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A CRIATIVIDADE COMO ESTRATÉGIA MEDIADORA DE PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM THE CREATIVITY AS MEDIATING STRATEGY OF DEVELOPMENT PROCESSES AND LEARNING PINHEIRO-CAVALCANTI, Maria Mônica

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Academic year: 2023

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e suas Interfaces Existenciais.

A CRIATIVIDADE COMO ESTRATÉGIA MEDIADORA DE PROCESSOS DE

DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM

THE CREATIVITY AS MEDIATING STRATEGY OF DEVELOPMENT PROCESSES AND LEARNING

PINHEIRO-CAVALCANTI, Maria Mônica1 FLEITH, Denise de Souza2

RESUMO

O presente trabalho objetiva relatar o processo de intervenção psicopedagógica com foco no desenvolvimento da criatividade de um aluno de 7 anos, que freqüentava uma escola da rede particular de ensino da capital de Alagoas. O objetivo da intervenção foi contribuir para o desenvolvimento do potencial intelectual e criador do aluno, favorecendo a expressão de seus talentos e a integração de suas habilidades e necessidades. O processo de intervenção psicopedagógica envolveu dois momentos distintos e consecutivos da trajetória escolar inicial da criança: no 2º ano do Ensino Fundamental, quando se recusava a grafar em letra cursiva, e no 3º ano, momento em que se negava a construir narrativas. Aspectos do contexto escolar e do processo de aprendizagem do aluno são relatados, bem como especificidades relacionadas à intervenção desenvolvida com a criança. A intervenção contribuiu para o desenvolvimento do potencial intelectual criador e socioemocional da criança com reflexos positivos sobre seu desempenho escolar.

Palavras-chave: Intervenção psicopedagógica; Criatividade; Ensino fundamental.

ABSTRACT

The present objective work to tell the psycho pedagogical intervention process with focus in the development of the creativity of a pupil of 7 years, who frequented a school of the particular net of education of the capital of Alagoas. The objective of the intervention was to contribute for the development of the intellectual and creative potential of the pupil, being favored the expression of its talents and the integration of its abilities and necessities. The psycho pedagogical intervention process involved two distinct and consecutive moments of the initial pertaining to school trajectory of the child: in 2º year of Basic Education, when one opposed to graf in cursive letter, and in 3º year, moment where if it denied to construct narratives. Aspects of the pertaining to school context and the process of learning of the pupil are told, as well as specificities related to the intervention developed with the child. The intervention contributed for the development of the creative and socioemotional intellectual potential of the child with positive consequences on its pertaining to school performance.

Keywords: Psycho pedagogical intervention; Creativity, Basic education.

1 Mestre em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde – IP/UnB, e-mail: mmonicapinheiro@gmail.com.

2 Professora do Instituto de Psicologia da UnB, e-mail: fleith@unb.br.

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INTRODUÇÃO

A escola, compreendida em sua complexidade e em seus multifacetados aspectos, atua como mediadora do processo de inserção do sujeito no mundo das ideias, do conhecimento, das crenças e da cultura, favorecendo sua adaptação na sociedade e contribuindo tanto para manutenção quanto para transformação da estrutura social vigente (NEVES-PEREIRA, 2007a, 2007b).

Entretanto, fatores como desagregação familiar, ausência de motivação para os estudos, dificuldades socioeconômicas e aspectos psicológicos comprometidos, aliados às falhas no processo pedagógico, marcadas pela negligência da dimensão socioemocional e criativa dos alunos, podem construir quadros de dificuldades ou recusa de aprendizagem. Em consequência disso, alterações nos aspectos da cognição, motivação e criatividade, podem ocorrer, sobretudo, nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Apesar dos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997) deixarem clara a necessidade de capacitar alunos para solução de problemas por meio do pensamento lógico, da criatividade, da intuição e da análise critica de situações e problemas, não é especificado como operacionalizar esses objetivos no contexto escolar. Como consequência, as escolas apresentam dificuldades acerca de como desenvolver os diferentes componentes curriculares de modo articulado com estratégias de estímulo à criatividade e à motivação para aprender dos alunos. Em virtude disso, a produção criativa dos alunos é pouco estimulada e o seu processo de aprendizagem nem sempre é considerado prazeroso e interessante. Neste sentido, a negação do aprender pode significar uma reação da criança perante as adversidades do contexto educacional que lhe oprimem e

causam desconforto, um sinal que traduziria sua demanda por formas diferenciadas de ensinar e de aprender.

São diversas as contribuições teóricas com base na Psicologia da Criatividade que podem subsidiar intervenções psicopedagógicas em direção ao desenvolvimento integrado da dimensão cognitiva e criativa dos alunos, sem divergir dos objetivos escolares. Neste sentido, Fleith e Alencar (2006) salientam que é de fundamental importância o ambiente social e escolar valorizar a dimensão da criatividade no ensino, promovendo oportunidades para desenvolvimento de motivações, atitudes, habilidades de pensamento criativo pela via da aprendizagem, sendo benéfica a promoção de atividades desafiadoras que estimulem o aluno a pensar criativamente, romper barreiras, identificar, prever e resolver problemas. Martínez (2006) corrobora esta perspectiva defendendo que a criatividade tem grande significação no processo de aprendizagem e desenvolvimento integral do aluno, incluindo bem-estar emocional e condições de saúde. Martínez considera, ainda, que a criatividade desempenha o papel de realizar a transformação personalizada dos conteúdos a serem aprendidos, pelo aluno, de forma significativa.

Desvios do processo de ensino caracterizados pela desarticulação teoria- prática escolar são bastante recorrentes no cotidiano das escolas. Em virtude deste descompasso entre o que se propõe na dimensão teórica e o que se pratica de fato, a escola pode produzir um aluno desmotivado para aprender, e descomprometido com as metas educacionais propostas, inibido em seu potencial criativo. Nesta direção, Renzulli (1992) enfatiza que para a promoção de uma aprendizagem criativa, é essencial considerar o aluno, o professor e o currículo. Com relação ao aluno, o autor

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prioriza a necessidade de desenvolver habilidades cognitivas e afetivas de modo articulado. Além disso, defende a consideração dos diferentes estilos de aprendizagem e interesses que favoreçam o pensamento divergente/convergente e a consciência de suas habilidades, com vistas à análise crítica de idéias, definição e solução de problemas. No que tange à dimensão do professor, Renzulli (1992) destaca a motivação para o ensino e o domínio dos conteúdos, o entusiasmo, o senso de humor, a positiva relação com os alunos, a oferta de feedback em relação ao desempenho, valorização dos erros como parte do processo de aprender, além do incentivo ao potencial criativo e autoconhecimento dos alunos. Quanto ao currículo, o foco recai na contextualização do conteúdo na perspectiva da interdisciplinaridade, conexão dos conteúdos programáticos com a realidade dos alunos e consideração de conhecimentos prévios, além de promover o apelo à imaginação dos alunos e favorecer o prazer pela aprendizagem.

Wechsler (1998) propõe como estratégias para implementação do ensino criativo nas escolas: incentivar o pensamento divergente, o debate de idéias e a diversidade de soluções para uma mesma questão, estimular a cooperação e neutralizar a competição, incentivar a curiosidade e a coragem para a inovação, individualizar o processo de ensino e aprendizagem, permitir escolhas dos alunos, criar clima de escuta, humor e autoconfiança na sala de aula. Uma análise crítica do panorama escolar atual permite concluir o quanto as referidas estratégias encontram-se distanciadas do cotidiano dos alunos em sala de aula.

Contudo, apesar das inúmeras barreiras ao desenvolvimento da aprendizagem, da motivação para aprender e da criatividade dos alunos, é possível promover na escola ações que contribuam para mudança deste quadro. Sobretudo, “se

houver um maior equilíbrio entre o cognitivo e o afetivo, se houver espaço para o lúdico, se o prazer de crescer, de criar, de sonhar, de se auto-realizar estiver presente”

(ALENCAR, 2001, p. 57).

De acordo com esta perspectiva, o objetivo deste trabalho é relatar uma experiência de intervenção psicopedagógica, com foco no desenvolvimento da criatividade, de um aluno de 7 anos de idade que se recusava a realizar as atividades escolares.

Apresentação do Caso

O relato do caso refere-se a G., um aluno de 7 anos, que cursava o 2º ano do Ensino Fundamental de uma escola da rede particular de ensino de Maceió- AL. Sua convivência em família demonstrava-se ajustada às suas necessidades, não havendo relatos de perturbações em seu histórico familiar nem pessoal. G. tinha uma irmã três anos mais velha e um irmão de 1 ano de idade. Seus pais eram médicos, demonstravam ser atenciosos e afetivos, além do que acompanhavam atentamente seu desenvolvimento e vida escolar. G.

tinha uma peculiaridade relacionada à forma comunicativa, era muito sucinto na fala utilizando-se de “poucas palavras” para se comunicar.

A escola de G. adotava a metodologia de apresentar sistematicamente a letra cursiva às crianças no momento final da alfabetização. Portanto, no início do 2o ano do Ensino Fundamental era demandado que todos já escrevessem em letra cursiva, exclusivamente, não sendo mais permitido o uso da letra bastão. G. passou a se recusar a praticar a forma de escrita cursiva, circunstância que dificultava a execução das tarefas escolares que demandavam o desenvolvimento dessa habilidade. Em consequência disso, grande parte das atividades propostas na escola não era cumprida. Na escola, apresentava queda na produtividade relacionada às atividades escritas e em casa não se dispunha a

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realizar as tarefas escolares. Sua mãe relatou que se propunha a ajudá-lo, mas suas tentativas eram frustradas, uma vez que G. se negava a pegar no lápis. A mãe concluiu, então, que naquele momento G.

necessitava de um auxílio para além das possibilidades de ação escolar e também da família, o que a levou a encaminhá-lo para um programa de atendimento psicopedagógico.

G. enfrentava um significativo desconforto ao tentar utilizar-se da letra cursiva. Para grafar a letra “a” (minúscula cursiva), G. retirava o lápis do papel por cinco vezes. Faltava-lhe o recurso da compreensão do traçado padrão das letras, ainda que também por meio dessa “não compreensão” ele ao mesmo tempo poderia estar sinalizando o repúdio às determinações escolares sobre as quais ele não admitia se submeter.

Portanto, ao final do 1º bimestre letivo do 2º ano, G. iniciou o trabalho de intervenção psicopedagógica no Centro de Estimulação do Potencial Intelectual Criador, instituição particular de atendimento a crianças com diferentes níveis de desempenho escolar. Os grupos eram formados tanto por crianças que apresentavam elevadas notas em seu boletim quanto por crianças que enfrentavam dificuldades no processo de aprendizagem.

O Contexto do Centro de Estimulação do Potencial Intelectual Criador

O centro de estimulação era um espaço que se propunha a oferecer às crianças do 2o ao 6o ano do Ensino Fundamental oportunidades de aprendizagem significativa, por meio de formulações de problemas e busca por soluções criativas, despertando e estimulando o exercício da curiosidade e a motivação para aprender. Utilizava-se de estratégias de ensino que permitissem à criança vivenciar formas de aprendizagem diferenciadas do padrão escolar, de modo a

equilibrar a oferta das atividades dirigidas e não dirigidas no processo educativo, considerando e privilegiando a dimensão criativa no processo de construção do conhecimento, as relações interpessoais, a curiosidade, a autonomia e autoconfiança, procurando compatibilizar e articular ao longo do processo de intervenção as necessidades e desejos de cada criança.

As práticas psicopedagógicas envolvidas no processo de intervenção baseavam-se também na concepção de zona de desenvolvimento proximal defendida por Vigotski (2003), na medida em que se valia das contribuições de colegas mais velhos e da própria mediação da dinamizadora do processo de intervenção (no caso, a primeira autora deste artigo).

Objetivos do Processo de Intervenção Psicopedagógica

O objetivo geral da intervenção era contribuir para o desenvolvimento do potencial intelectual e criador de G., favorecendo a integração de suas habilidades intelectuais e criativas e promovendo a expressão de seus talentos.

Como objetivos específicos buscou-se: (a) dinamizar o processo de aquisição e desenvolvimento de habilidades associadas à leitura e escrita; (b) favorecer a autoestima e o autoconceito de G.; (c) promover a conscientização dos pais de G.

acerca das reais demandas do filho, bem como a reavaliação da escola acerca de concepções pré-estabelecidas e padrões de comportamentos associados a este aluno.

Uma Descrição a partir da Intervenção Psicopedagógica

A intervenção foi realizada em duas fases: inicialmente no final do 1º bimestre letivo do 2º ano e posteriormente no 3º ano.

A 1ª intervenção teve a duração de três meses, com duas sessões (90 minutos) semanais de atendimento em grupo, intercaladas com duas sessões (60 minutos) semanais de atendimento individualizado.

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A dinamização destas sessões era realizada pela primeira autora deste artigo.

Inicialmente, foi promovido o espaço de escuta e levantou-se a percepção de G.

acerca de suas experiências escolares, incluindo seus prazeres, preferências, desejos e lamentos. O trabalho de iniciação à escrita cursiva foi desenvolvido de forma integrada com atividades lúdicas e criativas por meio das quais ele poderia se expressar em diversas modalidades, tais como: sucata, pintura, montagem de painéis, origami, modelagem, construção de narrativas, teatro de fantoches e dramatizações, além de jogos e brincadeiras em grupo.

Foram observados e respeitados aspectos da motricidade de G. associados à peculiaridade na maneira de lidar com o traçado das letras, isto é, sem excluir ou negar a dimensão pessoal (estilo) de sua expressão escrita. Com o objetivo de promover a fluência da escrita cursiva, o trabalho era sistemático com foco no domínio do traçado contínuo das letras maiúsculas e minúsculas cursivas e na legibilidade, não havendo direcionamento em relação ao tamanho das letras nem tampouco quanto a formas mais arredondadas ou pontiagudas de seu traçado.

No final do processo interventivo, a própria escola reconheceu que G. regatou condição de lidar positivamente com as demandas escolares. Em casa, não mais resistia executar suas atividades escolares nem tampouco a grafar em letra cursiva.

Adquiriu certo grau de autonomia nos estudos, valendo-se, sem esquiva, do acompanhamento de seus pais em relação às tarefas de casa e passando a demonstrar maior interesse e envolvimento no cumprimento das atividades escolares.

Entretanto, no início do 3º ano, G.

apresentou nova recusa de aprendizagem na área da escrita. Desta vez, a queixa da escola, e também dos pais, era que ele se negava terminantemente a produzir narrativas, independente da situação ou da

temática envolvida. Cabe lembrar que no 2º ano a queixa era G. não se submeter a grafar em escrita cursiva. Nesta 2ª intervenção, G. chegou ao centro de estimulação muito chateado e argumentando: “Eu não preciso vir aqui para aprender a escrever! Eu já sei ler e escrever muito bem...”. Foi aberto um espaço para a escuta de sua fala queixosa e profundamente pertinente. G. possuía autopercepção bastante positiva em relação a sua habilidade de leitura e escrita, argumentando ser capaz de compreender o que lia e de grafar bem as palavras, o que de fato era real. Nesta 2ª intervenção, G. foi integrado em um grupo multisseriado (2o ao 5º ano) de crianças intercaladamente com atendimentos individuais, focando tanto o desenvolvimento de habilidades específicas relativas à produção textual, como também o atendimento mais reservado para escuta e interlocução, considerando-se a dimensão subjetiva que envolve a produção de narrativas. O processo de intervenção psicopedagógica não se limitou a instruir G.

sobre como construir narrativas, muito embora também incluísse o desenvolvimento de habilidades necessárias para construção de um texto com coerência e estilo adequado aos seus propósitos.

Observou-se que nas sessões coletivas G. demonstrava maior motivação para produzir e se expressar criativamente. Em virtude disso, com base nas produções coletivas, nas quais G. apresentava intensa motivação, eram selecionadas as atividades a serem desenvolvidas nas sessões individuais, considerando-se seus interesses e necessidades, estratégia esta que muito favoreceu o alcance dos objetivos da intervenção.

Ressalta-se a participação de G. na produção coletiva de um filme intitulado

“A odisséia robótica”. Nesta atividade G. se envolveu de forma intensa na confecção de diversos personagens em sucata que envolvia definição dos atributos físicos e psicológicos de cada personagem (deixando

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claro sua fragilidade e defesa), montagem de cenários, criação do roteiro e diálogos do filme. G. criou e construiu uma grande variedade de personagens e demonstrou por todos eles enorme apreço, guardando cada um de seus bonecos de sucata com muito cuidado a cada final de sessão coletiva, o que denotava manter com o objeto (personagem) por ele criado uma subjetiva ligação (significativa construção de sentido). Observou-se que os personagens em sucata criados por G. eram praticamente todos construídos com materiais relacionados à comunicação, como: disco vinil, microfone, mouse e muitos fios elétricos. Isso também denota a forte relação estabelecida entre seus conflitos internos e a externalização e resolução dos mesmos pela via da criatividade.

Ao final do processo de intervenção, G. passou a não somente construir narrativas com prazer e habilidade, mas também a se incluir como personagem de suas construções, recriando sua realidade e assumindo-se como protagonista de sua história. Em uma de suas narrativas G.

reconhece a importância do outro no papel de mediar situações e favorecer a resolução de seus conflitos. Estas evidências revelam a evolução socioemocional de G. a partir de sua expressão criativa, o que também contribuiu favoravelmente para seu desempenho escolar.

Em uma de suas narrativas, G.

entrelaçou três dimensões (passado, presente e futuro) de modo original, onde animais pré-históricos e objetos futuristas eram apresentados a partir de uma perfeita conexão entre diferentes dimensões de tempo e espaço. Havia uma situação de conflito e a presença de seu pai (representação do outro/mediador) foi marcante como forma de resolução. G.

conclui esta narrativa de modo original revelando a proteção e a alegria como faces ocultas do medo e da angústia. Com muito entusiasmo G. levou esta narrativa para mostrar à professora e colegas de classe,

uma vez que não representava simplesmente o cumprimento de uma tarefa solicitada, mas era um produto de sua criação que refletia a totalidade de seu ser considerando sua idiossincrasia.

Discussão

A sensibilidade dos agentes da escola para com a dimensão subjetiva dos alunos necessita ser traduzida em práticas e acompanhamento do processo de ensino e aprendizagem que considerem a dimensão da criatividade como fundamental para o desenvolvimento pleno e harmonioso de seu potencial intelectual. Neste sentido, o relato do caso apresentado traz à tona aspectos pertinentes à questão da dificuldade da escola em lidar com idiossincrasias dos alunos, sugerindo métodos de ensino que privilegiem de fato o processo de desenvolvimento e aprendizagem sem negligência da dimensão da criatividade, que tanto favorece o aspecto socioemocional como também abre espaço para a fluência do processo de ensino e aprendizagem.

Nesta perspectiva, o caso relatado enseja reflexão acerca das práticas pedagógicas aplicadas no contexto escolar e análise das possibilidades e recursos associados ao estímulo da criatividade como ferramenta para o desenvolvimento integral do aluno, considerando-se a dimensão cognitiva, criativa e socioemocional. Também oferece subsídios práticos e teóricos para análise das interações/relações presentes no contexto escolar e de sala de aula que podem tanto estimular quanto inibir o desenvolvimento do potencial cognitivo, criativo e socioemocional dos alunos.

Como evidência do sucesso da intervenção, além da promoção de habilidades escolares necessárias (escrita cursiva e construção de narrativas) destaca- se o êxito no resgate do interesse pela aprendizagem e o desenvolvimento de G.

nos aspectos da fluência, da flexibilidade e

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da originalidade de ideias, habilidades criativas favoráveis à aprendizagem escolar.

Ademais, foram observados benefícios do ponto de vista socioemocional. As atividades criativas desenvolvidas em grupo representaram para G. vivências significativas do ponto de vista socioemocional. Mais autoconfiante, G. se sentiu encorajado a buscar novas soluções para problemas e conflitos, condições que promoveram seu bem-estar dentro e fora da escola.

Para Vigotski (2003), a emoção e o interesse devem servir como ponto de partida para qualquer trabalho educativo, sendo a aprendizagem possível somente na medida em que se baseia no próprio interesse da criança. Neste sentido, o processo de intervenção, por ter privilegiado a expressão criativa de G., promoveu efeito terapêutico. Segundo Vigotski (2003), o efeito terapêutico oriundo das produções criativas salienta-se por permitir que a atividade estética funcione como catarse para libertação do espírito diante das paixões que o atormentam o indivíduo. Vigotski concebe a expressão criativa como emoção dialética que reconstrói o comportamento do indivíduo a partir de atividades complexas envolvendo processos intrapsicológicos que se externalizam pela catarse.

Avalia-se que a ação mediada pelo equilíbrio entre a condução do processo educativo (fatores externos) e o acompanhamento da criança (fatores intrapsicológicos) contribuiu para sucesso da intervenção. Bruner (2002) assinala que o papel do mediador, em circunstâncias de compartilhamento de aprendizagem, corresponde a um acontecimento humano e não a um dispositivo de informação, considerando-se a criança não só como receptor da transmissão do conhecimento, mas como agente de transformação significativa desse conhecimento. Ademais, ao se considerar ao longo do processo

interventivo “a fusão entre o objetivo e o subjetivo, entre o concreto e o abstrato, entre o real e o imaginário, entre a necessidade e o desejo, dimensões significativas do processo de ensino- aprendizagem” (ALENCAR, 2001, p. 57), foi favorecido o desenvolvimento pleno de G. sem dele nada subtrair.

REFERÊNCIAS

ALENCAR, E. M. S. Criatividade e educação de superdotados. Petrópolis:

Vozes, 2001.

BRUNER, J. Realidade mental, mundos possíveis. Porto Alegre: ArtMed, 2002.

FLEITH, D. S. & ALENCAR, E, M. L. S.

Percepção de alunos do ensino fundamental quanto ao clima de sala de aula para criatividade. Psicologia em Estudo, 11, 513-521, 2006.

MARTÍNEZ, A. M. Criatividade no trabalho pedagógico e criatividade na aprendizagem. Em M. C. V. R. Tacca (Org.), Aprendizagem e trabalho pedagógico (p. 69-94). São Paulo: Alínea, 2006.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC, 1997.

NEVES-PEREIRA, M. S. Abordagem psicopedagógica às dificuldades de aprendizagem. Brasília: CETEB, 2007a.

NEVES-PEREIRA, M. S. Fundamentos da psicopedagogia. Brasília: CETEB, 2007b.

RENZULLI, J. S. A general theory for the development of creative productivity through the pursuit of ideal acts of learning.

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VIGOTSKI, L. S. Psicologia pedagógica.

São Paulo: Artmed, 2003.

VITA-MORE, Natasha. Posthuman in Water. Marca D’água. Disponível em:

<http://www.fairpoint.net/~jpierce/images/p osthuman_in_water.jpg> Acesso em: 13 ago 2010.

WECHSLER, S. M. Criatividade:

descobrindo e encorajando. São Paulo: Psy, 1998.

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