• Nenhum resultado encontrado

Contratos de Investimento Estrangeiro: Segurança Jurídica como Pressuposto e como Incentivo

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Contratos de Investimento Estrangeiro: Segurança Jurídica como Pressuposto e como Incentivo"

Copied!
42
0
0

Texto

(1)

193

Contratos de Investimento Estrangeiro:

Segurança Jurídica como Pressuposto e como Incentivo

Manoel Gustavo Neubarth Trindade1 Patrícia Fraga2

1

Advogado e Economista, Especialista em Processo Civil pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Mestrando em Direito pela Faculdade de Direito da UFRGS, Vice-Presidente da Comissão Especial de Energia, Mercado de Capitais e Commodities da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Rio Grande do Sul. E-mail: ntrindade@ntrindade.com.br. Endereço Profissional: Rua Padre Chagas, 35, conj. 402, POA/RS/BRASIL – CEP 90570-080. Telefone: (55 51) 9951 14 18

2

Advogada, Especialista em Processo Civil pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Mestranda em Direito pela Faculdade de Direito da UFRGS. E-mail:

patricia.f.fraga@gmail.com. Endereço Profissional: Rua Laurindo, 186/202, Porto Alegre – RS/BRASIL - 90040-140. Telefone: (55 51) 8114 19 41.

Resumo

No presente artigo, buscou-se investigar a temática dos contratos de investimento estrangeiro, assim como identificar os fatores que o induzem e o estimulam, salientando aqueles considerados mais relevantes, nomeadamente à segurança jurídica e os seus desdobramentos, tudo sob o prisma da Análise Econômica do Direito, mediante revisão bibliográfica. Outrossim, pretendeu-se sugerir novas proposições terminológicas e mesmo de classificação, tanto relativamente aos contratos de investimento estrangeiro quanto aos elementos a eles pertinentes, além de se apresentar, ainda que seminalmente, modelo para enfrentar o problema do enforcement das decisões proferidas em âmbito supranacional. Palavras-chave: Investimento Estrangeiro. Contratos. Segurança Jurídica.

Abstract

In this paper, we intended to investigate the issue of foreign investment contracts, and identify the factors that induce and stimulate, highlighting those considered most relevant, namely legal certainty and its ramifications, all through the prism of the Economic Analysis of law. Furthermore, we suggested new proposals about terminology and classification, both in relation to contracts of foreign investment and on the elements relevant to them, and present, although seminal, model to address the problem of enforcement of supranational judgments.

Keywords: Foreign investment. Contracts. Legal Certainty.

(2)

194

1

Introdução

presente artigo possui como escopo investigar a temática dos contratos de investimento estrangeiro. Assim, pretende-se delimitar, definir e classificar o fenômeno em questão, bem como os elementos a ele pertinentes, para então buscar-se identificar quais são os fatores que o induzem e o estimulam, salientando aqueles considerados mais relevantes no âmbito do presente estudo, nomeadamente à segurança jurídica e os seus desdobramentos.

Neste sentido, analisar-se-á também tais elementos considerados de maior relevância, procurando-se revelar quais são as suas características e suas respectivas implicações, assim como por qual canal ou canais e de que forma influenciam na realização dos contratos de investimento estrangeiro, perquirindo acerca das variáveis que podem inibir ou mesmo impossibilitar as suas ocorrências, tudo sob o prisma da Análise Econômica do Direito.3

Ademais, pretendendo-se lançar luzes sobre o tema aqui tratado, sugerir-se-á novas proposições terminológicas e mesmo de classificação, tanto relativamente aos contratos de investimento estrangeiro quanto aos elementos a eles pertinentes, especialmente no que

3 Importante salientar que são consideradas expressões sinônimas “Direito Economia” e “Análise Econômica do

Direito”, tanto na literatura nacional quanto estrangeira, com os seus equivalentes Law and Economics e

Economic Analysis of Law, respectivamente. Entretanto, parte da doutrina vem sustentando ser preferível a

utilização da expressão “Direito e Economia” por ser mais ampla e não transmitir a idéia de redução do Direito a simples objeto de investigação da Economia, até mesmo porque, em realidade, as relações entre estas duas áreas do conhecimento, no âmbito do movimento ao qual aqui nos referimos, são recíprocas. Sobre o tema, interessante e aprofundada distinção entre estas expressões é feita no artigo intitulado Law and Economics versus

Economic Analysis of Law, de autoria de Geoffrey P. Miller, in NYU Law and Economics Research Paper, n.

11-16. Contudo, no Brasil, inclusive por se tratar de abordagem relativamente nova, a expressão “Direito e Economia” ainda não é devidamente associada ao seu respectivo movimento, sendo até mesmo mais utilizada e compreendida a expressão “Análise Econômica do Direito” e mesmo a expressão alienígena Law and

Economics, pelo que, no presente trabalho, ressalvando-se que o entendimento do presente autor é consonante

(3)

195 diz respeito à segurança jurídica, além de se apresentar, ainda que seminalmente, modelo para enfrentar o problema do enforcement das decisões proferidas em âmbito supranacional.

Desta forma, passamos agora, na seção seguinte, a definir o que efetivamente significam contratos de investimento estrangeiro e quais as suas abrangências, especialmente no que diz respeito aos seus aspectos econômicos.

2 Ponderações Conceituais e de Classificação sobre Contratos de

Investimento Estrangeiro e Elementos Afins

nicialmente, importante definir e delimitar, ainda que sucintamente, o conceito de contrato de investimento estrangeiro, sendo que, para tal tarefa, atentaremos para o seu real significado técnico e abrangência em termos econômicos, o que nem sempre coincide com as acepções coloquiais, buscando-se com isto maior precisão terminológica e maior profundidade na análise do fenômeno estudado, bem como de seus componentes. Outrossim, tratando-se de fenômeno complexo, é preciso decompor os elementos que o constituem, igualmente com a finalidade de se obter maior e mais exata compreensão do objeto investigado.

Assim, mandatório esclarecer o significado do termo investimento, em conformidade com a literatura econômica, que consiste na aplicação de recursos (dinheiro ou títulos) em empreendimentos nos quais existe a expectativa de rendimento de juros ou lucros, em geral a longo prazo. Portanto, em sentido amplo, o termo se aplica tanto à compra de máquinas, equipamentos e imóveis para a instalação de unidades produtivas, assim como à compra de

com a idéia de não haver redução do Direito a simples objeto de estudo no âmbito do movimento em questão,

(4)

196 títulos financeiros (letras de câmbio, ações e bond’s). Entretanto, o seu significado técnico é outro, mais restrito, o qual é utilizado em Economia, onde investimento é definido como a aplicação de recursos em bens de capital, ou seja, em meios que levam ao crescimento da capacidade produtiva, como, por exemplo, em instalações, máquinas e meios de trans-porte.4

Já o investimento caracterizado como estrangeiro, por sua vez, é aquele no qual a aquisição de empresas, equipamentos, instalações, estoques ou interesses financeiros de um determinado país dá-se por empresas, governos ou indivíduos de outro ou outros países. No que tange às espécies existentes, o investimento de capital estrangeiro pode ser direto, quando é aplicado na criação de novas empresas ou na participação acionária de empresas já existentes; ou indireto, quando assume a forma de empréstimos e financiamentos, geralmente também a longo prazo.

Quanto à classificação, os investimentos estrangeiros são considerados privados quando realizados por indivíduos ou entidades privadas, geralmente visando a: i) obtenção de maiores taxas de lucro, maiores facilidades fiscais ou legislativas; ii) variações cambiais favoráveis e iii) temor relativo à mudanças políticas ou fiscais no país de origem; ou, entao, governamentais, quando realizados por Estados, entidades governamentais ou empresas

utilizar-se-ão estas últimas expressões.

4 Oportuno também é esclarecer os significados de investimento bruto e líquido, nos seguintes termos:O

investimento bruto corresponde a todos os gastos realizados com bens de capital (máquinas e equipamentos) e formação de estoques. O investimento líquido exclui as despesas com manutenção e reposição de peças, equipamentos e instalações desgastadas pelo uso. Como está mais diretamente ligado à compra de bens de capital e, portanto, à ampliação da capacidade produtiva, o investimento líquido mede com maior precisão o crescimento da economia. Os investimentos realizados na compra de equipamentos e instalações são registrados nas contas nacionais no item "formação de capital fixo" (ou investimento fixo). Os investimentos com capital circulante (formados pelos estoques de produtos finais) compõem o item "variação de estoques". Diferencia-se ainda a formação interna de capital dentro de um país e os investimentos realizados no exterior. Geralmente cada país define o que considera investimento de uma forma específica e que corresponda melhor às suas necessidades econômicas.” In: SANDRONI, Paulo. Novíssimo Dicionário de Economia. 14ª ed. São Paulo: Editora Best Seller, 2004, p. 308/309.

(5)

197 públicas, geralmente em razão de questões políticas, diplomáticas ou militares e, muitas vezes, independentemente da expectativa da obtenção de retornos econômicos, porém ainda assim podem ter a função de equilibrar a balança de pagamentos do país de origem ao longo do tempo.

Assim sendo, com base nas definições técnicas supramencionadas, possível melhor compreender o que efetivamente significam contratos de investimento estrangeiro, os quais, conforme o entendimento aqui adotado, são aqueles destinados à produção de bens ou serviços em determinado país, com recursos oriundos de outro, e não com a simples finalidade de comércio internacional. Portanto, via de regra, tratam-se de feixes de contratos, destinados à realização de empreendimentos em determinado país com capital estrangeiro, de origem pública ou particular.

Ainda neste sentido, muito embora aqui não seja objeto de investigação direta, pertinente mencionar, com a finalidade de proporcionar melhor compreensão do que aqui se sustenta, que os contratos internacionais são considerados, em síntese, de acordo com Timm, Ribeiro e Estrella (2009, p. 53 e seguintes), aqueles que apresentam um ou mais elementos que o conectam a dois ou mais ordenamentos jurídicos, contendo, portanto, um “elemento de estraneidade”, sendo que os principais elementos de conexão constituem a força do domicílio, a nacionalidade, a sede principal dos negócios, o lugar do contrato, o lugar da execução, ou qualquer outra circunstância que exprima uma ligação indicativa de qual Direito, proveniente de qual país, deva ser aplicado no caso concreto.5

5 No mesmo sentido, RECHSTEINER, Bear Walter. Direito Internacional Privado: teoria e prática. 12ª ed. São

Paulo: Saraiva, 2009 e ARAÚJO, Nádia de. Direito Internacional Privado: teoria e prática brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

.

(6)

198 Justamente neste ponto é possível concluir que os contratos de investimento estrangeiro diferenciam-se dos contratos internacionais na medida em que não são os chamados elementos de estraneidade que precipuamente os caracterizam, muito embora possam mesmo existir, mas sim o fato de que os fatores de produção encontram-se no país destinatário dos investimentos, onde é realizada a produção de bens ou serviços, sendo que, entretanto, a origem dos recursos (capital) é estrangeira, os quais, dependendo da legislação do país destinatário, podem vir a tomar a forma jurídica determinada neste território, inclusive eventualmente com a necessidade de constituição de personalidade jurídica própria deste país, pelo que, portanto, podem até mesmo serem considerados uma das espécies de contratos internacionais, mas se distanciam da maior parte dos demais uma vez que não se destinam, específica e diretamente, ao tráfico (comércio) de bens ou serviços, mas sim à própria produção de bens ou serviços em determinado país com recursos de outro, ainda que tais bens ou serviços venham posteriormente a se constituirem objeto do comércio internacional. Em outras palavras, são empreendimentos realizados com investimento estrangeiro, normalmente compostos por feixes de contratos, realizados mediante a alocação direta de recursos provenientes do exterior em um determinado país, ou seja, sujeitos à jurisdição diferente da do país de origem dos recursos e estando, portanto, sob a égide da soberania de outro Estado.

Neste sentido, apresentam maior complexidade do que os demais contratos internacionais, até mesmo porque, em se tratando, na maioria dos casos, da aquisição de bens móveis e imóveis, assim como de contratação de mão-de-obra por parte de um agente econômico estrangeiro em local sujeito à soberania própria, as cortes dos países destinatários dos investimentos avocam para si a competência jurisdicional e,

(7)

199 principalmente, a execução de medidas sancionatórias, aumentando com isto os riscos de apropriação (nacionalização ou outros tipos de apropriação indevida) e, portanto, de incertezas quanto ao retorno dos investimentos.

Nesta senda, na próxima seção abordaremos justamente quais são os elementos responsáveis por ensejar e mesmo estimular a realização de investimentos estrangeiros, o que implica na identificação das variáveis que influem na decisão de investir.

3 Decisão de Investir e Elementos Indutores dos Investimentos

artindo-se das premissas da Teoria das Vantagens Absolutas, de Adam Smith, assim como da Teoria das Vantagens Comparativas, desenvolvida por David Ricardo,6 e indo além, é possível compreender que não só através do comércio, mas cada vez mais através dos investimentos estrangeiros, sobremaneira considerando-se a crescente facilidade de circulação do capital e dos próprios fatores de produção, os recursos destinados à produção de bens e serviços vêm sendo drenados para os países que apresentam as melhores alternativas, isto é, as maiores expectativas de retorno, ainda que

6 A Teoria das Vantagens Absolutas surgiu das idéias do economista Adam Smith, em sua obra "A Riqueza

das Nações", editada em 1776, onde sustentava que a especialização das produções, motivada pela divisão do trabalho, bem como pelas características particulares de cada localidade, acarretariam vantagens para a produção de determinados bens em determinados países, motivo pelo qual as trocas efetuadas através do comércio internacional poderiam aumentar do bem-estar das populações, isto é, cada país deveria concentrar seus esforços na produção dos bens os quais produz a custo mais baixo e trocar o excedente dessa produção por produtos que custem menos em outros países. Já a Teoria das Vantagens Comparativas ou Relativas surgiram do desenvolvimento das idéias de Adam Smith pelo economista inglês David Ricardo, em 1817, na qual defendia que o comércio internacional será vantajoso até mesmo nos casos em que um país possa produzir internamente a custos mais baixos do que o país parceiro, desde que, em termos relativos, as produtividades de cada país fossem relativamente diferentes. Assim, a especialização internacional seria mutuamente vantajosa em todos os casos em que os países parceiros alocassem seus recursos para a produção daqueles bens em que sua eficiência fosse relativamente maior. Ao conduzir à especialização e a divisão internacional do trabalho, seja por desiguais reservas produtivas, por diferenças de solo e de clima ou por desigualdades estruturais de capital e trabalho, o comércio exterior aumentaria a eficiência com que os recursos disponíveis em cada país poderiam ser empregados. E este aumento de eficiência, possível sempre que observadas as vantagens comparativas, elevaria a produção e a renda nos países envolvidos nas trocas.

(8)

200 por motivos circunstanciais e, portanto, eventualmente com caráter temporário, como, por exemplo, em razão do nível de desenvolvimento e a situação política de cada país, o que permite ser alcançada maior eficiência produtiva (em termos de Riqueza Global ou Kaldor-Hicks) e, portanto, níveis mais elevados de bem-estar se, acompanhando este processo7, somarem-se efeitos distributivos.

Todavia, a decisão de se realizar investimentos, inclusive quanto à espécie aqui tratada, isto é, investimentos estrangeiros, leva em consideração, quando efetivamente motivada por aspectos econômicos, a expectativa dos retornos esperados frente aos custos de oportunidade. Neste sentido, importante conhecer-se o significado de Retorno Esperado, que é o valor esperado (a esperança) dos possíveis valores que o retorno de um ativo pode assumir. Nestes termos, o retorno de um ativo é uma variável aleatória, ou seja, não podemos prever com certeza seu valor futuro, pelo que, caso conheçamos a função de probabilidade do retorno do ativo (dessa variável aleatória), poderemos calcular o seu valor esperado.

Oportuno trazer à colação a seguinte definição:

“O valor esperado associado a uma situação incerta corresponde a uma média ponderada dos payoffs ou valores associados a todos os possíveis resultados, sendo as probabilidades de cada resultado utilizadas com o seu respectivo peso. O valor esperado mede a tendência central, isto é, o payoff que, na média, deveríamos esperar que viesse a ocorrer”.8

7 Denominaremos o efeito, que diz respeito ao estímulo e à crescente realização de investimentos estrangeiros

ante a facilidade de circulação do capital e dos fatores de produção, ainda que por motivos circunstanciais e, portanto, eventualmente temporários, como, verbi gratia, em razão do nível de desenvolvimento e a situação política de cada país, de Teoria das Vantagens Comparativas Dinâmicas dos Investimentos Estrangeiros, concepção que será desenvolvida em trabalho próprio.

(9)

201 Outrossim, essencial é conhecimento do conceito de custos de oportunidade, que representam o custo associado à uma determinada escolha medido em termos da melhor oportunidade abdicada em razão da opção escolhida. Em outros termos, o custo de oportunidade representa o valor que os agentes econômicos atribuem à melhor alternativa que renunciam quando efetuam determinada escolha.

Portanto, em regra, realizar-se-ão investimentos em países estrangeiros se as expectativas de retorno forem maiores que os seus custos de oportunidade. Assim, infere-se que a decisão de se realizarem investimentos em outros países depende fundamentalmente do conhecimento da expectativa de retorno deste investimento (empreendimento), para o que, contudo, é imprescindível que seja possível mensurar esta expectativa de retorno. Desta fomra, considerando-se que uma das principais, se não a principal variável para determinar a decisão de se realizar (ou não) determinado investimento estrangeiro são os retornos esperados, constitui-se requisito (pressuposto) para tanto, contudo, que seja viável esta mensuração ou estimação, para então poder-se compará-los com os custos de oportunidade e, então, decidir-se por qual alternativa se constitui a melhor.

Deste modo, é preciso ser investigado quais os elementos que influenciam nos retornos esperados, bem como na possibilidade de sua mensuração, no âmbito dos investimentos estrangeiros.

 Elementos que Influenciam na Expectativa de Retorno e na Possibilidade da Sua Mensuração

Os elementos que influenciam nos retornos esperados, assim como na possibilidade de sua mensuração, podem ser classificados de acordo com a espécie a qual pertencem, os

(10)

202 quais, aqui, para fins didáticos e com o objetivo de facilitar as suas análises, dividiremos em três categorias principais de fatores, de acordo com o maior grau de relação que possuem com cada uma delas, muito embora possam relacionar-se, simultaneamente, com outras categorias de fatores, a saber: econômicos, políticos e jurídicos.

Desse modo, podemos destacar como elementos relacionados mais diretamente a fatores econômicos, as condições de mercado, concernentes à oferta e demanda; as condições de produção, que por sua vez dizem respeito à disponibilidade de recursos de produção, custos de matéria-prima e mão-de-obra, assim como infra-estrutura. Já os elementos mais diretamente relacionados a fatores políticos, muito embora também tenham influência jurídica, temos as políticas fiscais e cambias. Quanto aos elementos mais diretamente relacionados a fatores jurídicos, temos a segurança jurídica, a forma de solução das controvérsias e a qualidade do enforcement das decisões judiciais ou institucionais.

Elementos relacionados mais diretamente a fatores econômicos:

 Condições de Mercado (Oferta e Demanda)

 Condições de Produção (Disponibilidade de Recursos de Produção, Custos de Matéria-Prima e Mão de Obra, Infra-Estrutura)

Elementos relacionados mais diretamente a fatores jurídicos e principalmente políticos:

 Políticas Fiscais e Cambiais

Elementos relacionados mais diretamente a fatores jurídicos:

(11)

203  Forma de Solução das Controvérsias

 Enforcement das Decisões

Contudo, ocorre que, em verdade, parece-nos que o principal elemento a influenciar o retorno esperado dos investimentos estrangeiros, assim como na possibilidade de sua mensuração, é a segurança jurídica, haja vista que os dois itens seguintes, isto é, tanto a forma de solução das controvérsias, quanto à qualidade do enforcement das decisões judiciais ou mesmo institucionais, constituem-se em desdobramentos ou, por assim dizer, subprodutos do primeiro elemento (segurança jurídica), estando pelo mesmo abrangido.

Deste modo, de modo geral, a segurança jurídica, bem como a sua intensidade, no âmbito ao qual está submetido o investimento realizado, é responsável por proporcionar estabilidade e previsibilidade jurídica e econômica, o que veremos mais detalhadamente na seção seguinte, de modo a proporcionar a conformação de mecanismo de incentivos (positivos ou negativos), assim como a função de balizar comportamentos, que o sistema normativo e institucional ao qual está inserido o investimento possui, seja de determinado país ou supranacional, permitindo a realização dos cálculos dos retornos esperados, bem como a redução dos custos de transação9, informação e coordenação e, inclusive, a própria redução dos riscos de perda dos investimentos, circunstâncias estas que também contribuem para o aumento dos retornos esperados.

Outrossim, como salientado, importante reiterar que quanto mais elevado o grau de segurança jurídica verificada na jurisdição sob a qual se encontra o investimento estrangeiro, além de permitir a realização do cálculo dos retornos esperados, igualmente influi nos custos

(12)

204 de transação, reduzindo as despesas com a prospecção de negócios, isto é, dos denominados custos de informação, assim como reduzem os custos de negociação e elaboração dos contratos (custos de contratação). De modo contrário, quanto menor o grau de segurança jurídica, menores os incentivos ao planejamento e à cooperação, comprometendo a eficiência econômica e, sobremaneira na hipótese estudada, especificamente a eficiência produtiva.

Assim, como se vê, que do ponto de vista jurídico, ao nosso entender, a maior contribuição para o estímulo aos investimentos estrangeiros e, portanto, à obtenção de melhorias no bem-estar social, é o fortalecimento da segurança jurídica, o que aprofundaremos com mais vagar na seção seguinte. Outrossim, vale lembrar que este é um dos elementos efetivamente passíveis de alteração, haja vista que principalmente no que tange aos aspectos econômicos que influenciam nas expectativas do retorno esperado não são manipuláveis através da vontade humana direta ou, normalmente, em longo prazo, quiçá constituem-se conseqüência de múltiplos fatores, revelando-se, a bem da verdade, muito mais complexos e de difícil alteração.

Desta forma, por tais motivos, e principalmente por se tratar o presente trabalho de investigação jurídica, ainda que multidisciplinar e sob o prisma da Análise Econômica do Direito, focaremos nossos esforços daqui para frente na questão da segurança jurídica, bem como em seus desdobramentos e, principalmente, em suas conseqüências para o estímulo aos investimentos estrangeiros.

9 Para uma compreensão mais aprofundada da importância da redução dos custos de transação para o

desenvolvimento econômico, ver Douglas North, em: Transaction costs, institutions and economic

(13)

205

4 Quadro Conceitual Vigorante acerca do Princípio da Segurança Jurídica e

Novas Proposições Terminológicas e de Classificação

inda que de modo breve, oportuno precisar algumas ponderações a respeito do significado, da abrangência e da consolidação do princípio da segurança jurídica. Desta forma, pertinente consignar, de acordo com os preclaros estudos do Professor Almiro do Couto e Silva, que “a segurança jurídica é entendida como sendo um conceito ou um princípio jurídico que se ramifica em duas partes, uma de natureza objetiva e outra de natureza subjetiva”10. A natureza objetiva, por sua vez, diz respeito à questão dos limites à retroatividade dos atos do Estado, isto é, à proteção ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada.

A natureza subjetiva, por seu turno, refere-se “à proteção da confiança das pessoas no pertinente aos atos, procedimentos e condutas do Estado, nos mais diferentes aspectos da sua atuação” 11.

Atualmente, no âmbito do direito comparado, a doutrina reconhece a existência de dois princípios diferentes. Neste sentido, fala-se no princípio da segurança jurídica para referir-se aos aspectos relacionados à natureza objetiva, isto é, atinentes à estabilidade das relações jurídicas, enquanto que, por outro lado, remete-se ao princípio da proteção à confiança para designar o aspecto subjetivo, pelo qual se impõe ao Estado limitações na liberdade de modificar os seus atos ou a sua conduta, especialmente quando estes tenham

10 COUTO E SILVA, Almiro do. O Princípio da Segurança Jurídica (Proteção à Confiança) no Direito Público

Brasileiro e o Direito da Administração Pública de Anular seus Próprios Atos Administrativos: o prazo decadencial do art. 54 da lei do processo administrativo da União (Lei nº 9.784/99). Revista Eletrônica de Direito do Estado, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº 2, abril/maio/junho, 2005. Disponível na Internet: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 16 de julho de 2011, p. 3.

11 Idem, ibidem, p. 10.

(14)

206 previamente gerado vantagens aos atingidos, ainda que de modo ilegal, considerando-se, ademais, que a sociedade acredita como legítimos tais comportamentos, além de razoavelmente confiar que os mesmos sejam mantidos.

Assim sendo, oportuno salientar que no direito alemão e por sua influência também no direito comunitário europeu, o princípio da segurança jurídica, ou a simples expressão segurança jurídica, geralmente designa a parte objetiva do conceito, enquanto que a parte subjetiva do conceito é identificada, no direito germânico, pela expressão proteção à confiança ou princípio da proteção à confiança e, no direito comunitário europeu, denominada de proteção à confiança legítima ou princípio da proteção à confiança legítima.

Na Alemanha, onde se originou o princípio da proteção à confiança, através de construção jurisprudencial e com auxílio da doutrina, o mesmo se dirige preponderantemente às questões de preservação dos atos inválidos, mesmo que nulos de pleno direito, seja por ilegalidade ou por inconstitucionalidade, bem como quanto à preservação dos seus efeitos, quando indiscutível a boa-fé daqueles atingidos pelos mesmos. Notório que os atos do Poder Público gozam de presunção de legalidade e aparência de legitimidade, o que em inúmeros casos justifica a sua conservação, ainda que eivados de vícios capazes de acarretar as suas destituições. Vale pontuar que o direito, na verdade, protege a confiança gerada nos indivíduos, justamente em razão da presunção de legalidade e da aparência de legitimidade dos atos do Poder Público, e não visa a proteger propriamente a simples presunção e aparência em si.12

12 Oportunas são as ponderações de Torsten Stein, “O conceito de ‘segurança jurídica’ é considerado conquista

especial do Estado de Direito. Sua função é a de proteger o indivíduo de atos arbitrários do poder estatal, já que as intervenções do Estado nos direitos do cidadão podem ser muito pesadas e, às vezes, injustas. No entanto, se tais intervenções têm base em lei e visam o bem-estar público, será preciso decidir-se pela avaliação conjunta do interesse coletivo e do interesse particular afetado para se aferir a juridicidade (conformação ao direito) da

(15)

207 De modo análogo, oportuno mencionar que no âmbito do direito privado, ainda em processo de sedimentação, há a teoria da aparência, que semelhantemente serve para tutelar interesses os quais, muito embora não estejam alicerçados em atos jurídicos constituídos de modo perfeito ou regular, revelam-se dignos de receber guarida, em virtude da aparente legitimidade que externam e das conseqüentes expectativas geradas nos indivíduos atingidos pelos mesmos.

Importante referir que o princípio da proteção à confiança, nas últimas décadas do século XX, ganhou autonomia e cada vez mais relevo, especialmente na Europa, onde teve sua maior acolhida. Neste sentido, oportuno salientar que tal princípio autonomamente começou a se sedimentar sobremaneira na Alemanha, a partir de decisão do Superior Tribunal Administrativo de Berlim, em 14 de novembro de 1956, seguida por julgado do Tribunal Administrativo Federal, de 15 de outubro de 1957, sucedendo-se manifestações jurisprudenciais neste sentido. Ainda, na década 70, o Tribunal Federal Constitucional Alemão reconheceu o princípio da proteção à confiança como princípio de valor constitucional.

Simultaneamente, no âmbito do direito da União Européia, a denominação adotada foi princípio da proteção à confiança legítima, permeando seus efeitos “tanto no vasto domínio da regulamentação econômica, como no da restituição de subvenção do Estado irregularmente concedida, como no da função pública comunitária”13, afirmando-se nas

medida estatal. Esse princípio é freqüentemente denominado ‘princípio da proporcionalidade’.

Para proteger os direitos do indivíduo, o princípio da segurança jurídica começa a atuar já quando dessa avaliação do bem-estar público e do interesse particular, exigindo-se antes de mais nada que essa intervenção do Estado seja previsível pelo cidadão. Portanto, a ação estatal deve estar sujeita a determinadas regras. Somente assim, o particular pode adequar sua conduta dentro do Estado, de modo a prever as intervenções ou atenuá-las”.

In: A segurança jurídica na ordem legal da República Federal da Alemanha. In: Cadernos Adenauer 3: Acesso à

justiça e cidadania. São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, maio 2000, p. 93/117.

13 CALMES, Sylvia. Du Principe de Protetion de la Confiance Légitime en Droit Allemand, Communautaire et Français. Paris, Dalloz, 2001, p. 16 e ss.

(16)

208 decisões da Corte de Justiça das Comunidades Européias como regra superior de direito e princípio fundamental do direito comunitário.

Os atuais temas dominantes acerca do princípio da segurança jurídica e da proteção à confiança, no direito comparado e no direito brasileiro, podem ser agrupados nos seguintes pontos14:

“a) a manutenção no mundo jurídico de atos administrativos inválidos por ilegais ou inconstitucionais (p. ex. licenças, autorizações, subvenções, atos pertinentes a servidores públicos, tais como vencimentos e proventos, ou de seus dependentes, p. ex. pensões, etc.);

b) a responsabilidade do Estado pelas promessas firmes feitas por seus agentes, notadamente em atos relacionados com o planejamento econômico;

c) a responsabilidade pré-negocial do Estado;

d) o dever do Estado de estabelecer regras transitórias em razão de bruscas mudanças introduzidas no regime jurídico (p. ex. da ordem econômica, do exercício de profissões, dos servidores públicos)”.

Conforme sustenta grande parte da doutrina, o princípio da segurança jurídica está intimamente ligado à concepção do Estado Democrático de Direito, dele fazendo parte e se originando. Nesse sentido é o que salienta Almiro do Couto e Silva:

“O ponto de partida, porém, para a correta interpretação e aplicação desse preceito está em que a segurança jurídica é um valor constitucional que se qualifica como subprincípio do princípio maior do Estado de Direito, ao lado e no mesmo nível hierárquico do outro subprincípio do Estado de Direito, que é o da legalidade. Segurança jurídica

14COUTO E SILVA, Almiro do. O Princípio da Segurança Jurídica (Proteção à Confiança) no Direito Público

Brasileiro e o Direito da Administração Pública de Anular seus Próprios Atos Administrativos: o prazo decadencial do art. 54 da lei do processo administrativo da União (Lei nº 9.784/99). Revista Eletrônica de Direito do Estado, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº 2, abril/maio/junho, 2005. Disponível na Internet: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 16 de julho de 2011, p. 8.

(17)

209

e legalidade são, sabidamente, os dois pilares de sustentação do Estado de Direito”.15

Também sobre este ângulo, oportuno é o magistério de Hans-Uwe Erichsen:

“O princípio da legalidade da Administração é apenas um dentre os vários elementos do princípio do Estado de Direito. Esse princípio contém, igualmente, o postulado da segurança jurídica (Rechtssicherheit und Rechtsfriedens) do qual se extrai a idéia da proteção à confiança. Legalidade e segurança jurídica enquanto derivações do princípio do Estado de Direito têm o mesmo valor e a mesma hierarquia. Disso resulta que uma solução adequada para o caso concreto depende de um juízo de ponderação que leve em conta todas as circunstâncias que caracterizam a situação singular”.16

Como visto, o princípio da segurança jurídica (referindo-se ao conceito amplo, isto é, de modo a abarcar as suas ramificações) já teve grande período de maturação e, conseqüentemente, deveras aprimoramento. Contudo, necessário ainda é mais aprofundar o seu estudo, bem como compreender as conseqüências do seu respeito, assim como de sua inobservância.

 Novas Proposições Terminológicas e de Classificação

Sem pretender substituir as proposições vigorantes, bem como de forma modesta, considerando tanto o acerto e consolidação dos entendimentos vigentes, como a compreensão das limitações do presente trabalho, pretende-se ponderar, ainda que de modo deveras sucinto, nova proposição conceitual e terminológica, sugerindo-se, outrossim,

15 Idem, ibidem, p. 11.

16 Hans-Uwe Erichsen e Wolfgang Martens. Allgemeines Verwaltungsrecht. 6ª ed. Berlim - New York, p. 240, apud MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 261.

(18)

210 conseqüente nova classificação da temática, quiçá com reflexos no que tange aos seus aspectos substanciais.

Assim, à semelhança da divisão do princípio da segurança jurídica em duas naturezas ou aspectos - objetiva e subjetiva - ora também se sugere a bifurcação do conceito, porém em duas dimensões, isto é, no caráter negativo, assim como no caráter positivo do princípio da segurança jurídica.

Neste sentido, primeiramente, diga-se que o caráter negativo refere-se às limitações impostas ao Estado, ou seja, às proibições de ofensa ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido, à coisa julgada e as limitações à retroatividade de modo geral, coincidindo, dessa forma, com a natureza objetiva que a doutrina atualmente convenciona denominar.

Desta forma, como é intuitivo, tal compreensão e nomenclatura se justificam vez que dizem respeito às imposições negativas ao Estado, aos comandos de limitações, aos impedimentos e não-fazeres, ainda que de modo indireto, presumindo comportamento passivo ou um omitir-se do Estado. Neste sentido, ao Estado não é exigida uma ação, mas sim uma omissão ou não fazer, analogamente mais ligado às limitações de atuação do Estado por conta e em consonância com os ideais de cunho liberal.

De outro lado, o caráter positivo do princípio da segurança jurídica diz respeito a exigências de perfil ativo, isto é, está por exigir atuação positiva, comissiva ou mesmo interventiva por parte do Estado, ainda que relacionadas tão somente a atividades de fiscalização e regulação, de modo a garantir ambiente ou cenário de previsibilidade, além de ofertar, ainda que minimamente, direitos e valores os quais a sociedade ou seus representantes elegem como importantes e os reivindicam, condizentes com cada época e que na atualidade, verbi gratia, estão a exigir do Estado novamente maior participação, a fim

(19)

211 de assegurar condições mínimas à população, muito talvez em resposta ao processo de arrefecimento do neoliberalismo verificado a partir do final do século XX.

Nesta senda, aliás, o chamado Estado Constitucional inclusive parece exigir a observância e compreensão do caráter positivo do princípio da segurança jurídica, porquanto reclama do Estado a sua atuação, a fim de garantir direitos e valores, ainda que de forma básica, à sociedade.

Nesta esteira, ademais, o caráter positivo estaria por compreender a exigência feita ao Estado do fornecimento de ambiente previsível, de modo a conformar adequado mecanismo de incentivos, facilitando, sugerindo ou mesmo induzindo, ainda que não obrigando, o comportamento eficiente17 dos agentes econômicos, aí entendidos a sociedade de modo geral e, inclusive, os agentes estatais.

Vale dizer, ainda, que muito embora hajam sobreposições e intersecções dos seus substratos, o caráter negativo da segurança jurídica estaria mais atrelado ao ônus de proporcionar estabilidade às relações jurídicas entre o Estado e os indivíduos (ou mesmo entre instituições supranacionais ou ambientes onde exista circulações econômica internacional e os agentes econômicos, estrangeiros ou não) estas reciprocamente entendidas, bem como, importante referir, entre particulares, ou seja, voltado ao fornecimento de ambiente estável, de forma a impedir a imposição de prejuízos a investimentos já realizados ou em curso, pelo que fala a situações presentes.18

17 Esclareça-se que o termo eficiente aqui se refere, precipuamente, ao aspecto econômico, isto é, a eficiência

econômica.

18 Neste sentido, interessante são as ponderações acerca da perspectiva dinâmica e intertemporal da segurança

jurídica, tanto em relação ao passado (imutabilidade vs. confiabilidade), como em relação ao futuro (previsibilidade vs. calculabilidade), realizadas por Humberto Ávila, em sua obra Segurança Jurídica: Entre Permanência, Mudança e Realização no Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 124/125.

(20)

212 O caráter positivo, por sua vez, relaciona-se mais contundentemente, embora não exclua a estabilidade, até mesmo porque difícil precisar e diferenciar as relações de causa e efeito (conseqüência) aí existentes, às condições de previsibilidade, de modo a permitir maior e melhor planejamento e coordenação pelos e entre os agentes privados e públicos, ou seja, voltado ao fornecimento de ambiente previsível, de modo a não inibir ou desestimular a realização de investimentos, pelo que fala a situações futuras.

Neste ponto justamente se verifica o ensejamento da estimação das expectativas de retorno dos investimentos que se pretendam realizar, em outros termos, a previsibilidade, da qual nos parece que o caráter positivo do princípio da segurança jurídica seja pressuposto, é responsável por viabilizar a realização do cálculo dos retornos esperados, o que sem ela não seria possível, bem como também contribui para a própria elevação dos retornos esperados, de modo a estimular a realização dos investimentos.

De qualquer forma, importante esclarecer que, evidentemente, o fortalecimento de uma das dimensões do princípio da segurança jurídica também restará por fortalecer a outra, porquanto consubstanciam-se em relações recíprocas de causa e efeito, que se reforçam e se retroalimentam, ou seja, em última instância, a estabilidade acaba por gerar previsibilidade, enquanto que a previsibilidade resta por proporcionar estabilidade.

Oportuno mencionar, que de modo análogo, Canotilho19 divide a segurança jurídica em dois conceitos, a saber: a estabilidade, ou eficácia ex post da segurança jurídica e a previsibilidade, ou eficácia ex ante da segurança jurídica.

Por fim, esclareça-se que o caráter negativo também está por abranger, pelo menos parte, da natureza subjetiva atualmente referida, conquanto igualmente diz respeito ao

(21)

213 impedimento da alteração de comportamentos ou atos capazes de ensejar confiança legítima e, portanto, compreendidas e dignas de amparo pelo princípio da proteção à confiança legítima, o que já permite observar as diferenças entre a terminologia e classificação vigorantes e as novas proposições aqui realizadas.

Portanto, anota-se que o caráter negativo do princípio da segurança jurídica abrange tanto a natureza objetiva quanto parte da natureza subjetiva, esta no que se refere ao impedimento de alterar atos ou comportamentos responsáveis por gerar confiança legítima nos indivíduos e, assim, dignas de proteção, o que implica, preponderantemente, na formação de ambiente estável.

Já o caráter positivo, por sua vez, provê nova e mais abrangente compreensão sobre o princípio da segurança jurídica, ampliando a extensão de seus efeitos e exigindo mais intensamente a sua maior observância, vez que demanda o fornecimento de ambiente previsível para os agentes.

Conseqüentemente, ainda mais exaltada é a importância do princípio da segurança jurídica, quiçá conferindo-lhe autonomia e independência, desligando-se em parte do entendimento de que seria subprincípio do Estado de Direito, para então postar-se ao lado do mesmo20.

20 A justificativa para tal entendimento se legitima na medida de que a segurança jurídica pode, em tese, fazer-se

presente ainda que em um contexto externo ao Estado de Direito, mas sim em qualquer relação em que é possível verificar-se intercâmbio e trocas (comércio), bem como a própria aquisição de bens capital e realização de empreendimentos geradores de produção (investimentos) por agentes estrangeiros.

(22)

214

5 Segurança Jurídica como Requisito para a Eficiência: A Teoria dos Jogos e o

Caráter de Bem Público do Princípio

princípio da segurança jurídica certamente exerce papel de suma importância para a implementação, desenvolvimento e consolidação dos processos de integração, assim como para o alcance de eficiência nestes contextos, sobremaneira quando analisados sob o prisma da Análise Econômica do Direito.

Desta forma, conforme abordado na seção anterior, o caráter negativo da segurança jurídica seria responsável por proporcionar estabilidade, sendo o caráter positivo, por sua vez, importante para o provimento de previsibilidade, sendo que ambos considerados conjuntamente restariam por consubstanciar sistema de incentivos apto a estimular as trocas e o intercâmbio, portanto, incentivando a cooperação e a integração e, em sua instância mais desenvolvida, a própria realização de investimentos estrangeiros, isto é, a própria circulação internacional de capital com a finalidade de produzirem-se bens ou serviços em países diferentes da origem dos recursos, implicando, portanto, na aquisição de bens de capital (móveis e imóveis) e na contratação de mão-de-obra no país destinatário.

Interessante analisar as balizadas palavras de Canotilho sob este enfoque, pelo que pertine trascrever a passagem a seguir:

“O homem necessita de segurança para conduzir, planificar e conformar autônoma e responsavelmente a sua vida. Por isso, desde cedo se consideravam os princípios da segurança jurídica e da proteção à confiança como elementos constitutivos do Estado de Direito. Estes dois princípios — segurança jurídica e proteção da confiança — andam estreitamente associados, a ponto de alguns autores considerarem o princípio da proteção de confiança como um subprincípio ou como uma

(23)

215

dimensão específica da segurança jurídica. Em geral, considera-se que a segurança jurídica está conexionada com elementos objetivos da ordem jurídica — garantia de estabilidade jurídica, segurança de orientação e realização do direito — enquanto a proteção da confiança se prende mais com as componentes subjectivas da segurança, designadamente a calculabilidade e previsibilidade dos indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos actos”.21

Neste sentido, sustenta-se que o princípio da segurança é requisito fundamental para a realização de investimentos estrangeiros e mesmo para os processos de integração, ou pelo menos, variável explicativa com forte poder determinante no grau de êxito destas espécies de fenômenos, sendo, outrossim, importante requisito para que a eficiência econômica possa ser alcançada, permitindo aos agentes econômicos, sobremaneira em razão da previsibilidade, estabilidade e uniformidade daí decorrentes, planejar, coordenar, cooperar e ajustar as suas condutas entre si, de modo a atingir níveis mais elevados de trocas e produtividade e, por conseguinte, de eficiência.

Não obstante, oportuno valermo-nos da metodologia da Teoria dos Jogos, que é um ramo da matemática atualmente muito utilizada nos estudos de Análise Econômica do Direito, onde se examina o comportamento estratégico dos agentes em situações de interação e que leva em consideração os comportamentos esperado dos demais agentes (ou também denominados jogadores), objetivando a obtenção dos maiores retornos, que é o cenário em que justamente se encontram os investidores na busca de onde alocarem seus recursos.

21 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2000. p.

(24)

216 Assim, muito embora não se pretenda examinar detidamente a temática sob este método, importante salientar algumas relevantes e já consolidadas conclusões, que são perfeitamente aplicáveis ao tema aqui investigado, especialmente no que diz respeito à importância da previsibilidade, a fim de estimular a interação e realização de investimentos.

Ainda nesta senda, possível compreender a segurança jurídica como curial requisito para a reciprocidade, o que pode ser constatado também através do manejo do instrumental da Teoria dos Jogos22 aplicada ao estudo dos processos de integração, como forma de ensejar uniformidade, isonomia e equidade entre os comportamentos e condutas demonstrados entre os Estados-Membros e, inclusive, entre particulares de diferentes nacionalidades.

Sendo assim, interessante são as ponderações de COOTER e ULEN, pelo que vale transcrevê-las:

“Podemos usar o dilema do prisioneiro para expor outro conceito fundamental da teoria dos jogos - os jogos repetidos. Suponha que o dilema do prisioneiro fosse jogado não apenas uma vez, mas várias vezes pelos mesmos jogadores. Isso mudaria nossa análise do jogo? Se os mesmos jogadores jogam o mesmo jogo de acordo com as mesmas regras repetidamente, é possível que surja cooperação e os jogadores tenham um incentivo para estabelecer uma reputação - neste caso, de confiabilidade.

Algo importante de se saber a respeito de um jogo repetido é se o jogo será repetido um número fixo de vezes ou um número indefinido. Para perceber a diferença, suponha que o dilema dos prisioneiros fosse repetido exatamente dez vezes. A estratégia ótima de cada jogador precisa ser levada em consideração agora em todos os jogos, e não apenas em um jogo de uma vez. Imagine o Suspeito 2 refletindo, antes de o primeiro jogo ser jogado, sobre qual estratégia ele deveria seguir em cada jogo. Poderia

22 Para aprofundamento do estudo da Teoria dos Jogos e cooperação, AXELROD, Robert. The Evolution of Cooperation, 1984.

(25)

217

imaginar que ele e seu parceiro, se fossem pegos após cada crime, irão aprender (ou acordar) a ficar calados, e a não confessar. Mas então o Suspeito 2 pensa no último jogo, o décimo. Mesmo que os jogadores tivessem aprendido (ou acordado) a ficar calados até o Jogo 9, as coisas serão diferentes no Jogo 10. Visto que esta é a última vez que o jogo será jogado, o Suspeito 1 tem um forte incentivo para confessar. Se ele confessar no último jogo e o Suspeito 2 se ativer ao acordo de não confessar, este ficará 7 anos na prisão contra o meio ano do Suspeito 1. Sabendo que ele tem esse incentivo para não manter um acordo de não confessar no último jogo, a melhor estratégia para o Suspeito 2 também é confessar no jogo final. Mas agora o Jogo 9 se torna, em certo sentido, o último jogo. E, ao decidir a respeito da estratégia ótima para esse jogo, aplica-se exatamente a mesma lógica que se aplicou ao Jogo 10 - ambos os jogadores irão confessar no Jogo 9 também. O Suspeito 1 também pode fazer esse raciocínio e se dar conta de que a melhor coisa a fazer é confessar no Jogo 8, e assim por diante. Na terminologia da teoria dos jogos, o jogo se desenvolve de tal modo que a confissão é feita por cada jogador a cada vez que o jogo é jogado, se ele for jogado um número fixo de vezes.

As coisas podem ser diferentes se o jogo for repetido um número indefinido de vezes.

Nessas circunstâncias, poderá haver uma indução à cooperação. Robert Axelrod mostrou que, num jogo como o dilema dos prisioneiros repetido um número indefinido de vezes, a estratégia ótima é (olho por olho) - se o outro parceiro cooperou na última rodada, você coopera nesta rodada; se ele não cooperou na última rodada, você não coopera nesta rodada”.23

Portanto, conforme é possível inferir das ponderações supra transcritas, um cenário de segurança jurídica pode se desenvolver quando os participantes de determinada

(26)

218 comunidade (ou mercado) estão preocupados com as suas reputações, o que induz à cooperação24 e, portanto, à eficiência.

Ainda neste contexto, pertinente ponderar que tanto o comércio internacional, assim como os investimentos estrangeiros, tratam-se de jogos do tipo repetido25 e não-competitivo26, o que torna necessário que haja previsibilidade e uniformidade, a fim de que os agentes sejam induzidos a cooperar, ensejando maior produção de riquezas.

Outrossim, considerando que em se tratando de jogos repetidos, as relações caracterizam-se por serem mais duradouras ou, ao menos, pela reiteração da prática de atos por ambas as partes envolvidas, de modo recíproco, o permite, caso uma das partes haja com deslealdade, o surgimento de atos de retaliação e, igualmente, a criação de reputação. Portanto, uma das soluções freqüentemente apontadas na Teoria dos Jogos é que sejam criados mecanismos que garantam o comprometimento dos agentes com as estratégias ou intenções pré-concebidas e reveladas à contraparte, até mesmo porque os atos das partes (jogadas), na maioria das vezes, não são simultâneos (seqüenciais).

24 Ainda sobre a temática, pertinente as seguintes observações: “Essas considerações de um número fixo versus

um número indefinido de rodadas de um jogo talvez pareçam distantes das preocupações do direito, mas na verdade não estão. Pense, por exemplo, nas relações entre um credor e um devedor. Quando os negócios do devedor estão indo bem, as relações creditícias entre o credor e o devedor poderão ser análogas a um jogo jogado um número indefinido de vezes. Mas se é provável que o devedor vá ficar insolvente em breve, as relações entre o devedor e o credor se tornam muito mais parecidas a um jogo jogado um número fixo (e, talvez, reduzido) de vezes. Em decorrência disso, a confiança e cooperação entre as partes poderão sucumbir: o devedor tenta esconder seus ativos e o credor tenta se apoderar deles para revendê-los e reaver seu prejuízo.”, Idem, ibidem, p. 59.

25 Jogos repetidos são àqueles nos quais os jogadores jogam mais de uma rodada, isto é, criam uma relação, pelo

que faz sentido em se falar da importância de criação de reputação e credibilidade.

26 Não-Competitivo no sentido que lhe é dado na Teoria dos Jogos, vez que, no caso, a cooperação é mais

eficiente do que a não-cooperaçao, vez que em se tratando de jogos que não se caracterizam por serem de soma zero, isto é, o que uma parte ganha não necessariamente é resultado da apropriação de uma perda correspondente e proporcional da contraparte, permite que sejam alcançados níveis mais elevados de eficiência econômica, justamente por meio desta cooperação.

(27)

219 Ainda neste sentido, conforme consolidado na literatura de Análise Econômica do Direito, é através da negociação que se supõe que os indivíduos possam, em regra, maximizar as suas utilidades, na busca de níveis mais elevados de bem-estar27.

Quanto ao tema, o Teorema de Coase (1960) nos informa que em não havendo custos de transação, a negociação maximiza a eficiência, ou seja, a liberdade de contratação e investimentos maximiza a riqueza total. Entretanto, certo é que, em realidade, toda a negociação envolve custos e riscos, o que implica perquirir sobre a adequada medida de negociação e exposição frente aos riscos, de forma a otimizar a eficiência alocativa dos recursos e maximizar os excedentes, o que tanto é ressaltado pelos argumentos acima referenciados, como pelos que passamos ora a analisar.

Assim, imperioso também mencionar que a segurança jurídica, sobremaneira no que tange ao seu caráter positivo, já antes mencionado, possui características de bem público28, de acordo com conceito já bem consolidado na Ciência Econômica, sendo pertinente trazer à liça, de modo sucinto, além deste significado, breves reflexões, que podem revelar importantes subsídios para o tema em apreço, com relevante potencial propositivo.

Primeiramente, como é axiomático, registre-se que os bens públicos são aqueles ofertados pelo Estado (ou instituição transindividual) em benefício da população (coletividade), não sendo destinados (ou apropriados), pelo menos em princípio, a apenas um indivíduo ou agente em específico. Saliente-se que para a Economia o conceito de bem

27Segundo Cooter e Ulen (2010, Cap. 6), os acordos alcançados sob custos de transação nulos esgotam o excedente resultante da cooperação, como exige a eficiência. Para maior aprofundamento, ver Coase (1960). 28 Sobre o caráter de bem público da jurisdição e da legislação, respectivamente, TIMM, Luciano Benetti; NEUBARTH TRINDADE, Manoel Gustavo. As Recentes Alterações Legislativas sobre Recursos aos Tribunais Superiores: a repercussão geral e os processos repetitivos sob a ótica da Law and Economics. Revista de Processo (RePro), 178, dezembro de 2009; e CARVALHO, Cristiano; NEUBARTH TRINDADE, Manoel Gustavo. The Overcoming of Legal Rules in the Judges' Decision-Making: a Maximizing Model. UC Berkeley:

Berkeley Program in Law and Economics. Disponível em: <http://escholarship.org/uc/item/4h7508fp> Acesso

(28)

220 público difere substancialmente daquele encontrado no Direito, especialmente no ramo Administrativo.

De acordo com Varian (2006), o consumo dos bens públicos pode ser feito simultaneamente por vários indivíduos, sem que haja aumento considerável, pelo menos em tese, dos seus custos29, o que também ocorre com o “consumo” da segurança jurídica, sobremaneira quando considerada como infra-estrutura jurídico-legal.

Portanto, o custo da produção de bem passível de ser utilizado pela coletividade não é superior àquele verificado quando o bem é destinado a apenas um individuo. Em outras palavras, o acréscimo de custo decorrente pela utilização de mais de um indivíduo é nulo (custo marginal igual a zero ou próximo disso).

Outrossim, conforme Pindyck e Rubinfeld (2006), atribui-se aos bens públicos características como a rivalidade e a excluibilidade. Um bem cujo consumo é não-rival pode ser consumido por diversas pessoas ao mesmo tempo, sendo exemplo clássico na literatura econômica a segurança nacional. Por seu turno, um bem cujo consumo é não-excluível significa que não é possível impedir ou restringir o seu consumo pelos indivíduos, muito embora possam ser criados meios de fazê-lo, como, por exemplo, pelo preço, pela autoridade ou pela ordem de chegada, entre outros.

Todavia, em razão da impossibilidade da adequada captura por parte dos agentes econômicos dos benefícios de sua produção (como, por exemplo, do lucro), o mercado não os oferta devidamente, gerando ineficiências, tanto na atividade social, como em termos de crescimento econômico. Neste tocante, o que, saliente-se, é deveras perceptível através da Teoria dos Jogos, em não havendo cooperação, não haverá estímulos para que os agentes

(29)

221 econômicos isoladamente venham a instituir um ambiente de segurança jurídica ou observar tais ditames, uma vez que buscarão individualmente os melhores resultados para si em cada situação, isto é, estarão mais propensos a apresentarem comportamentos oportunistas, circunstância esta, todavia, que não é a mais eficiente.

De outro lado, o conceito de externalidades, também denominadas economias ou deseconomias externas, são efeitos positivos ou negativos gerados por atividades de produção ou consumo exercidas por determinados agentes, que acabam por atingir outros indivíduos, sem que haja a participação direta destes.

As externalidades são denominadas negativas quando geram prejuízos (como custos) para os demais agentes. De outro modo, as externalidades podem ser positivas quando os demais agentes, involuntariamente, são beneficiados, a exemplo dos investimentos

governamentais em infra-estrutura e mesmo de instituições supranacionais30.

Nesta senda, compreende-se que os bens públicos são responsáveis por irradiar externalidades, vez que principalmente a oferta dos mesmos por parte do Estado ou instituições supranacionais é responsável por atingir a sociedade ou o mercado de modo geral. Assim, em razão de suas características, os bens públicos oferecem externalidades positivas, pois implicam na distribuição involuntária dos seus benefícios.

Neste contexto, podemos identificar o caráter de bem público que a segurança jurídica possui, atingindo não só aqueles diretamente envolvidos em processos de interação e conflito já estabelecidos, mas também a todos aqueles que estejam em situações análogas ou que potencialmente possam vir a assim se encontrar, vez que adaptam seus

29 Vale ressaltar que os custos legislativos e normativos não são alterados pela extensão da população atingida

pelos regramentos editados.

(30)

222 comportamentos às expectativas de resposta e solução observadas na realidade vivenciada. No mesmo sentido, deve ser salientado que a segurança jurídica influi, consistentemente, nos custos de transação e na assimetria de informação e, portanto, na eficiência social e econômica.

Desta forma, compreende-se o caráter de bem público da segurança jurídica, a qual necessita incorporar as características acima elencadas, a fim de exercer, com plenitude, as suas principais funções. Portanto, é justamente o caráter de bem público da segurança jurídica que permite o adequado funcionamento do sistema de incentivos que a mesma assegura, garantindo mecanismos que tanto podem estimular os comportamentos almejados, quanto inibir as condutas consideradas inadequadas e prejudiciais ao bem comum (ineficiente, como diriam os economistas).

Assim, certo é que o desrespeito à segurança jurídica faz com que seja esmaecido o seu caráter de bem público, comprometendo sobremaneira as relações internacionais, de modo a enfraquecer o seu poder de influenciar comportamentos e, assim, gerando

ineficiências. Por exemplo, a não observância e efetivação31 das normas pelos seus

destinatários, aqui considerados em contextos de realização de investimentos internacionais, sobremaneira considerando a falta de mecanismos de impositivos ou sancionatórios, faz com que, em última instância, as próprias normas, internas ou internacionais, percam as suas finalidades, destituindo-as de suas funções de orientar o

comportamento social32. Em alguns casos, até mesmo, pode ocorrer que os estímulos se

31 Em outros termos, cumprimento, observância ou enforcement.

32 Analogamente aplicável à concepção aqui defendida, especialmente quando ao tema da segurança jurídica e as

normas, ver ÁVILA, Humberto Bergmann. Princípios e regras e a segurança jurídica. In: Revista de Direito do Estado. Rio de Janeiro: Ano 1, n. 1, (jan./mar. 2006), p. 189-206.

(31)

223 tornem contrários àqueles pretendidos, somado ao fato de acrescerem os custos de transação (informação e contratação).

De outro ângulo, quanto menor for a segurança jurídica, mais riscos haverão ao se realizarem investimentos em países alienígenas, porquanto os custos e benefícios esperados

tornam-se difíceis de avaliar.33 Desta forma, dependendo do grau de insegurança jurídica

constatada, é muito provável que os investimentos sejam reduzidos, o que usualmente se verifica e, em situações extremadas, até mesmo podem acarretar a absoluta não realização

de investimentos.34

Exemplificando, considerando um contexto onde os direitos de propriedade não estejam devidamente garantidos, ou então quando os custos de transação possam ser aumentados de forma inesperada ou abrupta, os investidores poderão limitar o uso do capital ou aumentar o preço da recompensa (juros ou lucros esperados) pela utilização de

33 Neste sentido, NONNENBERG, Marcelo José Braga; MENDONÇA, Mário Jorge Cardoso de. Determinantes

dos Investimentos Externos Direitos em Países em Desenvolvimento. São Paulo: Est. Econ., 35(4): 631-655, out-dez 2005.

34 Quanto à importância de se considerar os riscos dos investimentos, interessante salientar o que pontua Victorio

Oxilia: “Outro aspecto a ser analisado, complementando o enfoque que desenvolvemos sobre as condições jurídicas e institucionais do setor energético no Mercosul, diz respeito ao ambiente geral de investimentos na região. Isto porque os investimentos em infra-estrutura - como é o caso da energia - precisam, pelo fato de serem intensivos em capital, um exato dimensionamento dos riscos e incertezas presentes no ciclo dos projetos. É interessante notar que o Tratado de Assunção que deu origem ao Mercosul foi assinado em 1991, coincidindo - com um pequeno período de diferença no caso do Brasil e do Uruguai - com o período das reformas estruturais que se deram no setor energético da maior parte dos países do bloco econômico. Com efeito, um dos principais objetivos dos países nessa época era a atração do investimento externo. No próprio preâmbulo do Tratado de Assunção se menciona que a ‘ampliação das atuais dimensões de seus mercados nacionais através da integração constitui condição fundamental para acelerar seus processos de desenvolvimento econômico com justiça social. Para o cumprimento desse objetivo superior, os governos estavam cientes da necessidade de incentivar e estimular o ingresso dos capitais externos, eliminando as barreiras à sua entrada e dando ao capital estrangeiro o mesmo tratamento que é dado ao capital nacional. A proteção dos investimentos, na visão de Ricardo Thomazinho da CUNHA, visa garantir os investidores contra os chamados riscos políticos. Os riscos políticos, identificados por Dominique CARREAU, são essencialmente: a) os riscos de ruptura do contrato de investimento pelo país receptor do investimento; b) o risco de guerras externas ou revoluções internas que produzam efeitos no território do país que recebe o investimento; c) os riscos de inconversibilidade e intransferi-bilidade dos recursos investidos, em virtude de medidas tomadas pelo país receptor do investimento; e d) os riscos de nacionalização e desapropriação dos investimentos”, in: OXILIA, Victorio. A integração dos mercados de energia no Mercosul: uma abordagem desde o Direito da Integração Econômica. In: CASELA, Paulo Borba; VIEGAS LIQUIDATO, Vera Lúcia (coord.) – Direito da Integração. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 373.

(32)

224 seus recursos, o que fará com que sejam reduzidos os investimentos, de modo a comprometer severamente a eficiência.

Como já ponderado anteriormente, uma das principais formas de se garantir segurança jurídica aos investidores, em nosso entender, é a existência de formas efetivas de resolução de conflitos, bem como a existência de mecanismos efetivos de enforcement das decisões que resolvem os conflitos desta espécie, sejam elas proferidas no âmbito da jurisdição interna e da soberania do país destinatário dos investimentos, ou por instituições ou organismos supranacionais (amplamente consideradas, como, por exemplo, o Tribunal Europeu de Justiça, no caso da Comunidade Européia, ou o Tribunal Arbitral Permanente de Revisão do Mercosul, muito embora este não possua efetivamente função jurisdicional, tampouco possibilidade de impor a observância de suas deliberações).35

Neste sentido, a falta de uniformidade e previsibilidade na solução de controvérsias impedem a correta mensuração dos retornos esperados, assim como aumentam os custos de transação, tendo em conta a dificuldade de avaliação e de realização dos prognósticos futuros, sobre os quais pairam incertezas quanto aos riscos de prejuízos e mesmo de perda total dos investimentos, como, por exemplo, através de nacionalizações ou mesmo apropriações indevidas por particulares do país destinatário36, devidas, principalmente, ao estímulo gerado para o surgimento de comportamentos oportunistas, vez que o Estado ou a parte que pretender se apropriar destes bens, às custas da imposição indevida de prejuízos à

35 Sobre a realidade do Mercosul e da Comunidade Européia, interessantes ponderação são feitas por Jürgen

Samtleben, em artigo de sua autoria intitulado Perspectivas para uma Corte do Mercosul e a Experiência Européia, constante na obra Contratos Internacionais, coordenada por João Grandino Rodas, Revista dos Tribunais, 2002, p. 317/330.

36 Como está a ocorrer recentemente no Paraguai com os fazendeiros de descendência brasileira (caso dos

Brasiguaios, que são brasileiros e seus descendentes, dos quais grande parte inclusive já pertencente à geraçao nascida em solo paraguaio e que se encontram em áreas fronteiriças com o Brasil, principalmente nas regiões chamadas Canindeyú e Alto Paraná, no sudeste do Paraguai, estimados em 350 mil pessoas, em sua maioria,

Referências

Documentos relacionados

A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se baseia no fato de que uma

Por isso, quando a quantidade de Oxigênio Dissolvido na água diminui, os peixes não conseguem compensar esta.. Diminuição, ficando prejudicados e,

Em relação às diferenças significativas na contaminação fúngica das superfícies nos 10 estabelecimentos entre antes e depois da lavagem e desinfecção, apenas se verificou

A Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis, por intermédio da Divisão Multidisciplinar de Assistência ao Estudante (DIMAE/PROAES) torna público o lançamento do presente edital

Botânica  Sistema radicular  Sistema radicular de cana planta mostrando os três tipos característicos de raízes, a distribuição percentual em profundidade e a

DATA: 17/out PERÍODO: MATUTINO ( ) VESPERTINO ( X ) NOTURNO ( ) LOCAL: Bloco XXIB - sala 11. Horário Nº Trabalho Título do trabalho

17 CORTE IDH. Caso Castañeda Gutman vs.. restrição ao lançamento de uma candidatura a cargo político pode demandar o enfrentamento de temas de ordem histórica, social e política

No entanto, quando se eliminou o efeito da soja (TABELA 3), foi possível distinguir os efeitos da urease presentes no grão de soja sobre a conversão da uréia em amônia no bagaço