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O que vem depois da ocupação

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Publicado em Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (http://www.epsjv.fiocruz.br)

O que vem depois da ocupação

Maíra Mathias - EPSJV/Fiocruz | 29/06/2016 15h20 - Atualizado em 06/09/2016 10h11

Desocupação do prédio do Ministério da Saúde no Rio contou com cortejo que percorreu o prédio e saiu às ruas para denunciar ataque ao SUS Foto: Maíra Mathias

“Se Barros pensa que saúde é plano, saúde não é plano não. Saúde é para todo mundo e plano toma um dinheirão! O Temer quer tirar tudo da gente: saúde, cultura, habitação. O Barros quer cortar o SUS metendo privatização”. Foi com irreverência e alegria que trabalhadores e estudantes que ocupavam há 20 dias o Ministério da Saúde no Rio de Janeiro deixaram o prédio na manhã da última segunda-feira (27). A desocupação foi decidida no fim de semana em resposta ao mandado de reintegração de posse expedido pela Justiça Federal na sexta-feira (24). A avaliação geral, no entanto, é de que o movimento continua.

“A gente não está entendendo a saída do Ministério como um fim, mas como um começo. Continua o diálogo para criar novas alternativas e frentes de enfrentamento ao governo Temer e em defesa do SUS”, afirma Cleiber Silveira, estudante do mestrado de Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz). “Ainda tem muita luta pela frente. [A ocupação] foi só início em um período ainda muito longo e difícil”, concorda outra ocupante, trabalhadora de OSs, que não quis se identificar com medo de represálias em sua unidade de saúde.

Balanço positivo

As malas foram arrumadas em meio a palavras de ordem, batuques e paródias políticas de canções populares. Ataduras e gazes foram enroladas nas cabeças e braços como denúncia dos descasos dos governos com os usuários do Sistema Único de Saúde. O cortejo de desocupação percorreu quase todos os andares do prédio – com exceção do 5º, onde despacha o secretário estadual de saúde, que teve o acesso barrado pelos seguranças e, por opção dos

próprios ocupantes, do 2º, onde funciona a creche. O balanço, para todos os militantes ouvidos pelo Portal EPSJV, foi positivo.

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“Essa ação direta nos tirou do gueto. O movimento de saúde estava em baixa. Em que pese ter sido feito a poucas mãos a princípio, [a ocupação] foi reunindo uma importante rede de apoiadores”, acredita Leandro Oliveira, da Frente Povo sem Medo, que acredita que conectar militantes e os colocar em movimento é uma forma de acumular forças em uma conjuntura em que a saúde tem dificuldade de reunir muitas pessoas em grandes manifestações. “A ocupação por si só é um espaço de formação política ímpar. É uma vivência muito intensa em um lugar de alto tensionamento, com ameaças e assédios a todo momento. Daqui vão sair lutadoras e lutadores ‘cascudos’ que vão resistir contra as privatizações, contra o subfinanciamento da saúde, contra o desvio de verbas”, completa.

Restritos a um corredor, os ocupantes enfrentaram diversas formas de pressão por parte da administração do prédio. Nos finais de semana, acessos eram trancados. Em pleno inverno, o ar condicionado era deixado ligado no máximo. Para completar, levaram literalmente um banho frio quando, há poucos dias, verificaram que as resistências dos chuveiros foram retiradas. “Não foi fácil, foram 20 dias de ocupação tocada principalmente por trabalhadores que não estão em greve, continuaram exercendo todas as suas funções nos serviços, conciliaram a luta com a vida pessoal, se revezando para estar aqui”, relata a ocupante que preferiu não se identificar. “Trabalhamos de dia e de noite voltamos para manter a ocupação, então, de certa forma, tem uma hora que fica difícil. Cansaço, pressão... Mas nãofoi isso que nos intimidou”, completa a psicóloga Amanda Almeida.

O professor-pesquisador da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), Geandro Pinheiro avalia que a ocupação abriu outras possibilidades de pensar a luta em defesa do SUS. “Vamos agora para outra fase, onde o movimento continua com muitas perspectivas, como ocupar unidades de saúde de maneira nômade, articular outras lutas. De toda forma, o OcupaSUS trouxe uma agitação política ímpar. Há muito tempo a gente nãoconseguia uma visibilidade desse porte na cidade, até com repercussão nacional”, reforça.

Dentre outras ponderações, os militantes lembram alguns aspectos que expressam os limites e dificuldades do atual momento político e das esquerdas. “Talvez um olhar mais crítico nesse balanço que a gente tem que fazer é de que faltou perna para um movimento nacional. Havia essa intencionalidade, mas faltou condições de concretizar uma mobilização mais orgânica do OcupaSUS em mais estados do país”, lembra Cleiber Silveira. “Infelizmente [o

OcupaSUS] acabou sendo referência para um setor mais intelectualizado do trabalhador da saúde. Ainda sim deu um pouco de gás para a galera das residências multiprofissionais, da luta antimanicomial, do Fórum de Saúde, para militantes de sindicatos que estão tendo muita dificuldade de mobilizar suas bases, para servidores de hospitais federais, alguns servidores do estado”, elenca Leandro.

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Pedras no caminho da mobilização

A emissão do mandado judicial que permitia uma ação policial para retirar a ocupação do prédio não foi a única notícia ruim recebida pelos militantes. Também na semana passada, um agente comunitário de saúde foi vítima de perseguição por colocar na unidade em que trabalha um cartaz de divulgação do ato do OcupaSUS, que aconteceu na sexta-feira (24) e transformou a Rua México no palco de manifestações culturais e debate político. Duas pessoas gravaram um vídeo em que mostram o agente e criticam o ato e o cartaz. O material foi repassado para um

parlamentar que fez alarde em torno do caso, e chegou a ir à unidade de saúde gravar outro vídeo em que ‘exigia’ a demissão do trabalhador. O Portal EPSJV optou por não citar nomes ou links para não compactuar com a exposição do agente comunitário.

“O que aconteceu e está acontecendo é um acinte. O trabalhador de saúde terceirizado fica vulnerável e sofre esse tipo de assédio. A atenção primária sempre forjou lideranças na defesa de um SUS universal, gratuito, de qualidade, foi a vanguarda da Reforma Sanitária. Hoje, chegamos ao ponto de não se poder colocar um cartaz de um ato em defesa do SUS em uma unidade de saúde”, analisa Leandro.

O episódio, junto com o cansaço e a avaliação geral de “dever cumprido”, pesou na decisão de evitar que a ocupação fosse retirada do prédio por ação policial. “De fato, temos muitos trabalhadores de OSs na ocupação e pesa, sim, a preocupação do que pode acontecer, já que não temos nenhum respaldo de que não possa haver algum tipo de retaliação ou ataque pelo fato dessas pessoas estarem ocupando. A gente está fazendo um ato político, mas temos preocupação com as pessoas que estão aqui”, afirma Amanda Almeida, completando: “Mas o principal foi o

entendimento de que um movimento de ocupação tão rico que durou 20 dias não precisava ficar a mercê da chegada da polícia. A gente até poderia esperar, mas entendemos que a ocupação cumpriu sua função. Chegamos até onde podíamos e não precisaria chegar a esse esgarçamento das relações. Então resolvemos tomar as rédeas do movimento e não aguardar a polícia”.

“Existe sempre o medo da demissão e a gente está começando a amadurecer a ideia de algum tipo de entidade que possa representar os trabalhadores das OSs de maneira unificada. Um dos grandes problemas das Organizações Sociais hoje é que esse modelo de gestão fragmentou o município, o estado, enfim. Você tem várias organizações contratantes e isso tornou muito difícil a organização dos trabalhadores”, anuncia a ocupante que prefere se manter anônima justamente por ser contratada por uma OS.

Para o vereador Renato Cinco (PSOL), que transmitiu a desocupação ao vivo de seu celular, ao mesmo tempo em que a precarização das relações de trabalho tem como consequências a desarticulação e desmobilização das pessoas a resistência está crescendo mesmo assim: “A posse do Temer como interino abre espaço para uma radicalização ainda maior dessas políticas porque ele está empenhado em aplicar um programa para o país que não seria vencedor em nenhuma eleição. Isso dá margem para o governo atender aos interesses do capital com ainda mais virulência do que já vinha acontecendo. As ameaças de retrocessos em várias áreas se avolumam. Mas os movimentos de resistência estão crescendo junto e isso é muito importante. As ocupações são fundamentais nesse momento”.

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Próximos passos

Já está marcada para a próxima sexta-feira (01/07) uma assembleia no Palácio Gustavo Capanema, onde desde 16 de junho funciona o OcupaMinC [Ministério da Cultura]. O objetivo da reunião é definir uma agenda de lutas e fazer um balanço da ocupação. O movimento também divulgou uma nota [1] sobre a saída do prédio.

Os militantes pretendem continuar usando o nome #OcupaSUSRJ. Além de questões práticas – como o número de seguidores da página do movimento no Facebook –, entrou no cálculo a vontade de continuar uma articulação com os chamados autonomistas. “Tem um contingente grande que não é militante de partidos, sindicatos, frentes e criou referência neste movimento. É uma estratégia para agregar a juventude de estudantes e essa nova jovem classe trabalhadora que a cada dia tem que estudar mais para ter um vínculo de trabalho mais precário, que é quem deu a tônica da ocupação”, explica Leandro.

Segundo ele, independente do modelo e do nome, o importante é não deixar as forças acumuladas se perderem. “O importante é que essas ocupações, esses movimentos sociais de novo tipo contra o golpe, conta o governo ilegítimo, em defesa das políticas universais criem uma tática que dê continuidade para a luta. Como essa tática vai se dar em cada lugar em um país continental como o Brasil é a história e a conjuntura que vão dizer. O importante é a

continuidade. Manter a perspectiva de uma frente ampla e plural que debate a partir de uma pauta e continua a agenda de lutas. Isso acontecendo – e vai acontecer – é uma vitória do movimento social da saúde”.

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