• Nenhum resultado encontrado

A DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA E A ARBITRARIEDADE NA GESTÃO PÚBLICA. Nádia Regina Ramos Cardoso dos Santos 1

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA E A ARBITRARIEDADE NA GESTÃO PÚBLICA. Nádia Regina Ramos Cardoso dos Santos 1"

Copied!
18
0
0

Texto

(1)

A DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA E A

ARBITRARIEDADE NA GESTÃO PÚBLICA

Nádia Regina Ramos Cardoso dos Santos

1

RESUMO: Este artigo procura demonstrar a importância da

discricionariedade administrativa para o atendimento das necessidades coletivas pela Administração Pública e a diferença entre ela e a arbitrariedade, enfatizando o princípio da legalidade. Como trabalho final de Gestão Pública, é voltado para elucidações no âmbito da Administração, sem adentrar em divergências conceituais polêmicas.

PALAVRAS-CHAVE: DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA. AR-

BITRARIEDADE. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

Brasília – DF, setembro de 2008.

1

Bacharel em Ciências Econômicas pela Associação de Ensino Unificado do Distrito Federal, Analista Judiciária do Superior Tribunal de Justiça. Atua na área de controle interno do STJ desde 1992, onde exerceu várias funções técnicas e de direção. Atualmente é responsável pela unidade de auditoria de gestão da Casa.

(2)

Agradeço aos meus pais, pela minha vida, formação e incentivo aos estudos; ao meu marido e filhas, pelo apoio e paciência ao longo do curso e da elaboração deste trabalho; aos meus colegas de trabalho, pelas sugestões e revisões; aos mestres, pelos conhecimentos e experiência transmitidos; à minha irmã Nívea e à colega Rita de Cássia, pelo companheirismo nas aulas; e a Deus, acima de tudo.

(3)

1 INTRODUÇÃO

O tema discricionariedade sempre constituiu interesse não somente entre os estudiosos do Direito Público, mas também no âmbito da própria Administração Pública.

No dia-a-dia da atividade administrativa pública, não poucas vezes, atos arbitrários são praticados e nomeados equivocadamente de atos discricionários, o que demonstra certo desconhecimento sobre o assunto ou, em alguns casos, um certo oportunismo, como forma de solucionar problemas muitas vezes decorrentes de má gestão administrativa.

De fato, a discricionariedade já foi sinônimo de arbítrio, mas essa idéia remonta ao absolutismo, onde prevalecia a vontade do rei. Esse período era o período do Estado de Polícia (Di Pietro, 2001, p. 17 a 20).

O conceito evoluiu a partir dos ideais da Revolução Francesa, com o princípio da legalidade sendo consagrado na Constituição Francesa de 1791. A lei não mais provinha da vontade do rei, mas sim dos anseios do povo. Era o período do Estado Liberal de Direito (Di Pietro, 2001, p. 20 a 28).

Prosseguindo na sua descrição, Di Pietro (2001, p. 28 a 40) trata do Estado Social de Direito onde, sintetizando, a Administração só poderia fazer o que estivesse determinado na lei.

Com o Estado Democrático de Direito (Di Pietro, 2001, p. 40 a 52), consagrado pela Constituição Federal de 1988, nota-se a preocupação com os valores sociais expressos na Carta Magna. Além da lei formal, a discricionariedade agora está submetida aos princípios consagrados pela Constituição e é passível de revisão pelo Poder Judiciário, muito longe, portanto, da acepção inicial que a aproximava da arbitrariedade.

Julgou-se oportuno, portanto, um estudo específico sobre o tema, no sentido de demonstrar o verdadeiro significado da discricionariedade administrativa e sua importância, para viabilizar o atendimento às necessidades coletivas pela Administração Pública.

Embora seja um tema instigante, a motivação deste artigo, uma vez que constitui trabalho final da especialização em Gestão Pública e não de matéria de Direito, é de ordem prática, voltado para elucidações no âmbito da Administração

(4)

Pública. Não visa, desta forma, adentrar divergências conceituais polêmicas, mas sim demonstrar, por meio de pesquisa em obras de doutrinadores renomados e da jurisprudência do Tribunal de Contas da União, que a discricionariedade administrativa pode e deve ser utilizada pela Administração Pública, sem a necessidade de se praticar atos arbitrários.

Embora em alguns momentos a política pública se mostre controversa quanto ao grau de liberdade conferido à Administração, a discricionariedade nem por isso deixa de ser uma ferramenta importantíssima conferida ao administrador público para o desempenho de suas funções, mas sempre com limitações das quais ele não pode prescindir, sob pena de vir a praticar um ato arbitrário.

(5)

2 CONCEITO DE DISCRICIONARIEDADE

Na trilha do pensamento dos doutrinadores, alguns conceitos mostram-se bastante esclarecedores.

Na visão de Hely Lopes Meirelles (1995, p.102), “poder discricionário é o que o Direito concede à Administração, de modo explícito ou implícito, para a prática de atos administrativos com liberdade na escolha de sua conveniência, oportunidade e conteúdo. “

Já Celso Antônio Bandeira de Mello (2004, p. 396, apud Marçal 2006, p. 160), não entende a discricionariedade como um poder atribuído em abstrato, mas um modo de disciplinar juridicamente a atividade administrativa. Vejamos:

A margem de liberdade conferida pela lei ao administrador a fim de que este cumpra o dever de integrar com sua vontade ou juízo a norma jurídica, diante do caso concreto, segundo critérios subjetivos próprios, a fim de dar satisfação aos objetivos consagrados no sistema legal.

Maria Sylvia Zanella di Pietro (2001, p. 67), por sua vez, entende que é uma “faculdade que a lei confere à Administração para apreciar o caso concreto, segundo critérios de oportunidade e conveniência, e escolher uma dentre duas ou mais soluções, todas válidas perante o direito.”

Na visão de Marçal (2006, p. 160), a discricionariedade é um instrumento jurídico das realizações da Administração. É um poder-dever que não pode ser identificado como uma liberdade nem como uma faculdade a ser exercida segundo juízo de conveniência pessoal: “[...] é o modo de disciplina normativa da atividade administrativa que se caracteriza pela atribuição do dever-poder de decidir segundo a avaliação da melhor solução para o caso concreto.”

Como mencionado anteriormente, o objetivo não é adentrar em polêmicas doutrinárias, mas sim chegar ao verdadeiro significado da discricionariedade. De irrefutável até aqui, tem-se que a discricionariedade deve obedecer os limites da lei.

(6)

3 A DISCRICIONARIEDADE E A EVOLUÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

A discricionariedade, entretanto, nem sempre esteve adstrita à lei.

Segundo ensina Di Pietro (2001, p. 18 a 57), ao comentar a evolução do princípio da legalidade, a discricionariedade, em sentido amplo, como sinônimo de arbítrio, remonta ao absolutismo, onde a vontade do soberano prevalecia sem quaisquer limites. Era o período do Estado de Polícia, época em que o direito público ficou na penumbra. Prevalecia a vontade do rei, considerada lei, tendo como único preceito jurídico o direito ilimitado de administrar.

Na seqüência, com a evolução da sociedade e os então novos ideais da Revolução Francesa, a discricionariedade ficou limitada a certos tipos de atos. No período do Estado de Direito, a doutrinadora explica que cabia ao Direito tão-somente garantir os direitos individuais, sem intervir na ordem social ou econômica. A lei não mais provinha da vontade do rei, mas sim da lei, proveniente da vontade geral. Estava consagrado o princípio da legalidade. Entretanto, a Administração ainda era livre do controle judicial e tudo o que a lei não proibia era permitido.

Já em um terceiro momento dessa evolução, chega-se ao Estado Social de Direito, onde o foco se desloca das liberdades individuais para a igualdade, que cabia ao Estado buscar, mesmo que para isso fosse preciso intervir na ordem social e econômica. Surge, então, a discricionariedade como poder jurídico, sob comando da lei. Nesse momento, o princípio da legalidade ganhou outro significado, a Administração só poderia fazer o que estava determinado na lei.

Chegou-se, antão, ao Estado Democrático de Direito, consagrado pela Constituição Federal de 1988, que traz, desde o seu preâmbulo, a preocupação com valores que devem ser observados no desempenho da função estatal e da função administrativa. A discricionariedade agora, continua a doutrinadora, não está submetida apenas à lei formal, mas também aos princípios que consagram valores expressos ou implícitos na Constituição. Esses princípios atuam como limites da discricionariedade administrativa e, quando ultrapassados, são passíveis de revisão pelo Poder Judiciário.

(7)

Cabe aqui um parênteses sobre uma crítica que a autora faz na obra citada no início deste tópico: em contraponto com os objetivos da Reforma Administrativa e a Administração Pública Gerencial, há a manutenção, pelo Estado, de leis excessivamente formais, que restringem a discricionariedade administrativa. Como exemplo, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 8.666/93) e a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF (Lei Complementar nº 101/2000). É a legalidade ante as novas demandas por maior agilidade e liberdade da máquina administrativa.

Não obstante tais considerações, o poder discricionário, tal como temos hoje, permanece como poder jurídico, exercido nos limites legais e também pelos princípios consagrados na nossa Constituição.

(8)

4 PODER VINCULADO E PODER DISCRICIONÁRIO

Segundo Hely Lopes Meirelles (1995, p. 100 a 105), a Administração é dotada de poderes administrativos, também chamados poderes instrumentais, uma vez que são autênticos instrumentos de trabalho, indispensáveis para o desempenho das tarefas administrativas, que lhe permite atender aos interesses coletivos. Eles nascem com a Administração e variam de acordo com as exigências do serviço público, com o interesse da coletividade e com os objetivos a que se dirigem. Dentre outras várias classificações, consoante a liberdade da Administração para a prática de seus atos, temos os poderes vinculado e discricionário.

No primeiro, o poder vinculado ou regrado, que é conferido pelo Direito Positivo, o agente público tem sua liberdade de ação limitada à letra da lei, ficando a prática do ato submissa às minúcias legais, sem margem para omissões ou diversificações.

No caso do Poder discricionário, a Administração tem liberdade de escolha para a prática do ato, quanto a sua conveniência, oportunidade e conteúdo. Não se pode falar em poder discricionário quando houver elementos objetivos que permitam chegar a uma única solução válida. Esta situação configura-se como interpretação da norma e não como discricionariedade.

(9)

5 ATO ADMINISTRATIVO, ATO VINCULADO E ATO DISCRICIONÁRIO

São várias as conceituações de ato administrativo utilizadas pelos doutrinadores. Vale citar algumas, sem descer a sua origem, com o objetivo único de nortear o entendimento de ato discricionário.

Hely Lopes Meirelles parte do conceito de ato jurídico, que é todo aquele que “tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos. (cc, art. 81)” (HELY, 1995, p.132) e acrescenta a finalidade pública. Vejamos o conceito:

Ato administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria. (HELY, 1995, p.133)

Di Pietro (2000, p. 180 a 181) considera alguns elementos para a formulação desse conceito. Primeiro, entende que o ato administrativo constitui declaração do Estado, e não manifestação, como no entendimento do doutrinador anteriormente citado. Ela considera que a declaração é necessariamente a exteriorização do pensamento, enquanto que a manifestação pode ou não ser exteriorizada. Considera, ainda, como elementos para formulação do conceito de ato administrativo, a sujeição ao regime jurídico administrativo, a produção de efeitos jurídicos imediatos e o fato de serem passíveis de controle judicial: temos então o ato administrativo como “[...] a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário.” (DI PIETRO, 2000, p. 181)

O ato administrativo é uma espécie de ato jurídico dotado de características próprias.

Assim, para que se configure um ato administrativo, deverá necessariamente haver a exteriorização da vontade da Administração (a ausência dessa exteriorização não é considerada um ato administrativo) e ela deverá estar agindo nessa qualidade (no exercício das funções administrativas). Deverá estar sujeito ao regime jurídico administrativo (sob o normativo próprio da Administração

(10)

Pública) e estar sujeito ao controle judicial, caso questionado pelo interessado (não se confunde com a autotutela administrativa). Não se pode esquecer também a produção de efeitos jurídicos imediatos (que o distingue da lei e dos regulamentos e dos atos não produtores de efeitos jurídicos diretos) e o fim imediato “um resultado concreto e objetivo que é a providência relativa a um direito ou dever da própria Administração ou do particular.” (CAMPOS, 2006, p. 164 e165).

A exemplo das classificações utilizadas para o poder discricionário, o ato administrativo é objeto de diversas classificações pela doutrina, conforme o critério em função do qual é agrupado. Uma delas, segundo o critério do grau de liberdade da Administração em sua prática, classifica os atos administrativos em atos vinculados e atos discricionários.

Atos vinculados são aqueles praticados sob a determinação de uma disposição legal que predetermina objetiva e complementa o comportamento a ser adotado em situação descrita. A ação do administrador está adstrita aos pressupostos estabelecidos pela norma legal, ele não dispõe de liberdade alguma e sua vontade é irrelevante, ou seja, estará diante de, apenas, uma possibilidade isolada para agir. A inobservância de qualquer requisito legal prejudica a eficácia do ato, o que o torna passível de anulação.

Já os atos discricionários são aqueles em que o administrador, em razão da maneira como a matéria foi regulada pela lei, deve levar em consideração as circunstâncias do caso concreto, sendo inevitável uma apreciação subjetiva para cumprimento da finalidade legal. Há, portanto, certa esfera de liberdade que deverá ser preenchida de acordo com o juízo pessoal e subjetivo do agente a fim de satisfazer a finalidade da lei no caso concreto.

Vale destacar o seguinte trecho do relatório proferido no julgamento do Acórdão 984/2004 – Plenário, do Tribunal de Contas da União, da lavra do Min. Adylson Motta:

Relatório do Ministro Relator

[...]

51. No caso de autorização informal para serviços não previstos contratualmente, trata-se de afronta a espécie de ato vinculado onde não há faculdade de opção do administrador, mas unicamente possibilidade de verificação dos pressupostos de direito e de fato, diversamente do que ocorre no próprio direito administrativo quando se trata de ato discricionário, em que, além dos elementos sempre vinculados (competência, finalidade e forma), há outros em que a administração decide livremente quanto ao motivo e ao objeto. [...]

(11)

Para complementar, vale o comentário de Hely Lopes Meyrelles (1995, p. 104 a 105), de que o ato discricionário não está imune à apreciação judicial. Somente a Justiça poderá dizer da legalidade e dos limites de opção do administrador público. O Judiciário não pode substituir o discricionarismo do administrador pelo do juiz, mas pode coibir abusos e anular o ato discricionário.

(12)

6 A DISCRICIONARIEDADE E OS PRINCÍPIOS LEGAIS

A discricionariedade administrativa está sujeita à lei e tem os princípios legais como seus limitadores.

A atividade discricionária deve ser compreendida pelo administrador público como uma liberdade vinculada à lei, com certa margem livre de apreciação de conveniência e oportunidade de soluções legalmente possíveis.

Vale à pena adotar os ensinamento de DI PIETRO (2001, p. 171 a 173) ao analisar a discricionariedade ante os princípios legais. No seu entendimento, a discricionariedade descrita como liberdade de ação limitada pela lei, deveria, sim, ser tratada como liberdade de ação limitada pelo Direito, uma vez que o princípio da legalidade deve ser entendido além do positivismo jurídico, mas abrangendo, também, os princípios gerais do direito, como já mencionado no tópico que trata da evolução do princípio da legalidade.

A Constituição de 1988, no Capítulo VI – Da Administração Pública, artigo 37, determina a observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, sujeitando, portanto, os atos administrativos a esses princípios.

Ante o caso concreto e os princípios legais, a margem discricionária da Administração Pública diminui sensivelmente. Na verdade, são os atos discricionários administrativos uma área de atuação perigosa para violação dos princípios legais, para o administrador público menos informado.

No caso da moralidade, por exemplo, o princípio foi reforçado pela Lei 9.784, de 29/1/1999, que trata do processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal (art. 2º).

Da mesma forma que a Administração Pública observa os preceitos legais, entre as várias soluções legalmente possíveis, a escolha deve recair levando em conta a moral, ou seja, aquele tipo de comportamento que a sociedade tem como ético.

(13)

Sob certo aspecto, pode-se até afirmar que a lei de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/92) inseriu a Moral no âmbito do Direito, ao considerar como atos de improbidade os que atentem contra os princípios da Administração (art. 11). Com isso, a lesão à moralidade administrativa constitui ato de improbidade sancionado pela lei. (2001, p. 165)

Há também a razoabilidade, intimamente ligada à proporcionalidade e à motivação. Proporcionalidade entre os “meios de que se utiliza a Administração e os fins que ela tem que alcançar. E essa proporcionalidade deve ser medida não pelos critérios pessoais do administrador, mas segundo padrões comuns na sociedade em que vive; [...]”(DI PIETRO, 2001, p. 201). A motivação é um instrumento de controle da razoabilidade, ou seja, por meio da declinação dos motivos, pode-se verificar a existência da razoabilidade na prática do ato.

O princípio do interesse público, inerente à atuação administrativa e o da impessoalidade, no que concerne à finalidade dos atos administrativos, também são limitadores da discricionariedade. Destaca-se o seguinte trecho do relatório proferido no julgamento do Acórdão 200/2005 – Plenário, do Tribunal de Contas da União, da lavra do Min. Marcos Vilaça:

Relatório do Ministro Relator

[...]

5. A esse respeito, vale lembrar que não se pode confundir discricionariedade com arbitrariedade. Na lição de Hely Lopes Meirelles, ‘a lei administrativa é sempre finalística: almeja um objetivo a ser atingido pela Administração, através de ato ou atos jurídicos que constituem meio para a consecução de tais fins. A atividade do administrador público ? vinculada ou discricionária ? há de estar sempre dirigida para o fim legal, que em última análise, colima o bem comum’ (in Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 18ª ed., p. 152). O que se discute aqui não é a conveniência e oportunidade do ato de veicular a propaganda, mas o fato de se ter visado a um fim que não era de interesse da empresa.

(14)

7 HIPÓTESES DE EXISTÊNCIA DA DISCRICIONARIEDADE E LIMITAÇÃO

A discricionariedade não existe por acaso. Ela é necessária e intencional. Não resulta da ausência de lei, mas do grau de liberdade que esta concede.

No caso da Administração Pública, no que concerne à finalidade para a qual ela foi criada, ou seja, a de atender aos interesses públicos, impossível seria desenvolver as suas atividades com a presteza e eficácia requeridas sem essa ferramenta.

Para Maria Sylvia Zanella di Pietro, a discricionariedade decorre de previsão legislativa, de omissão legislativa em razão da impossibilidade de previsão de todas as situações supervenientes à promulgação ou, ainda, de quando a lei prevê a competência, mas não regula a conduta a ser adotada.

Para a autora, o poder discricionário se justifica em três fundamentos não excludentes, quais sejam, o deliberado intento de conferir à Administração certa margem de liberdade em razão dos acontecimentos singulares; a impossibilidade material de prever todas as situações possíveis; e a inviabilidade jurídica de supressão da discricionariedade em vista da separação dos poderes.

A discricionariedade se manifesta no teor do ato ou, na omissão da Administração, possível nos casos em que a lei faculta agir ou não.

Em qualquer dos casos, o exercício da discricionariedade é sempre limitado pela lei e a liberdade conferida não pode extrapolar os limites por ela impostos, sob pena de se praticar um ato arbitrário.

Destacam-se alguns trechos de relatórios a corroborar com esse pensamento, proferidos no julgamento de acórdãos do Tribunal de Contas da União, da lavra dos Ministros Aroldo Cedraz e Augusto Sherman, respectivamente:

Voto do Ministro Relator

[...]

9. Na mesma linha, assinalo que discricionariedade não pode ser confundida com arbitrariedade. Discricionariedade refere-se à liberdade conferida ao administrador para decidir livremente entre caminhos igualmente legais, legítimos e que tenham por fim o atingimento do interesse público. Nas palavras de Marçal Justen Filho, ‘É evidente que discricionariedade não se confunde com arbitrariedade. A discricionariedade consiste numa autonomia de escolha exercitada soba a égide da Lei e nos limites do Direito. Isso significa que a discricionariedade não pode traduzir

(15)

um exercício prepotente de competências. Não autoriza a faculdade de escolher ao bel-prazer, por liberalidade ou para satisfação de interesses secundários ou reprováveis’ (in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, p. 284,. Dialética, 9ª ed.) (Acórdão 459/2007 – Plenário)

Relatório do Ministro Relator

[...]

21. Conforme preleciona o Ilustre Mestre Celso Antônio Bandeira de Mello, in Curso de Direito Administrativo, Malheiros Editora, 13ª Edição, pág. 385, "discricionariedade é liberdade dentro da lei, nos limites da norma legal" . "Não se confundem discricionariedade e arbitrariedade. Ao agir arbitrariamente o agente estará agredindo a ordem jurídica, pois terá se comportado fora do que lhe permite a lei . (grifos nossos)” (Acórdão 1035/2008 – Plenário)

Registrada, portanto, a jurisprudência do órgão que, em auxílio ao Congresso Nacional, detém a competência, dentre outras, de “julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos [...]”. (Constituição Federal de 1988, art. 71, inciso II).

(16)

8 CONCLUSÃO

Assim, verifica-se que a discricionariedade é uma prerrogativa conferida pelo Direito ao agente público, para dispor de certa liberdade no exercício da sua competência, seja para produzir o ato ou não, seja para escolher o seu conteúdo, decidir o momento oportuno da sua prática ou selecionar sua forma.

A discricionariedade não deve ser interpretada como ausência de lei, falha do legislador ou como uma faculdade abstrata. É conferida ao administrador público para que, ante o caso concreto, faça uso da lei e dos princípios que a norteiam para tomar a decisão mais adequada.

Porém, deve ser exercida nos limites que a norma jurídica confere, sempre buscando o interesse coletivo, norteador de todos os atos do gestor público e a razão de existir da Administração.

Não pode, portanto, transfigurar-se em mecanismo escuso ou caminho mais curto para solucionar impasses no dia-a-dia da Administração Pública. O Administrador Público deve caminhar com firmeza, porém, com muito cuidado nesse particular. Não pode prescindir do grau de liberdade concedido pelo instrumento legal, sob pena de engessar a Administração ou de praticar a omissão irresponsável ou não autorizada. Na verdade, ele precisa estar bem informado e conhecer os limites entre a discricionariedade administrativa e um ato arbitrário, para que possa fazer uso, com propriedade, de ferramenta tão importante para uma boa gestão. Ademais, sobretudo ante a responsabilidade que tem para com a coletividade, nunca poderá perder de vista a finalidade legal, o alcance social, ético e moral dos seus atos.

(17)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL, Constituição da República Federativa, de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.

Acesso em agosto/2008.

BRASIL, Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal). Estabelece Normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em agosto/2008.

BRASIL, Lei nº 8.666, de 21/6/1993 (Lei de Licitações e Contratos

Administrativos). Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal,

institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em agosto/2008.

BRASIL, Lei nº 9.784, de 29/1/1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em agosto/2008.

CAMPOS, GABRIEL DE BRITO, Curso de Direito Administrativo. Brasília: Fortium, 2006.

DI PIETRO, MARIA SYLVIA ZANELLA. Direito Administrativo. 12. edição. São Paulo: Atlas, 2000.

DI PIETRO, MARIA SYLVIA ZANELLA, Discricionariedade Administrativa na

Constituição de 1988. 2. edição. São Paulo: Atlas, 2001.

JUSTEN FILHO, MARÇAL, Curso de Direito Administrativo. 2. edição. São Paulo: Saraiva, 2006.

MEIRELLES, HELY LOPES, Direito Administrativo Brasileiro. 20. edição. São Paulo: Atlas, 1995.

(18)

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, Acórdão nº 200/2005– Plenário. Ata nº 07/2005 – Plenário. Sessão de 09/03/2005. Aprovação em 14/03/2005. DOU de 17/03/2005.

Disponível em: <http://contas.tcu.gov.br/portaltextual/PesquisaLivre> Acesso em 9/9/2008.

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, Acórdão nº 459/2007 – Plenário. Ata nº 12/2007 – Plenário. Sessão de 28/03/2007. Aprovação em 29/03/2007. DOU de 30/03/2007.

Disponível em: <http://contas.tcu.gov.br/portaltextual/PesquisaLivre> Acesso em 9/9/2008.

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, Acórdão nº 984/2004 – Plenário. Ata nº 26/2004 – Plenário. Sessão de 21/07/2004. Aprovação em 28/07/2004. DOU de 02/08/2004.

Disponível em: <http://contas.tcu.gov.br/portaltextual/PesquisaLivre> Acesso em 10/9/2008.

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, Acórdão nº 1035/2008 – Plenário. Ata nº 21/2008 – Plenário. Sessão de 04/06/2008. Aprovação em 05/06/2008. DOU de 06/06/2008.

Disponível em: <http://contas.tcu.gov.br/portaltextual/PesquisaLivre> Acesso em 9/9/2008.

Referências

Documentos relacionados

Entre os bairros avaliados o Santa Rita apresentou as condições mais precárias de saneamento básico no ano de 2007 em função da ausência de fornecimento de

Esta pesquisa discorre de uma situação pontual recorrente de um processo produtivo, onde se verifica as técnicas padronizadas e estudo dos indicadores em uma observação sistêmica

79 - 1862-2016 [DPEE] - DIVISÃO DE PROJECTOS, EDIFÍCIOS E EQUIPAMENTOS; NOMEAÇÃO DE COMISSÃO DE VISTORIA PARA EFEITOS DE LIBERAÇÃO PARCIAL DE CAUÇÕES DA EMPREITADA

Evidentemente, a língua portuguesa representa o Brasil. A valorização da mesma significa, por transferência de significado, uma valorização da nação brasileira. A comparação do

A equipe desistente receberá 00 (zero) ponto na classificação. 3) Maior saldo de pontos. 4) Maior número de pontos conquistados (cestas pró). h) Caso o empate se estabeleça entre

Humanização da atenção e da gestão no SUS. Princípios da Bioética. Ética Profissional e na pesquisa. Exercício profissional. O papel  do  enfermeiro 

Considerando a complexidade, tempo e custos possíveis para levantar to- das essas informações, neste ponto do problema está a principal parte deste traba- lho: a engenharia reversa

SOFTWARES EDUCACIONAIS EM REDE 20 h TECNOLOGIAS EDUCACIONAIS EM REDES COLABORATIVAS 20 h CULTURA DIGITAL E REDES SOCIAIS 25 h SISTEMAS VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM 30 h