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A deficiência da atuação na gestão pública do recadastramento dos aposentados e pensionistas brasileiros

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Academic year: 2021

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Universidade de Trás-Os-Montes e Alto Douro

A DEFICIÊNCIA DA ATUAÇÃO NA GESTÃO PÚBLICA DO RECADASTRAMENTO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS BRASILEIROS

Dissertação de Mestrado em Gestão Versão definitiva

Arcênio Pereira Santos Filho

Orientador: Professor Doutor Francisco José Lopes de Souza Diniz Coorientador: Professor Doutor Adilson Florentino da Silva

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Universidade de Trás-Os-Montes e Alto Douro

A DEFICIÊNCIA DA ATUAÇÃO NA GESTÃO PÚBLICA DO RECADASTRAMENTO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS BRASILEIROS

Dissertação de Mestrado em Gestão Versão definitiva

Arcênio Pereira Santos Filho

Orientador: Professor Doutor Francisco José Lopes de Souza Diniz Coorientador: Professor Doutor Adilson Florentino da Silva

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i Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

A DEFICIÊNCIA DA ATUAÇÃO NA GESTÃO PÚBLICA DO RECADASTRAMENTO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS BRASILEIROS

Dissertação de Mestrado em Gestão Versão definitiva

Arcênio Pereira Santos Filho

Orientador: Professor Doutor Francisco José Lopes de Souza Diniz Coorientador: Professor Doutor Adilson Florentino da Silva

Composição do Júri:

_______________________________________________________ _______________________________________________________ _______________________________________________________

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ii Dissertação submetida para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Gestão na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, pelo candidato Arcênio Pereira Santos Filho, sob a orientação do Professor Doutor Francisco José Lopes de Sousa Diniz.

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iii

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, pela graça de poder agradecer.

Às pessoas que se fizeram ausentes materialmente, mas que, espiritualmente, tanto me inspiram e me impulsionam na realização deste trabalho, em todos os instantes.

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A DEFICIÊNCIA DA ATUAÇÃO NA GESTÃO PÚBLICA DO RECADASTRAMENTO DOS APOSENTADOSE PENSIONISTAS BRASILEIROS - RESUMO

Esta dissertação aborda a deficiente atuação da Gestão Pública Brasileira bem como o recadastramento dos aposentados e pensionistas, tanto do Regimento Geral de Previdência Social, quanto dos Regimes Próprios destinados à Previdência dos Servidores Públicos no Brasil. O objeto de análise está configurado na relação entre o poder público, enquanto sujeito ativo do recadastramento, e a Administração Pública. Um dos resultados da pesquisa realizada comprovou a existência de dois sistemas que concorrem para o mesmo fim, criando uma situação problemática já que o funcionamento de um interfere e obstaculiza o funcionamento do outro. Um dos sistemas, incongruente face ao ordenamento jurídico, caracteriza-se pela exigência do recadastramento dos aposentados e pensionistas como produto decorrente da deficiente Gestão Pública Brasileira. O outro, prevendo uma dinâmica de funcionamento intrínseca do Estado, assenta numa efetiva e sistemática comunicabilidade entre o Registo Civil de Pessoas Naturais e o Sistema Integrado de Controlo de Óbitos; é o Sistema Nacional de Informação de Registros Civis que exprime a adequada atuação do Estado, desconstruindo e quebrando o paradigma do recadastramento dos aposentados e pensionistas. A presente pesquisa foi desenvolvida no sentido de destacar a prevalência do paradigma exclusivamente estatal do controlo e fiscalização dos óbitos na esfera do poder público, inclusivamente para o fim do controlo do orçamento da Previdência. Demonstra-se o caráter insipiente do controlo no sistema de recadastramento dos aposentados e pensionistas, a partir da constatação da deficiência na integração do Sistema de Tecnologia da Informação com a Secretaria de Fiscalização da Tecnologia da Informação, com o Sistema Informatizado de Controlo de Óbitos e o Sistema de Informação de Registros Civis. A pesquisa recorreu ao mapeamento da função Administrativa do Estado Brasileiro, articulada pela Gestão Pública.

Palavras-Chave: Recadastramento; Aposentados; Pensionistas; Administração Pública; Gestão

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INNEFICIENT PERFORMANCE OF BRASILIEN RETIREES’ AND PENSIONERS’ REREGISTRATION IN PUBLIC MANAGEMENT - ABSTRACT

This thesis addresses the question of Brazil’s Public Management System inefficient performance as well as the obligation of reregistering for retirees and pensioners of both the General Social Security Regime and the Civil Service Social Security Regime. It focuses on the relationship between the government as the active subject of the reregistration and Public Administration. This research aimed at proving the existence of two systems, competing with each other to attain the same goal, in such a way that one interferes with the other. One of those systems is in fact incongruous in view of the Brazilian legal system and requires retirees and pensioners to reregister themselves, which points to the inefficiency of Brazil’s Public Management System, the other, is based on an effective and systematic communication between the Civil Register of Natural Persons and the Integrated System of Control of Deaths. This system, known as the National Information System of Civil Registers, represents the proper performance of the State and deconstructs the paradigm of the reregistration of retirees and pensioners. This research was conducted along the lines of presenting evidence as to how the State controls and oversees deaths within the sphere of public authorities, namely for the purpose of controlling the social security budget. Departing from the notion that there is no articulation between Information Technology Systems and the Department for Supervising Information Technology, the computerized System of Control of Deaths and the Information System for Civil Registers, it was possible to show that the control system for the reregistration of retirees and pensioners is inadequate and does not comply with the law. This study used as methodology the mapping of the administrative function of the Brazilian State articulated by the Public Management System.

Keywords: Reregistration; Retirees; Pensioners; Public Administration; Public Management

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vi ÍNDICE GERAL

INTRODUÇÃO ... 1

CAPÍTULO I - A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ... 5

1.1 O CONCEITO DE PODER E SUAS IMPLICAÇÕES NA CULTURA ORGANIZACIONAL ... 6

1.2 A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA ... 16

CAPÍTULO II – APOSENTADOS E PENSIONISTAS ... 19

2.1 PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO ... 21

2. 2 HISTÓRICO E DEFINIÇÃO DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ... 23

2. 3 POLÍTICAS PÚBLICAS ... 26

2.4 A REGULAÇÃO NO DIREITO ... 28

CAPÍTULO III – ASPETOS METODOLÓGICOS ... 30

CAPÍTULO IV – RECADASTRAMENTO NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ... 36

4.1 A ORIGEM DO RECADASTRAMENTO NO BRASIL: O ABISMO ... 37

4.2 A PONTE SOBRE O ABISMO: A LEI 10.887/2004 ... 39

4.3 RESOLUÇÕES: PRAGMATISMO, UM RETROCESSO ... 42

4.4 DADOS CONSTITUCIONAIS ... 44

4.5 CONTEXTUALIZAÇÃO: FLUXOS DE DADOS DE CERTIDÕES DE ÓBITO ... 52

CAPÍTULO V – O PODER PÚBLICO: O SUJEITO EFETIVO DO RECADASTRAMENTO 55 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 59

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 65

ANEXOS ... 74

ANEXO 1: PORTARIA Nº 847 DE 19 DE MARÇO DE 2001 ... 75

ANEXO 2: CÓDIGOS DE ÓRGÃO EMISSOR DE IDENTIDADE ... 77

ANEXO 3: INSTRUÇÕES PARA PREENCHIMENTO DO FORMULÁRIO DE CADASTRAMENTO DE ÓBITOS... 78

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vii ANEXO 4: INSTRUÇÕES PARA PREENCHIMENTO DO FORMULÁRIO PARA

ATUALIZAÇÃO DE DADOS DE CARTÓRIOS ... 83 ANEXO V: SISTEMA INFORMATIZADO DE CONTROLO DE ÓBITOS – SISOBI ... 86

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ABREVIATURAS E SIGLAS

CF Constituição Federal

CGU Coordenadoria Geral da União

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INPS Instituto Nacional da Previdência Social

INSS Instituto Nacional da Previdência Social

MPAS Ministério da Previdência e Assistência Social

MPOG Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão

RCPN Registro Civil de Pessoas Naturais

SEFTI Secretaria de Fiscalização da Tecnologia da Informação

SI Sistema de Informação

SIM Sistema de Informações de Mortalidade

SISOBI Sistema Informatizado de Controlo de Óbitos

SIRC Sistema Nacional de Informações de Registro Civil

SUB Sistema Unificado de Benefício

TCU Tribunal de Contas da União

TI Tecnologia da Informação

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2 INTRODUÇÃO

Esta Dissertação, produto de um trabalho de pesquisa, trata do tema da ineficácia da atuação da Gestão Pública Brasileira, particularmente no que diz respeito à questão do recadastramento de aposentados e pensionistas, tanto do Regimento Geral de Previdência Social, quanto dos Regimes próprios destinados à Previdência dos Servidores Público no Brasil.

Um olhar crítico pela configuração da legislação brasileira referente aos aposentados e pensionistas ─ sujeitos passivos da obrigação de recadastramento ─ remete-nos para o instituto de recadastramento que se torna, deste modo, objeto de análise. Remete-nos, igualmente, para o poder público como sujeito ativo do recadastramento, o que implica observar a dinâmica entre a Administração Pública e as Políticas Públicas, analisando os pontos em que convergem e aqueles em que divergem.

Os princípios jurídicos da eficácia e da legitimidade da Lei a par das sanções e penalizações, regulados pela legislação brasileira e pertinentes ao tema em questão, norteiam os capítulos que constituem esta dissertação.

A imposição pelo Estado Brasileiro do recadastramento de aposentados e pensionistas gera um problema de inconstitucionalidade nacional que obriga a que se examine, em termos jurídicos, o conceito de causalidade como nexo material que liga o facto ao seu autor. Dessa ideia de relação causal, decorre a necessidade de explicar a racionalidade do sistema político e económico que rege as sociedades modernas.

O Estado Brasileiro, gerencial e neoliberal, que tem como propósito a criação de mecanismos que permitam reduzir o mais possível a intervenção do Estado nas atividades económicas e sociais, cumpre a exigência do recadastramento dos aposentados e pensionistas, embora dando, com isso, origem a problemas. Com efeito, o Estado, na dinâmica da defeituosa execução da tarefa que lhe é própria e indelegável, fez nascer um sistema geneticamente defeituoso, com base em parâmetros éticos que justificam a própria necessidade de existência do Estado.

O problema abordado nesta dissertação é o facto de a aposentação representar uma fase da vida na qual se verifica uma rutura com o mundo do trabalho, que pode influenciar a transformação das interações sociais e a atuação do sujeito face à sua nova condição, no que

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3 diz respeito à capacidade produtiva. A transição do mundo do trabalho para a aposentação permite o aparecimento de desigualdades e contradições do sistema social no qual o sujeito se insere. Torna-se, portanto, fundamental entender de que modo as desigualdades socioprofissionais se relacionam com os mecanismos de adaptação à nova condição de aposentado.

Na representação do senso comum, a aposentação significa a inserção do sujeito no mundo do envelhecimento e o ponto de chegada ao final da vida produtiva. A discussão em torno da aposentação está diretamente relacionada com os temas da velhice e da morte. A literatura sobre as relações de trabalho e a aposentação enfatiza os estudos sobre o tema da previdência, as suas crises e emergências. Esta temática, no entanto, pode ainda ser considerada embrionária no Brasil, principalmente em função das novas tendências de organização da Previdência Social face ao mundo globalizado e ao desaparecimento do Estado de Bem-Estar Social.

É, sobretudo, neste contexto que reside o interesse da presente pesquisa. Desse interesse, decorre, ainda, a seguinte questão: de que modo a legislação Brasileira, no âmbito Previdência Social, lida com a obrigatoriedade do processo de recadastramento de aposentados e pensionistas? Como é que a Previdência Social brasileira realiza o controlo dos óbitos desses funcionários?

O objetivo geral desta dissertação é o de compreender os fundamentos legais que tornam obrigatório o recadastramento que se configura como um meio legal do Estado ter o controlo da vida dos aposentados e pensionistas para efeitos de pagamento de um benefício que lhes é determinado por Lei.

Para alcançar esse objetivo geral, foram estabelecidos os seguintes objetivos específicos: identificar, na legislação brasileira atual sobre previdência social, o dispositivo legal que torna obrigatório o recadastramento de aposentados e pensionistas; inserir a temática relativa ao recadastramento de aposentados e pensionistas no ponto de interseção do debate sociológico entre administração pública, gestão pública e políticas públicas; identificar os dispositivos utilizados pela Previdência Social no controlo dos óbitos das pessoas aposentadas ou pensionistas.

No decorrer desta investigação procedeu-se a uma análise documental, com recurso ao método da pesquisa bibliográfica, como meio de produção de conhecimento científico nos campos da administração e gestão públicas. O estudo heurístico dos documentos pressupõe

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4 que o investigador se coloque na perspetiva de quem os produziu, seguindo duas etapas distintas e interligadas, a saber: a recolha de documentos e a análise dos dados.

A primeira etapa consistiu no levantamento e organização dos materiais disponíveis sobre o tema em questão. Foi feita a leitura de uma vasta documentação jurídica com o intuito de escolher os documentos que apresentavam dados relevantes para a investigação. Em seguida, foram destacados os trechos que incluíam a descrição relativa ao recadastramento de aposentados e pensionistas. As bases de dados utilizadas tinham caráter livre, sem qualquer restrição em termos do acesso que foi realizado, basicamente, de dois modos: em suporte papel e eletronicamente.

Esta pesquisa teve como referência a cidade do Rio de Janeiro, no Brasil, no período compreendido entre 2009 e 2012, de acordo com o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE de 2010. Além disso, recorreu à Constituição Federal do Brasil, às Leis, Decretos, Acórdãos e Portarias relevantes para o desenvolvimento do tema em questão.

O Direito, enquanto forma de regulação social, de certa forma conduziu a pesquisa não distanciada da compreensão do Estado-Providência na sua tarefa de produzir políticas sociais, o que implica legislação e recursos tecnológicos que se manifestam em sistemas complexos de informação.

No final, foi possível concluir que o modo como o processo de recadastramento de aposentados e pensionistas, no Brasil, tem vindo a ser feito não é um processo eficaz.

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CAPÍTULO I - A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

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1.1 O CONCEITO DE PODER E SUAS IMPLICAÇÕES NA CULTURA ORGANIZACIONAL

Tradicionalmente, a reflexão em torno da relação entre administração pública, gestão pública e políticas públicas fundamenta-se em diversas perspetivas epistemológicas e teóricas que permitem construir modelos de análise para um determinado objeto de investigação. Esta argumentação justifica-se pelo facto de que o tema em discussão, tal como qualquer outro objeto de conhecimento, depende dos múltiplos enfoques teóricos de explicação. Portanto, existem diferentes teorias que se propõem explicar/analisar a génese, estruturação e desenvolvimento da relação entre administração pública, gestão pública e políticas públicas, tal como ocorre no campo das ciências sociais.

O trabalho científico consiste, principalmente, em problematizar as teorias explicativas dos fenómenos da realidade, na tentativa de demonstrar, mediante evidências e provas empíricas, se as hipóteses estão corretas ou devem ser refutadas. Esta conceção empirista de ciência esteve na base da principal corrente de investigação no campo da administração pública, gestão e políticas públicas. Todavia, nas últimas décadas, o paradigma da complexidade tornou-se um importante eixo de análise das categorias aqui em questão.

Esta nova perspetiva refuta a utilidade de provas empíricas principalmente porque propõe teorias e metodologias que consideram a administração pública, a gestão pública e o campo das políticas públicas como construções discursivas, constituídas por argumentos e elementos retóricos baseados em narrativas orais, relatos e memórias vinculadas ao sujeito. Foucault (1989) recorda, de maneira crítica, que as políticas são feitas de palavras. De modo que estas teorias não só enfatizam o papel das ideias, dos fatores cognitivos, retóricos e estéticos na formação das políticas públicas, da administração pública e da gestão pública, como minimizam, igualmente, o papel da centralidade de interesses no campo da racionalidade.

Assim sendo, a reflexão epistemológica relativa ao debate sobre o paradigma da complexidade é introduzida no campo de análise da administração pública, da gestão pública e das políticas públicas. Pesquisas realizadas neste domínio têm demonstrado que as teorias científicas não são neutras; pelo contrário, são marcadas por uma certa visão social do mundo, isto é, por um determinado paradigma, conforme afirmam Bachelard (1996) e Sousa Santos (2000).

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7 A teoria é como um mapa com o qual se pretende simplificar a realidade de modo a torná-la inteligível, isto é, reduzir ao extremo a complexidade do mundo; é uma espécie de armadilha construída para capturar o mundo real que, como dizia Baudrillard (1990), possui uma complexidade tão específica que nenhuma teoria, por si só, é capaz de explicar. Esta perspetiva envolve a incorporação do estudo de alguns autores, que demonstram bem o rigor académico em lidar com a questão das relações de poder. É importante encarar a problemática do poder a partir de novas perspetivas e novos interesses, uma vez que a sociedade, a economia e até mesmo a gestão permanentemente propiciam novas conotações nas relações de poder, ao mesmo tempo que incorporam novos elementos envolvidos nestas relações, possibilitando a sua compreensão com recurso à análise do paradigma da complexidade.

O pensamento complexo constitui um dos pressupostos básicos do método transdisciplinar que propõe a rutura com o padrão de pensamento cartesiano e preconiza a passagem do paradigma de dominação - poder, fragmentação e hierarquização - para o paradigma da cooperação - colaboração e partilha. Neste contexto, é posta a ênfase nos elementos operadores cognitivos da complexidade, tais como auto-organização, dialogia, circularidade complexa e autonomia. Do mesmo modo, são levados em consideração conceitos como ciberespaço e seus elementos, a saber: redes, conectividade, interatividade e autoria.

Nesta dissertação, o pensamento complexo modulou uma dialógica cognitiva entre as incoerências produzidas na cultura organizacional do Sistema de Previdência Brasileiro, mormente no que se refere ao recadastramento de aposentados e pensionistas. A incoerência entre a questão legal que postula a necessidade de um recenseamento e a ordem imposta pela Previdência Social, que impõe o recadastramento para os aposentados e pensionistas, causando vários problemas às pessoas idosas, permite-nos considerar a problemática em questão numa dinâmica de equilíbrio/desequilíbrio e ambiguidade/ambivalência.

Tendo em conta estes elementos, é possível ver como as organizações do século XX atingiram novos desenvolvimentos quanto ao modo de enfrentar as suas relações e estruturas de poder. A partir dessa consideração, esta pesquisa pretende proporcionar uma nova visão sobre a conjugação dos eixos de linearidade e de complexidade, abandonando a disjunção que anteriormente se verificava e estava ancorada na visão linear e reduzida da modernidade cartesiana, com o intuito observar o modo como vão emergindo novas relações que entretecem uma rede complexa entre a unidade e a multiplicidade.

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8 A partir do paradigma da complexidade, nasce uma nova visão do poder no seio das organizações. Este ponto de vista permite assumir o pressuposto de que o poder surge e consolida-se como um rizoma, em qualquer parte do nó que amarra as relações e cujo determinante básico são os interesses das pessoas que permeiam a cultura da organização e as mesmas estruturas que se desenvolvem e agem num contexto permanente de mudança e complexidade.

Este capítulo está organizado, em primeiro lugar, em torno da reflexão sobre a conceção de poder desenvolvida por Foucault (1989; 1991) e Max Weber (2000)1 a partir da descrição de poder na sociedade, e a sua implementação na organização, sublinhando, particularmente, o quadro administrativo de Weber (2000). No modelo weberiano, a burocracia é mostrada como uma forma de poder presente na sociedade. Nesse modelo, é possível identificar um conceito de poder que permite estabelecer um diálogo com as posições de Foucault (1989). Estes autores foram escolhidos pela sua enorme relevância para a análise do objeto em estudo nesta pesquisa.

O pensamento de Foucault (1989) explora os modelos transformadores do poder no seio da sociedade e as formas como o poder se relaciona com as pessoas, bem como as críticas levantadas sobre o controlo imposto pela arquitetura do século XIX. Além disso, o autor faz uma profunda crítica da razão como forma de dominação e manipulação política. A partir das suas posições, assistiu-se à crise da modernidade. Foucault (1989) pôs em marcha uma reforma do pensamento a partir da manipulação das relações. Já Max Weber (2000) analisa sistematicamente a sociologia política e o desenvolvimento do capitalismo e da burocracia, chamando a atenção para o caráter social de que qualquer forma organizacional se reveste.

Seguidamente, a pesquisa envereda pelo mundo da complexidade, definindo alguns dos elementos que a constituem e fazendo, igualmente, uma procura resumida relativamente à temática das emergências do poder. Com base em autores como Morin (2003) e Capra (2002), entre outros, é possível estabelecer um roteiro das redes inextricáveis que permitem o acesso a um mundo onde o acaso, as perturbações aleatórias e a incerteza entram em conjunção, e os componentes heterogéneos da natureza brincam livremente, possibilitando relações rizomáticas que dependem de múltiplas variáveis. Neste momento, existe a compreensão de que a vida é cheia de relações que se excluem mas que devem ser reincorporadas para

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A data de publicação citada corresponde à da edição da tradução brasileira consultada. A obra original, com o título Wirtschaft und Gesellschaft foi publicada postumamente, em 1921 e 22.

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9 recriarem a natureza das relações dos atores sociais e, por esta via, penetrarem na cultura das organizações a fim de possibilitarem o surgimento de uma nova maneira de encarar o poder em si mesmo.

A afirmação destes pressupostos implica o reconhecimento de que a estrutura hierárquica é parte essencial da organização, mas que, ao invés de ser mutuamente exclusiva, deve incorporar as diferentes interações e relações que rompem com esse rigor e formam um plexo entrelaçado com a estrutura formal de relações informais. Sob o olhar dessa apreciação, fixado na emergência do poder como resultado da combinação entre acaso e incerteza, forma-se um novo arranjo organizacional ao qual podem forma-ser aplicadas novas ferramentas de gestão do poder.

Nesta dissertação, propõe-se a construção de uma nova trajetória que permita considerar o paradigma da complexidade como uma alternativa potencial e não como uma teoria definitiva. Com efeito, a complexidade representa, apenas, um primeiro passo rumo a uma nova maneira de ver a vida das organizações e, portanto, de lançar luz sobre o problema em questão.

O conceito de poder tem muitos significados de acordo com o contexto no qual é considerado, desde os cenários mais simples da vida humana até aos mais complexos. Desde a antiguidade, até hoje, foram vários os conceitos apresentados por diversos filósofos aceites e reconhecidos como marcos na história da humanidade. O poder, profundamente enraizado em todas as sociedades, abrange desde o individualismo até às relações coletivas existentes na vida social. É medido através dos recursos disponíveis para o seu exercício e promove a adesão ou a rejeição dos atores sociais por ele afetados. No contexto da presente investigação, serão tidos como referência os conceitos básicos de poder problematizados por Max Weber (2000) e Foucault (1989; 1991), autores que dedicaram parte de seu trabalho académico à temática do poder e das suas estratégias de atuação.

Para Foucault (1991), o conceito de poder tem várias dimensões e afeta todos os atos humanos no tipo de relações que estão envolvidos, como o trabalho, a escola, a vida familiar, isto é, nos diversos cenários de relações de proibição e punição. Da mesma forma, pelo poder se tecem as interações entre as instituições, situação percetível em diversas manifestações. Para este filósofo e teórico social, o poder não é um objeto natural, ou uma coisa; é, sim, uma prática social, com formas díspares, heterogéneas e em transformação. Logo, não pode ser interpretado como uma mercadoria mas como uma operação de tecnologias políticas

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10 aplicadas a um corpo social, constituindo, por isso, uma matriz de relações de forças desiguais e assimétricas.

Na sua teoria da burocracia, Weber (2000) defende que o poder está ativo em todo tipo de sociedade e presente em todas as organizações, demonstrando como as pessoas usam o poder de diferentes maneiras e em diferentes cenários.

Esta concordância entre os dois autores permite reafirmar que o poder é parte de vida humana e, portanto, é essencial olhar para as relações que emergem dentro das organizações, como produto da interação dos atores sociais.

Para o filósofo alemão, poder significa a probabilidade de impor a própria vontade a uma relação social, mesmo contra toda a resistência e qualquer que seja o fundamento dessa probabilidade. O estudo do poder decompõe-se em duas componentes distintas e indispensáveis: dominação e disciplina. Estas ocorrem de acordo com as circunstâncias presentes nas interações sociais, produto da hierarquia estabelecida, quer na sociedade, ou dentro de um quadro administrativo, por exemplo, uma organização. Segundo Capra (2002), a organização pode ser entendida como uma comunidade de pessoas que interagem para estabelecer relações, apoiarem-se uns aos outros e dar sentido às suas atividades quotidianas a nível pessoal.

Para Morin (2003), é a disposição de relações entre componentes ou indivíduos que produz uma unidade complexa ou sistema. A organização reúne, de modo inter-relacional, elementos, eventos ou vários indivíduos que, a partir daí, se assumem como componentes de uma totalidade. Em seguida, a organização transforma, produz, reúne, mantém, operando numa lógica inter-relacional como já foi dito.

Ao contrário de Weber (2000), Foucault (1989) não explicita o seu conceito de poder, não o estabelece com rigor conceptual, ainda que nos seus textos sempre faça referência a este conceito. Além disso, na sua conceção, o poder transita pelos indivíduos, não se lhes aplicando, reiterando a noção de que não é composto por um único elemento, o que implica que os estudos neste domínio tenham uma abrangência ampla e complexa.

Esta diferença visível entre os dois autores faz com que o conceito weberiano seja preferencialmente usado em ambiente administrativo.

Numa outra perspetiva, Foucault (1991) apresenta a prisão como um lugar onde o poder se expressa abertamente em todas as suas dimensões, configurando uma ação social rígida e repressiva. Na prisão, o poder representa uma ferramenta repressiva ao dispor da sociedade e é exercido com a intenção de converter um ser, em dado momento tornado

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11 monstro, numa pessoa de bem. Para que esse objetivo seja alcançado, a sociedade deve mostrar todo o seu poder e reprimir fortemente o comportamento desviante, considerado inadequado, de acordo com os padrões de comportamento por si mesma estabelecidos.

Foucault (1989) estudou, também, o poder a partir da perspetiva dos cenários para o exercício do poder repressivo, como, por exemplo, a escola e as instituições para doentes mentais. No entanto, considera que o poder não é apenas repressivo. O que faz com que seja atrativo e o sujeito a ele se apegue é, simplesmente, o facto de que ele não pesa apenas como uma força que diz não, mas, na verdade, circula, produz coisas, induz ao prazer, forma saber e produz discurso; deve ser considerado como uma rede produtiva que atravessa todo o corpo social e não como uma instância negativa cuja função seja, apenas, a de reprimir.

As universidades, por exemplo, destinam-se a mudar o pensamento das pessoas que as frequentam. Para alcançar a mudança, a estrutura e as práticas repressivas, nesses espaços, devem ser modificadas; deve produzir-se conhecimento e devem ser dadas oportunidades à participação. Nas instituições para doentes mentais, as intervenções de poder passam por caminhos semelhantes aos das prisões e o poder repressivo é exercido do mesmo modo. Aí são internadas as pessoas que, de acordo com o conceito social, têm distúrbios mentais e são submetidas a um tratamento no qual o paciente não tem qualquer interferência.

É por isso que o poder é aceite e permeia toda a sociedade, efetivando uma transversalidade que tem por finalidade e como produto mudar e melhorar a vida das pessoas. Numa sociedade como a nossa, as múltiplas relações de poder atravessam o corpo social, caracterizam-no e constroem-no, não podendo estabelecer-se, nem funcionar, sem que o discurso verdadeiro seja produzido, acumulado, circule e funcione.

O desenho dos cenários onde o poder é exercido, segundo Foucault (1991), usa sistemas e signos que fortalecem o exercício do poder sobre as pessoas que a ele estão submetidas. A arquitetura panótica2 de Bentham (apud Foucault, 1991) é uma forma de arquitetura, mas é, principalmente, uma forma de governo; é para o espírito uma maneira de exercer o poder sobre o próprio espírito, como, por exemplo, em hospitais, escolas, prisões e outras organizações similares, que se caracterizam por desenhar espaços nos quais se possa praticar a vigilância como elemento fundamental para o exercício do poder, por parte de quem o possui e daqueles que sofrem o seu controlo.

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12 A partir destas considerações, Foucault (1991) sugere que a sociedade funciona como um panótico onde se estabelecem as regras que regulam o comportamento do homem para vigiá-lo e puni-lo de acordo com os padrões fixados pela sociedade. O caso típico é o das prisões, onde a sua arquitetura panótica a torna o único lugar onde o poder pode mostrar-se desnudado, nas suas dimensões mais excessivas e justificar-se como poder moral. Na sociedade panótica, observam-se todas as manifestações de poder, além de se verificar uma relativa aceitação das formas em que é exercida na perspetiva da moral. O poder moral, instituído pela mesma sociedade, é aceite como desejável para lograr um estado ideal de convivência que atua como uma força social e um garante da institucionalidade do poder.

Do ponto de vista social, Weber (1992) também considera que o poder é exercido na sociedade a partir de diferentes dimensões, que não exclusivamente económicas, já que é motivado por diferentes fatores. Este filósofo e sociólogo apresenta diferentes situações nas quais o exercício do poder é representado como uma necessidade inerente à vida quotidiana. Refere, por exemplo, os partidos políticos, instituições das quais alguns participantes da sociedade desejam obter o poder político, agindo socialmente com o propósito de o obter.

Weber (1992) argumenta que, numa comunidade, o poder circula pelas classes sociais, e partidos, que realizam atividades conjuntas para manter ou melhorar a sua posição social, embora cada um aja de acordo com os seus interesses particulares. As classes, por exemplo, orientam a sua ação no sentido da ordem económica, e os partidos buscam o poder social; as ações comunitárias dos partidos sempre envolvem uma "societalização", já que as ações partidárias sempre apontam para um alvo. Este mesmo processo ocorre, igualmente, em todas as organizações sociais. No mundo das empresas, por exemplo, a sua administração envolve relações de poder que são necessárias para o desenvolvimento das atividades que sustentam a sua legitimidade e preservam a institucionalidade. Nessas áreas, é observável, segundo Weber (1992), uma desigualdade de forças nas situações de dominação, comparativamente com os interesses particulares e de acordo com as ações levadas a cabo para cumprir os compromissos.

Weber (1992) e Foucault (1991) coincidem em muitos aspetos quando estabelecem a universalidade do poder na sociedade e nas instituições que as circunscrevem; poder categorizado de acordo com diversos fatores que se tecem na sua aplicabilidade. Em Weber (1992), o poder apresenta duas componentes que podem chegar a confundir-se: dominação e disciplina.

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13 A dominação é a probabilidade de se verificar obediência a um mandato de conteúdos específicos entre as pessoas. O poder, do ponto de vista da dominação, tem pretensões de legitimidade que este filósofo classifica de acordo com as relações determinadas pela legitimidade de propriedade: autoridade legal, autoridade tradicional e autoridade carismática. Estes tipos de dominação legítima constituem a base fundamental para a compreensão do poder, tanto na sociedade quanto nas organizações.

De acordo com o pensamento de Weber (1992), é importante notar que a autoridade é sinónimo de poder, mas o inverso não é necessariamente verdadeiro, isto é, ter poder nem sempre significa ter autoridade, uma vez que esta depende da legitimidade que se adquire e do grau de aceitação alcançado por um grupo de pessoas. A dominação, seja de natureza racional, legal ou burocrática, é a forma mais pura de autoridade que pode ser apresentada; neste tipo de autoridade predominam a impessoalidade e a racionalidade e os subordinados aceitam as ordens porque as consideram justificadas graças à legitimidade que adquiriram.

Na dominação tradicional, onde predominam as características patriarcais e hereditárias, as ordens são aceites porque há uma tradição de realizar as tarefas sempre do mesmo modo. Este tipo de poder não é racional, mas sim extremamente conservador. Na dominação carismática, em que predominam as características místicas, arbitrárias e pessoais, as ordens são cumpridas devido à influência exercida pelo superior - pela sua personalidade e liderança - com o qual há uma plena identificação. A partir da componente da disciplina, o poder, para Weber (1992), pressupõe a probabilidade de encontrar a obediência necessária a um certo mandato.

Para Foucault (1989), o conceito de disciplina não pode ser identificado nem com instituição nem com instrumento. É uma forma de poder, uma modalidade para exercê-lo que envolve todo um conjunto de instrumentos, técnicas, procedimentos, níveis de aplicação, metas; é uma física ou uma anatomia do poder; é uma tecnologia. No entanto, na sua teoria, não se estabelece o conceito de domínio porque ele está identificado com o poder ou, mais precisamente, como uma componente indivisível do poder.

Com este argumento, Foucault (1989) esboça o seu conceito de sociedade panótica, onde a disciplina, sempre na ordem do dia, permeia o comportamento dos seus membros e restringe os seus pensamentos por meio das instituições e da ciência que o homem criou e está continuamente a criar. Seria necessário saber até onde o poder é exercido, quais os seus relevos, contornos e instâncias, mesmo que ínfimas, de hierarquia, controlo, vigilância, proibição, coação, restrição. Em qualquer lugar onde há poder, ele é exercido.

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14 Foucault (1989) afirma que não há relações de poder sem resistência, e que as resistências são muito mais concretas e eficazes quando se formam no exato lugar em que se exercem as relações de poder. De acordo com esta linha interpretativa, o poder é indissociável da resistência e um não se imagina sem o outro. A oposição ao poder, nas instituições onde é exercido, afeta as relações de poder, porque, num dado momento, a resistência pode atingir mais poder do que aquele que é legalmente estabelecido por uma sociedade ou instituição, ao ponto de alguém poder afirmar que não sabe, exatamente, quem é detentor de tal poder, mas sabe que ele/ela não é.

No que diz respeito ao conceito de verdade e à sua relação com o poder, aspeto que Weber (1992) não considera, Foucault (1989) apresenta-o como uma forma de alienar o pensamento dos homens, uma vez que a verdade é estabelecida por quem exerce o poder. Está ligada, de modo circular, aos sistemas de poder que a induzem e propagam. Foucault (1989) não afirma que a verdade se afaste ou esteja desligada do poder; o que acontece é que ela é utilizada como uma ferramenta de hegemonia social, económica ou cultural de domínio sobre o sujeito.

Ao contrário, Habermas (2000) não concorda com esta visão ao expressar que o sucesso da ação depende da verdade dos juízos que entram no plano de atuação desta, através do critério que representa o êxito da própria ação, o do poder sobre a verdade.

Foucault (1989) postula que o exercício do poder cria, permanentemente, conhecimento e, inversamente, o saber conduz aos efeitos de poder. Assim, as relações de poder que emergem através do conhecimento podem ser estudadas como um suporte para as novas formas de dominação e como produto das interações entre os sujeitos, seja na sociedade ou numa organização. À medida que as interações se tornam mais complexas, as redes sobrepõem-se, estabelecendo relações e interferindo, mesmo, noutros tecidos. Quanto maior for a complexidade, mais as relações são intrincadas.

Foucault (1989) fornece dinamismo ao poder, como algo em movimento, através das relações que emergem da interação e na correlação dos homens com outros homens. Na sua opinião, o poder deve ser analisado como algo que circula ou, melhor dizendo, como algo que não funciona senão de modo encadeado. O poder está sempre em movimento, cada vez mais enredado nas relações. Por outras palavras, o poder transita de maneira transversal e permanece inquieto nos sujeitos.

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15 Já Weber (1992) não encara a resistência como algo evidente, mas sim casual. Para ele, todo aquele que pretende romper uma dominação tem de recriar um quadro administrativo próprio que possibilite a sua própria dominação.

Os limites do poder não estão bem definidos, levando Foucault (1989, 1991) a um constante questionamento. Para entender toda a extensão do poder seria preciso, antes de tudo, saber bem até onde ele é exercido, as suas conexões e instâncias hierárquicas, de controlo e vigilância, as proibições e restrições. O poder existe em todas as partes e constitui-se como um exercício. Não é um complexo completamente autossuficiente, mas depende de outros fatores, tanto para as condições que o tornam possível, como para o seu nível de procura e necessidade.

O estudo das relações de poder no campo da administração tem passado um pouco despercebido. Taylor (1992)3, por exemplo, na sua organização do trabalho científico, estabelece mecanismos de controlo, mas não fala do poder. A teoria das relações humanas circunscreve a manipulação do poder à liderança. Quem mais enfatiza o papel das relações de poder é, sem dúvida, Weber (1992), quando determina o seu significado para uma abordagem. Todo o desiderato até aqui analisado é, forçosamente, necessário para se compreender como os campos da administração pública, da gestão pública e das políticas públicas influem na questão do recadastramento de aposentados e pensionistas da Previdência Social, no Brasil. O descrédito da burocracia pública, nos tempos modernos, é, sem dúvida, uma perceção amplamente generalizada. Frequentemente ouve-se falar de ineficácia e corrupção como características essenciais e intrínsecas da Administração Pública. No marco desta impressão coletiva, os governos têm sérias dificuldades em legitimar a sua ação, muitas vezes seriamente prejudicada pela opinião negativa que o público tem da ação administrativa.

No próximo ponto, apresenta-se a Administração Pública no âmbito dos Estados modernos, de acordo com diferentes abordagens analíticas estudadas.

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A data de publicação citada corresponde à da edição da tradução brasileira consultada. A obra original, com o título The Principles of Scientific Management, foi publicada em 1911, quatro anos antes da morte do autor.

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1.2 A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA

Uma das abordagens analíticas mais frequentes relativamente à Administração Pública corresponde a um ponto de vista predominantemente sociopolítico e refere-se ao enfoque histórico estrutural que lança o seu olhar, principalmente, sobre os atores que podem participar conflitualmente do processo de formulação de políticas como o Estado, os indivíduos ou grupos, as organizações e os setores da sociedade no desempenho de funções de natureza económica e política. Estes, de acordo com o momento histórico em que se inserem, e em relação ao jogo de forças resultantes, conseguem influenciar, em maior ou menor grau, o processo de formulação de políticas públicas.

Uma outra abordagem diz respeito ao enfoque administrativo organizacional e refere-se à preocupação com a organização da Administração Pública em si, isto é, o refere-seu funcionamento interno e a relação que estabelece com o contexto em que está imersa e com o qual interage. Cabe ressaltar que estas abordagens têm vindo a ser reinterpretadas à luz do paradigma da complexidade.

Uma melhor compreensão da visão do mundo implica encará-lo como um sistema complexo. Esta visão leva em consideração as teorias da complexidade como um prelúdio necessário à compreensão das teorias de sistemas.

Todavia, o que é a complexidade? Segundo Morin (2003), à primeira vista, o complexo é um tecido; complexo é tudo aquilo que é tecido em conjunto, constituído por elementos heterogéneos inseparavelmente associados, representando o paradoxo do uno e do múltiplo. O termo complexidade tem sido utilizado pela ciência contemporânea para dar ressonância e relevância a alguns conceitos, mas apresenta limitações, ou, se preferirmos, coloca fronteiras, quando, efetivamente, o que se pretende é pôr em marcha uma forma de estudar o tecido da realidade com todos os elementos que a compõem.

No contexto deste trabalho, o conceito de complexidade é tratado numa perspetiva epistemológica. A complexidade está associada a várias teorias, como a sistémica, a cibernética e a teoria da informação. O desenvolvimento destas teorias permite compreender conceitos como emergência, acaso, acontecimento, interações e relações, entre outros.

A complexidade não está orientada por uma visão reducionista e mecanicista do mundo. O panorama da complexidade está sujeito a indeterminações, incertezas, fenómenos aleatórios e ao acaso.

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17 No trânsito fugaz do ser humano pela sua existência, um dos fatores mais marcantes diz respeito à complexidade. Para Morin (2003), os modos de organização que regem a atuação das pessoas resultam das interações sociais que podem acontecer por via de afinidades, contradições, dominações ou comunicações, entre outros, e que conduzem ao aparecimento das tensões entre ordem e desordem. Estas interações devem ser entendidas numa perspetiva complexa porque estão inseridas nas organizações como produto do exercício do poder. Assim sendo, Morin (2003) traz à baila o conceito de cultura organizacional na qual se vão tecendo redes de poder que emergem das inter-relações.

Pensar de modo complexo significa configurar um pensamento multidimensional que permita entender que as estruturas hierárquicas não são as únicas detentoras de poder nas organizações. As redes formadas pelas interações entre os seus membros e com agentes externos podem, num dado momento, transformar o comportamento das organizações e, por conseguinte, da sua cultura.

O Sistema de Previdência Brasileiro é aqui entendido como um sistema vivo e complexo, permanentemente revisto e reordenado pelos seus processos, procedimentos e estratégias operacionais, como resposta às incertezas e incoerências produzidas pela suposta obrigatoriedade de recadastramento imposto aos aposentados e pensionistas.

A complexidade aborda uma mudança nos modos de administrar e gerir as organizações, pois os acontecimentos são tratados nas suas múltiplas relações vitais e não como objetos isolados. Propõe-se uma visão ecológica que aborda os conceitos de redes, nódulos, rizomas e outras metáforas que permitem compreender, de forma complexa, a vida das organizações e as suas conexões profundas e inconscientes.

Após a Segunda Guerra Mundial, a conceção do papel que o Estado deveria desempenhar apontava para uma rutura com o pensamento e prática da primeira metade do século XX. O Estado adquiriu a posição de personagem principal na resolução dos problemas que afetavam a sociedade como um todo e protagonizou, em termos gerais, o papel de um gigante que garantia as necessidades sociais dos cidadãos. Esta perceção, contudo, foi desaparecendo com o transcorrer do tempo e a evolução de diferentes variáveis, mercê de novas circunstâncias históricas e das posições dos grupos de interesse que se foram manifestando como um desafio ao Estado-Providência.

A crescente abertura da economia, decorrente do conceito de globalização, conferiu particular importância à competitividade, realçando a interdependência dos setores público e privado. Cada vez mais os cidadãos colocam aos governos exigências mais complexas e, ao

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18 mesmo tempo, questionam a capacidade destes de enfrentar e resolver os problemas sociais que continuam a persistir. A ação governamental ocorre num ambiente marcado por turbulência e muitas incertezas face ao atual contexto de forte integração financeira.

As estruturas políticas e administrativas, bem como as formas de gestão tradicional, estão cada vez mais obsoletas, sendo difícil dar resposta às atuais exigências sociais. A necessidade de mudanças com o fim de preservar a capacidade de governar e prestar serviços tornou-se um problema de que urge dar conta, quando se consideram a governabilidade e os sistemas democráticos de governo. Daí, a necessidade de reconsiderar as razões dos governos para intervir, de encontrar novos estímulos, fortalecer os mecanismos de decisão e reavaliar a relação custo-eficácia no setor público.

Quais foram os critérios subjacentes à implementação de reformas? De que modo foram aplicados? Após a aplicação dessas reformas, quem saiu prejudicado? E quem foi beneficiado?

No campo das ciências sociais, a Administração Pública é alvo de interpretações que, frequentemente, geram controvérsias e polémica. Às vezes, é considerada a partir de uma visão introspetiva que enfatiza a importância dos procedimentos, estruturas e processos. Também se coloca a tónica no processo de tomada de decisão. Outras vezes, ela é vista como um mero instrumento da política, que se desconhece, negligenciando-se a sua autonomia funcional para orientar, implementar, executar e condicionar as políticas e os planos de governo.

No entanto, numa perspetiva complexa, o pressuposto é o de que a Administração Pública é um dispositivo acentuadamente marcado pelas relações de contradição entre a regulação e a emancipação, no contexto da transição paradigmática que é a marca da crise do projeto de modernidade. A Administração Pública está intimamente relacionada com as questões referentes ao poder, à dominação, à autoridade e à legitimidade.

Em síntese, depois de apresentada uma breve fundamentação conceptual sobre a relação entre Administração Pública, gestão pública e política pública, na ótica do poder, abordar-se-á, no capítulo seguinte, a situação constitucional dos aposentados e dos pensionistas no Brasil.

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CAPÍTULO II – APOSENTADOS E PENSIONISTAS

A Constituição Brasileira de 1988, ao tratar das dimensões dos direitos humanos fundamentais, aborda a questão da Previdência, no que diz respeito ao regime jurídico de proteção dos direitos humanos destinados aos servidores públicos. Tem como referencial a Convenção Americana de Direitos Humanos, assinada em San José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, posteriormente ratificada, no Brasil, pelo Decreto 678/92 de 6 de novembro.

O artigo 40º da Constituição Federal de 1988 consagra que “aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, [...] é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas” (1988). Também o artigo 201, referente à organização da Previdência Social, postula que esta tem “a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial” (1988).

Para tanto, estabelece o ordenamento jurídico brasileiro que a proteção dada pela Previdência às pessoas que não possuem vínculo com a Administração Pública deve ser realizada por meio de um conjunto de regras e capitaneada por uma entidade pública com quem tais pessoas fixam o vínculo jurídico, conforme os princípios da Convenção Americana de Direitos Humanos, ratificada, no Brasil, como atrás referido, em 1992. A entidade pública consagrada no ordenamento jurídico brasileiro para esse efeito é o denominado Instituto Nacional do Seguro Social-INSS.

O conjunto de regras que regula o Sistema de Previdência brasileiro está consolidado em dois diplomas legais ─ a Lei 8.212/91 de 24 de julho, que institui o plano de custeio da Previdência Social e a Lei 8.213/91 de 24 de julho, que institui o regime geral de Previdência Social, discriminando as coberturas, os sinistros e as hipóteses de filiação. Quanto aos regimes próprios, estes são previstos para dar resposta à Proteção Social dos Servidores Públicos pelos diversos elementos da federação. Por conseguinte, os estados, os municípios, o Distrito Federal e a União, através de legislação específica, criam o Regime de Previdência no qual se inserem os seus servidores públicos.

É, precisamente, este universo de aposentados e pensionistas, abrangidos pelo Regime de Previdência Social, que é afetado pela exigência, por parte do Poder Público, de se recadastrarem, cumprindo, deste modo, o objetivo de fornecer prova de vida. Esta exigência

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21 gera efeitos contraditórios que, além do mais, vão, indubitavelmente, de encontro ao próprio ordenamento jurídico.

2.1 PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO

O Código Civil brasileiro, consignado na Lei 10.406/2002 de 10 de janeiro, no seu artigo 45º, estabelece, já, “a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo” A criação e a denominação do Registro Civil de Pessoas Naturais foi instituído pela Lei 6.015/73 de 31 de dezembro, que recebeu nova redação pela Lei 6.216/75 de 30 de junho, e foi reconduzida pelo Artigo 236, parágrafos 1º e 2º da Constituição Federal de 1988. Entre o Registro Civil de Pessoas Naturais-RCPN e os Órgãos do Governo existe, portanto, uma íntima relação jurídica que se foi fortalecendo graças ao contributo de outras instituições como: o Instituto Nacional de Seguro Social-INSS; o Instituto Nacional da Previdência Social-INPS; o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social-INAMPS; o Ministério da Previdência e Assistência Social-MPAS; o Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão-MPOG; a Secretaria de Fiscalização da Tecnologia da Informação-SEFTI; o Tribunal de Contas da União; e a Coordenadoria Geral da União-CGU.

Estas instituições têm ligação aos Sistemas de Informação referentes às pessoas tomadas em caráter jurídico e natural, a saber: Sistema Informatizado de Controlo de óbitos-SISOBI; Sistema de Informação-SI; Tecnologia da Informação-TI; Sistema Unificado de Benefício-SUB; Sistema de Informação de Mortalidade-SIM e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE.

Da história dos Registos Brasileiros, consta como documento o Decreto 520/1847 de 11 de junho que, no seu artigo 172, estabelece as normas para o registo de nascimentos, casamentos e óbitos em livros específicos:

O Registro será feito em 3 livros separados. No 1º serão lançados os actos dos nascimentos, no 2º os dos casamentos, e no 3º os dos óbitos. Haverá outro livro que

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22 servirá para registrar as procurações e lançar os autos que se fizerem, e de que ao

diante se trata. Todos estes livros serão numerados e rubricados pelo Cônsul, quando não haja Legação no Districto, e conterão os competentes termos no princípio e no fim deles.

Como se pode verificar pela regulamentação consular, havia, já, no século XIX, registos de óbitos que eram válidos para aqueles que não residiam no Brasil ou imigrantes que aqui chegavam. Mesmo, ainda, durante a Monarquia, D. Pedro II, Príncipe Regente, instituiu a Lei 586/1850 de 6 de setembro, que, no parágrafo 3º do artigo 17º, diz o seguinte:

Para despender o que necessario for a fim de levar a effeito no menor prazo possivel o Censo geral do Imperio, com especificação do que respeita a cada huma das Provincias: e outrossim para estabelecer Registros regulares dos nascimentos e obitos annuaes.

Para fins de regulamentação dos registos de nascimento e óbito, foi criado o Decreto 798/1851 de 18 de junho, a partir do qual se determina as funções atribuídas aos escrivães e o quadro legal em que operavam. No referido Decreto, pode ler-se que: “os Escrivães dos registros dos nascimentos e óbitos não perceberão salário algum pelos termos que lavrarem nos livros” (1851, art. 21º), embora, por cada certidão emitida, recebessem “de igual valor os emolumentos que competiam aos Tabeliães de Nota” (1851, art. 210).

O mesmo Decreto legisla sobre a responsabilidade dos escrivães quanto ao registo de óbitos e seu lançamento em livros próprios, ficando sujeitos à aplicação de penas no caso de haver erros, omissões ou algum tipo de prevaricação:

Os Escrivães dos registros são responsaveis pelos damnos que causarem com a demora do lançamento dos termos nos livros, e da expedição das certidões, alem das penas em que incorrerem pelas omissões, erros e prevaricações que commetterem. (1851, art. 21º)

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2. 2 HISTÓRICO E DEFINIÇÃO DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A Emenda Constitucional nº19 de 4 de junho de 1998 altera o disposto no caput4 do Artigo 37 da Constituição Federal de 1988, incluindo no ordenamento jurídico brasileiro o princípio da eficiência. Castro (2006), no 30º encontro da Associação Nacional de Pesquisa em Administração-ANPAD, considerou a “efetividade” mais benéfica que a eficácia, no domínio da área pública, quando se tem como objetivo satisfazer uma população que necessita de serviços públicos efetivos.

O Registro Civil de Pessoas Naturais-RCPN, instituído pela Lei 6015/73 de 31 de dezembro, reconduzida pelo artigo 236 da Constituição Federal de 1988, delineada e regulamentada pela Lei 8.870/94 de 15 de abril, foi criado, especificamente, para proceder ao registo de casamentos, nascimentos e óbitos. O seu artigo 68º, nos parágrafos 1º e 2º, obriga os cartórios, o Registro Civil de Pessoas Naturais e o Instituto Nacional de Seguro Social a comunicar aos órgãos competentes do Governo, dentro de prazos estipulados, o número de óbitos. Neste acervo, ao referir-se os direitos e deveres dos funcionários, estabelecem-se as bases e normas para uma melhor comunicabilidade entre o Registro Civil de Pessoas Naturais e os gestores públicos. Também neste domínio, foi criada a Secretaria de Fiscalização da Tecnologia da Informação. Leis, serviços e encargos dão visibilidade a uma constelação de agenciamentos do Estado moderno para controlar e fiscalizar os beneficiários da política pública como expressão do que disciplinarmente se denomina por Administração Pública: Estado regulador da sociedade civil, gestor dos dispositivos disciplinares que, por via da emissão de certidões, conferem legitimidade aos nascimentos, casamentos e óbitos.

A responsabilidade pelas informações relativas, por exemplo, às notificações de óbitos atribuída aos funcionários está consignada na Lei 8.870/94 de 15 de abril que estipula, nos 1º e 2º parágrafos do artigo 68, que é obrigação do funcionário notificar os óbitos de cidadãos, até ao dia 10 de cada mês, para que todo o sepultamento seja devidamente certificado por meio de um registo oficial do lugar onde a morte aconteceu, lavrando-se o assento e atestado de óbito, passado pelo médico ou por duas pessoas qualificadas que tenham presenciado ou verificado a morte, conforme determina o dispositivo expresso pela Lei. Como facilmente se

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24 depreende, não existe sepultamento sem a devida certidão e, consequentemente, sem a notificação ao Instituto Nacional de Seguro Social-INSS.

Administrar significa gerir negócios públicos ou privados, reger com autoridade suprema, governar, dirigir, conferir, ministrar. Assim sendo, a Administração Pública, como efeito institucional, cuida historicamente da economia da sociedade geopoliticamente organizada. O Estado moderno pode ser pensado como um conjunto de engrenagens às quais são atribuídas funções específicas.

A Administração Pública, no Brasil, ainda no tempo em que o país era uma colónia portuguesa, herdou do país colonizador o paradigma europeu da relação entre o Direito positivo e o Estado. De acordo com Freitag (1986), a fase colonial do Brasil “caracterizava-se pela inexistência de instituições autônomas que compusessem a sociedade política. Essa se reduzia às representações locais do poder da metrópole. A sociedade civil era composta quase que exclusivamente pela Igreja” (p.47). Os representantes da Coroa preocupavam-se, apenas, com a formação de futuros teólogos, reproduzindo os seus próprios quadros hierárquicos e neles formatando os educadores, recrutados quase exclusivamente entre os seus. Deste modo, a Igreja Católica assumia-se como força hegemónica dentro da sociedade civil, de certa forma estendendo a sua área de influência à própria sociedade política.

Com a afirmação da sociedade política no Brasil republicano, e mercê da produção de café em larga escala para satisfazer a procura por parte do mercado internacional, o Estado brasileiro teve necessidade de articular-se com uma sociedade, então configurada por exigências económicas. A partir daqui, era o Estado que avalizava, por exemplo, os investimentos no setor ferroviário, contraía empréstimos para expansão da produção cafeeira nos países de economia hegemónica ou incentivava a imigração da força de trabalho necessária à lavoura em expansão por meio de financiamentos.

Os grandes latifundiários produtores de café, até então uma classe hegemónica, viram-se obrigados a dividir o poder com a nova clasviram-se burguesa emergente. Em conviram-sequência dessa nova situação, houve lugar a uma reorganização dos aparelhos repressivos do Estado, num processo em que sociedade política assumiu o papel de controladora e organizadora da sociedade civil.

Com o auxílio de certos grupos militares e apoiado pela classe burguesa, Getúlio Vargas assumiu o poder em 1930, implantando, sete anos mais tarde, um regime de traços ditatoriais designado por Estado Novo.

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25 No Brasil, a organização da Administração Pública tem como referência a doutrina administrativa criada, na primeira década do século XX, pelo engenheiro francês Henry Fayol (1978)5. O fayolismo era, segundo os seus propagandistas, uma escola de chefes que dava resposta à necessidade imprescindível da organização de esforços que se manifestou durante a I Grande Guerra Mundial, tendo, daí em diante, adquirido popularidade e conhecido um grande impulso. A Fayol (Coltro, 2005) se deve a criação do Centro de Estudos Administrativos, onde se reuniam semanalmente pessoas interessadas na administração de negócios comerciais, industriais e governamentais.

Para Fayol (1978), toda a administração significa previsão, organização, mando, coordenação e fiscalização. Administrar implica um conjunto de operações levadas a cabo em todas as empresas, sejam públicas ou privadas. As operações são de natureza técnica, comercial, financeira, de segurança e de contabilidade. De acordo com Matias-Pereira (2012), administrar envolve interpretar objetivos a fim de transformar a administração em ação organizacional, por meio de planeamento, de organização e de controlo. A Administração Pública, num sentido amplo, deve ser entendida como todo o sistema de governo, todo o conjunto de ideias, atitudes e normas, processos, instituições e outras formas de conduta humana que determinam a forma de distribuir e de exercer a autoridade política e o modo de dar resposta aos interesses públicos.

Na generalidade, sustenta White (apud Matias-Pereira, 2012, p. 8), “a Administração Pública, abrange todas as operações que têm por propósito a realização ou o cumprimento dos desígnios públicos”. Assim, pode ser percebida como uma estrutura do poder executivo que tem por missão coordenar e implementar as políticas públicas. Configura-se como um conjunto de atividades diretamente destinadas à execução concreta de tarefas consideradas de interesse público ou comum, numa coletividade ou numa organização estatal.

Com a população nativa crescendo e o número de imigrantes aumentando, e sem a necessária preparação para concretizar um processo de desenvolvimento, a dada altura, a Administração Pública brasileira foi confrontada com a necessidade de inserir um novo dado na equação: a política pública.

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A data de publicação citada corresponde à da edição da tradução brasileira consultada. A obra original, com o título Administration Industrielle et Générale, foi publicada, pela primeira vez, em 1916.

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2. 3 POLÍTICAS PÚBLICAS

Numa breve passagem pela bibliografia acerca do compromisso da Gestão Pública com as políticas públicas, verificamos que estas se foram autonomizando, quer na Europa quer nos Estados Unidos, a partir, sobretudo, de meados do século XX. Para tal contribuiu, nomeadamente, o norte-americano Lasswell que, em 1936, publicou a obra Politics - Who Gets What, When, How, onde defende que a ciência política é uma ciência do poder que tem por objeto a conquista e conservação do poder e pode ser entendida como um jogo de soma zero. Facilmente se percebe que Lasswell (1936) introduz na sua argumentação uma nota de ironia em relação ao Estado, quando se interroga sobre quem sai a ganhar e o quê ou quando.

A construção de uma área disciplinar específica, englobando a política pública, no entanto, ocorreu em meados do século passado, com a publicação de The Governmental Process (Truman, 1951) e de Policy Sciences: Recent Developments in Scope and Method (Lasswell & Lerner 1951). O início dos estudos acerca das políticas públicas, no Brasil, deu-se um pouco mais tarde, no final dos anos deu-setenta, princípio dos anos oitenta do século XX.

Na verdade, este novo objeto de ciência foi ganhando expressão devido à influência do mercado capitalista de produção em países centrais cuja classe hegemónica era a burguesia e onde a conceção de modernidade estava associada ao desenvolvimento do capitalismo. Segundo Sousa Santos (2000), o capitalismo tornou-se um vetor de desenvolvimento que ocorreu em três períodos.

O primeiro período corresponde ao do capitalismo liberal, no século XIX; o segundo ao do capitalismo organizado, que atinge o seu ponto alto no período entre as duas guerras e nas duas primeiras décadas do pós-guerra; e o terceiro ao do capitalismo desorganizado, com início nos finais dos anos 60 do século XX, prolongando-se até à atualidade (Sousa Santos, 2000). A caraterização destes três períodos ajuda a perceber e a demonstrar a relação que, na modernidade, se estabeleceu entre poder jurídico e Estado liberal, em que os princípios éticos de ordem jurídica perderam espaço e o Direito positivo potenciou e agilizou os dispositivos da regulação do mercado.

O sistema racional de leis, que emana do Estado, legitima, juridicamente, a Administração Pública. O Direito formal e racional garante a vontade do Estado pensado como agente de vontade e poder. O Direito moderno, de acordo com o pensamento de Weber

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