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JOGOS DE DIFERENTES CULTURAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

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Clovis Claudino Bento (SEE - NEFEF/UFSCar – SPQMH)

RESUMO

Entendemos que a educação física escolar, como componente curricular, deve contribuir para processos educativos, dialogando sobre as influências e contribuições de diferentes povos na cultura corporal. A pesquisa teve como objetivo central, observar os processos educativos envolvidos diante do levantamento, apresentação, ensino e aprendizagem acerca dos jogos de diferentes culturas. Propusemos aos educandos que levantassem junto a seus pais ou responsáveis a sua descendência e, conjuntamente, um ou mais jogos relacionados a esta. Como resultados, observamos a valorização dos jogos de diferentes culturas. Sendo que uns-com-os-outros, em processo de diálogo igualitário, foram ensinando, aprendendo e ao mesmo tempo construindo uma compreensão significativa acerca da Diversidade Cultural.

Palavras-chaves: Educação Física Escolar, Diversidade Cultural, Práticas Corporais.

Introdução

A educação física escolar comumente aborda e/ou desenvolve suas aulas a partir de conteúdos relacionados aos esportes, o que reduz ou até elimina o acesso dos educandos ao contato com outras práticas corporais, tais como jogos, aqui entendidos de modo amplo, portanto incluindo brincadeiras, danças, lutas, contação de histórias e demais manifestações com características lúdicas, provenientes de diferentes povos.

Entendemos que a educação física escolar, como componente curricular obrigatório da educação básica, deve contribuir para processos educativos significativos, no que tange a diversidade, dialogando sobre as influências e contribuições de diferentes povos na cultura corporal.

A este respeito Gonçalves Junior (2007, p.31), comenta:

“Por falar em cultura, observamos comumente nas aulas de Educação Física, a predominância do esporte como conteúdo por vezes exclusivo, o que acaba por reduzir o universo da Motricidade Humana, circunscrevendo-o, não raro, ao contexto cultural estadunidense e/ou europeu do futebol, voleibol, basquetebol e handebol, em detrimento das potencialidades que podem ser exploradas ao propor a vivência de outras manifestações da Motricidade Humana (jogos, brincadeiras, lutas, danças), oriundas da diversidade cultural de diferentes povos que construíram e constroem o Brasil, tais como os africanos, os indígenas e os orientais”.

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Neste sentido, os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs - (BRASIL, 1997) indicam a importância de se: “conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, bem como aspectos socioculturais de outros povos e nações, posicionando-se contra qualquer discriminação baseada em diferenças culturais, de classe social, de crença, de sexo, de etnia ou características individuais e sociais” (p.7).

Diante dessa situação e entendendo a educação física como um dos componentes curriculares que pode e deve contribuir para apresentação, diálogo e reflexão acerca dos jogos de diferentes culturas, resolvemos desenvolver intervenção em aulas regulares deste componente curricular e, nesta perspectiva, educar e nos educarmos, no (re)conhecimento das influências de diferentes povos.

A pesquisa teve como objetivo central observar os processos educativos envolvidos diante do levantamento, apresentação, ensino e aprendizagem acerca dos jogos de diferentes culturas.

A Educação Física escolar

Nas aulas de educação física, frequentemente, nós professores de educação física, propomos diferentes práticas corporais e, não aproveitamos para ouvir e dialogar junto aos escolares, seus familiares e comunidade sobre as práticas que possuem no bairro nas cidades, na raiz familiar e que, por vezes, estão se perdendo por falta de espaço por falta de espaço nas cidades e, ou até mesmo, vem sendo substituídas por jogos eletrônicos.

A este respeito comenta Gonçalves Junior (2004):

Os jogos, brincadeiras e brinquedos populares são partes da cultura, habitualmente transmitidos de geração para geração, por meio da oralidade. Muitos desses brinquedos e brincadeiras preservam sua estrutura inicial; outros se modificam, recebendo novos conteúdos. No entanto, observa-se, cada vez mais, que o contato das crianças com jogos, brinquedos e brincadeiras tradicionais vem perdendo espaço, possivelmente como conseqüência dos processos de urbanização e de produção / consumo de equipamentos de alta tecnologia (videogames, computadores, televisores e brinquedos de controle remoto) (p.133).

Essas tradições culturais, muita das vezes, são dialogadas em casa, ou podem ser estimulados através de proposições junto aos escolares e seus familiares, isto é, o que pode e deve ser aproveitado no ambiente escolar, favorecendo assim construção de um processo educativo significativo, ou seja, construído, executado e avaliado em um projeto educacional

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da escola, elaborado com a participação de todos envolvidos: pais, alunos, professores, zeladores, merendeiros, etc. (GONÇALVES JUNIOR; RAMOS; COUTO, 2003)

Porque não considerar esses saberes que os alunos trazem consigo e dialogarmos na escola, em acordo com Gonçalves Junior (2004, p.130 e 131) que considera a escola um lugar privilegiado para promover a educação de si mesmo, o cultivo do ser, a criação e recriação, com espontaneidade, alegria e prazer, ainda que, muitas vezes, esses elementos estejam embotados e sejam desvalorizados nas instituições escolares.

Numa perspectiva de buscar a compreensão do mundo em que vivemos, por que não aproveitamos esses saberes dos educandos têm a respeito das suas origens (antepassados), contribuindo significativamente para construção de um projeto educativo, visando o reconhecer e o valorizar não só das práticas corporais e suas manifestações culturais, mas dialogar sobre as influências dos diferentes povos.

Entende-se que para tal é indispensável, conforme nos alerta Freire (1998), o educador respeitar os saberes dos educandos, discutindo a relação desses saberes com o ensino de conteúdos, ou seja, aproveitando a experiência que eles têm, associando a realidade ao componente curricular cujo conteúdo se ensina e, ainda, estabelecer uma necessária “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos educandos e as experiências que eles têm como indivíduos.

Trata-se de respeitar o “saber de experiência feito” (FREIRE, 2005), o que significa respeitar os saberes do educando, pois chegando ao espaço escolar, o mesmo já traz uma compreensão do mundo, isto é, possui saberes em torno da saúde, da religião, do corpo, da sexualidade, do lazer, do trabalho, das manifestações culturais, da educação e da educação física, entre outros.

Entendemos, muitos desses jogos que realizamos não só no ambiente escolar, mas também fora da escola, foram trazidos e influenciados por outras culturas, isto é, os diferentes povos que aqui chegaram (africanos, europeus, orientais, etc.) e, inclusive, aqueles que já viviam aqui no Brasil, no caso os indígenas que influenciam e significam e re-significam, todos os dias, a nossa cultura corporal.

Entendendo, cultura corporal como:

A expressão cultura corporal, diz respeito à existência humana em sua relação/incrustação com o mundo, considerando a dimensão imaterial, ou seja, a motricidade (movimento intencional), lúdica, agonística, espetacular, estética ou, ainda, higiênica, já que faz parte do acervo de experiências humanas. Tais intenções manifestam-se, habitualmente, quando o ser humano se entrega ao jogo, á dança, às

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artes marciais, ao esporte, à ginástica e à expressão corporal em geral, elementos constitutivos da cultural corporal (GONÇALVES JUNIOR, 2003, p.6).

Sobre o Jogo

Observa-se algumas características e definições próprias do jogo, como espontâneo, livre, voluntária, divertido, possuidor de uma certa ordem e certas regras.

A este respeito, Huizinga (1971, p.16) cita:

Numa tentativa de resumir as características formais do jogo, poderíamos considerá-lo uma atividade livre, conscientemente tomada como “não-séria” e exterior à vida habitual, mas ao mesmo tempo capaz de absorver o jogador de maneira intensa e total. É uma atividade desligada de todo e qualquer interesse material, com a qual não se pode obter qualquer lucro, praticada dentro de limites espaciais e temporais próprios, segundo uma certa ordem e certas regras. Promove a formação de grupos sociais com tendência a rodearem-se de segredo e a sublinharem sua diferença em relação ao resto do mundo por meio de disfarces ou outros meios semelhantes.

Já Caillois (1990, p.26) afirma ser “[...] é indiscutível que o jogo deve ser definido como uma actividade livre e voluntária, fonte de alegria e divertimento. Um jogo em que fossemos forçados a participar deixaria imediatemente de ser jogo.”.

Csikszentmihalyi (1975) entende que existe um estado experimental presente em várias formas de jogo, chamado “fluxo”, sendo um tipo de sensação presente quando agimos com total envolvimento. Também, classifica como uma sensação da qual alguém nostalgicamente diz: “foi divertido” ou “foi agradável”. Ainda, diz que somente ocorre quando está ativamente engajada em alguma forma de interação claramente especificada com o meio. Sendo o tipo mais característico de “fluxo”. Os jogos são as formas mais comuns da atividade lúdica.

De acordo com Kishimoto (1999, p.38 e 39):

Muitas brincadeiras preservam sua estrutura inicial, outras modificam-se, recebendo novos conteúdos. A força de tais brincadeiras explica-se pelo poder da expressão oral. Enquanto manifestação livre e espontânea da cultura popular, a brincadeira tradicional tem a função de perpetuar a cultura infantil, desenvolver formas de convivência social e permitir o prazer de brincar.

Ao propor alguma forma de jogo ou brincadeira, nas aulas de educação física, percebe-se o envolvimento e participação dos educandos de uma forma livre e espontânea, muitos acabam comentando outros nomes, outras formas e/ou formato de jogar e/ou brincar.

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A Intervenção

Se pararmos para observar a escola que trabalhamos ou freqüentamos, ou ainda, uma sala de aula composto por 35 educandos, na qual representa uma parcela mínima da comunidade, verificaremos e encontraremos educandos de diferentes grupos étnicos, isto é, educandos das mais diversas descendências.

A partir deste contexto, por que não aproveitar essas relações que são construídas a partir da experiência e conhecimento que cada educando tem acerca das suas origens, isto é, das suas descendências e construir um projeto educativo significativo a respeito da diversidade cultural.

Pois, muitas das vezes, não damos importância para esse fenômeno, pois às relações que se constroem e são construídas no ambiente escolar acabam tornando-se irrelevante, o que poderia ser um bom começo para construção de um processo educativo a respeito da diversidade cultural, a partir das próprias histórias dos educandos, respeitando assim as suas falas no que concerne as suas origens e reconhecimento do outro como ser humano.

Pensando-se nisso, construir um projeto significativo que dialogue sobre os diferentes povos, mais especificamente, os índios e africanos que muito contribuíram para a nossa cultura (língua escrita e falada, alimentos, jogos, brincadeiras, danças entre outras manifestações).

A partir da tomada de conhecimento e reconhecimento sobre o histórico-social dos diferentes povos, educadores e educandos teriam mais respeito e, também, dariam mais valor ao reconhecer as diferentes manifestações culturais (comidas, religiões, jogos, entre outras), seria positiva não só para os descendentes (os indígenas, os afro-brasileiros e asiáticos), mas para os demais descendentes, pois a questão étnico-racial, como sabemos, é de toda a sociedade.

Na escola, principalmente, onde se deveria construir um projeto pedagógico da diversidade, e que se acaba reforçando o preconceito e discriminação contra o negro, pois geralmente não temos e não encontramos referências nos livros, nos jogos, na própria história do país que relata, geralmente, a situação do negro como escravo e o índio como preguiçoso, sem fazer qualquer referência a sua cultura.

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Ao não explicitar a questão racial existente em nossa sociedade, com seus conflitos, complexidade, positividades e problemas, a escola contribui também no processo de fragmentação da identidade ou das identidades negras. Reforça práticas racistas e autopreconceito e não fortalece um sentimento de responsabilidade e solidariedade entre os sujeitos pertencentes aos diferentes grupos étnicos e raciais.

Já as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (BRASIL, 2004,p.17):

É importante destacar que não se trata de mudar um foco etnocêntrico marcadamente de raiz européia por um africano, mas de ampliar o foco dos currículos escolares para diversidade cultural, racial, social e econômico brasileira. Nesta perspectiva, cabe as escolas incluir no contexto dos estudos e atividades, que proporciona diariamente, também as contribuições histórico-culturais dos povos indígenas e dos descendentes de asiáticos, além das de raiz africana e européia.

No ambiente escolar, principalmente, nos deparamos com atividades e temas que ora transmitem e reforçam os ideais europeus, quer seja sobre uma sociedade mais desenvolvida (primeiro mundo), padrão de beleza, alta tecnologia, etc. e, ainda, a questão religiosa (cristianismo).

Sobre a perspectiva multicultural, Gonçalves e Silva (2004, p.16) discorre que o:

[...] conhecimento transmitido privilegia arbitrariamente a cultura euro-ocidental (branca, masculina, cristã, capitalista, cientificista, predatória, racionalista, etc.), silenciando outras culturas, ou tratando-as como inferiores, o multiculturalismo é reivindicado como antídoto contra o eurocentrismo.

Não podemos esquecer do papel dos meios de comunicação, no que tange a questão étnico-racial, que acaba contribuindo e reforçando estereótipos e preconceitos, mais especificamente, no que diz respeito a construção de valores étnicos-raciais, pois as mensagens que são veiculadas apresentam-se de forma multifacetada, contribuindo para valores negativos.

Tendências e comportamentos vão sendo in(corpo)rados, a partir das proposições (imposições) da mídia, buscando imprimir a padronização e/ou, ainda, reforçando ou negando valores étnico-raciais.

Comenta Daolio (1994):

[...] por meio do seu corpo, vai assimilando e se apropriando de valores, normas e costumes, num processo de inCORPOração (a palavra é significativa). (...) Mais do

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que um aprendizado intelectual, o indivíduo adquire um conteúdo cultural, que se instala no seu corpo, no conjunto de suas expressões (p.39-40).

Cabe-nos desenvolvermos as bases para projetos que contemplem decisivamente o reconhecimento e valorizando a diversidade cultural, isto é, oportunizando o diálogo acerca dos diferentes grupos étnicos pouco citados no ambiente escolar, no caso dos africanos, dos indígenas e dos asiáticos.

Propusemos, assim, inicialmente aos educandos de uma turma de 3ª série do 1º ciclo do ensino fundamental de uma escola pública estadual, localizada em Santo André (área metropolitana de São Paulo), que levantassem junto a seus pais ou responsáveis a sua descendência e, conjuntamente, uma ou mais brincadeiras/jogos relacionados a esta.

A partir desse levantamento, o qual foi trazido por eles na forma de um trabalho escrito, juntos identificamos e promovemos um diálogo acerca da diversidade cultural e a contribuição de diferentes povos na construção da cultura corporal brasileira, particularmente na forma de jogos e brincadeiras.

Dos 35 educandos da 3ª série em estudo, após diálogo com seus pais, 15 afirmaram serem descendentes de italianos, 11 de portugueses, 5 de indígenas, 5 de espanhóis, 2 africanos, 1 de japoneses, 1 de romenos e 1 de poloneses. Salientamos que alguns alunos citaram mais de uma descendência e que alguns (descendentes de japoneses e poloneses) não relacionaram brincadeiras ou jogos.

Dentre os jogos e brincadeiras vinculados as suas respectivas descendências levantados pelos educandos junto a seus pais e responsáveis, trouxeram os seguintes relatos: 9 Italianos: bocha, pular corda, rodas cantadas e variantes de pega-pega;

9 Portugueses: amarelinha, pular corda, rodas cantadas, variantes de pega-pega, o rei manda e cobra-cega;

9 Indígenas: peteca, perna de pau, capoeira e rodas cantadas; 9 Espanhóis: tourada e cantigas;

9 Africanos: variantes de pega-pega, cabo de força, capoeira, cantigas e parlendas; 9 Romenos: bilboquê.

Com base neste levantamento conjunto, combinamos de, a cada aula, experimentarmos as brincadeiras e jogos pesquisados.

Neste sentido procuramos, conforme nos alerta Freire (1998), respeitar os saberes dos educandos, discutindo a relação desses saberes com o ensino de conteúdos, ou seja, aproveitando a experiência que eles têm, associando a realidade ao componente curricular

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cujo conteúdo se ensina e, ainda, estabelecer uma necessária “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência que eles têm como indivíduos.

Trata-se, segundo Freire (2005) de respeitar o “saber de experiência feito”, ou seja, os saberes do educando, pois chegando ao espaço escolar, o mesmo já traz uma compreensão do mundo, isto é, possui saberes em torno da saúde, da religião, do corpo, da sexualidade, do lazer, do trabalho, da educação, da educação física, entre outros.

A Coleta de Dados

Desde o início da intervenção pautamos o uso de registros sistematizados em diário de campo. Assim, realizamos 30 aulas sobre a temática jogos de diferentes culturas ao longo dois primeiros bimestres letivos. Em cada uma das aulas foram feitas notas de campo, sempre ao término dos compromissos na escola em que se desenvolveu o estudo.

Conforme propõe Bogdan e Biklen (1994):

Depois de voltar de cada observação (...) é típico que o pesquisador escreva (...) o que aconteceu. Ele ou ela dão uma descrição das pessoas, objectos, lugares, acontecimentos, actividades e conversas. Em adição e como parte dessas notas, o investigador registrará ideias, estratégias, reflexões e palpites, bem como os padrões que emergem. Isto são as notas de campo: o relato escrito daquilo que o investigador ouve, vê, experiencia e pensa no decurso da recolha e reflectindo sobre os dados de um estudo qualitativo. (p.150).

Análise dos Dados Coletados

No decorrer da intervenção fomos anotando em diários de campo os acontecimentos, observando, particularmente se ocorria à valorização dos jogos e brincadeiras de diferentes culturas pelas crianças educandas e os processos educativos envolvidos diante do levantamento, apresentação, aprendizado e diálogos destes.

Neste contexto, logo nas primeiras aulas foi necessário dialogarmos sobre do que se tratava Diversidade Cultural, o que provocou perguntas e comentários acerca das influências culturais que recebemos dos diferentes povos que aqui chegaram, como europeus, africanos e asiáticos, bem como sobre aqueles que já viviam aqui, os indígenas.

Ainda nestas aulas iniciais, ao perguntarmos para os alunos sobre as influências que tais povos exerceram em nós, os educandos falaram sobre as comidas típicas, a linguagem escrita e falada, as vestimentas, as festas, as danças, entre outras manifestações.

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Uns com os outros, em processo de diálogo igualitário, foram ensinando e aprendendo e ao mesmo tempo construindo uma compreensão significativa acerca da diversidade cultural.

Em um momento seguinte, como já descrevemos, solicitamos levantamento junto aos pais e responsáveis sobre a descendência de cada um e jogos e brincadeiras relacionadas a tal.

A partir de então, conforme os educandos iam trazendo os seus levantamentos, entusiasmados com o que haviam descoberto com seus pais ou responsáveis, tanto de sua descendência (algumas nem a sabiam), como de jogos e brincadeiras, fomos conversando sobre elas, observando como a brincadeira ou jogo descrito era praticado e efetivamente o realizávamos.

Antes de iniciarmos qualquer jogo ou brincadeira comentávamos quem havia pesquisado e qual a suposta origem, inclusive quando percebíamos incertezas (seria a capoeira indígena ou africana?) ou presença de jogos e brincadeiras similares em diferentes povos (rodas cantadas, variações de pega-pega, pular corda, cantigas). Cabia-nos contextualizar com base em nossos estudos e experiência, sem, no entanto, termos a pretensão de sermos a última palavra.

Processos educativos também ocorreram no ensino e aprendizagem de diferentes nomenclaturas, regras ou formas de brincar das atividades. O jogo da amarelinha, por exemplo, foi nomeado pelas crianças de sapata, avião, macaca e pula macaca. Também apresentaram diferentes formas de desenhar o diagrama da amarelinha (formato de avião, de escada, de caracol) e o modo de percorrê-lo (saltar com um pé, saltar com os dois pés, colocando as mãos, pegando objetos atirados).

Também explicitamos que, próximo ao final de cada bimestre, temos como parte do processo de avaliação, a realização de prova escrita com questões discursivas, nesta tivemos um bom desempenho dos educandos, principalmente citando e descrevendo a origem das brincadeiras e jogos trazidos pelos colegas de classe.

Considerações Finais

Podemos dizer, com base nos registros em diário de campo, que com a valorização nas aulas de Educação Física dos conhecimentos dos educandos provenientes de ambientes externos a escola, promovemos maior participação, envolvimento e generosidade destes para com os colegas no ambiente escolar, que com entusiasmo apresentaram aos colegas suas descobertas sobre sua origem e jogos/brincadeiras relacionados.

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Acreditamos, como Freire (2005), que o ato de educar envolve necessariamente o de

educar-se, sendo necessária a afetividade, a humildade, o gosto pelo ensinar e aprender, a

busca incansável pela competência e pela esperança engajada da transformação pessoal (somos seres incompletos e inconclusos), da educação e do mundo.

Podemos assegurar que além dos aprendizados realizados pelos educandos, nós mesmos aprendemos muito, e de modo significativo. Entendemos, no entanto, que nossa experiência e pesquisa foi uma aproximação inicial com o tema transversal Diversidade Cultural nas aulas de Educação Física, e que há necessidade de experiências de trabalhos e estudos mais prolongados, efetivos e aprofundados, nossa e de outros colegas educadores.

Parafraseando Gonçalves Junior (2003), a escola tem importante papel a cumprir na transmissão e na reflexão dos arcabouços da cultura corporal da humanidade, possibilitando tanto a preservação como a reflexão e a compreensão das transformações dessas manifestações.

Portanto, a Educação Física deve construir e desenvolver um processo educativo que além de refletir sobre as coisas e o mundo, fomente a autonomia do educando, para que o mesmo após anos na escola, possa discernir e compreender os valores atribuídos pela sociedade a respeito da cultura corporal da diversidade de povos que influenciaram e continuando influenciando a nossa cultural corporal.

Deixamos claro a não intenção de esgotar o diálogo, mas de alguma forma contribuir para processos educativos, nas aulas de educação física, principalmente no que concerne a diversidade cultural, mais especificamente, jogos e brincadeiras de diferentes culturas, favorecendo reflexões para um outro olhar nos conteúdos e processos educativos da Educação Física Escolar.

Referências

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BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.

Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação Física. Brasília: MEC / SEF, 1997.

BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das

Relações Ético-Raciais e para o Ensino de Historia e cultura Afro-Brasileira. Brasília:

MEC, 2004.

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DAOLIO, Jocimar. Da cultura do corpo. 3ª ed. Campinas: Papirus, 1994.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança: um reencontro com a Pedagogia do oprimido. 12ªed. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

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GOMES, Nilma Lino. Prática pedagógicas e questão racial: o Tratamento é igual para todos/as? In: DINIZ, Margareth; VASCONCELOS, Renata Nunes (Org.). Pluralidade

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educação especial, educação indígena, educação de jovens e adultos. Belo Horizonte: Formato Editorial, 2004.

GONÇALVES, Luiz Alberto Oliveira; SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves. O jogo das

diferenças: o multiculturalismo e seus contextos. 3ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 1998.

GONÇALVES JUNIOR, Luiz; RAMOS, Glauco Nunes Souto; COUTO, Yara Aparecida. A motricidade humana na escola: da abordagem comportamental à fenomenológica. Revista

Corpoconsciência - FEFISA, Santo André, nº12, p.23-37, 2003.

GONÇALVES JUNIOR, Luiz. Cultura corporal: alguns subsídios para sua compreensão na contemporaneidade. São Carlos: EDUFSCar, 2003.

GONÇALVES JUNIOR, Luiz. Atividades recreativas na escola: uma educação fundamental (de prazer). In: SCHWARTZ, Gisele Maria. (Org.). Educação física no ensino superior: atividades recreativas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004, p.130-136.

GONÇALVES JUNIOR, Luiz. A motricidade humana no ensino fundamental. In: I Seminário Internacional de Motricidade Humana: passado-presente-futuro, 2007, São Paulo. Anais... São Paulo: ALESP, 2007. v.1. p.29-35.

HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 1980.

Kishimoto, Tizuko M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 1999.

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