MODELAGEM MATEMÁTICA E SUAS IMPLICAÇÕES NO ENSINO
Carmen Kaiber da Silva Universidade Luterana do Brasil
Um número significativo de educadores e pesquisadores têm tentado encontrar respostas satisfatórias para questões fundamentais relativas ao processo de ensino e aprendizagem da Matemática: o que ensinar, como ensinar, a quem ensinar, que tipo de aluno se quer formar?
Neste contexto, a busca por caminhos metodológicos que integrem a realidade com o “fazer matemático” das aulas, possibilitando uma estreita vinculação entre a estrutura lógico-formal da disciplina e sua utilização para compreender e descrever o mundo que nos cerca, permitindo ao aluno uma participação central e atuante no processo de ensino e aprendizagem, tem sido insistentemente perseguida por educadores comprometidos com a Educação Matemática.
É consenso que o ensino tradicional da Matemática, baseado em aulas expositivas e resolução de exercícios se constitui numa das causas mais significativas do baixo rendimento e aproveitamento na disciplina. Buscando a superação de problemas que surgem no processo de ensino e aprendizagem da Matemática, objetivando tornar o aluno participativo e as aprendizagens significativas, aponta-se o caminho metodológico Modelagem Matemática como possibilidade de atingir esta superação.
A Modelagem Matemática pode ser caracterizada como o processo mediante o qual se estuda problemas e situações reais utilizando a matemática como linguagem para sua compreensão, resolução, interpretação e significação. Apresenta-se, fundamentalmente, como uma forma de resolução de problemas da vida real, sendo que a busca de soluções exige a utilização de conhecimentos e um grande número de habilidades matemáticas. De imediato não se chega a uma resposta específica, mas a uma série de respostas que descrevem a conduta da situação considerada o que permite ao aluno participar e controlar o processo de solução, estruturando sua maneira de pensar e agir.
Enquanto caminho metodológico a Modelagem Matemática possibilita aprendizagens significativas, pois é uma metodologia dinamizadora do ensino por meio da qual os alunos constróem o seu conhecimento matemático em função de suas próprias
experiências. Assim os alunos desenvolvem uma atitude de investigação e passam a enxergar a Matemática ao seu redor, o que influi de maneira significativa nos resultados da aprendizagem escolar.
É consenso entre diferentes autores que têm se dedicado ao estudo da Modelagem Matemática que este processo envolve etapas, que são apresentadas de modo sucinto a seguir:
- identificação de um problema real, organização e estruturação das informações relativas a ele buscando identificar relações e os aspectos matemáticos envolvidos;
- interpretação matemática do problema utilizando tabelas de valores, representações geométricas, relações com situações já conhecidas e dominadas matematicamente, sendo que o modelo vai se estruturando por aproximações à situação real;
- utilização de teorias, métodos e ferramentas matemáticas para chegar a solução do problema, chegando-se, assim, ao modelo;
- interpretação, avaliação e validação da solução do problema utilizando o modelo obtido;
- retomada do estudo do modelo buscando sua aplicação a outras situações chegando a uma generalização.
Neste contexto foram propostos dois projetos utilizando a Modelagem Matemática como estratégia metodológica:
- “Quantidade de papel desperdiçada em sala de aula”, aplicado em duas turmas da 5ª série do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Marechal Rondon, Canoas, RS, totalizando 66 alunos na faixa etária de l0 a 14 anos e desenvolvido de forma integrada pelas professoras de Matemática e Ciências.
- “Energia elétrica - em busca de um consumo racional”, aplicado em dezenove alunos da primeira série do Ensino Médio da mesma escola.
Os temas que serviram de base para a modelagens foram escolhidos procurando alcançar os seguintes objetivos:
- analisar situações da realidade através de modelos matemáticos, assim como utilizá-los nas construções dos conceitos.
- utilizar a modelagem como meio de aprender e compreender idéias e conceitos matemáticos já introduzidos.
- propor um projeto que auxilie os estudantes a relacionarem-se com o meio ambiente, valorizando-o como parte integrante e sentindo-se responsável pela sua preservação.
A seguir os referidos projetos são detalhados:
PROJETO: QUANTIDADE DE PAPEL DESPERDIÇADA EM SALA DE AULA
OBJETIVOS
• Conscientizar os alunos da necessidade de não desperdiçar papel. • Retomar operações no conjunto dos números Naturais.
• Desenvolver conhecimentos relativos à sistemas de medidas e números decimais. • Desenvolver conhecimentos estatísticos: coleta, apresentação e análise de dados. • Utilizar corretamente a calculadora.
ETAPAS
• Palestra sobre o Meio Ambiente (Batalhão de Polícia Ambiental). • Pesquisa teórica sobre o lixo.
• Coleta de papéis no lixo de cada sala de aula, no término do turno da manhã durante uma semana.
• Desenvolvimento dos conteúdos a partir das relações estabelecidas com o material coletado e as pesquisas realizadas.
• Análise e apresentação dos resultados.
• Elaboração e construção de cartazes para divulgação do trabalho. CONCLUSÕES
• A quantidade média de papel desperdiçada em uma sala de aula, nesta escola, é de 31,575 folhas de papel por dia.
• A provável quantidade de papel desperdiçada por dia na escola é de 1515,36 folhas de papel.
• Durante o ano letivo, o desperdício é equivalente a 18 árvores.
• Há necessidade da realização um trabalho de conscientização da comunidade escolar, alertando-os sobre a necessidade de se evitar o desperdício.
• Os conteúdos de matemática desenvolvidos no projeto foram: operações no conjunto dos números Naturais, números decimais (necessidade, conceito, operações), sistemas de medidas, noções de estatística, regra de três simples, uso da calculadora e representação gráfica.
Fez parte do trabalho uma avaliação por parte do aluno em relação ao seu nível de satisfação e importância dada ao mesmo dos quais alguns aspectos são apresentados a seguir:
AVALIAÇÃO DO PROJETO PELOS ALUNOS
0 20 40
sim em parte não
Ajudou-me a clarear os assuntos desenvolvidos na matemática
0 20 40 60
sim em parte não
Aprendi que o desperdício de papel desperdiça a natureza
Alunos e professores que participaram do trabalho o consideraram bastante satisfatório. Os alunos mostraram-se interessados e participaram intensamente de todas as fases. O trabalho foi bastante rico pois foi possível desenvolver conteúdos e idéias além dos previstos inicialmente.
PROJETO: ENERGIA ELÉTRICA - EM BUSCA DE UM CONSUMO RACIONAL
OBJETIVOS
• Conscientizar os alunos da necessidade da conservação de energia elétrica • Modelar a função polinomial de 1º grau
• Desenvolver conhecimentos estatísticos: coleta, apresentação e análise de dados • Revisar e aprofundar conteúdos de trigonometria e regra de três simples
0 20 40 60
sim em parte não Entendi a importância de não
desperdiçar papel 0
20 40 60
sim em parte não
Gostei de desenvolver o projeto nas aulas de matemática
ETAPAS
• Ler e interpretar a conta de energia de uma residência.
• Pesquisar dados de várias contas de energia elétrica de uma família, para encontrar o preço da energia em função do consumo e escrever o modelo matemático que relaciona as duas grandezas.
• Fazer simulações do consumo de energia elétrica de uma família.
• Responder a pergunta: “É possível prever o consumo de energia elétrica em uma residência?”
• Relatar conclusões. CONCLUSÕES
• Os alunos demonstraram interesse no desenvolvimento do projeto, questionando e pesquisando sobre o assunto.
• As etapas do projeto não apresentaram problemas, os alunos estavam bem motivados. Dúvidas e questionamentos foram discutidos no grande grupo com mediação do professor. • Conteúdos desenvolvidos: função polinomial de 1º grau, trigonometria, noções de estatística.
No Ensino Fundamental constatou-se que, além dos conteúdos próprios da série, foram introduzidos e explorados novos assuntos como regra de três simples, noções de estatística, representação gráfica e uso da calculadora. No Ensino Médio ao modelar a função linear foi possível prever, estimar resultados e simular situações, que são comportamentos importantes para a construção do pensamento matemático. Além disso, foi possível a revisão de conteúdos como regra de três simples, representação gráfica, trigonometria, uso correto da calculadora e a introdução de noções de estatística. Os projetos permitiram abordar os conteúdos utilizando o tema transversal Meio Ambiente, proposto nos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Os projetos possibilitaram uma melhor compreensão da realidade do aluno e permitiram trabalhar com situações-problema dessa realidade. A metodologia utilizada
permitiu potencializar os conteúdos, no sentido que foram abordados mais assuntos que os previstos inicialmente. A modelagem apresentou-se como uma alternativa de valorização da matemática contextualizada, desenvolvendo no aluno a vontade de conhecê-la, explorá-la, redescobri-la e sentir gosto pelo aprender. Foi possível mostrar que a Matemática não é uma disciplina desvinculada da realidade sendo possível sua integração com outras áreas.
Palavras chaves: Ensino, Educação Matemática, Modelagem Matemática
Bibliografia:
ALBÉ, Maristela de Quadros. Atividade: Preço da energia elétrica em função do
consumo. Polígrafo "Função Polinomial do 1º Grau com enfoque em
Desenvolvimento Sustentável".
______________________. É possível prever o consumo de energia elétrica em uma
residência?". Polígrafo, 1999.
BIEMBENGUT, Maria Salett. Modelagem Matemática & Implicações no
Ensino-Aprendizagem de Matemática. Blumenau, SC: Editora da FURB, 1999.
DAVIS, P.J. e HERSH, R. A experiência Matemática. Tradução de João B. Pitombeira.Rio de JaneiroFrancisco Alves, 1986.
D'AMBRÓSIO, Ubiratan. Educação Matemática: da teoria à prática. Campinas, São Paulo: Papirus, 1996.
EDWARDS JR.,Charles Henry; PENNEY, David E. Equações Diferenciais Elementares
comPproblemas de Contorno. Rio de Janeiro: Prentice-Hall do Brasil, 1995.
FURIÓ MAS, C.J.; BARRENETXEA, J.; MARTÍN, J.V. Contribuicion de la resolucion de
problemas como investigación de paradigma constructivista de aprendizaje de las ciencias. In: Investigación en la Escuela nº 24. SEVILLA: Díada Editora, 1994.
TIMM, Ursula Tatiana; SILVA, Carmen Kaiber; GROENWALD, Claudia Lisete Oliveira.
