
Suplente: Sebastião Rodrigues Ferreira Filho Pedro Jabur
Carlos Eduardo Poli Figueiredo Rogério Mulinari
Maria Eliete Pinheiro
Fernando Antonio de Almeida
DepartamentoDe epiDemiologiae prevençãoDe Doença renal Coordenadora: Gianna Mastroianni Kirsztajn
Suplente: Rachel Bregman Marcus Gomes Bastos Edison Souza
Sérgio Wyton Lima Pinto Marcus Vinicius de Pádua Netto Paulo Roberto Abreu da Silva DepartamentoDe neFrologia ClíniCa Coordenador: Márcio Dantas
Suplente: Rui Toledo Barros Ita Pfeferman Heilberg Jenner Cruz
Yvoty Alves Santos Sens
José Hermogenes Rocco Suassuna Elizabeth De Francesco Daher
DepartamentoDe neFrologia peDiátriCa Coordenadora: Vera Hermina Kalika Koch
Suplente: Anelise Del Vecchio Gessullo Maria Goretti Moreira G. Penido Alberto Zagury
Rejane de Paula Menezes Maria Cristina de Andrade Marcelo de Sousa Tavares Sociedade BraSileira de Nefrologia
C
omitê
dos
d
istúrbios
do
m
etabolismo
Ó
sseo
e
m
ineral
na
d
oença
r
enal
C
rôniCa
Membros: José Edevanilson Barros Gueiros Aluizio Barbosa de Carvalho Elisa de Albuquerque Sampaio Rosa Maria Affonso Moysés Vanda Jorgetti
Carolina Lara Neves
Coordernador: Rodrigo Bueno de Oliveira
Aluizio Barbosa de Carvalho – Consultor/Palestrante das seguintes empresas: Genzyme, Abbott, Mantecorp. Ana Paula Santana Gueiros – Consultora/Palestrante das seguintes empresas: Abbott, Genzyme.
Carolina Lara Neves – Consultora/Palestrante das seguintes empresas: Abbott.
Cristina Karohl – sem potenciais conflitos de interesse. Eleonora Moreira Lima – sem potenciais conflitos de interesse.
Elisa de Albuquerque Sampaio – Consultora/Palestrante das seguintes empresas: Abbott.
Fabiana Rodrigues Hernandes – sem potenciais conflitos de interesse.
Fellype de Carvalho Barreto – sem potenciais conflitos de interesse.
José Edevanilson Barros Gueiros – Consultor/Palestrante das seguintes empresas: Abbott, Genzyme.
Leandro Junior Lucca – Consultor/Palestrante das seguintes empresas: Abbott, Amgen.
Lilian Cuppari – Consultora/Palestrante das seguintes empresas: Genzyme.
Lillian Andrade da Rocha – Consultora/Palestrante das seguintes empresas: Abbott.
Maria Eugênia Fernandes Canziani – Consultora/Palestrante das seguintes empresas: Genzyme, Abbott, Roche.
Maria de Fátima Câmera Gesteira – sem potenciais conflitos de interesse.
Maria de Fátima Santos Bandeira – sem potenciais conflitos de interesse.
Melani Ribeiro Custodio – Consultora/Palestrante das seguintes empresas: Mantecorp, Abbott.
Rodrigo Bueno de Oliveira – Consultor/Palestrante das seguintes empresas: Covidien.
Rosa Maria Affonso Moysés – Consultora/Palestrante das seguintes empresas: Abbott, Genzyme, Mantecorp, Fresenius, Amgen.
Rosélia Ribeiro dos Santos Lobão – sem potenciais conflitos de interesse.
Sônia Maria Holanda Almeida Araújo – sem potenciais conflitos de interesse.
Vanda Jorgetti – Consultora/Palestrante das seguintes empresas: Mantecorp, Genzyme, Abbott.
EM 5016
O Jornal Brasileiro de Nefrologia tem como missão publicar artigos cien-tíficos clínicos e experimentais relativos a temas nefrológicos.
Brazilian Journal of Nephrology has as principle to publish scientific ar-ticles resulting of clinical and experimental researches related to nephro-logic themes.
Rua Machado Bittencourt, 205 - Cj 53 - Vila Clementino 04044-000 - São Paulo, SP
Tel.: (11) 5579-1242 - Fax: (11) 5573-6000 E-mail: jbn@sbn.org.br
Diretrizes Brasileiras de Prática Clínica para o Distúrbio Mineral e Ósseo na Doença Renal Crônica é um suplemento sem indexação do Jornal Brasileiro de Nefrologia
O Jornal Brasileiro de Nefrologia recebe apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenlvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo Programa de Apoio a Publicações Científicas e é associado à ABEC. O Jornal Brasileiro de Nefrologia é indexado nas bases
de dados MEDLINE/PubMed, LILACS e SciELO. Editada por: Sociedade Brasileira de Nefrologia. Publicada por: Elsevier Editora Ltda.
©2011 Elsevier Editora Ltda.
RJ: Tel.:21 3970-9358 • Fax: 21 2507-4566 SP: Tel.: 11 5105-8555 • Fax: 11 5505-8908 Website: www.elsevier.com.br
A Elsevier não assume nenhuma responsabilidade por qualquer injúria e/ou danos a pessoas ou bens como questões de responsabilidade civil do fabricante do produto, de negligência ou de outros motivos, ou por qualquer uso ou exploração de métodos, produtos, instruções ou ideias contidas no material incluso. Devido ao rápido avanço no campo das ciências médicas, em especial, uma verificação independente dos diagnósticos e dosagens de drogas deve ser realizada.
Embora todo o material de publicidade deva estar em conformidade com os padrões éticos (médicos), a inclusão nesta publicação não constitui uma garantia ou endosso da qualidade ou valor de tal produto ou das alegações feitas pelo seu fabricante.
Esta publicação foi distribuída com o apoio institucional de Abbott Laboratórios do Brasil.
Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/98. Nenhuma parte dessa publicação poderá ser reproduzida sem autorização prévia por escrito da Elsevier Editora Ltda., sejam quais forem os meios em-pregados: eletrônico, mecânico, fotográfico, gravação ou quaisquer outros. Material de distribuição exclusiva à classe médica.
Gerhard Malnic
USP, São Paulo, SP, Brasil
Hélady Sanders Pinheiro
UFJF, Juiz de Fora, MG, Brasil
Hugo Abensur
USP, São Paulo, SP, Brasil
Irene L. Noronha
USP, São Paulo, SP, Brasil
Ita Pfefermann Heilberg
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
José Bruno de Almeida
UFRGN, Natal, RN, Brasil
José Gastão R. de Carvalho
UFPR, Curitiba, PR, Brasil
José Pacheco M. Ribeiro Neto
Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, Recife, PE, Brasil
Kleyton de Andrade Bastos
UFSE, Aracaju, SE, Brasil
Lucila Maria Valente
UFPE, Recife, PE, Brasil
Lúcio Ronaldo Cardoso
UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Luis Yu
USP, São Paulo, SP, Brasil
Luis Alberto Batista Peres
UNIOESTE, Cascavel, PR, Brasil
Luiz Antonio Miorin
Santa Casa, São Paulo, SP, Brasil
Luiz Antônio Moura
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
Luiz Carlos Ferreira Andrade
UFJF, Juiz de Fora, MG, Brasil
Luiz Felipe Santos Gonçalves
UFRGS – Porto Alegre, RS, Brasil
Luiz Sergio Azevedo
USP, São Paulo, SP, Brasil
Manuel Carlos Martins de Castro
USP, São Paulo, SP, Brasil
Marcello Fabiano de Franco
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
Marcelo Mazza do Nascimento
Fac. Evangélica de Medicina, Curitiba, PR, Brasil
Margarida M. Dantas Dutra
UFBA, Salvador, BA, Brasil
Maria Eliete Pinheiro Lessa
UFAL, Maceió, AL, Brasil
Maria Ermecília A. Melo
UFBA, Salvador, BA, Brasil
Mário Abbud Filho
FAMERP, São José do Rio Preto, SP, Brasil
Maurício Braz Zannolli
Famema, Marília, SP, Brasil
Miguel Luis Graciano
UFF, Niterói, RJ, Brasil
Mirian A. Boim
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
Natália Fernandes
UFJF, Juiz de Fora, MG, Brasil
Nelson Zocoler Galante
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
Nestor Schor
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
Noêmia Perli Goldraich
UFRGS, Rio Grande do Sul, RS, Brasil
Paulo Benigno Pena Batista
EBMSP- Escola Bahiana de Med. e Saúde Pública, Salvador, BA, Brasil
Paulo César Koch Nogueira
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
Pedro A. Gordan
UEL, Londrina, PR, Brasil
Rachel Bregman
UERJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Regina Célia R. de Moraes Abdulkader
USP, São Paulo, SP, Brasil
Roberto Zatz
USP, São Paulo, SP, Brasil
Rogério Baumgratz de Paula
UFJF, Juiz de Fora, MG, Brasil
Ronaldo Bérgamo
Fundação ABC, Santo André, SP, Brasil
Semiramis Jamil Hadad do Monte
UFPI, Teresina, PI, Brasil
Sérgio Antônio Draibe
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
Sérgio F. F. santos
UERJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Sônia Maria Holanda Almeida Araújo
UFCE, Fortaleza, CE, Brasil
Valter Duro Garcia
Santa Casa, Porto Alegre, RS, Brasil
Vanda Jorgetti
USP, São Paulo, SP, Brasil
Waldir Eduardo Garcia
UEL, Londrina, PR, Brasil
Yvoty Alves Sens
Santa Casa, São Paulo, SP, Brasil
Nefrologia
Órgão Oficial da Sociedade Brasileira de NefrologiaJ o r n a l B r a s i l e i r o d eOffical Organ of Brazilian Society of Nephrology
Publicação Trimestral (Quarterly Edition)
SBN
Paulo Novis Rocha
UFBA, Salvador, BA, Brasil
Rui Toledo
USP, São Paulo, SP, Brasil ex-editoreS (Ex Editor)
Prof. Dr. José Augusto Barbosa de Aguiar (in memorian) Prof. Dr. César Costa
Prof. Dr. Emil Sabbaga
Prof. Dr. José Francisco Figueiredo Prof. Dr. Horácio Ajzen
Prof. Dr. Décio Mion Jr.
Prof. Dr. João Egídio Romão Junior Prof. Dr. Jocemir Ronaldo Lugon
editor chefe (Editor)
Prof. Marcus Gomes Bastos
UFJF, Juiz de Fora, MG, Brasil
coeditoreS (CoEditors)
Gianna M. Kirsztajn
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
Jorge Paulo Strogoff de Matos
UFF, Niterói, RJ, Brasil
Seção (editoreSde Seção) (sECtion Editors)
doeNça reNal crôNica
Maria Eugênia Fernandes Canziani Natalino Salgado Filho
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil UFMA, São Luís, MA, Brasil doeNçareNaldiaBéticaedoeNçareNal
NaoBeSidadeeSíNdromemetaBólica
Maurilo Nazaré Leite Jr. Patrícia Abreu
UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil epidemiologia
Ricardo Sesso Jocemir Ronaldo Lugon
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil UFF, Niterói, RJ, Brasil glomerulopatiaSe doeNça
túBulo-iNterSticial
Domingos O. L. D’Ávila Francisco Veronese
PUC, Porto Alegre, RS, Brasil UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil hiperteNSãoarterial
Sebastião Rodrigues Ferreira Filho Francisco de Assis Rocha Neves
UFU, Uberlândia, MG, Brasil UnB, Brasília, DF, Brasil
iNSuficiêNciareNalaguda
José Hermógenes R. Suassuna Emmanuel de A. Burdmann
UERJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil FAMERP, São José do Rio Preto, SP, Brasil NefrologiadacriaNçaedoadoleSceNte
Maria Goretti M. Penido Vera Hermina K. Koch
UFMG, Belo Horizonte, MG, Brasil Instituto da Criança, São Paulo, SP, Brasil NefrologiaexperimeNtal
Antônio Carlos Seguro Niels Olsen Saraiva Câmara USP, São Paulo, SP, Brasil USP, São Paulo, SP, Brasil perSpectivaSem Nefrologia
Vicente de Paulo Castro Teixeira Elizabeth de Francesco Daher
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil UFCE, Fortaleza, CE, Brasil traNSplaNtereNal
Roberto Ceratti Manfro José O. Medina Pestana
UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil tratameNtodialítico
Roberto Pécoits Filho Rodrigo Bueno de Oliveira
PUC, Curitiba, PR, Brasil USP, São Paulo, SP, Brasil
(Editorial Board)
comiSSão editorial
Aluízio Costa e Silva
UnB, Brasília, DF, Brasil
Alvimar Delgado
UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Antonio Alberto Lopes
UFBA, Salvador, BA, Brasil
Antonio Carlos Duarte Cardoso
UFAM, Manaus, AM, Brasil
Carlos Eduardo Poli de Figueiredo
PUC, Porto Alegre, RS, Brasil
Cibele Isaac Saad Rodrigues
PUC de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
Clotilde Druck Garcia
Santa Casa, Porto Alegre, RS, Brasil
Edison Souza
UERJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Eduardo Homsi
UNICAMP – Campinas, SP, Brasil
Eduardo Rocha
UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Eleonora Moreira Lima
UFMG, Belo Horizonte, MG, Brasil
Elias David Neto
USP, São Paulo, SP, Brasil
Elisa de A. Sampaio da Cruz
UFF, Niterói, RJ, Brasil
Eurípedes Barsanulfo Pereira
UFMS, Campo Grande, MS, Brasil
Fernando A. de Almeida
PUC, Sorocaba, SP, Brasil
Frida Liane Plavnik
UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil editoreS eStraNgeiroS
Aldo J. Peixoto
Section of Nephrology, Yale Univ. School of Medicine EUA
Fernando C. Fervenza
Mayo Clinic, Rochester, MN, USA
José Antônio Arruda
University of Illinois, Medical Center, Illinois, Chicago, USA
(intErnational Editorial Board) Secretaria (Bsn offiCE)
Rua Machado Bittencourt, 205, Conj.53, Vila Clementino – São Paulo – SP Fone: 5579.1242 Fax: 5573.6000 E-mail: jbn@sbn.org.br www.jbn.org.br
Diretrizes BrasileirasDe Prática clínicaParao DistúrBio Minerale Ósseona Doença renal crônica | Prefácio
Prefácio
Foreword
A elaboração desta 2ª edição das Diretrizes Brasileiras de Prática Clínica para o Distúrbio
Mineral e Ósseo na Doença Renal Crônica é, mais uma vez, uma iniciativa da Sociedade
Brasileira de Nefrologia (SBN). Trata-se da nova edição de um guia prático para a nor-matização do diagnóstico e tratamento do Distúrbio Mineral e Ósseo na Doença Renal Crônica (DMO-DRC), cujo objetivo principal foi o de atualizar as Diretrizes já existentes, publicadas no Jornal Brasileiro de Nefrologia (JBN) em março de 2008. Seguindo a mes-ma tendência da comunidade nefrológica mundial, esta edição atualizada teve como base as recomendações propostas e recentemente publicadas pelo Kidney Disease: Improving
Global Outcomes (KDIGO) para o diagnóstico, avaliação, prevenção e tratamento do
DMO-DRC.
Da mesma forma que para as Diretrizes de 2008, constituiu-se um fórum nacional, desta vez coordenado pelo Comitê para o DMO-DRC da SBN, que constou de um maior número de nefrologistas, nefrologistas-pediátricos e nutricionistas, todos especialistas na área em questão e provenientes de diferentes regiões do país.
Aos temas da edição anterior foram acrescidos mais dois capítulos, um referente à doença óssea pós-transplante renal, e outro no qual a doença óssea adinâmica, cuja im-portância nesse cenário é cada vez maior, mereceu uma abordagem específica. Assim, torna-se esta edição um guia prático mais completo no qual foram considerados os temas mais relevantes para a prática diária do nefrologista frente ao DMO-DRC. Nos mesmos moldes da edição anterior, cada capítulo deste volume contém as diretrizes propriamente ditas, seguidas de um racional e de referências bibliográficas. O racional representa um resumo da literatura sobre cada diretriz em questão, visando justificar a recomendação nela contida. Atribuiu-se o termo Evidência toda vez que a diretriz baseou-se em evidên-cia publicada na literatura, independente de seu grau. Do contrário, foi utilizado o termo
Opinião, decorrente das opiniões contidas nas Diretrizes consultadas, muitas vezes
adap-tadas à experiência pessoal deste fórum.
É importante salientar que, como todo guia de prática clínica, sua consulta deve ser feita com bom senso, lembrando sempre que a conduta médica diante de cada paciente é individual e soberana. Este fórum permanecerá aberto a futuras revisões, e críticas e sugestões serão sempre bem-vindas.
O grupo coordenador desta 2ª edição das Diretrizes Brasileiras de Prática Clínica para
o Distúrbio Mineral e Ósseo na Doença Renal Crônica agradece o empenho e a
dedica-ção de todos que contribuíram para este trabalho. Agradecemos o apoio e incentivo da Diretoria da SBN, na sua gestão passada e atual, principalmente do Departamento de Diálise, que tornou possível mais esta iniciativa da nossa sociedade.
Nosso muito obrigado!
Aluizio Barbosa de Carvalho Vanda Jorgetti
S
umário |J o r n a l B r a s i l e i r o d e N e f r o l o g i a
Volume 33, Suplemento 1 - Abril - 2011 - ISSN 0101-2800
Controle da hiperfosfatemia na DRC
Aluizio Barbosa de Carvalho, Lilian Cuppari
______________________________________
S1
Prevenção e tratamento do hiperparatireoidismo secundário na DRC
José Edevanilson Barros Gueiros, Fabiana Rodrigues Hernandes, Cristina Karohl,
Vanda Jorgetti
________________________________________________________________
S7
Concentração de cálcio do dialisato e hipercalcemia na DRC
Leandro Junior Lucca, Rosélia Ribeiro dos Santos Lobão, Cristina Karohl
____________
S15
Doença óssea adinâmica
Rodrigo Bueno de Oliveira, Rosa Maria Affonso Moysés, Lillian Andrade da Rocha,
Aluizio Barbosa de Carvalho
___________________________________________________
S19
Intoxicação alumínica na DRC
Fellype Carvalho Barreto, Sonia M. Holanda Almeida Araújo
_______________________
S21
Calcificação vascular na DRC
Maria Eugênia F. Canziani, Rosa Maria A. Moysés
________________________________
S26
Paratireoidectomia na DRC
Elisa de Albuquerque Sampaio, Rosa Maria Affonso Moysés
________________________
S31
Biópsia óssea na DRC
Fellype Carvalho Barreto, Leandro Júnior Lucca
__________________________________
S35
Distúrbio mineral e ósseo após o transplante renal
Ana Paula Santana Gueiros, Carolina Lara Neves, Elisa de Albuquerque Sampaio,
Melani Ribeiro Custódio
______________________________________________________
S37
Diretrizes do distúrbio do metabolismo mineral e ósseo na doença renal
crônica da criança
Eleonora Moreira Lima, Maria de Fátima Câmera Gesteira,
Maria de Fátima Santos Bandeira
_______________________________________________
S42
D
iretrizes
B
rasileiras
De
P
rática
c
línica
Para
o
D
istúrBio
M
ineral
e
ósseo
na
D
oença
r
enal
c
rônica
1
Diretrizes BrasileirasDe Prática clínicaParao DistúrBio Minerale Ósseona Doença renal crônica | caPítulo 1
Controle da hiperfosfatemia na DRC
Management of hyperphosphatemia in CKD
Autores: Aluizio Barbosa de Carvalho Lilian Cuppari1 Avaliação dos níveis de fósforo sérico na DRC
1.1 O fósforo (P) sérico deve ser do-sado em todos os pacientes com doença renal crônica (DRC), a par-tir do estágio III, ou seja, quando a taxa de filtração glomerular (TFG) for inferior a 60 mL/min/1,73m2.
A Tabela 1 descreve as frequências e os valores recomendados para cada estágio da DRC (Evidência).
1.2 A coleta de sangue para avaliação do P sérico deverá ser preferen-cialmente em jejum (Opinião).
2 Avaliação da ingestão e prescrição die-tética de P na DRC
2.1 A avaliação da ingestão dietética de P e a prescrição de P dietético deverão ser sempre realizadas por nutricionista (Opinião).
2.2 Na DRC estágios III e IV, a inges-tão dietética de P deverá ser man-tida em valores que atendam a recomendação de proteínas entre 0,6 e 0,8 g/kg/dia, porém não su-perior a 700 mg/dia se o P estiver acima dos valores normais e/ou se o paratormônio (PTH) estiver aci-ma do nível recomendado para o estágio da DRC (Opinião).
2.3 Na DRC estágio V D, a ingestão dietética de P deverá estar entre 800 e 1.000 mg/dia, respeitando a recomendação de pelo menos 1,0 g de proteína/kg/dia (50% de proteína de alto valor biológico), desde que o P sérico não esteja abaixo de 3,5 mg/dL (Opinião).
2.4 Alimentos que contêm aditivos à base de P devem ser restringidos ao máximo (Evidência).
2.5 Alimentos com menor razão P/ proteína devem ser preferencial-mente empregados (Evidência).
3 Uso de quelantes de P na DRC 3.1 Os quelantes de P deverão ser
to-mados no mesmo momento em que alimentos que contenham quantidade significativa de P são ingeridos. A dose prescrita deverá estar de acordo com a quantidade de P contida na refeição estimada por meio de inquérito dietético (Opinião).
Pacientes com DRC estágios III-V
3.2 Os quelantes de P devem ser pres-critos se, apesar do controle da ingestão dietética, o P sérico e/ou o PTH estiverem acima dos níveis recomendados (Opinião).
Estágio da DRC TFG (mL/min) Níveis de P (mg/dL) Frequência de dosagem
III 30 – 59 Dentro do valor de referência Semestral/anual
IV 15 – 29 Dentro do valor de referência Semestral/trimestral
V < 15 Dentro do valor de referência Trimestral/mensal
V D Diálise Reduzir o P sérico em direção
ao valor normal
Mensal Tabela 1 ValoresrecoMenDaDosefrequênciaDeaValiaçãoDosníVeisDe P nos
3.2.1 Quelantes de P à base de cálcio (Ca) são
efe-tivos e podem ser utilizados desde que a dose total de Ca elemento neles contida não exce-da 1,5 g/dia ou, incluindo o Ca exce-da dieta, não exceda 2,0 g/dia. Além disso, quelantes à base de Ca não devem ser utilizados na presença de hipercalcemia persistente e recorrente, ou então, na presença de calcificação vascular, doença óssea adinâmica ou níveis de PTH persistentemente baixos. Dentre os quelantes à base de Ca, o acetato de Ca deve ser utiliza-do preferencialmente (Opinião).
3.2.2 Quelantes de P isentos de Ca (carbonato de
sevelamer e carbonato de lantânio) são efe-tivos e podem ser utilizados; devem ser a primeira escolha nos casos em que haja con-traindicação ao uso de quelantes à base de Ca (Opinião).
Pacientes com DRC estágio V D
3.3 Tanto os quelantes de P à base de Ca, assim como aqueles isentos de Ca (carbonato ou cloridrato de sevelamer e carbonato de lantâ-nio), são efetivos e ambos podem ser utiliza-dos como terapia inicial (Evidência).
3.3.1 A dose total de Ca elemento fornecida pelos
quelantes de P à base de Ca não deve exceder 1,5 g/dia ou, incluindo o Ca da dieta, não ex-ceder 2,0 g/dia (Opinião).
3.3.2 Quelantes de P à base de Ca não devem ser
utilizados na presença de hipercalcemia per-sistente e recorrente, ou na presença de cal-cificação vascular, doença óssea adinâmica ou níveis de PTH persistentemente baixos (Opinião).
3.3.3 Quelantes de P à base de alumínio não
deve-rão ser utilizados em qualquer circunstância (Evidência).
4 Dose de diálise
4.1 Em pacientes em diálise, nos quais as medidas dietéticas e terapêuticas não foram suficientes para o controle adequado do P sérico, a dose de diálise deverá ser aumentada (Opinião).
4.1.1 Para pacientes em hemodiálise (HD), uma
sessão extra de 2 horas é preferível em vez do aumento das horas de diálise de uma sessão--padrão (Opinião).
R
acionalA hiperfosfatemia na DRC é resultante de três fato-res principais: a ingestão excessiva de P, a redução da depuração de P (renal e pelos métodos dialíticos) e o estado da remodelação óssea (alta ou baixa).
A retenção de P e/ou a hiperfosfatemia estão entre os fatores que contribuem para o desenvolvimento do hiperparatireoidismo secundário (HPS) em pacientes com DRC. A hiperfosfatemia também está associa-da com morbiassocia-dade e mortaliassocia-dade nesses pacientes, principalmente relacionadas aos eventos cardiovas-culares.1,2 Os mecanismos pelos quais a retenção de
P aumenta o risco de eventos cardiovasculares e de mortalidade ainda não estão totalmente elucidados.3,4
Esses mecanismos envolvem a transformação feno-típica das células musculares lisas da camada média dos vasos arteriais, induzidas pelo P ou indiretamente pelos efeitos da hiperfosfatemia sobre o PTH, desen-cadeando o HPS e a calcificação vascular.5,6
O racional para prevenir a retenção de P ou tratar a hiperfosfatemia estabelecida está no seu conhecido papel no desenvolvimento do HPS. Além disso, ou-tros benefícios ainda não provados seriam a dimi-nuição do risco de calcificação vascular e de tecidos moles, prevenção de eventos cardiovasculares e de progressão da DRC. As evidências disponíveis supor-tam que valores de P séricos, inferiores ou superiores aos da faixa de normalidade, se associam com piores desfechos incluindo morte.2,7 Porém, os níveis
reco-mendados de P, associados com melhor prognóstico, são difíceis de determinar.
Nos estágios II, III e IV da DRC, os estudos que avaliam esse aspecto são escassos. Recentemente, foi reportado que níveis de P sérico acima de 3,5 mg/dL, em pacientes na fase pré-dialítica, estavam associados com aumento da mortalidade.8 No estágio V D da
DRC, os achados de estudos observacionais indicam diferentes valores associados com risco de complica-ções cardiovasculares ou morte. Porém, uma análise recente de uma coorte de 40.000 pacientes prevalen-tes em HD demonstrou que o risco de morte aumenta quando o P plasmático se encontra acima de 5,0 mg/ dL.2 Assim, as evidências sugerem que níveis de P
sé-rico dentro da faixa de normalidade estão associados com melhores desfechos. No entanto, ainda há neces-sidade de estudos de intervenção que possam identi-ficar com maior precisão os níveis ideais de P para os pacientes com DRC.
Estudos mostram que a concentração séri-ca de P se mantém dentro da faixa de normalida-de até que a TFG normalida-decline para 20 a 30 mL/min.8
3 Controle da hiperfosfatemia na DRC
J Bras Nefrol 33; Supl1 (2011) S1-S6 J Bras Nefrol 33; Supl1 (2011) S1-S6
Isso faz supor que a intervenção dietética com re-lação ao P só é necessária quando o P se encontra acima dos valores normais. No entanto, a retenção de P parece ocorrer precocemente no curso da DRC, participando, assim, da gênese do HPS. Porém, não existem estudos, até o momento, que identifiquem o valor de P sérico a partir do qual o controle da sua ingestão deva ser iniciado. Assim, foi consen-so desse grupo de trabalho que a ingestão de P nos estágios III e IV da DRC não exceda 700 mg/dia, que é o valor recomendado para indivíduos adultos saudáveis de acordo com as Recommended Dietary
Allowances (RDA).9 O controle deve ser feito
parti-cularmente para aqueles pacientes com P sérico aci-ma do noraci-mal ou ainda para aqueles com níveis de PTH acima dos valores recomendados, mesmo que o P sérico esteja normal. O controle da ingestão de P deve ser feito com cuidado, de forma a não provocar redução excessiva da sua concentração sérica, visto que a hipofosfatemia pode indicar ingestão insufi-ciente de proteína, além de estar associada ao maior risco de morbimortalidade.7
No estágio V da DRC, a redução na ingestão de P é necessária, já que os métodos dialíticos são re-lativamente ineficientes na sua remoção. Porém, um fator limitante é a manutenção da elevada necessida-de necessida-de proteína (1,0 a 1,2 g/kg/dia) nesse estágio da
DRC. Os alimentos com alto teor de proteína são naturalmente ricos em P e contribuem com a maior parte do P ingerido. Assim, é muito difícil atender à necessidade de proteína com uma oferta de P infe-rior a 800 mg/dia.
De qualquer forma, ações devem ser implementa-das de maneira a evitar que a ingestão de P seja su-perior a 1.000 mg/dia. Na Tabela 2, estão apresenta-dos os alimentos fontes de proteína e P. Uma forma de oferecer a quantidade necessária de proteína, com o menor teor possível de P, é selecionar os alimen-tos que têm a menor relação P/proteína, conforme mostrado na Tabela 2. Estudo recente com pacientes em hemodiálise demonstrou pela primeira vez que o risco de morte foi 2,37 vezes maior no maior tercil de ingestão de P quando comparado ao menor tercil. Além disso, o risco também foi maior no grupo de pacientes com relação P/proteína da dieta acima de 16 mg/g.10 Além disso, é importante a restrição de
alimentos processados que contêm aditivos à base de P (ácido fosfórico, polifosfatos e pirofosfatos) como alimentos semiprontos, os chamados fast foods, em-butidos, queijos processados, produtos instantâneos, biscoitos, cereais matinais e refrigerantes à base de cola. Há evidência que a restrição de alimentos que contêm aditivos de P promove redução na fosfate-mia em pacientes em HD.11
Alimento Quantidade (g) Medida caseira P (mg) Proteína (g) P/Proteína (mg/g)Relação
Carne de frango 80 1 filé de peito médio 150 23,0 6,5
Carne de porco 80 1 bisteca média 147 21,2 6,9
Carne bovina 85 1 bife médio 209 26,0 8,0
Pescada branca 84 1 filé médio 241 20,6 11,7
Ovo inteiro 50 1 unidade 90 6,0 15
Clara de ovo 30 1 unidade 4,3 3,3 1,3
Fígado de boi 85 1 bife médio 404 22,7 17,8
Sardinha 34 1 unidade 170 8,4 20,2
Presunto 48 2 fatias médias 136 14 9,7
Queijo prato 30 2 fatias finas 153 7,5 20,4
Iogurte 120 1 pote pequeno 159 6,3 25,2
Leite 150 1 copo americano 140 4,9 28,6
Soja cozida 54 5 colheres de sopa 130 9 14,5
Feijão cozido 154 1 concha média 133 6,9 19,3
Amendoim 50 1 pacote pequeno 253 13 19,5
Chocolate 40 1 barra pequena 92 3 30,7
Ref 13
Uma orientação dietética individualizada por tricionistas, associada a programas de educação nu-tricional, é fundamental para melhorar a adesão do paciente.12
Considerando-se as limitações associadas com a restrição de P e com a remoção de P pela diálise, os quelantes de P são necessários para quase todos os pa-cientes submetidos à diálise. Em teoria, os quelantes de P deveriam prevenir ou tratar a hiperfosfatemia. No entanto, na prática clínica observa-se que o efeito dos quelantes é limitado. Os principais quelantes de P utilizados em nosso meio, bem como suas caracterís-ticas, estão listados na Tabela 3.
A escolha do tipo de quelante e a dose a ser pres-crita dependerão de alguns fatores. Primeiramente, nas refeições em que a quantidade de P é maior, o quelante deve ser prescrito em maior quantidade e, naquelas refeições em que não há alimentos ricos em P, não há necessidade de quelante. Lanches ou alimen-tos com elevada quantidade de P, ingeridos a qualquer momento, devem ser sempre associados com os que-lantes. Não existem doses estabelecidas para a pres-crição de quelantes baseadas na quantidade de P da alimentação.
Dessa forma, o acompanhamento frequente é a melhor maneira de avaliar a adequação da prescri-ção, fazendo ajustes quando necessário. Os quelantes devem ser ingeridos junto com a alimentação, de for-ma a permitir a melhor mistura com os alimentos. É importante que o paciente compreenda como agem os quelantes, para que se obtenha a melhor adesão e, consequentemente, os melhores resultados. Outra consideração a ser feita é quanto aos níveis de Ca séricos. Pacientes com hipercalcemia não devem uti-lizar quelantes que contêm Ca, e para aqueles com calcemia no limite superior da normalidade a dose prescrita de quelantes à base de Ca deve ser bastante cautelosa. Se essa for a única opção, usar acetato de Ca. A dose de Ca elementar proveniente de quelantes não deve exceder a 1.500 mg/dia.14
Caso haja contraindicação ao uso de quelantes à base de Ca, o cloridrato de sevelamer deve ser sem-pre emsem-pregado. Uma atenção deve ser dada àqueles pacientes em uso de 1,25-hidroxivitamina D (calci-triol), já que esse hormônio promove aumento na absorção intestinal de Ca e de P. A observação e o acompanhamento dos níveis de PTH ao longo do tratamento também são necessários, pois muitas ve-zes o HPS se mostra resistente ao tratamento clíni-co, situação esta que inviabiliza a diminuição do P sérico, mesmo com a restrição dietética e utilização maciça de quelantes. Além disso, na situação oposta, ou seja, no hipoparatireoidismo relativo, quando a remodelação óssea está diminuída, a reduzida incor-poração de P pelo osso faz com que a hiperfosfate-mia se mantenha. Nesses dois casos, outras opções de tratamento devem ser consideradas, sendo impor-tante que o paciente seja informado quanto às razões da falha no tratamento. A avaliação do tratamento proposto deve acontecer periodicamente, para que ajustes dietéticos e medicamentosos possam ser re-alizados. Finalmente, o sucesso da terapia depen-de fundamentalmente da participação do paciente. Assim, as orientações devem ser claras e objetivas e toda a equipe multiprofissional deve estar envolvida e, em especial, o nutricionista.
Quando o controle dietético e o uso de quelan-tes de P são insuficienquelan-tes, mudanças na prescrição de diálise podem ser medidas coadjuvantes. O tratamen-to dialítico convencional é insuficiente para manter um balanço negativo de P na maioria dos pacientes em diálise. Tal fato torna-se óbvio quando compa-ramos a capacidade de depuração de P de uma ses-são de 4 horas de HD, que é de aproximadamente 900 mg de P,15 com a quantidade diária ingerida,
que é de até 1.000 mg/dia, contida em uma dieta preconizada com 1,0 a 1,2 g de proteína/kg/dia.14
Mesmo alterações na composição e fluxo do dialisa-to, assim como no tipo de membrana capilar, não se mostram efetivas na melhora da depuração de P.16,17
Quelante Poderquelante Vantagens Efeitosadversos
Carbonato de cálcio (40% de cálcio elementar)
Baixo Baixo custo – Constipação
– Hipercalcemia e calcificação metastática Acetato de cálcio
(25% de cálcio elementar)
Moderado Maior poder quelante
com menor oferta de cálcio que o carbonato
de cálcio
– Constipação e náuseas
– Hipercalcemia e calcificação metastática
Cloridrato de Sevelamer Moderado Não contém alumínio
ou cálcio
– Diarreia ou constipação, flatulência, náuseas e dispepsia
5 Controle da hiperfosfatemia na DRC
J Bras Nefrol 33; Supl1 (2011) S1-S6 J Bras Nefrol 33; Supl1 (2011) S1-S6
Já a diálise peritoneal (DP) é capaz de prover um controle do P pouco melhor que a HD, porém ainda insuficiente.18
A remoção inadequada do P pela HD convencional decorre de sua própria cinética. Primeiramente, é funda-mental sabermos que o P é um elemento predominan-temente intracelular. Durante a primeira hora de uma sessão de HD ocorre uma rápida remoção de P, que atin-ge o seu pico por volta dos 120 minutos. A partir daí, a taxa de remoção cai e se mantém em torno da metade daquela da fase inicial, sem que haja, porém, alteração do P sérico.15 Finalmente, pode haver um rebote
pós--dialítico no qual os níveis de P podem até mesmo exce-der os do início da sessão de diálise.15,19
Portanto, a cinética da remoção do P obedece a um modelo de duas fases. Inicialmente, ocorre a re-moção do P do compartimento extracelular, seguida por um fluxo de P do meio intra para o extracelular, o que mantém seu nível sérico constante ao longo do restante do tratamento. São justamente a velocidade de efluxo de P para o dialisato durante as primeiras horas de diálise e a velocidade de mobilização entre os compartimentos intra e extracelular que limitam a remoção do P. Daí, a frequência e a duração das sessões de diálise correlacionam-se diretamente com o controle adequado da fosfatemia.
Os efeitos de novos padrões de HD, como a diá-ria e a prolongada noturna, sobre o controle do P têm sido estudados.20-23 Um achado universal desses
estudos é o melhor controle do P, com redução ou mesmo interrupção do uso de quelantes de P. Além disso, obtém-se melhor controle do PTH e do produ-to Ca x P.23,24 Embora promissoras, essas
modalida-des dialíticas ainda não fazem parte da nossa prática diária. Nos casos de hiperfosfatemia grave, podemos sempre lançar mão do aumento no número de ses-sões semanais de diálise ou de sua duração, embora, por vezes, haja resistência por parte do paciente, em razão da interferência direta em seu cotidiano. Além disso, uma vez que a HD convencional é um método limitado para o controle do P, são de extrema impor-tância a assiduidade do paciente e a manutenção da adequação de diálise, evitando-se a redução do tempo de tratamento, prática que vem tornandose frequente em nosso meio.
R
efeRências1. London GM, Guerin AP, Marchais SJ et al. Arterial media calcification in end-stage renal disease: impact on all-cause and cardiovascular mortality. Nephrol Dial Transplant. 2003; 18:1731-40.
2. Block GA, Klassen PS, Lazarus JM et al. Mineral me-tabolism, mortality, and morbidity in maintenance he-modialysis. J Am Soc Nephrol. 2004; 15:2208-18. 3. Giachelli CM. Vascular calcification mechanisms. J Am
Soc Nephrol. 2004; 15:2959-64.
4. Kavanaugh MP, Kabat D. Identification and character-ization of a widely expressed phosphate transporter/ret-rovirus receptor family. Kidney Int. 1996; 49:959-63. 5. Almaden Y, Hernandez A, Torregrosa V et al. High
phosphate level directly stimulates parathyroid hor-mone secretion and synthesis by human parathyroid tissue in vitro. J Am Soc Nephrol. 1998; 9:1845-52. 6. Goodman WG, Goldin J, Kuizon BD et al.
Coronary-artery calcification in young adults with end-stage re-nal disease who are undergoing dialysis. N Engl J Med. 2000; 342:1478-83.
7. Lowrie EG, Lew NL. Death risk in hemodialysis pa-tients: the predictive value of commonly measured vari-ables and an evaluation of death rate differences be-tween facilities. Am J Kidney Dis. 1990; 15:458-82. 8. Kestenbaum B, Sampson JN, Rudser KD et al. Serum
phosphate levels and mortality risk among people with chronic kidney disease. J Am Soc Nephrol. 2005; 16:520-8.
9. Institute of Medicine/Food and Nutrition Board: Dietary reference intakes for calcium, phosphorus, magnesium, vitamin D and fluoride. Washington, National Academy Press, 1997. 432p.
10. Noori N, Kalantar-Zadeh K, Kovesdy CP et al. Association of dietary phosphorus intake and phospho-rus to protein ratio with mortality in hemodialysis pa-tients. Clin J Am Soc Nephrol. 2010; 5:683.
11. Sullivan C, Sayre SS, Leon JB et al. Effect of food addi-Effect of food addi-tives on hyperphosphatemia among patients with end-stage renal disease. JAMA 2009; 301:629.
12. Nisio MJ BA, Kamimura MA, Lopes MGG et al. Impacto de um programa de educação nutricional no controle da hiperfosfatemia de pacientes em hemodiáli-se. J Bras Nefrol. 2007; 29:152-7.
13. United States of America (USA). Human Nutrition Information Service. Department of Agriculture: Compo-sition of foods: Raw, processed, prepared foods. Agriculture Handbook n.8, series 1-16. Revised 1976-1986.
14. National Kidney Foundation (NKF-DOQI). Clinical practice guidelines for bone metabolism and disease in chronic kidney disease. Am J Kidney Dis. 2003; 42(sup-pl. 3):1-201.
15. Hou SH, Zhao J, Ellman CF et al. Calcium and phos-phorus fluxes during hemodialysis with low calcium dialysate. Am J Kidney Disease 1991; 18:217-24. 16. Zuchelli P, Santoro A. Inorganic phosphate removal
during different dialitic procedures. Int J Art Organ. 1987; 10:173-8.
17. Chaveau P, Piognet JL, Kano T. Phosphate removal rate: A comparative study of five high-flux dialysers. Nephrol Dial Transplant. 1991; 6(supl2):114-15.
18. Cannata-Andia JB, Rodriguez-Garcia M.
Hyperphosphatemia as a cardiovascular risk factor – how to manage the problem. Nephrol Dial Transplant. 2002; 17(supl11):16-19.
19. Minutolo R, Belizzi V, Crofti M. Postdialytic rebound of serum phosphorus: pathogenesis and clinical insight. J Am Soc Nephrol. 2002; 13:1046-54.
20. Uldall R, Ouwendyk M, Francoeur R et al. Slow noc-turnal home hemodialysis at the Wellesley Hospital. Adv Ren Replace Ther. 1996; 3:133-6.
21. Kooistra MP, Vos J, Koomans HA et al. Daily home haemodialysis in The Netherlands: effects on meta-bolic control, haemodynamics, and quality of life. Nephrol Dial Transplant. 1998; 13:2853-60.
22. Mucsi I, Hercz G, Uldall R et al. Control of serum phosphate without any phosphate binders in patients treated with nocturnal hemodialysis. Kidney Int. 1998; 53:1399-404.
23. Lindsay RM, Alhejaili F, Nesrallah G et al. Calcium and phosphate balance with quotidian hemodialysis. Am J Kidney Dis. 2003; 42(Suppl 1):24-9.
24. Mizani M, Ayus JC. Control of severe hyperparathy-roidism (SHPT) by short daily dialysis (SDHD) with concomitant use of high dose of vitamin D analog (par-acalcitol). J Am Soc Nephrol. 2004; 15:736A.
7
Diretrizes BrasileirasDe Prática clínicaParao DistúrBio Minerale Ósseona Doença renal crônica | caPítulo 2
Prevenção e tratamento do hiperparatireoidismo
secundário na DRC
Prevention and treatment of secondary hyperparathyroidism in CKD
Autores: José Edevanilson Barros Gueiros Fabiana Rodrigues Hernandes Cristina Karohl Vanda Jorgetti
1 Avaliação dos níveis de paratormônio (PTH) e fosfatase alcalina (FA) na DRC 1.1 Os níveis séricos de PTH devem
ser analisados em todos os pacien-tes com DRC, cuja taxa de filtra-ção glomerular (TFG) for inferior a 60 mL/min/1,73 m2 (Evidência).
A Tabela 1 descreve as frequên-cias recomendadas (Opinião).
dosagem do PTH e, para cada mé-todo, qual a fonte ideal: plasma ou soro, além das características ideais de coleta e armazenamento (Evidência).
1.5 Nos pacientes com DRC estágios IV e V em tratamento conser-vador ou diálise, a FA deve ser dosada anualmente, ou mais fre-quentemente na vigência de níveis elevados de PTH (Evidência).
2 Prevenção e tratamento do hiperpara-tireoidismo secundário na DRC
Pacientes com DRC estágios III e IV
2.1 Nos pacientes com DRC estágios III a V, os níveis ideais de PTH não são conhecidos. No entanto, sugerimos que os pacientes com níveis de PTH acima do limite su-perior de referência para o méto-do sejam avaliaméto-dos quanto à pre-sença de hipocalcemia, hiperfos-fatemia ou fração de excreção de P elevada, e deficiência de 25-hi-droxivitamina D (25-vit D). Se fo-rem detectadas alterações nesses parâmetros, estes devem ser corri-gidos; sais de Ca para correção da hipocalcemia, orientação dietética e/ou uso de quelantes de P para correção da hiperfosfatemia e uso de ergocalciferol (vitamina D2) ou colecalciferol (vitamina D3) para correção da hipovitaminose D (Evidência).
2.2 Se os níveis de 25-vit D forem in-feriores a 30 ng/mL, inicia-se a su-plementação com vitamina D2 ou vitamina D3 (Tabela 2) (Opinião).
Tabela 1 FrequênciaDeavaliação Dosníveis De PtH nos DiFerentesestágiosDa
Drc Estágio da
DRC (mL/min)TFG Frequência de coleta
III 30 – 59 Anual
IV 15 – 29 Semestral
V ou VD < 15 ou
diálise Trimestral
1.2 Deve-se modificar a frequência de avaliação dos níveis séricos de PTH se os resultados das análises mostrarem uma tendência de ele-vação ou de descenso ou após a instituição do tratamento, seja ele para reduzir ou elevar os níveis de PTH (Opinião).
1.3 A amostra de sangue para dosa-gem do PTH deverá ser obtida, preferencialmente em jejum, nos pacientes com DRC em tratamento conservador ou naqueles em diáli-se peritoneal (DP). Nos pacientes em hemodiálise (HD), as amostras poderão ser obtidas no início da sessão de diálise (Opinião).
Os laboratórios de análises clí-nicas devem informar ao médico qual o método que utilizam para a
2.2.1 Durante a suplementação com vitamina D2
ou D3, os níveis séricos de cálcio (Ca) e P de-vem ser analisados a cada 2 meses (Opinião).
2.2.2 Se os níveis séricos de Ca forem superiores
aos limites de referência do método, suspen-der a suplementação (Evidência).
2.2.3 Se o P sérico for superior ao valor de
referên-cia, inicia-se ou ajusta-se a dose de quelan-tes de P. Se após essa conduta a fosfatemia persistir elevada, suspender a suplementação com vitamina D2 ou D3 (Opinião).
2.3 Se os níveis séricos de PTH permanecerem elevados apesar da correção dos fatores des-critos anteriormente, indica-se o tratamento com calcitriol ou análogo da vitamina D. Recomenda-se o tratamento com calcitriol na dose de 0,25-0,5 mg/dia. Entretanto, o Ca e o P séricos devem permanecer dentro dos limites de referência, além de a função renal permanecer estável (Evidência).
Pacientes com DRC estágio V ou V D
2.4 Pacientes com DRC estágio V ou V D devem manter os níveis de PTH entre 2 e 9 vezes o valor superior do método. No entanto, se as avaliações mostrarem tendência de elevação ou redução nos níveis de PTH, medidas tera-pêuticas devem ser introduzidas e a frequên-cia de dosagem aumentada (Evidênfrequên-cia).
2.5 Pacientes com PTH elevado ou com tendên-cia à elevação devem ser tratados com calci-triol ou análogos de vitamina D e/ou calcimi-méticos (Evidência).
2.6 O critério de seleção para a escolha da droga deve levar em consideração o perfil bioquí-mico do Ca e P do paciente (Opinião):
2.6.1 Pacientes com hipercalcemia e/ou
hiperfosfa-temia, o uso de calcitriol ou de análogos da vitamina D devem ser evitados até a corre-ção dos níveis de Ca e de P (Evidência).
2.6.2 Pacientes com hipocalcemia, o uso de
calci-mimético deve ser evitado até a correção dos níveis de Ca (Evidência).
2.7 Pacientes tratados com calcitriol ou análo-gos de vitamina D que desenvolvam hiper-calcemia e/ou hiperfosfatemia devem ter a dose da medicação reduzida ou suspensa (Evidência).
2.8 Pacientes tratados com calcimiméticos que desenvolvam hipocalcemia devem ter a sua dose reduzida ou suspensa de acordo com a gravidade da hipocalcemia e quadro clínico apresentado pelo paciente (Evidência).
2.9 A escolha do tipo de quelante de P, bem como a sua dose, devem ser ajustadas de for-ma a permitir que níveis séricos de Ca e P mantenham-se dentro dos valores de referên-cia, possibilitando o tratamento do hiperpa-ratireoidismo secundário (HPS) (Opinião).
2.10 Pacientes que apresentam redução dos níveis
de PTH abaixo de 150 pg/mL devem ter as doses de calcitriol ou análogos de vitamina D e/ou calcimiméticos reduzidas ou suspen-são das drogas (Evidência).
2.11 O controle de tratamento deve ser feito por
meio da dosagem mensal de PTH, Ca, P até que os níveis de PTH estejam estáveis dentro da faixa recomendada (Opinião).
2.12 Pacientes que, a despeito das medidas
clíni-cas e terapêuticlíni-cas adotadas, persistirem com níveis de PTH acima da faixa recomendada devem ser tratados com paratireoidectomia (Evidência).
Tabela 2 suPleMentaçãocoMergocalciFerol (vitaMina D2) oucolecalciFrol (vitaMina D3) coMBasenos níveisséricosDe 25-vit D
Nível sérico (ng/mL) Dose de ergocalciferol ou colecalcifrol Tempo de suplementação < 5 50.000UI/sem/12 sem. Após, 50.000UI/mês 6 meses e repetir dosagem 25-vit D 5 – 15 50.000UI/sem/4 sem. Após, 50.000UI/mês 6 meses e repetir dosagem 25-vit D
9 Prevenção e tratamento do hiperparatireoidismo secundário na DRC
J Bras Nefrol 33; Supl1 (2011) S7-S14 J Bras Nefrol 33; Supl1 (2011) S7-S14
R
acionalNos pacientes com DRC, os níveis séricos de PTH se elevam quando a TFG diminui abaixo de 60 mL/ min/1,73 m2.1 As alterações ósseas decorrentes do
ex-cesso de PTH podem estar presentes já no estágio III da DRC. Com a progressão da doença renal, estas alterações tornam-se mais evidentes. Dessa forma, a avaliação dos níveis séricos de PTH se inicia a partir do estágio III.
As técnicas empregadas para a determinação do PTH sérico são: imunorradiometria (IRMA) e imuno-quimioluminescência (ICMA). Essas técnicas superes-timam os níveis de PTH biologicamente ativos, pois detectam fragmentos não ativos da molécula2, o que
explica a presença de altos níveis de PTH associados à doença óssea de baixa remodelação em alguns pacien-tes.3-5 Novos ensaios para dosagem desse hormônio
têm sido desenvolvidos, porém, até o presente mo-mento, não existem estudos que demonstrem a supe-rioridade desses ensaios, com relação aos anteriores, uma vez que não foram realizados estudos com biop-sia óssea, para avaliar se distintas faixas de níveis de PTH são capazes de predizer que tipo de lesão óssea acomete o paciente.6-9
Vale lembrar que existem vários testes para dosa-gem de PTH. A maioria dos estudos realizados até a publicação do KDOQI 2003 baseou-se nos resultados com o teste produzido pela Nichols (Allegro) e que atualmente não é comercializado.10 Estudo publicado
recentemente comparou resultados de dosagem do PTH empregando-se os testes disponíveis no merca-do, com os resultados obtidos com o teste da Nichols/ Allegro. Os resultados mostraram uma variabilidade significante do resultado do nível de PTH nos diferen-tes diferen-tesdiferen-tes, pois esdiferen-tes diferen-tesdiferen-tes dosavam quantidades dife-rentes de moléculas ativas ou inativas do PTH.11-12
É de fundamental importância que as amostras co-lhidas, para a dosagem do PTH, sejam imediatamen-te colocadas em gelo, rapidamenimediatamen-te centrifugadas em centrífuga refrigerada, evitando, assim, que a molécu-la se degrade, o que poderia interferir nos resultados. Importante também é ter conhecimento do método empregado para a dosagem bem como os valores de referência do laboratório.
A FA é uma enzima que retira o P das proteínas e dos nucleotídeos. Está presente em todo o organismo na forma de isoenzimas específicas para cada tecido. Altas concentrações de FA são encontradas no fíga-do e nos ossos, portanto, elevações na fíga-dosagem sérica desta enzima ocorrem por alterações hepáticas, alta remodelação óssea ou metástases ósseas. Os valores
de FA também se encontram aumentados nos casos de crianças em fase de crescimento ósseo ou após fratu-ras. A dosagem da FA nos pacientes com DRC, desde que não apresentem alterações hepáticas, serve como um teste adjunto no diagnóstico do DMO subjacente e também como um parâmetro no acompanhamento do tratamento do HPS.
Nos pacientes com DRC estágios III a V (conser-vador), os níveis ideais de PTH não são conhecidos. Nos estágios iniciais da DRC, as alterações dos ní-veis de PTH representam a adaptação do organismo à perda da função renal, visando manter os níveis de Ca e P séricos adequados. Ainda não sabemos como distinguir uma resposta adaptativa de uma situação anormal. Portanto, a melhor conduta será aumentar a frequência de dosagem dos níveis de PTH se hou-ver uma tendência à elevação desse hormônio e, nesse caso, iniciar o tratamento com calcitriol ou análogos da vitamina D após correção da hipocalcemia, da hi-perfosfatemia ou da deficiência de vitamina 25-vit D, se estiverem presentes.
A suplementação com Ca, nos pacientes com DRC nos estágios III a V (conservador), deve ser cautelosa e apenas nos casos diagnosticados de hipocalcemia. Estudos com população normal13 e pacientes com
DRC em tratamento conservador14 já demonstraram
um aumento do risco cardiovascular e da calcificação coronariana associados à suplementação de Ca.
Devemos acompanhar os níveis de P séricos e na-queles pacientes com níveis elevados, iniciar dieta e uso de quelantes à base de Ca quando necessários.
Recentemente, demonstrou-se que pacientes em tratamento conservador e com níveis normais de P podem apresentar elevação dos níveis séricos de PTH e do FGF-23, sugerindo uma sobrecarga de P. Portanto, a fosfatemia parece não ser um marcador ideal da carga de P no organismo, chamando aten-ção para a importância do controle do conteúdo de P na dieta e da monitoração da fração de excreção de P em fases precoces da DRC.15
A 25-vit D tem duas formas e inúmeros metabó-litos. As duas formas são o ergocalciferol (vitamina D2) e o colecalciferol (vitamina D3) e seus principais metabólitos são o calcidiol ou 25-vit D e o calcitriol ou 1,25-vit D. O termo 25-hidroxivitamina D não deve ser confundido com calcitriol que, na verdade, se trata de um hormônio sintetizado principalmente nos rins, a partir da 25-vit D.
Os níveis séricos de 25-vit D representam o esto-que corporal de vitamina D. Indivíduos com níveis séricos inferiores a 15 ng/mL são classificados como deficientes em vitamina D, e aqueles cujos níveis
encontram-se entre 16 e 30 ng/mL, como insuficien-tes. Estudos realizados nos Estados Unidos, Europa e inclusive no Brasil mostram prevalências de 20% a 90% de deficiência/insuficiência nas populações estudadas, independentemente da raça, faixa etária e sexo.16-22
Pacientes com DRC também apresentam elevada prevalência de deficiência deste hormônio.23,24 Alguns
estudos mostram deficiência superior a 70% nos pa-cientes com DRC estágios III e IV.23-25 Nos pacientes
em HD e DP, essa prevalência é superior a 90%26-28 e,
nos transplatados renais, superior a 70%.29 Tanto em
indivíduos normais como nos pacientes com DRC, níveis reduzidos de 25-vit D associam-se a aumento dos níveis de PTH. Na DRC, a deficiência dessa vi-tamina também está associada a progressão e gravi-dade do HPS. Nos indivíduos normais, a deficiência de 25-vit D está associada à menor densidade mineral óssea e à maior taxa de fraturas,29,30 o que também foi
observado nos pacientes em diálise.27,31
Esses dados revelam que tanto a deficiência como a insuficiência de 25-vit D são danosas aos pacientes com DRC, agravando o HPS e causando prejuízo à saúde dos ossos. As principais causas de deficiência/ insuficiência de 25-vit D na DRC são a baixa expo-sição solar, baixa ingestão de alimentos ricos em tamina D e a diminuição da síntese endógena de vi-tamina D na pele. Devemos lembrar que indivíduos idosos também sintetizam menos vitamina D e, por-tanto, têm a deficiência de 25-vit D agravada quando na presença de DRC. Também indivíduos de cor de pele negra apresentam maior risco de deficiência/in-suficiência de 25-vit D, pois a presença da melanina diminui a síntese cutânea da vitamina D.31,32
A prevenção e o tratamento da insuficiência/defici-ência de vitamina D nos pacientes com DRC estágios 3 e 4 têm sido preconizados visando reduzir a frequência e a gravidade do HPS.33 Poucos são os estudos que
ava-liaram a efetividade da suplementação com vitamina D2 ou D3 na DRC. A suplementação com ergocalciferol re-duziu os níveis de PTH nos pacientes com DRC estágio 3.34-36 Nos pacientes em HD ou DP, a reposição de
ergo-calciferol foi segura e efetiva para normalizar os níveis de 25-vit D, o mesmo não ocorrendo com os níveis de PTH.25-27 Até o momento, a efetividade da reposição de
vitamina D2 ou D3 neste grupo de pacientes não está es-tabelecida. Deve-se ressaltar que o calcitriol não deve ser usado para tratar insuficiência /deficiência de 25-vit D.
No Brasil foi recentemente lançada uma prepara-ção comercial de vitamina D3 (colecalciferol – Addera D3 ® – 134 UI/gota) como único elemento da
formula-ção, pois em geral, as apresentações estão associadas
à vitamina A, Ca ou associadas à polivitamínicos, porém em baixa concentração. Esta nova formula-ção muitas vezes não supre a necessidade de reposi-ção de 25-vit D nos casos de deficiências mais graves. Recomenda-se, então, manipular na forma de gotas. A concentração mais preconizada é de 1.000 UI/gota. Vale ressaltar que essa vitamina deve ser armazenada em geladeira e protegida da luz.
Os níveis séricos ideais de PTH para pacientes com DRC, seja em tratamento conservador ou em diálise, continuam a desafiar os nefrologistas. Fatores ligados à metodologia empregada na dosagem do PTH, a falta de correlação entre histologia óssea e valores interme-diários de PTH dificultam a determinação de níveis ótimos desse hormônio.12,37 Estudos mostraram
asso-ciação entre aumento da mortalidade e níveis reduzi-dos ou elevareduzi-dos de PTH nos pacientes em diálise.38-40
Dessa forma, deve-se evitar manter os pacientes com níveis extremos e daí a sugestão de valores entre 2 e 9 vezes o limite superior do método. O seguimento, ao longo do tempo, é imprescindível para a conduta terapêutica. Detectando-se tendência de aumento ou redução do intervalo recomendado, medidas imedia-tas devem ser adotadas para o retorno aos níveis su-geridos. O tratamento com calcitriol ou análogos de vitamina D e/ou calcimiméticos deve ser instituído. O critério de escolha da droga depende dos níveis séricos de Ca e P. Dessa forma, pacientes com hipercalcemia e/ou hiperfosfatemia não devem utilizar calcitriol ou análogos de vitamina D, e pacientes com hipocalcemia não podem ser tratados com calcimiméticos.
Pacientes com DRC, especialmente em diálise, apresentam níveis reduzidos de calcitriol.41 Esse é
um dos fatores responsáveis pelo desenvolvimento e progressão do HPS, tanto por reduzir a absorção intestinal de Ca, levando à hipocalcemia, como por diminuir o controle da síntese e secreção de PTH. Além disso, na DRC, a expressão dos receptores da 25-vit D está diminuída nas glândulas da paratireoi-de, limitando a ação do calcitriol na inibição do gene do PTH.42-44
Os principais efeitos adversos do tratamento com calcitriol são a maior absorção intestinal de Ca e P podendo produzir hipercalcemia, hiperfosfatemia e aumentar o produto Ca x P.45 Além disso, o
calci-triol pode reduzir a formação óssea e originar uma condição de doença óssea de baixa remodelação, a chamada doença óssea adinâmica.46,47 Por tais
mo-tivos, os níveis séricos de PTH, Ca e P devem ser monitorados no curso do tratamento com calcitriol e sua dose ajustada para manter os níveis recomen-dados desses elementos.
11 Prevenção e tratamento do hiperparatireoidismo secundário na DRC
J Bras Nefrol 33; Supl1 (2011) S7-S14 J Bras Nefrol 33; Supl1 (2011) S7-S14
Calcitriol pode ser administrado tanto nas formas diária por via oral ou intermitente (em pulso), via intravenosa ou oral, 2 a 3 vezes por semana. A ad-ministração intermitente parece ser mais efetiva para controlar os níveis de PTH do que a forma diária.48,49
No entanto, não há um consenso na literatura sobre a melhor via de administração, assim como a melhor dose e frequência. Nos pacientes com hiperparati-reoidismo leve a moderado não há diferença entre o uso oral intermitente ou diário na redução dos níveis de PTH.10,11 Nas formas graves, recomenda-se o uso
intermitente.
Não existe um consenso na literatura sobre o uso de calcitriol intermitente oral ou intravenoso. O K/ DOQI analisou quatro estudos clínicos controla-dos nos quais a administração intermitente intrave-nosa foi comparada com a oral e concluíram que a intravenosa foi mais efetiva na supressão dos níveis de PTH.48,52-54 No entanto, estes estudos apresentam
diferenças metodológicas que limitam os resultados. Dois destes compararam tratamento oral diário com tratamento intravenoso intermitente (3x/semana), portanto, não é possível concluir que o oral intermi-tente é inferior ao intravenoso.48,51 Além disso, os
ní-veis de PTH no início do estudo eram inferiores a 400 pg/mL, ou seja, formas mais leves de HPS.
Slatopolsky e cols. comparam formas oral e intra-venosa intermitentes e demonstraram que a intrave-nosa foi mais efetiva.55 Outros estudos não
observa-ram diferença entre as formas de administração.56-58
No hiperparatireoidismo leve a moderado tanto a via oral como intravenosa são efetivas. Nas formas mais graves a terapia intravenosa é mais eficaz.59,60
No entanto, faltam na literatura estudos clínicos que definam a melhor forma de administrar calcitriol.19
Nos pacientes em hemodiálise recomenda-se o uso intravenoso quando a dose for superior a 1 mg. Para pacientes em DP ou em tratamento conservador reco-menda-se o uso oral, preferencialmente à noite.
As doses iniciais de calcitriol devem ser ajustadas de acordo com os níveis de PTH e gravidade do HPS. O ajuste da dose deve ser realizado a cada quatro se-manas, no mínimo, nos três primeiros meses, quando a queda do PTH pode ser observada e há o risco de supressão acentuada. Estudos prospectivos mostram que pacientes com hiperparatireoidismo severo, isto é, com níveis de PTH superiores a 600 pg/mL, preci-sam de doses mais elevadas de calcitriol. Além disso, o tempo de tratamento é mais prolongado para ava-liar resposta – no mínimo de 12 a 24 semanas.61,62
Diversos fatores são associados à falta de res-posta ao uso de calcitriol: o volume das glândulas
paratireoides, a menor sensibilidade ao Ca, a menor densidade de receptores da 25-vit D ou o desenvol-vimento de hipercalcemia e/ou hiperfosfatemia.43,63-65
Estudos sugerem que os análogos da vitamina D controlam efetivamente os níveis de PTH com menor incidência de efeitos colaterais, como hiperfosfate-mia e hipercalcehiperfosfate-mia. Dentro dessa classe de drogas, o paricalcitol é o composto mais estudado. Sprague e cols.,66 em um estudo duplo-cego randomizado,
estu-daram a eficácia do calcitriol e paricalcitol em supri-mir a produção de PTH. Esses autores mostraram que ambas as drogas, são eficazes, porém os pacientes tra-tados com paricalcitol controlaram mais rapidamente os níveis de PTH. Esse estudo revelou também que a incidência de hipercalcemia foi semelhante nos dois grupos; porém, nos pacientes tratados com parical-citol, a hipercalcemia mantida foi menos frequente.
Quanto ao tratamento com calcimimético, o mes-mo se baseia na sua ligação com o receptor de Ca pre-sente nas células paratireoides de forma a mudar a sua conformação, possibilitando melhor interação do Ca com este receptor e proporcionando maior supressão da secreção e síntese de PTH. Moe e cols.67 em uma
análise secundária de três estudos randomizados e con-trolados que compararam a eficácia da terapêuticapa-drão (uso de quelantes de P associados a calcitriol ou análogos de vitamina D) contra um grupo de pacientes que utilizaram a terapêutica-padrão acrescida do cal-cimimético (cinacalcete), mostraram que o acréscimo do cinacalcete permitiu que maior proporção de pa-cientes atingissem níveis adequados de Ca, P e PTH. Entretanto, muitos pacientes abandonaram os estudos, diminuindo, assim, sua relevância.
Até o presente momento, a maioria dos estudos falhou na identificação de uma droga ideal, ou seja, que seus efeitos contribuam para melhores desfechos clínicos (mortalidade, hospitalização, fratura, qua-lidade de vida etc.). Isso ocorre, pois a maioria dos estudos apresenta limitações metodológicas (número insuficiente de pacientes, perdas elevadas de segui-mento, tempo de seguimento curto, análises secundá-rias pouco conclusivas ou insuficientes, estudos ob-servacionais etc.). Diante do exposto, não podemos apontar, de forma definitiva, qual o melhor esquema terapêutico para o tratamento do HPS. No entanto, considerando sua fisiopatologia, entendemos que a abordagem deva incluir várias drogas.
Para aqueles pacientes que não respondem aos es-quemas terapêuticos, ou seja, desenvolvem hiperpa-ratireoidismo refratário, resta a paratireoidectomia. Entretanto o nível exato de PTH que determina esta intratabilidade ainda não foi definido.68