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Repositório Institucional UFC: Os governos neoliberais de Fernando Henrique Cardoso e Lula

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO, ATUÁRIA, CONTABILIDADE E SECRETARIADO EXECUTIVO (FEAAC)

CURSO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

ARISTON SILVA DE AZEVEDO

OS GOVERNOS NEOLIBERAIS DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO E LULA

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ARISTON SILVA DE AZEVEDO

OS GOVERNOS NEOLIBERAIS DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO E LULA

Monografia apresentada à Faculdade de Economia, Administração, Atuária, Contabilidade e Secretariado Executivo, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Ciências Econômicas.

Orientador: Prof. Dr. Fabio Maia Sobral

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

Universidade Federal do Ceará

Biblioteca da Faculdade de Economia, Administração, Atuária e Contabilidade

A986g Azevedo, Ariston Silva de.

Os governos neoliberais de Fernando Henrique Cardoso e Lula / Ariston Silva de Azevedo - 2013.

53 f.; il.; enc.; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de

Economia, Administração, Atuária e Contabilidade, Curso de Ciências Econômicas, Fortaleza, 2013.

Orientação: Prof. Dr. Fabio Maia Sobral.

1.Neoliberalismo 2.Brasil – política e governo I. Título

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ARISTON SILVA DE AZEVEDO

OS GOVERNOS NEOLIBERAIS DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO E LULA

Monografia apresentada à Faculdade de Economia, Administração, Atuária, Contabilidade e Secretariado Executivo, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Ciências Econômicas.

Aprovada em ____/____/_____

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________________

Prof. Dr. Fabio Maia Sobral (Orientador) Universidade Federal do Ceará (UFC)

_______________________________________________________________

Prof.Dr. André Vasconcelos Ferreira Universidade Federal do Ceará (UFC)

________________________________________________________________

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AGRADECIMENTOS

A meus pais, José Otaviano de Azevedo e Maria Fátima Silva de Azevedo, que sempre me incentivaram.

Aos meus irmãos, Ana, Adriana, Ademir, Alessandra, Anderson e Adilson; os quais contribuíram de todas as formas possíveis.

Aos meus cunhados, Rogério e Elton.

Ao Prof. Dr. Fabio Maia Sobral pela atenção e excelente orientação.

Aos professores componentes da Banca examinadora André Vasconcelos Ferreira e Carlos Américo Leite Moreira por terem aceitado gentilmente o convite.

(7)

RESUMO

O avanço do ideário neoliberal no Brasil marcou o início de grandes transformações tanto econômicas como sociais. A era Collor, interrompida por conta do impeachment, foi a primeira experiência neoliberal brasileira, e coube a Fernando Henrique Cardoso (FHC) dar continuidade ao legado incompleto deixado por Collor. A partir de então, os processos de integração passiva da economia brasileira, de flexibilização, de desregulamentação e de privatizações seguiram a todo vapor. As políticas sociais seguiram as orientações do Banco Mundial e, por isso, priorizaram a focalização, e não a universalização. Lula herdou o modelo político e econômico de FHC e quase nada modificou. As políticas sociais – principalmente com o Bolsa Família – continuaram na mesma lógica, mas servindo, dessa vez, como instrumento de controle das classes sociais mais frágeis. Este trabalho se propôs a investigar em que medida os governos FHC e Lula aderiram ao ideário neoliberal, uma vez que o neoliberalismo permeou ambos os governos.

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ABSTRACT

The advancement of neoliberal ideas in Brazil marked the beginning of major economic and social changes. The Collor era, interrupted by the impeachment, was the first Brazilian neoliberal experience, and it was Fernando Henrique Cardoso (FHC) who assumed to continue the legacy left incomplete by Collor. Thereafter, the processes of passive integration of the Brazilian economy, of flexibility, deregulation and privatization have continued at full steam. Social policies followed the guidelines of the World Bank and therefore prioritized focus, and not universality. Lula inherited the political and economic model of FHC and changed almost nothing. Social policies - especially the ‘Bolsa Família’ - continued in the same logic, but served this time as a means to control the weaker social classes. This study aims at investigating the extent to which the governments of FHC and Lula followed the neoliberal ideal, since neoliberalism permeated both of them.

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SUMÁRIO

1 Introdução ... 9

2 O neoliberalismo no mundo ... 11

2.1 No Brasil ... 16

3 A eleição de Fernando Henrique Cardoso ... 22

3.1 Os custos da implantação do plano... 24

3.2 A reforma de Estado e as famigeradas privatizações ... 30

3.3 Políticas sociais ... 33

3.4 O mercado de trabalho ... 36

4 Uma “esperança” chamada Lula ... 40

4.1 A política macroeconômica do novo governo ... 41

4.2 Dívida Pública ... 46

4.3 Políticas sociais ... 47

4.4 Cooptação dos movimentos sociais ... 51

5 Conclusão ... 53

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1 Introdução

Ao longo de toda sua história, o capitalismo nunca esteve e nunca estará imune a crises. E foi assim, devido ao esgotamento do fordismo, somado, posteriormente, aos efeitos das duas crises do petróleo (1973 e 1979), que foi desmoronando o modelo de capitalismo em voga nos Estados Unidos e na Europa desde o fim da Segunda Guerra até o fim década de 1960. A partir dessa crise estrutural, as ideias neoliberais, deixadas de lado por anos, retornaram com força.

As experiências neoliberais, para não dizer trágicas, sempre trazem em sua esteira sérias consequências às economias que se rendem de maneira passiva às suas intempéries. No âmbito das orientações transmitidas pelos teóricos neoliberais, as medidas de austeridade recaem, em sua grande maioria, sobre a classe produtora da riqueza da sociedade, ou seja, a trabalhadora.

Os direitos sociais, duramente conquistados ao longo do século XX, são vistos como danosos à “livre concorrência” tão propugnada pelos neoliberais. Para estes, é preciso acabar com as “benesses” dadas aos trabalhadores, e nada mais oportuno, senão uma crise estrutural, para que se achem desculpas para enfatizar a necessidade de reformas, muitas das quais acarretam desemprego e cortes dos direitos sociais.

A história mostra que as ações de Margaret Thatcher (na Inglaterra), com sua dilapidação econômica e sua postura reacionária no trato com os movimentos sociais, do que provém a famosa expressão “Dama de Ferro”, são os exemplos mais nítidos do que o neoliberalismo pode ser. Durante o governo Thatcher, os movimentos sindicais foram duramente reprimidos, haja vista a famosa greve dos mineiros de 1984/85. Na outra potência de capitalismo avançado, os Estados Unidos, o ex-presidente Ronald Reagan introduziu uma espécie de neoliberalismo

“diferenciado”1, voltado para expansão militar, preocupado em fazer frente à União

Soviética.

1

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O Brasil – principal objeto de estudo deste trabalho –, há pelo menos vinte anos, vem passando por uma série de mudanças econômicas e sociais orientadas pela lógica neoliberal, apesar de alguns se negarem a se assumir neoliberais. Iniciando pela era Collor (incompleta) e passando pelo interregno Itamar Franco e seu sucessor, Fernando Henrique Cardoso, até chegar a Lula, é possível falar em processo de continuidade.

Este estudo passará a investigar com ênfase o período que vai do início do governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) ao fim do governo Lula, com o objetivo de verificar em que medida ambos os governos aderiram ao ideário neoliberal. A investigação cientifica foi realizada através da consulta a livros, artigos, jornais, revistas, documentos oficiais e dados estatísticos obtidos em fontes secundárias.

A presente pesquisa foi dividida em três seções. A primeira tratará do avanço do ideário neoliberal no mundo e no Brasil; a segunda analisará o caráter do governo FHC; e a terceira, do governo Lula. Por fim, a conclusão trará as evidências encontradas ao longo de toda a pesquisa.

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2 O neoliberalismo no mundo

A concepção do neoliberalismo, se assim pode-se dizer, deu-se após a Segunda Guerra Mundial, para fazer frente ao Estado intervencionista e de bem-estar social. Hayek, com sua obra O caminho da servidão, incumbiu-se da tarefa de produzir ferrenhas críticas ao modelo de Estado interventor que regulava a atividade econômica (ANDERSON, 1995; PAULANI, 2008).

No entanto, não é imediatamente ao pós-guerra que as ideias neoliberais tomaram força, pois o padrão de desenvolvimento capitalista surgido nos Estados Unidos (fordismo), o qual dava sustentação ao Estado Benfeitor, apresentou um relativo sucesso (em termos de taxa de crescimento e de proteção social) durante, pelos menos, duas décadas e meia (FILGUEIRAS, 2006a).

A partir do final da década de 1960 e início de 1970, assiste-se ao processo de esgotamento do modelo fordista. Antunes (1999) aponta os principais traços que evidenciaram o inicio de um quadro crítico, foram eles: a queda da taxa de lucro, causada pelo aumento do preço da força de trabalho, conquistado pelos trabalhadores pós 1945 e pelas diversas lutas da década de 60, que visavam controle social da produção2; esgotamento do modelo de acumulação de produção dado pela retração do consumo, ocasionada pelo inicio do desemprego estrutural; ascensão da esfera financeira frente à esfera produtiva; concentração de capitais, ocasionada por fusões de empresas monopolistas e oligopolistas; e incremento das privatizações.

Além dos traços acima citados, as crises do petróleo, experimentadas pelo mundo em 1973 e em 1979, e a elevação das taxas de juros estadunidenses foram também responsáveis pela mudança de paradigma na economia mundial. Tem-se, a partir desse momento, um processo que levou o capitalismo a ingressar em uma nova fase, que se caracteriza pela apologia à financeirização da economia, como explica Paulani (2008, p. 115):

O choque do petróleo e a profundidade da crise que se seguiu contribuíram decisivamente para a engorda geral dos capitais em busca de valorização

2O somatório desses elementos levou a redução dos níveis produtividade do capital que, por sua

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financeira. Aos eurodólares já acumulados na city de Londres vieram se

juntar os petrodólares e uma nova leva de eurodólares, agora com mais motivos para desertar da atividade produtiva, dada a recessão que atingia quase todo mundo, particularmente o centro do sistema, ou seja, os países

desenvolvidos. Os bancos privados internacionais com operações na city

londrina se associaram para reciclar esses euros e petrodólares buscando tomadores entre os países da periferia do sistema. Os países latino-americanos estiveram, portanto entre as primeiras vítimas da sanha rentista desses capitais, já que muitos deles resolveram enfrentar, com elevação de seu grau de endividamento, a crise então experimentada.

Sendo assim, o modelo de capitalismo dos anos anteriores não era ideal para os novos moldes em que a economia mundial se inseriu, ou seja, prevalecia agora a lógica da acumulação financeira. Ficava inviável para os capitais voláteis uma economia regulada, pois as principais características deles são a velocidade frenética com a qual se movimentam e a desconexão com a esfera produtiva real.

O neoliberalismo, segundo Filgueiras (2006a, p. 49, grifo do autor):

[...] saiu do ostracismo político que o caracterizou durante os “anos de ouro”

do desenvolvimento capitalista, apresentando-se como uma doutrina atual. Posteriormente, após a derrocada do “socialismo real” no leste da Europa,

se auto-intitulou o porta-voz dos novos tempos, da “modernidade” ou da

“pós-modernidade” e da vitória definitiva do capitalismo na sua forma mais “ pura”; período agora marcado pela absoluta hegemonia do mercado e da competição, em oposição às “ velhas idéias (sic) intervencionistas”.

Dessa forma, o avanço das ideias neoliberais encontrou certa facilidade, uma vez que não havia obstáculos devido à queda do modelo de acumulação anterior. A primeira experiência neoliberal se deu na América Latina, mais precisamente, na ditadura chilena de Augusto Pinochet. Ao que se sabe, “[...] no Chile, naturalmente, a inspiração teórica da experiência pinochetista era mais norte-americana do que austríaca. Friedman e não Hayek, como era de se esperar nas Américas”

(ANDERSON, 1995, p. 19). Naomi Klein, no livro A doutrina do choque: a ascensão do capitalismo de desastre (2008), também faz considerações pertinentes acerca da introdução do pensamento neoliberal nos países da América latina.

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A eleição de Thatcher, em 1979, na Inglaterra, e a de Reagan, em 1980, nos Estados Unidos, significaram as primeiras experiências neoliberais, no que diz respeito a países de capitalismo avançado.

É lógico que havia diferenças um pouco consideráveis na maneira com que as medidas neoliberais foram colocadas em prática nos dois países. Thatcher impôs políticas de extrema austeridade, entre as quais se destacam: contração da emissão de moeda, redução dos impostos sobre a renda (da faixa da população que auferia rendas mais altas), elevação da taxa de juros, liberdade aos fluxos financeiros, intenso combate às greves e aos movimentos sociais, além de um incisivo programa de privatização (ANDERSON, 1995; FILGUEIRAS, 2006a).

Reagan, por sua vez, concentrou esforços no sentido de fazer frente militarmente à União Soviética. O objetivo era desarticular a economia soviética e, por conseguinte, impor uma derrota ao regime comunista. A análise de Anderson (1995, p. 12, grifo nosso) corrobora o entendimento do período em questão:

Deve-se ressaltar que, na política interna, Reagan também reduziu os

impostos em favor dos ricos, elevou as taxas de juros e aplastou a única greve séria de sua gestão. Mas decididamente, não respeitou a disciplina orçamentária; ao contrário, lançou-se numa corrida armamentista sem precedentes, envolvendo gastos militares enormes, que criaram um déficit público muito maior do que qualquer outro presidente da história norte-americana.

A partir da citação acima é reforçada a ideia de que o governo Reagan teve caráter duplo, combinando a política militar expansionista com as políticas típicas neoliberais, por isso é fato que “de 1980 a 1985 a aquisição de armamentos

aumentou em 100%, a pesquisa em 80% e a construção militar em mais de 90%”

(NAVARRO, 1991, p.204). Os maiores gastos militares representaram transferência de fundos federais sociais para o militar como enfatiza Navarro (1991).

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tentativas, não foi possível resistir às pressões do mercado financeiro; dessa forma, o governo francês “[...] se viu forçado a mudar seu curso drasticamente e reorientar-se para fazer uma política muito próxima à ortodoxia neoliberal [...]” (ANDERSON, 1995, p. 13).

Chama atenção o fato de até governos ditos de esquerda terem aceitado, de maneira subserviente, as instruções da cartilha neoliberal, uma vez que, a princípio, somente governos direitistas o haviam feito.

Tendo como álibi o combate à inflação que marcou a década de 1970, o neoliberalismo conseguiu ser eficiente. Segundo Anderson (1995 p.14-15):

A prioridade mais imediata do neoliberalismo era deter a grande inflação dos anos 70. Nesse aspecto, seu êxito foi inegável. No conjunto de países da OCDE, a taxa de inflação caiu de 8,8% para 5,2%, entre os anos 70 e 80, e a tendência de queda continua nos anos 90.

Contudo, algumas ressalvas devem ser feitas. O custo para que isso fosse possível passava pela recuperação dos lucros via deflação. Então, foram impostas duras derrotas aos sindicatos e, por conseguinte, redução do número de greves e controle impiedoso dos aumentos salariais. Outro ponto que merece destaque diz respeito à redução da tributação em cima dos salários mais altos nos países que compunham a Organização Europeia Para o Comércio e Desenvolvimento (OCDE) (ANDERSON, 1995).

Se, por um lado, as medidas adotadas para se conter a inflação e recuperar os lucros foram eficazes, por outro, nos anos de 1980, não se alcançou o crescimento econômico esperado, assim como ocorreu na década anterior. Por conta da desregulamentação financeira empregada, houve uma migração dos recursos financeiros da esfera produtiva para a esfera especulativa.

O processo de reestruturação produtiva também tem sua parcela de contribuição nos rumos em que o capitalismo tomou a partir do advento neoliberal. De acordo com Filgueiras (2006a, p 64-65):

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As inovações tecnológicas e as novas formas de organização do trabalho, que são tidas como fatores positivos no que diz respeito à fase de acumulação flexível do capitalismo, revelam sua outra face, ou seja, o aumento do desemprego estrutural, o qual é a própria expressão fenomênica das contradições dessa nova fase. Portanto, ainda de acordo com Filgueiras (2006a, p.65):

A natureza das inovações tecnológicas e organizacionais, juntamente como

o reduzido crescimento econômico – próprio de uma fase do capitalismo

caracterizada pela mais absoluta hegemonia do capital financeiro e, por

decorrência, de sua lógica de funcionamento – determinam a existência de

elevadas taxas de desemprego e/ou a ampla disseminação da precarização do trabalho.

Anderson (1995) lembra que devido à recessão econômica do ano de 1991, esperava-se uma reação contrária ao neoliberalismo. Este, no entanto, ganhou novo fôlego com a eleição de uma leva de presidentes de direita em países como Inglaterra, Suécia e Itália.

Para finalizar, a indagação feita por Anderson (1995, p. 22):

A pergunta que está aberta é se o neoliberalismo encontrará mais ou menos resistência à implementação duradoura dos seus projetos aqui na América

Latina do que na Europa ocidental ou na antiga União Soviética. Seria

o populismo – ou obreirismo – latino-americano um obstáculo mais fácil ou

mais difícil para a realização dos planos neoliberais do que a social-democracia reformista ou o comunismo?

Cabe ressaltar que o esforço do presente trabalho se concentrará em procurar respostas para o caso brasileiro. A pergunta lançada data de 19943, e, examinando o caso brasileiro a partir daquele ano, tivemos a eleição de Fernando Henrique Cardoso, reeleito em 1998, e, de forma semelhante, Lula, eleito em 2002 e reeleito em 2006. Portanto, será possível verificar em que medida os dois governos adotaram o ideário neoliberal.

3

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2.1 No Brasil

Durante a década de 1980, diversos países latino-americanos sofreram com a crise da dívida externa e, por isso, viram-se obrigados a aderir, de maneira servil, às imposições dos organismos financeiros internacionais. O cerne do problema havia sido gestado na década anterior, em que a oferta internacional de crédito era abundante e os juros encontravam-se em patamares considerados baixos, ou seja, havia facilidade na contração de empréstimos internacionais. A elevação das taxas de juros estadunidense, somada ao segundo choque do petróleo, em 1979, foram os estopins de uma era de dificuldades relacionadas a pressões cambiais e ao aumento do montante dos juros das dívidas dos países tomadores. Para complementar o cenário caótico, não era mais possível contrair empréstimos com a facilidade anteriormente encontrada (FILGUEIRAS 2006a).

Eram diferentes os países e diferentes os casos, mas o receituário era sempre o mesmo. Os diversos planos de estabilização econômica, introduzidos nos variados países da América Latina, tinham a mesma linhagem, como aponta Filgueiras (2006a, p. 94, grifo do autor):

Em todos os lugares onde foram adotados, esses planos seguiram, sempre, o mesmo roteiro: combate à inflação, através da dolarização da economia e a valorização das moedas nacionais, associado a uma grande ênfase na necessidade do “ajuste fiscal”. Acompanharam a realização de reforma do

Estado – sobretudo privatizações e mudanças na seguridade social –

desregulamentação dos mercados e liberalização (internacionalização) comercial e financeira.

Apesar de ter fincado raízes na América Latina, durante a década de 1980, o neoliberalismo encontrou certa resistência para ser implantado no Brasil. As lutas populares, típicas dos movimentos organizados, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT), tiveram papel exemplar na resistência ao avanço da onda neoliberal no Brasil4.

4 Datam dos anos de 1980 pelo menos cinco greves gerais organizadas pela mobilização da classe

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O quadro abaixo é um exemplo histórico retrado em uma matéria de jornal dos anos de 1980 e mostra a proporção que as greves, principalmente do ABC paulista, tomava.

Quadro 1: Uma das principais greves da década de 80

Fonte: Adaptado do jornal Folha de São Paulo, 22 de julho de 1983.

É muito importante, senão clássica, a mobilização política dos trabalhadores, a qual fez surgir um partido político de massa5, a ponto de representar ameaça ao

poder das classes dominantes. Por conta de não conseguir tornar hegemônico seu projeto nacional, democrático e popular, possibilitou a vitória do projeto neoliberal. Por isso, apesar das contradições e das disputas internas, as diversas frações do capital uniram-se em torno da candidatura de Collor (FILGUEIRAS, 2006b).

O ex-governador de Alagoas “[...] apresentou-se como outsider do empresariado, das associações sindicais, da política e dos partidos políticos”

(FILGUEIRAS, 2006a, p.85). Collor surgiu na disputa presidencial de 1989 como uma figura dúbia, dada a fragilidade do seu discurso, pois prometia defender os

interesses dos mais necessitados(os “descamisados” e os “pés descalços”)

enquanto recebia apoio das elites do país, principalmente da mídia que trabalhou na construção de sua candidatura e dos ruralistas. Tavares (1998, p.32-33) explica a relação de Collor com a mídia:

Na época a imprensa seguia todos os passos do candidato e Collor se aproveitou do seu poder de sedução e acabou recebendo tratamento generoso por parte da maior rede de televisão do país, a TV Globo, um ícone da cultura nacional. [...] Fernando Collor foi, sem dúvida nenhuma, um candidato formado pelo mais elaborado e eficiente marketing político.

5 Trata-se do Partido dos Trabalhadores (PT), fundado em 1980.

A greve nacional de protesto contra a política econômica do governo praticamente ficou restrita à Grande São Paulo, onde a paralisação foi apenas parcial, mas a população viveu ontem um dia de medo, refletido nas ruas vazias e na grande quantidade de lojas que, por precaução não abriram suas portas na Capital, como se fosse feriado.

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Beneficiando-se de todos os holofotes e das bênçãos da poderosa mídia a favor de sua campanha, Collor elegeu-se como o primeiro presidente por voto direto após a ditadura militar.

A agenda neoliberal proposta pelo Consenso de Washington ganharia adesão durante o governo Collor. Sob a batuta do FMI e do Banco Mundial, um conjunto de reformas estruturais deveria ser feito. Os pontos propostos foram basicamente: disciplina fiscal, redução dos gastos públicos, reforma tributária e previdenciária, liberalização financeira, câmbio flutuante, liberalização comercial, investimento direto estrangeiro, privatização, desregulamentação das relações trabalhistas e de setores controlados ou cartelizados e, por fim, garantia da propriedade intelectual (ao que tudo indica, visava tão somente estabelecer um monopólio favorável aos

patenteados). Mas é possível afirmar que “[...] o colapso do governo Collor frustraria o alinhamento total do Brasil ao Consenso de Washington. É difícil, senão inconveniente, voltar atrás no muito que já se caminhou naquela direção” (BATISTA, 1994, p. 28). Por conta do impeachment, Collor deixou a Presidência da República em 1992.

A trágica experiência vivida na era Collor não serviu de impulso para a ruptura com o modelo neoliberal; pelo contrário, foi depois dela que se abriu espaço para ascensão de Fernando Henrique Cardoso à presidência da República. Com status de progenitor do Plano Real, o então Ministro da Fazenda do governo Itamar Franco se fortaleceu na disputa presidencial respaldado pelo “sucesso” obtido sobre a inflação.

O governo Fernando Henrique Cardoso, como aponta Antunes (2005), seguiu outra racionalidade, mas continuou alinhado com o mesmo ideário do Consenso de Washington. Dessa maneira, foram mantidos os processos de transformação estrutural, ou seja, foi dada continuidade ao conjunto de reformas tipicamente liberais iniciadas no governo anterior.

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Antunes (2005, p. 131-32) analisa assim o período do governo Fernando Henrique Cardoso:

Eleito em 1994, depois do desastre da fase Collor, FHC conseguiu posteriormente, em 1998, a reeleição. Ficou, desse modo, governando o país por oito anos. Nesse período, o nosso parque produtivo foi enormemente alterado e retraído pela política intensa de privatização do setor produtivo estatal (especialmente na siderurgia, telecomunicações e energia elétrica), o que alterou sobremaneira o tripé que sustentava a economia brasileira (capital nacional, capital estrangeiro e setor produtivo nacional), elevando o binômio integração/subordinação do país ao universo globalizado e desorganizando o padrão produtivo existente nas últimas cinco décadas.

Do governo Lula, muitos esperavam que fosse o marco da ruptura com as políticas econômicas notadamente liberais. No entanto, ao que tudo indica, “[...] o governo Lula manteve a mesma política do segundo governo Cardoso – metas de inflação, ajuste fiscal permanente e câmbio flutuante” (FILGUEIRAS; GONÇALVES, 2007, p. 101).

Paulani (2008) explica que muitos economistas acreditam haver uma só política macroeconômica, não havendo, portanto, política econômica de direita, de centro ou de esquerda. A política econômica certa seria tecnicamente fundamentada e neutra; a errada, por conseguinte, seria irresponsável, ingênua, utópica e populista.

Continuando a análise sobre o governo Lula, Filgueiras e Gonçalves (2007, p. 21) afirmam que:

No governo Lula configura-se um processo de adaptação passiva e regressiva do país ao sistema econômico internacional, em geral, e ao sistema mundial de comércio, em particular. A maior competitividade internacional está centrada nos produtos intensivos em recursos naturais e se dá, no essencial, mantendo o mesmo padrão de especialização existente.

No campo da política social, observa-se uma relação muito próxima com a política herdada do governo anterior. O Bolsa Família, carro-chefe da política social do governo Lula, é o que se pode chamar de política social focalizada feita a partir, pura e simplesmente, da transferência direta de renda.

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anteriormente, o eixo da atual política social é o Bolsa Família, ou seja, política assistencialista, com grande potencial clientelista.

O tipo de política social praticado combina perfeitamente a flexibilização e precarização do trabalho com programas focalizados e flexíveis. Lula demonstrou habilidade quando conseguiu utilizar as políticas assistencialistas a seu favor. Elas serviram tanto como uma espécie de escudo para que as medidas neoliberais passassem de forma quase despercebida pela grande maioria da população como instrumento de cooptação da faixa à qual é destinado esse tipo de política.

Quando se observam as reformas introduzidas no mercado de trabalho, percebem-se a manutenção das desregulamentações e a diminuição dos direitos sociais; além disso, a fiscalização não funciona de maneira eficiente – e, por isso, não há respeito à legislação trabalhista – e falta política salarial de reposição das perdas, no sentido contrário está a Lei de Falência6, que foi aprovada beneficiando

o sistema bancário em detrimento dos trabalhadores (BOITO JR, 2006).

A herança da privatização deixada por Fernando Henrique Cardoso a Lula não sofreu nenhum tipo de alteração. Boito Jr (2006, p. 57) fornece uma síntese dessa questão:

O governo Lula herdou e manteve essa privatização, inclusive os contratos leoninos que asseguram alta lucratividade aos novos monopólios privados, e nem sequer cogitou investigar os casos de corrupção mais rumorosos que envolveram a política de privatização. [...] Os projetos encaminhados pelo governo Lula de Parceria Público-Privadas para serviços públicos e infra-estrutura (sic) e o projeto-lei de privatização do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) são as suas propostas de privatização.

Para completar, a ascensão ainda maior do grande capital financeiro confirma o traço de continuidade do governo Lula em relação ao anterior. A combinação de uma série de benesses oferecidas ou mantidas ao capital financeiro proporcionou um ambiente extremamente favorável.

A justificativa do governo Lula para continuidade de elementos da política do governo anterior era que não se podia romper com o modelo anterior sem antes fazer a travessia segura para outro, senão, a credibilidade do governo seria afetada. Os elementos da política econômica e social dos governos Fernando Henrique

6 A partir de um determinado valor, a prioridade é dada ao pagamento de dívidas bancárias, em vez

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3 A eleição de Fernando Henrique Cardoso

A eleição presidencial de 1994 colocou frente à frente o sociólogo e

“intelectual” Fernando Henrique Cardoso e o ex-metalúrgico do ABC paulista Luiz Inácio Lula da Silva. O primeiro trazia na bagagem a experiência como Ministro da Fazenda e a fama de mentor intelectual do Plano Real. O segundo, por sua vez, apresentava-se como a esperança dos movimentos sociais organizados, mencionados anteriormente.

No início da corrida presidencial, as pesquisas de opinião indicavam vantagem do candidato Lula em relação a Fernando Henrique Cardoso. As notícias de jornal da época davam conta da polarização entre as duas candidaturas e das alterações que poderiam ocorrer nos números das pesquisas posteriores, caso o resultado do Plano Real fosse positivo no combate à inflação.

Quadro 2: A mídia nas eleições de 1994

Fonte: Adaptado do jornal Folha de São Paulo de 17 de julho de 1994. A mais recente pesquisa Datafolha sobre a sucessão presidencial, que a Folha publica hoje, confirma a notável estabilidade nas intenções de voto dos principais candidatos. É pouco provável que esse quadro se altere significativamente até o fim de julho ou começo de agosto.

(...). Caindo a inflação, como aposta a grande maioria dos economistas, a candidatura FHC tende a mexer-se do patamar em que estacionou nos últimos dois meses.

É provável, porém, que esse fato novo só se introduza no cenário eleitoral a partir de

agosto. A própria equipe econômica arquivou o discurso triunfalista – em que recaíra o

próprio FHC, enquanto ministro de que a inflação baixaria a zero assim que o real chegasse.

Admite-se, no governo, que os índices do primeiro mês do real estarão contaminados pelos resíduos da inflação em cruzeiro real. Logo, esperar algo muito perto de zero em julho fica fora de cogitações.

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Fernando Henrique Cardoso, usando o discurso vitorioso do Plano Real, ultrapassou Lula nas pesquisas de intenção de voto e, consequentemente, aproveitando-se disso, conseguiu traduzir os resultados em forma de votos. Iniciava-se, a partir de então, uma era que se estendeu por dois mandatos. O conjunto de transformações drásticas que o país conheceu no inicio da década ganharia tom mais agudo na era FHC.

Nessa perspectiva, não é possível fazer uma análise da era FHC deixando de lado seu maior cabo eleitoral: o Plano Real. Para tanto, é necessário deixar claro que a introdução do novo plano não se deu de maneira imediata. Dividida em três fases, a introdução se deu da seguinte forma:

 Primeira fase (ajuste fiscal) – ocorrida entre julho de 1993 e agosto de 1994 –

Significou, sobretudo, uma manobra com o objetivo de garantir as condições necessárias para introdução da nova moeda. Destaca-se a aprovação do Fundo Social de Emergência (FSE), que possibilitou cortes no orçamento do governo para o ano de 1994, além de dar flexibilidade ao uso dos recursos e controle no fluxo de caixa. Filgueiras (2006a, p. 102-03) chama atenção para o seguinte fato:

No discurso do governo, este fundo, aprovado através de emenda à Constituição, deveria ter por objetivo, tal como em outros países da América Latina que passaram por experiências de estabilização, minorar os custos sociais decorrentes da implementação do plano. [...] Mais tarde, no entanto, com a destinação de suas verbas para outras finalidades, como, por exemplo, as que foram enviadas ao Ministério do Exército, às Polícias Rodoviária e Federal e ao DNOCS -, ficaria evidente que o Fundo se caracterizou, de fato mais como um artifício para se aumentar a liberdade de manipulação dos gastos públicos no interior do orçamento, do que como um instrumento social propriamente dito, servindo, sobretudo, ao objetivo de se buscar o equilíbrio fiscal primário e ao uso eleitoral.

Vale lembrar que houve um aumento nos impostos federais e a criação do Imposto Sobre Movimentação Financeira (IPMF); além disso, o governo efetuou

(25)

 Segunda fase (introdução da Unidade de Referência de Valor - URV) – 1° de março de 1994 a 1° de julho de 1994 – Consideradaum superindexador, pois fazia uma espécie de mixagem entre três indexadores: IGP-M da Fundação Getúlio Vargas, IPCA do IBGE e o INPC da FIPE-USP.

 Terceira Fase (a nova moeda) – A URV se transformou em Real, na proporção de um por um (R$ 1,00 = 1 URV); da mesma forma ocorreu com a taxa de câmbio Real/Dólar, ou seja, foi acertado que R$ 1,00 valeria US$ 1,00. Na visão de Filgueiras (2006a, p. 107-08):

Nesta última fase do plano, evidenciou-se a natureza específica da “dolarização” proposta para economia brasileira. Apesar de amarrar a nova moeda ao dólar, o governo não garantiu, ao contrário do que na Argentina,a conversibilidade entre as duas moedas.

No primeiro momento, para que fique claro, houve uma combinação entre combate à inflação, crescimento e aumento do emprego. Mas, em contrapartida, observou-se um processo de abertura da economia e uma política de juros altos, implicando uma maior entrada de capitais especulativos (FILGUEIRAS, 2006a).

3.1 Os custos da implantação do plano

A partir da implantação do plano real, ficaram evidentes os desequilíbrios estruturais e a instabilidade macroeconômica da economia. Criou-se um cenário em que o país ficou mais suscetível a impactos externos, ou seja, a economia brasileira ficou mais vulnerável (FILGUEIRAS, 2006; PAULANI, 2008).

Contribuíram para a conformação desse cenário: a taxa de câmbio sobrevalorizada, a abertura da economia e um dos mais importantes elementos do plano, a famigerada âncora cambial, que, para se sustentar, demandava elevados níveis de reservas cambiais, os quais, por sua vez, eram atraídos à custa de taxas de juros em níveis altíssimos (FILGUEIRAS, 2006a).

(26)

formas, afastar os efeitos da crise vivida por Argentina e México sobre a economia brasileira. Os modelos adotados pelos países periféricos, muito similares, diga-se de passagem, tinham a sobrevalorização cambial como remédio contra a inflação e visavam sustentar crescimento e abertura econômica ao mesmo tempo (FILGUEIRAS, 2006a).

Ainda com base na análise de Filgueiras (2006a, p. 126), pode-se questionar a viabilidade da estratégia adotada no Brasil:

No Brasil, com a fuga de capitais que ocorreu a partir daí, percebeu-se que essa estratégia era insustentável a longo prazo, uma vez que o equilíbrio no balanço de pagamentos ficava na dependência da entrada de capitais especulativos, atraídos, necessariamente, por taxas de juros cada vez mais elevadas, ou na dependência da existência de reservas cambiais estáveis, uma vez que seu montante passou a depender exatamente desses capitais voláteis, já que o crescimento dos saldos negativos na balança comercial potencializava o déficit da conta de transações correntes.

Tratando do caso brasileiro, o remédio utilizado a fim de neutralizar os danos provados pelos solavancos externos e pela debandada dos capitais especulativos trazia em sua composição uma série de medidas, as quais vão desde a elevação da taxa de depósitos compulsórios até o controle da importação de automóveis7. As medidas fiscais ficaram por conta dos cortes no orçamento, da mudança nos pagamentos dos servidores públicos, da redução nas despesas de custeio das empresas públicas e bancos federais e da medida mais impactante: a inclusão da Companhia do Vale do Rio do Doce no programa de privatização (FILGUEIRAS, 2006a).

De todo modo, as iniciativas colocadas em prática ensejavam garantir certo grau de confiabilidade da economia brasileira perante os especuladores internacionais. Dessa forma, o que se pôde observar, logo em seguida, foi o retorno dos capitais especulativos. As reservas cresceram, sendo que, no ano de 1995, fecharam no patamar de US$ 51 bilhões (FILGUEIRAS, 2006a).

O capital especulativo busca ambientes com altas taxas de juros e com outras condições que possibilitem sua alta reprodução. No caso de cenários econômicos com advento de crises, a fuga ocorre em massa. É o chamado “efeito manada”.

7

(27)

Gráfico 1 - Investimento em carteira – Total (líquido) – anual e Reservas internacionais – conceito liquidez: Saldo em US$ milhões

Fonte: Banco Central.

A crise dos países asiáticos (Coreia do Sul, Tailândia, Filipinas, Malásia, Hong Kong) em 1997, a qual teve como estopim a desestruturação do sistema financeiro daqueles países, provocou uma nova onda de instabilidade financeira internacional. A fim de afastar os efeitos de uma fuga de capitais sobre a economia brasileira, o governo agiu de maneira austera. A taxa de juros, mais uma vez, foi aumentada, passando a 43% ao ano; para garantir a entrada de capitais estrangeiros, uma série de medidas foi tomada, e um novo pacote econômico, conhecido como Pacote 51, chegou a ser anunciado.

As medidas ficariam por conta, por um lado, da contenção de despesas, ou seja, envolveria a demissão de funcionários não estáveis (33 mil) e corte no reajuste salarial, redução de 15% dos gastos em atividades e corte de 6% em projetos de investimento; por outro lado, o das receitas, ficariam por conta do aumento no Imposto de Renda de Pessoas Física (10%) e da redução das deduções, da elevação das alíquotas sobre automóveis e da elevação dos preços dos derivados de petróleo e álcool (FILGUEIRAS, 2006a).

12.324,60 50.642,20 9.216,80 21.618,90 12.615,60 18.125,00

3.801,60 6.955,10 77

-5.118,60 32.211 38.806 51.840 60.110 52.173 44.556 36.342

33.011 35.866

37.823 -10.000,00 0,00 10.000,00 20.000,00 30.000,00 40.000,00 50.000,00 60.000,00 70.000,00

1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Investimento em carteira - Total (líquido) - anual

(28)

Ainda segundo Filgueiras (2006a), os objetivos traçados pelo pacote não alcançaram o tão esperado sucesso, e diversas das medidas anunciadas não saíram do papel.

Pouco tempo depois, houve a crise da Rússia (1998). Não muito diferente das crises anteriores, verificou-se uma leva de medidas, a fim de conter os estragos que poderiam ser provocados na economia brasileira. O teor das medidas não sofreu muita alteração. Portanto, houve a elevação da taxa de juros e a concessão de benefícios ao capital estrangeiro. Além disso, um novo pacote econômico, que trazia em seu bojo a contenção das despesas e a elevação de impostos, foi anunciado e entrou em vigor no ano de 1999.

Mesmo assim, ainda no ano corrente (1998), realizaram-se cortes dos gastos federais e das estatais, redução dos desembolsos de empréstimos feitos pelos bancos federais aos estados e municípios, adoção de meta para superávit do governo federal e, por fim, criação de uma espécie de comissão para garantir o alcance das metas (FILGUEIRAS, 2006a).

Sob os diversos aspectos, é possível afirmar que a economia brasileira experimentou consequências não muito agradáveis. Há que se dizer que a dívida pública interna aumentou consideravelmente e que as receitas advindas das privatizações não foram suficientes para compensar esse aumento; por isso o custo foi repassado à sociedade na forma de impostos (FILGUEIRAS, 2006a; LESBAUPIN; MINEIRO, 2002).

No caso das Transações Correntes, os somatórios dos péssimos resultados da balança comercial com os da balança de serviços contribuíram para manutenção dos déficits, os quais, embora já existissem, foram dilatados no período que vai de 1995 a 1998. No entanto, é possível observar uma redução desses déficits no período que vai de 1999 a 2002, ocasionada pela redução e, posteriormente, pela inversão nos déficits na balança comercial e em menor escala pela sensível melhora na balança de serviços. Filgueiras (2006a, p.247) confirma e complementa hipótese aqui levantada:

(29)

principalmente, pela performance da balança comercial e, menor intensidade, da balança de serviços.

O gráfico 2 ilustra o que foi dito anteriormente em relação à redução nos déficits em transações correntes. Percebe-se a melhora na balança comercial a partir de 2000 e a pequena melhora na balança de serviços no fim do período (2002). Utilizando-se da análise acima, feita Filgueiras (2006a), pode-se afirmar que os impactos das crises cambiais (especialmente a crise do Brasil) tiveram importância relevante, uma vez que, as importações e a viagens internacionais se tornaram mais caras, sobretudo, a partir de 1999. Além disso, o câmbio desvalorizado torna as exportações brasileiras mais baratas, o que as torna mais competitivas em termos de preços.

Gráfico 2 – Transações correntes, Balança de Serviços e Balança Comercial – 1993 a 2002: Saldo em US$ milhões.

Fonte: IPEADATA.

O Plano Real resistiu durante os primeiros quatro anos do governo FHC, mas após as sucessivas crises não foi mais possível sustentar o regime de câmbio fixo. Ainda assim, de acordo com Filgueiras (2006a, p.189, grifo do autor):

A necessidade de correção do caminho que conduziu o país em direção à crise cambial, insistentemente reivindicada por economistas de distintas tendências, principalmente após as crises de México, da Ásia e da Rússia,

foi rechaçada sistematicamente –a partir de uma crença que “apostava” na

iminência de um salto de competitividade da economia brasileira, que iria pôr ordem na balança comercial do país.

Todavia, apesar de todo esforço empreendido no intuito de sustentar a âncora cambial, a qual viabilizava o regime de câmbio fixo, a dinâmica dos acontecimentos

-40000 -30000 -20000 -10000 0 10000 20000

1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

(30)

tratou liquidar todas as expectativas governo. Por isso, Filgueiras (2006a, p.189, grifo do autor) explica que:

A crise derradeira [da Rússia], que inviabilizou de vez a âncora cambial e a sobrevalorização do real, foi quase como a “crônica de uma morte anunciada” que testava a capacidade do Governo Cardoso em sustentar a nova posição. As reações se fizeram sentir nas quedas dos títulos brasileiros e das bolsas de valores em todo mundo.

A crise brasileira empurrou o país a um novo acordo com o FMI e pelo menos três empréstimos foram tomados nos anos de 1999, 2001 e 2002, os quais, de acordo com Filgueiras (2006a), foram utilizados para conter a crise do balanço de pagamentos.

A explicação do governo para o aumento das contas externas e públicas dava a entender que se gastava mais do que se arrecadava. Sendo assim, tornava-se necessário recorrer à poupança externa, que aumenta o déficit em transações correntes, a fim de possibilitar o aumento do investimento interno8. Nessa perspectiva, seria necessário aumentar a taxa de juros, no intuito de atrair poupadores que financiassem o déficit público. Por fim, o excesso de demanda do setor público teria de ser suprido através de importações que, mais uma vez, se realizariam à custa de capitais externos. Recorrer à estratégia de aumentar a taxa de juros deixa o país mais vulnerável a uma crise cambial, tendo em vista que a dependência externa se torna maior9.

Dadas todas as explicações, a solução utilizada para neutralizar todos esses efeitos seria um ajuste fiscal (corte nas despesas e aumento da receita) que, na teoria, garantiria, entre outras coisas: estabilidade de preços, crescimento do PIB, melhora do desequilíbrio externo e redução da taxa de juros.

Em pelo menos um ponto, o Plano Real cumpriu seu papel. É certo que o objetivo de reduzir a inflação foi alcançado, mas a fatura a ser paga custou muito caro ao país. Filgueiras (2006a, p. 161) faz as seguintes considerações:

Portanto, a contrapartida da estabilização dos preços foi a vulnerabilidade externa, com o aumento da dívida líquida do país, que foi acrescida, no

período, em mais de US$ 72 bilhões – empréstimos e financiamentos

menos amortizações -; a perda de boa parte do patrimônio público

8

Recorrer à poupança externa era a solução apontada pelo governo, ou seja, não é a opinião do autor.

9 Na maioria das vezes, a estratégia de aumentar a taxa de juros colabora para atrair capitais

(31)

construído em mais de 30 anos, com privatizações questionadas até do ponto de vista de sua operacionalização e o aprofundamento da desnacionalização da economia brasileira, agora adentrando outros setores, como os de telecomunicações, de energia e financeiro.

As privatizações são um dos pontos-chave da gestão Fernando Henrique Cardoso. De fato, elas se iniciaram na era Collor, mas é a partir de FHC que esse processo se tornou célere.

3.2 A reforma de Estado e as famigeradas privatizações

Em seu primeiro governo, Fernando Henrique Cardoso conseguiu aprovar algumas reformas econômicas, entre as quais estava a extinção do monopólio estatal nas seguintes áreas: petróleo (prospecção, exploração e refino), telecomunicação e energia.

Continuando com as reformas aprovadas, na pauta também estava a reforma administrativa, com intuito de “separar” o que era ou não função do Estado. Dessa

forma, seria possível passar diversas atividades da área social para o setor privado, ou seja, terceirizar. Nas palavras de Filgueiras (2006a, p. 111):

Isso está associado à questão da estabilidade do funcionalismo, identificado como o empecilho fundamental para ajustar as contas públicas, em especial dos estados e municípios. Assim, aprovou-se a possibilidade de demissão

por excesso de quadros – quando os salários pagos ultrapassem mais de

60% das receitas e por ineficiência.

Tudo parecia estar programado desde a época em que FHC era Ministro da Fazenda, pois, na apresentação da “Exposição de Motivos”10 da reforma de Estado,

já se viam sinais de que os servidores públicos seriam um dos principais alvos. No mesmo caminho, as privatizações eram encaradas como prioridades do processo que estava em curso.

Dessa maneira, pela perspectiva dos defensores das privatizações, havia funções das quais o Estado deveria se retirar, pois não fazia mais sentido que este fizesse papel de empresário. Há anos o Estado brasileiro vinha tomando as rédeas de alguns setores, devido à falta de iniciativa privada. Era necessário reverter essa

(32)

situação11. Aguiar12 (1999, p. 74) é um bom exemplo de como pensavam os

governistas:

O diagnóstico era simples. Houve, em nossa economia, momento em que faltaram capitais internos e interesse externo nos grande projetos produtivos e de fornecimento de infra-estrutura (sic). O Estado supriu bem essa carência, mas a fase acabou. Hoje, é evidente a inadequação do Estado diante dos novos desafios, e até mesmo das necessidades de manutenção da pesada estrutura por ele montada.

Também vistas como refúgio de funcionários públicos privilegiados, as estatais eram um “fardo” a ser carregado pelo governo. Portanto, era necessário que o Estado se desfizesse desse “ônus”, a fim de se “modernizar” e, através dos recursos captados, reduzir a dívida pública interna, o que, na realidade, não aconteceu. A dívida pública interna aumentou de forma assustadora, e, mesmo somando as transferências dos títulos podres da dívida e os recursos obtidos com as privatizações, não foi possível fazer frente a tamanha escalada.

A baixa arrecadação com a venda das estatais tem uma explicação: a subestimação do preço de venda. Além disso, o BNDES emprestava os recursos necessários aos compradores com juros financiados. Todo o processo, sem dúvida, representou prejuízo aos cofres públicos. Anunciava-se a quem quisesse ouvir que o governo tinha dificuldades em manter funcionando tamanhas estruturas, mas não se falou nada a respeito das melhorias feitas pelo governo, como no caso das telecomunicações, antes de repassá-las à iniciativa privada.

As informações de Biondi (2003) dão conta de que os investimentos foram de cerca de R$ 21 bilhões no período de dois anos e meio. Não fosse somente isso, há de se dizer que as dívidas trabalhistas dos funcionários demitidos foram assumidas pelo governo. É notável que os compradores obtiveram muitas vantagens, mas o mesmo não se pode dizer em relação ao governo, que vendeu as estatais e socializou as dívidas das estatais vendidas com o povo.

Outra justificativa altamente difundida falava da melhoria dos serviços prestados e da redução das tarifas pelas empresas dos setores de energia e telecomunicações, visto que as empresas seriam postas à concorrência de mercado e produziriam a satisfação esperada. Cabe fazer questionamentos se os serviços

11

Nesse trecho, a intenção é reproduzir a opinião dos entusiastas das privatizações.

12 Não é de se estranhar a opinião de Ubiratan Aguiar, dada sua estreita relação com setores

(33)

melhoraram realmente, ou se tudo não passou de mais uma desculpa. Para isso, é necessário observar alguns indícios que podem ser fornecidos por dados ou até mesmo por consumidores desses serviços.

Se analisados os números do setor de telefonia, por exemplo, verifica-se que os serviços se ampliaram realmente, mas, em contrapartida, como explica Oswald (2010):

A ampliação dos serviços significou receitas cada vez maiores para as operadoras e o aumento expressivo do recolhimento de impostos. O setor, que pagou R$8 bilhões em tributos em 1998, recolheu R$42,8 bilhões no ano passado (435%). Para o sindicato [Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e Serviço Móvel e Celular Pessoal – SindiTelebrasil] , a carga tributária onera o cidadão em mais de 43% sobre o preço dos serviços.

O serviço custa caro e está longe de ser um dos melhores. Ainda segundo Oswald (2010):

As operadoras de serviços de telecomunicações investiram R$ 180 bilhões nos últimos 12 anos na expansão, modernização e melhoria da qualidade da prestação de serviços. Até o fim do primeiro trimestre de 2010, o setor empregava 400,9 mil pessoas. Mas, apesar do aumento da oferta de serviços, o consumidor brasileiro paga a fatura mais cara do mundo pelo uso do celular, segundo o índice de Paridade de Poder de Compra (PPP). Para o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), o Brasil tem o sistema de banda larga caro, lento e mal distribuído por seu território. O setor também é campeão de reclamação de consumidores, segundo o Sindec, que reúne Procons de 23 estados mais o Distrito Federal, sobretudo

em relação a cobrança indevida.

Com o setor de energia elétrica não foi tão diferente. A melhora tão esperada do serviço não aconteceu, e as queixas também são grandes. Em uma matéria do jornal Folha de São Paulo do dia 02 de maio de 201313, é possível encontrar os

principais motivos que geram reclamação: os desligamentos (conhecidos como apagões) e os erros de leitura.

A causa da crise energética de 2001 era atribuída à falta de chuvas, que poderia implicar na baixa capacidade dos reservatórios, mas, na realidade, o problema não era a falta de chuvas e sim a falta de investimentos em melhorias da rede (TOMASQUIM, 2001, apud LESBAUPIN; MINEIRO, 2002).

Ainda fazendo considerações acerca do setor elétrico, têm-se informações de que, a partir do ano do racionamento, é possível notar uma série de benefícios às

13Isso mostra que a qualidade do serviço não melhorou, mesmo tendo passado tanto tempo do

(34)

empresas do setor. Aprovou-se uma medida provisória que possibilitou aumentar o preço das contas residenciais e industriais por um período de seis anos. Por causa dessa medida, foram repassados ao setor recursos titânicos para compensar as

“supostas perdas”, alugar máquinas das termelétricas e pagar combustível destas e, por fim, para pagar energia livre comprada no mercado no ano de 2002. As informações citadas acima tomaram por base Lesbaupin e Mineiro (2002), que utilizaram matérias dos jornais Folha de São Paulo e Jornal do Brasil.

3.3 Políticas sociais

Condizentes com o modelo macroeconômico de ajuste fiscal, as políticas sociais pautavam-se, continuando até hoje, na focalização e não na universalização. Não por acaso, as políticas sociais focalizadas têm estreita relação com as reformas de cunho liberal e visam tão somente minorar os efeitos das políticas propostas pelo Banco Mundial. O modelo de política social focalizado trabalha com um conceito defasado de pobreza14 e “[...] reduz o número real de pobres, suas necessidades e o

montante de recursos públicos a serem disponibilizados – adequando-os ao permanente ajuste fiscal [...]” (FILGUEIRAS; DRUCK, 2006, p. 4).

É por esse motivo que as políticas sociais ficam passivas a cortes que reduzem cada vez mais os investimentos. Lesbaupin e Mineiro (2002, p. 40) apresentam os seguintes dados:

Entre 1995 e 2001, o investimento em saúde cai de 4,8% para 3,9%, a educação desce de 3% para 2%, a parte relativa à habitação permanece durante todo o mandato abaixo de 0,2%, e o setor de assistência e previdência oscila de 17,15% para 14,1% até chegar em 2001 com 18,7% - sendo que a maior parte desse orçamento é a parte da previdência (a parte da assistência social caiu fortemente).

Sofrendo dos males do corte orçamentário, a alternativa proposta à saúde foi a criação da Contribuição Provisória Sobre Movimentação Financeira (CPMF), a fim de obter recursos para aplicação exclusiva. Após idas e vindas, a criação da referida contribuição foi aprovada, mas os recursos a serem obtidos não ficaram restritos à aplicação em saúde; pelo contrário, destinaram-se ao pagamento de dívidas do governo.

(35)

Da mesma forma que se pregava a melhor eficiência dos serviços quando em tutela do setor privado, a ideia passada pelo Banco Mundial priorizava novamente a focalização. Dever-se-ia cobrar os serviços dos que podem pagar e estimular a oferta privada de alguns serviços (COSTA, 1996; CARVALHO, 2002, apud LESBAUPIN; MINEIRO, 2002).

Passando ao caso da educação, o projeto proposto pelo Banco Mundial, como todos, era privatizar. A educação deveria ser pública somente no Ensino Fundamental; no Médio, mista; e, no Superior, totalmente privada. Para enfatizar,

“[...] o argumento usado é que, se a universidade fosse paga, haveria mais espaço para os estudantes pobres, que receberiam bolsas” (LESBAUPIN; MINEIRO, 2002, p. 46).

A qualquer custo, precisava-se encontrar “provas” de que a universidade pública era dispendiosa. Para isso, muitas medidas foram utilizadas, a fim de promover a aceitação por parte das pessoas que compunham a academia. Como explicam Lesbaupin e Mineiro (2002), as principais foram: congelamento de salários, redução de verbas, corte paulatino das bolsas de estudo (mestrado e doutorado) e ameaça à aposentadoria de professores e servidores. Agindo em outra frente, as estruturas das instituições foram deixadas à própria sorte. Em alguns casos, faltava água, luz e serviço de segurança. Por fim, uma das propostas mais chocantes idealizava desvincular o ensino da pesquisa. Por causa dessa perspectiva, criar-se-iam centros de excelência em pesquisa.

Uma contestação feita por Lesbaupin e Mineiro (2002) refere-se à desculpa

da “falta” de recursos para as universidades, pois se tem notícia de que o BNDES financiou atividades de universidades privadas. Diante disso, torna-se falha a alegação de falta de recursos, uma vez que o setor privado foi beneficiado mais uma vez, em detrimento do público.

(36)

serviços e a infraestrutura foram oferecidos de maneira inadequada. De todo modo, uma ressalva feita por Lesbaupin e Mineiro (2002, p. 52) indica uma pequena vitória:

Apesar destas não pequenas dificuldades, muitos assentamentos conseguiram se organizar, estruturar cooperativas, diversificar as atividades e ter como resultado uma alta produtividade. Nestes casos, o assentamento é inclusive um dinamizador da economia da região.

A questão da violência no campo é outra observação a se fazer. Notou-se uma série de conflitos violentos no campo, resultando em massacres de trabalhadores, quase sem nenhuma punição aos responsáveis. Muito disso deve ser creditado ao fato de o governo rotular os movimentos sociais camponeses como criminosos. A comissão da Pastoral da Terra (CPT) é a responsável por divulgar uma série de números que dão a exata noção do tamanho do problema. Por exemplo, somente no ano de 2002, foram registrados 36 assassinatos e 245 ameaças de morte (CPT, 2002).

O direito à propriedade da terra para fins sociais é uma questão importante e não deve ser tratada pela lógica de mercado, assim como foi feito no governo FHC (LESBAUPIN; MINEIRO 2002). Faz-se necessária uma reforma agrária que, de fato, privilegie os camponeses e rompa como a estrutura do agronegócio.

A indústria do agronegócio resume-se a um empreendimento que visa somente o lucro, não importando a forma como a produção seja alcançada. O uso predatório da terra, de agrotóxicos, de maneira indiscriminada, e a especialização em apenas um tipo de cultura são suas principais características (PESSOA; RIGOTTO, 2012). Além disso, o latifúndio, marca registrada do agronegócio, limita o acesso à terra àqueles que realmente necessitam. Por conta dos grandes latifúndios, a função social da terra não é respeitada, ou seja, seu uso pelo indivíduo como moradia e para a produção de alimentos que garantam sua própria subsistência e a de seus familiares (MARÉS, 2010).

Os discursos e as propostas de campanha tentaram passar a ideia que um novo país seria construído. Segundo o próprio Cardoso (2008 p 4, grifo do autor):

(37)

discussão um projeto de transformação da sociedade brasileira. Estão definidas diretrizes claras e viáveis que respondem às necessidades fundamentais do povo brasileiro. Por trás da desorganização do Estado e das dificuldades da economia que a inflação expressava, está o

esgotamento do nosso modelo de desenvolvimento baseado na

industrialização protegida. É preciso definir e implementar um novo modelo de desenvolvimento que combata a miséria, melhore a distribuição de renda, assegure a inserção inteligente da economia brasileira no mundo e reorganize o Estado.

No entanto, de acordo com Lesbaupin e Mineiro (2002, p.7):

Durante os últimos oito anos, este país não teve governo positivo, se considerarmos que um governo deve se caracterizar por ter uma uma (sic) política de saúde, de educação, de habitação, de transporte, uma política industrial e tantas outras necessárias ao desenvolvimento da nação. Ele teve apenas uma política, a política econômica de ajuste. E essa se caracterizou por oferecer o Brasil como um espaço de valorização ao capital financeiro nacional e internacional, multiplicando os lucros dos bancos e dos aplicadores financeiros, com taxas de juros elevadas e sobreendividamento (sic). Foram feitos acertos com os organismos financeiros internacionais para garantir os ganhos dos investidores, comprometendo enorme quantidade de recursos preciosos do orçamento do país transferidos como ganhos financeiros aos credores das dívidas interna e externa

O primeiro trecho citado faz parte do livro Mãos à obra, Brasil: proposta de governo, e, como o próprio título sugere, é apresentada a proposta do então candidato Fernando Henrique Cardoso. O segundo trecho citado foi utilizado para contrapor o primeiro.

No discurso apresentado antes das eleições, como já mencionado, dava-se a entender que o país passaria por uma série de transformações tanto sociais como econômicas, e que, a partir delas, alcançaria o progresso. O discurso não representou a realidade, pois se observou um governo determinado a cumprir sem questionamentos as imposições dos organismos financeiros internacionais e das elites conservadoras do país.

3.4 O mercado de trabalho

O desempenho esdrúxulo do crescimento do PIB, característico de toda a era FHC, enfatiza mais uma vez a face das políticas econômicas ortodoxas, como chama atenção Filgueiras (2006a).

(38)

[...] A dificuldade crescente com as exportações ante o avanço da importação gerou um quadro complexo de déficit comercial [já discutido ], o que complicou ainda mais a sustentação do crescimento econômico diante das altas taxas de juros. A reversão da situação exigia não apenas a mudança do regime cambial, mas a queda nas taxas de juros, com a adoção de uma política de estímulo à produção e ao emprego nacional. Nada disso, todavia, ocorreu.

O regime cambial brasileiro permaneceu inalterado até o ano de 1999, mas, devido às diversas circunstâncias relacionadas às sucessivas crises internacionais, não foi mais possível sustentar o regime de câmbio fixo. Isso ficou evidente após a crise russa, pois a estratégia de manter a taxa de juros em níveis elevados, a qual dava sustentação à âncora cambial, não era mais eficaz no controle dos ataques ao Real (FILGUEIRAS, 2006a).

Devido à abertura econômica e à âncora cambial a piora nas diversas variáveis macroeconômicas ficou visível, inclusive no crescimento do produto a taxas pequenas (gráfico3) - o qual por sua vez, implicou no aumento das taxas de desemprego, ocasionado pelo fechamento dos postos de trabalho - e no crescimento insuficiente da ocupação no comércio e nos serviços. O aumento da população economicamente ativa, que se faz pela entrada de milhões de pessoas no mercado de trabalho, todos os anos, ensejava um crescimento do PIB a taxas maiores do que as observadas (FILGUEIRAS, 2006a).

Gráfico 3 – Variação do PIB (%) – 1994 a 2002

Fonte: IPEADATA.

Em relação às leis trabalhistas brasileiras, Pochmann e Borges (2002) enfatizam que o processo de desregulamentação do mercado de trabalho ocorreu

5,33

4,42

2,15

3,38

0,04 0,25 4,31

1,31

2,66

0 1 2 3 4 5 6

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sob a égide de que elas estavam atrasadas e do elevado custo do trabalho, o que, na verdade, não parece ser verdade, pois, através dessa manobra, foi possível não só modificar a CLT, mas também estabelecer novas modalidades de contrato de trabalho sem a parte do salário, como, por exemplo, o Sistema Simples e o contrato por tempo determinado.

Outro ponto deve ser comentado: a questão dos rendimentos. Devido a uma série de questões relacionadas – como, por exemplo, a ausência de crescimento econômico sustentado somado à expansão do desemprego –, a maior escolarização e a qualificação da oferta da mão de obra desencadearam maior concorrência no interior das classes trabalhadoras, levando a piora da parcela salarial na renda nacional. Nesse contexto, o efeito das políticas de desregulação do mercado de trabalho, somado ao chamado processo de terceirização das definições salariais e ao enfraquecimento do poder dos sindicatos, contribuiu para a queda nos rendimentos do trabalho. (POCHMANN; BORGES, 2002).

No bojo de todas as transformações impostas à regulação do mercado de trabalho, não poderia ser deixada de lado a reforma da Previdência. A Proposta de Emenda Constitucional 3315, que tratava da reforma, previa uma série de mudanças

na maneira como as aposentadorias se dariam. As principais mudanças inseridas foram: aumento da idade mínima para aposentadoria (60 anos para homens e 55 para mulheres); a substituição da aposentadoria por tempo de serviço pela aposentadoria por tempo de contribuição (35 anos para homens e 30 para mulheres); e a instituição de limite de idade para a aposentadoria integral dos servidores públicos (53 anos para homens e 48 para mulheres). No primeiro momento, a reforma da Previdência Social prejudicou mais os trabalhadores do setor privado.

Para toda e qualquer reforma danosa à sociedade, sempre havia algum argumento. No caso da Previdência não foi diferente. E qual foi o argumento utilizado?

A Previdência Social foi apontada como a causadora do déficit público, portanto, era uma questão de ajustamento das contas do governo. Mas isso é

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apenas um argumento do governo. Não se pode aceitar tudo o que é posto sem antes fazer uma investigação. O estudo intitulado A reforma da previdência: a verdade nua e crua, do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (UNAFISCO SINDICAL), desmente todos os argumentos do governo.

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Gráfico  1  -  Investimento  em  carteira  –   Total  (líquido)  –   anual  e  Reservas  internacionais  –  conceito liquidez: Saldo em US$ milhões
Gráfico 2  –  Transações correntes, Balança de Serviços e Balança Comercial  –  1993  a 2002: Saldo em US$ milhões
Gráfico 3  –  Variação do PIB (%)  –  1994 a 2002
Gráfico 4: Transações Correntes (FOB)  –  2002 a 2010: Saldo em US$ milhões
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Referências

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