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Viver bem para longeviver melhor

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Academic year: 2021

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Viver bem para longeviver melhor

Vera Brandão

iver bem!

Todos querem bem viver. Mas o que é bem viver?

Nas conversas, na mídia e nas pesquisas se observa que para cada pessoa existe uma “fórmula ideal” para viver bem - saúde (em primeiro lugar), estabilidade financeira e emocional, harmonia familiar... Muitos outros itens poderiam ser acrescentados à lista.

Quando o tema é viver bem na cidade – considerando-se a megalópole paulistana –, surgem questões como segurança, trânsito, custo de vida, poluição, ruídos... E uma enorme lista de necessidades vitais.

Ao ampliar a perspectiva para o “novo” mundo, interconectado em tempo real, consumista, narcísico, violento, profundamente desigual – e do qual fazemos parte e do qual recebemos fortes influências –, a questão é: como viver bem? Todos os indivíduos, ao longo do tempo e em seus diferentes espaços geográficos e culturais - formadores de identidades específicas – têm o ideal de bem viver. Em cada tempo e cultura uma perspectiva, em cada indivíduo um desejo.

Todos querem viver bem e muito – sonho humano e desafio social.

Na sociedade atual, o número de indivíduos com 60 anos e mais cresce minuto a minuto, indicando envelhecimento populacional e perspectiva de crescente longevidade. Viver bem, viver muito.

Importante esclarecer que os termos envelhecimento e longevidade são empregados, muitas vezes, como sinônimos, mas aqui serão abordados como correspondentes a duas realidades inter-relacionadas, que não querem dizer o mesmo.

O envelhecimento é um processo de desenvolvimento natural e inerente à condição biológica de todo ser vivo, ciclo vital que vai do nascimento à morte, considerando seu processo normal. Como resultado dos progressos das diferentes ciências, se observa a crescente extensão do ciclo, apontando a perspectiva do longeviver, ou seja, o maior número de anos que se vive após a marca legal dos 60 anos.

O termo longeviver, aqui utilizado, traduz de modo mais fiel o ciclo natural da vida moderna - processo com interfaces biológicas, sociais, econômicas e existenciais – na qual existe, para muitos, a possibilidade de um prolongamento do “tempo de vida”.

Como viver bem para um longeviver melhor?

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Como fazer frente ao grande desafio?

Caminhos do bem-viver1

“Sinto-me extremamente bem aos 73 anos. Sem exagero, nada mudou. A carteira de identidade apenas registra a minha data de nascimento – 4 de julho de 1938 -, mais nada”, revela Maria Lúcia Brancante. Dona Lulu, como é carinhosamente chamada, mostra que garra não lhe falta: depois de adulta, formou-se em Decoração e em Turismo, na Anhembi Morumbi. Atuou como decoradora, mas a segunda faculdade foi pelo prazer de conhecer. Com um espírito inquieto, dona Lulu tem o marido como companheiro de descobertas. A viagem seguinte do casal, quando da entrevista, seria para o Camboja, China e Vietnã. “Quero aliar o exotismo da região à descoberta de parte de um mundo absolutamente intrigante”, declarou, à época.

Diversas pessoas se identificam com esse ritmo constante, e cada uma cria a maneira particular de curtir a vida. Marilene Bartoli, 64 anos, é professora aposentada. Entre suas atividades diárias estão os cuidados com casa, neta e a mãe, dona Júlia, de 90 anos.

Mas não é só isso. Marilene reserva tempo para se dedicar às aulas na Faculdade da Terceira Idade das Faculdades Integradas de Santo André (Fafisa). “Estudar para me manter atualizada e cuidar da saúde são dois dos caminhos que me trazem alegria e que sinceramente aconselho”. Ela faz aulas de dança, alongamento e condicionamento

físico, e não deixa de lado sua espiritualidade. “Gosto de mim hoje. Faço coisas que me dão alegria, vou à missa todos os domingos, convivo com pessoas de idades diferentes, passeio sempre que posso. Realmente, me sinto feliz”.

Não existe tempo certo para praticar o “longeviver” leve. “O que importa não é a idade cronológica, mas o que temos dentro de nós”, afirma Maria de Fátima Caetano Pinto, médica com dois MBAs em Gestão Empresarial, pela FGV e PUC, mestranda em Gerontologia na PUC. Ela define o seu “longeviver” como bom viver. “Tenho saúde, grandes amigos, pratico atividades físicas, adoro viajar e conhecer pessoas, frequento teatros, ou seja, estou em sintonia comigo mesma e com a vida, percebo a magnitude do

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universo e vivo o momento presente. O espírito nunca envelhece. Precisamos nos reinventar a cada dia”.

Já o corpo, apesar das tecnologias médicas, segue o ciclo natural. “Não encaro muito bem o processo de envelhecimento”, declara Carlos Dantas, 51 anos. A prevenção é saída encontrada pelo engenheiro, gerente da área comercial da unidade brasileira de uma empresa espanhola. “Se por um lado tenho uma atividade profissional frenética, por outro há pouco tempo para mim”. Mesmo assim, faz caminhadas e mantém uma constante atividade cultural. A preocupação de Dantas é vista por ele mesmo como “verdadeira neurose”. Mas diz respeito à independência que alimentamos em toda nossa vida. “Gostaria de me mudar para uma cidade praiana e continuar ativo profissionalmente, com carga de trabalho bem menor, dando aulas à noite”.

Os cuidados com o futuro começam sempre no presente. Gustavo Chaves sabe disso. Personal trainer, 26 anos, professor de educação física, pratica natação, musculação e futebol. Chaves pode até passar a impressão de que lhe falta tempo para pensar no amanhã. Mas demonstra plena consciência de que ele – o amanhã - sempre chega, e chega melhor para quem se previne. “Tenho atividades físicas, culturais e espirituais. Frequento teatro e cinema regularmente, e todo ano me programo para fazer ao menos uma viagem marcante, que sempre dura mais de uma semana”.

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No mesmo caminho de Chaves está Talitha Lobo, 30 anos, gerontóloga, casada e com dois filhos, de 11 anos e de um ano. Graduada em fisioterapia, aposta no corpo em movimento para a solução de quaisquer problemas. “Arrumar a casa, levar o cachorro para passear, andar de bicicleta com os filhos. Sou adepta de deixar o carro na garagem o máximo de tempo possível, e sair a pé, caminhando. Aprendi que caminhar, além do benefício físico, nos ajuda a pensar”.

Outra maneira de sentir-se bem vem por meio da espiritualidade. “Encontrei na religião e na filosofia respostas que me fizeram acreditar que existe algo muito maior. Isso é fundamental para aceitar e conviver com as dificuldades pelas quais passamos ao longo da nossa existência”.

Aposentadoria não faz parte da realidade de Talitha. “Não acredito que o sistema que conhecemos hoje continuará existindo”. Mas deseja um futuro no qual esteja cercada de amigos e familiares. “Meu companheiro, meus filhos, minha família e amigos, e um jardim grande para receber todos”.

Cultura da Longevidade - desafios

O viver muito - viver bem –, longeviver melhor, é resultado, especialmente nos últimos 30 anos, de estudos e descobertas científicas - progresso aliado a mudanças estruturais nas sociedades e seus diferentes e sempre novos arranjos.

Muito se estuda, fala e escreve sobre o assunto, mas os indivíduos – em diferentes faixas etárias - tornaram-se, contraditoriamente, cada vez mais presentes e, simultaneamente, mais abstratos.

O fenômeno, que muda muito lentamente, é o não protagonismo dos indivíduos em diferentes etapas da vida, especialmente aqueles com 60 anos e mais, tornando-nos “genéricos”. São enfatizados, atualmente, o empoderamento e protagonismo social, mas o que quer dizer?

Quer dizer uma tomada de poder sobre a própria vida – poder sobre si –, priorizando necessidades e desejos pessoais e grupais. Mas para o processo se concretizar é essencial dar visibilidade e voz aos indivíduos.

O processo começa nos direitos cidadãos de base. Não viveremos e longeviveremos bem se as espantosas desigualdades entre cidadãos de diferentes lugares, cidades, estados e países, ao longo do ciclo de vida, não forem superadas. Se as vozes não forem ouvidas.

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Se cada um pudesse falar, respondendo às questões existenciais fundamentais ao ser humano: Quem sou? O que quero? Para onde vou?, surgiria a possibilidade de “despertar” a consciência e o compromisso do papel cidadão, que se inicia na infância e se estende na vida.

O cidadão não tem idade.

A cultura para um bem longeviver passa pela formação continuada - eixo

fundamental para mudança de atitude –, alcançada por meio da construção e

divulgação democrática de conhecimento, não como algo superior aos indivíduos, privilégio de um grupo, mas próprio, natural e coletivo.

A “atitude” frente aos seres/saberes é o pressuposto para o seu desenvolvimento contínuo, envolvendo toda a sociedade, buscando superar conceitos estigmatizadores sobre todos os “diferentes” – aqueles que não se enquadram na norma produção/consumo/beleza/vitalidade/poder.

A educação continuada é assunto complexo, como a própria vida nas múltiplas dimensões – biológicas, sociais, psicológicas e filosóficas –, e para a qual propomos uma perspectiva e “atitude” interdisciplinares, valorizando o respeito pelo outro, o reconhecimento e trocas solidárias de saberes, a espera no tempo em constante devir.

Mudanças, adequações e transformações nos saberes estabelecidos, como vimos acima, são fundamentais para um progresso que vise alcançar patamares elevados na execução de novas políticas e ações que atendam às necessidades dos indivíduos, em todas as etapas da vida. Viver bem para longeviver melhor na perspectiva da “cultura da longevidade” – indica uma vida plena e em processo - criativa, digna, ética, solidária e cidadã para todos, desde sempre e para sempre.

Data de recebimento: 17/05/2013; Data de aceite: 02/06/2013.

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Vera Brandão - Pedagoga (USP). Mestre e doutora em Ciências

Sociais-Antropologia pela PUC/SP. Pesquisadora CNPq PUC-SP. Docente do COGEAE PUC-SP. Idealizadora e docente da Oficina de Formação Continuada: Narrativas Autobiográficas: Memória, Identidade e Cultura. Coeditora do Portal do Envelhecimento e da Revista Portal de Divulgação

Referências

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