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A SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO BÁSICA: RUMO A INTEGRALIDADE

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Academic year: 2021

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A SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO BÁSICA: RUMO A INTEGRALIDADE

RESUMO:

O presente Resumo Expandido apresenta uma discussão teórico-conceitual sobre a importância da presença da saúde mental na atenção básica. Para tanto, pauta-se na revisão bibliográfica de artigos científicos, manuais e livros sobre a saúde mental e atenção básica e na experiência com quatro turmas de Agentes Comunitários de Saúde e Auxiliares e Técnicos de Enfermagem de quatro municípios diferentes do Curso de Formação em Saúde Mental (crack, álcool e outras drogas) do projeto Caminhos do Cuidado. Com base na junção de elementos dessas duas fontes, identificou-se aspectos que apontam para a importância da aproximação da saúde mental e da atenção básica.

PALAVRAS-CHAVE:

Saúde Mental; Atenção Básica; Sujeito; Integralidade

INTRODUÇÃO:

Costuma-se pensar a saúde mental como um campo de estudo e práticas específicos. Não sem razão, pois sua constituição envolve marcadores históricos que são exclusivos e conceitos que lhe são particulares. Apresenta-se como campo abrangente, plural e polissêmico, que envolve contribuição de diversas disciplinas e que por isso mesmo é, inclusive, difícil de ser definido. Optamos por defini-lo como um campo das políticas públicas ligado à saúde das pessoas (AMARANTE, 2007).

A saúde mental é fruto das discussões provenientes dos movimentos da luta antimanicomial e da reforma psiquiátrica, que possibilitaram ampliar as formas de abordar o sofrimento psíquico, priorizando atividades de caráter multiprofissional, que privilegiam estratégias considerando o território em que o sujeito vive e não somente o hospital e utilizando contribuições de diversas áreas do saber, possibilitando, por vezes, na prática, a interdisciplinaridade. Como estratégia de rever o modelo de assistência, antigamente pautado na assistência hospitalar, criaram-se os CAPS’s.

Desde então essas instituições vêm tentando desenvolver práticas em saúde coerentes com a reforma psiquiátrica, culminando na constituição do campo de atenção psicossocial, que implica num fazer pautado em habilitar e potencializar os circuitos de trocas nos territórios existenciais, o que é diferente de criar circuitos de vida paralelos e protegidos para os usuários.

O fato é que os CAPS’s atingem parte específica das situações que envolvem intenso sofrimento psíquico. Ademais, parte considerável das demandas de saúde “física” atendidas em unidades de saúde evocam questões da saúde mental. Como dar atenção a essas situações e acolher esses sujeitos? Por isso os CAPS’s tem se aproximado cada vez mais da atenção básica em saúde.

MÉTODO:

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Saúde Mental (crack, álcool e outras drogas) para Agendes Comunitários de Saúde (ACS), Auxiliares e Técnicos de Enfermagem (ATEnF) das Equipes de Saúde da Família (ESF) de 4 municípios do estado de Santa Catarina, com suas peculiaridades em termos de rede e território e particularidades quanto a representações sobre o envolvimento dos profissionais da saúde com suas práticas e com os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS).

RESULTADOS E DISCUSSAO:

A atenção básica tem se demonstrado um lugar estratégico para implementar ações de cuidado em saúde, pois é a principal porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS), inclusive para as situações de saúde mental, e um lugar privilegiado no acesso para o reconhecimento dos elementos condicionantes da vida dos sujeitos/usuários, que possibilitam a criação de modos e estilos de vida. Ao considerar isso, os sujeitos/usuários passam a ser reconhecidos a partir de suas histórias e para além de suas queixas. Neste sentido, a atenção primária de saúde assume um lugar privilegiado para abordar questões relativas à saúde mental, pois possibilita ações visando à autonomia, utilizando-se de recursos materiais e afetivos da própria comunidade e seu entorno.

São princípios norteadores da atenção básica: a universalidade, a acessibilidade, o vínculo, a continuidade do cuidado, a integralidade da atenção, a responsabilização, a humanização, a equidade e a participação social. Essas ideias, caso materializadas nas práticas de saúde, evidenciam a importância da atenção primária e como ela tem lugar estratégico ao se pensar no trabalho em rede, pois é o espaço em que as práticas se dão mais próximas das experiências de vida do sujeito. Cabe à atenção básica “ser base, atuando no mais elevado grau de descentralização e capilaridade”, o que remete diretamente as potencialidades relacionadas a acompanhar o sujeito e construir estratégias de abordagem do mesmo a partir do território e de seu cotidiano (BRASIL, 2013).

Uma ideia fundamental para se entender e apostar na junção das políticas de saúde mental e atenção básica é não dissociar saúde mental de saúde física. Tal separação remonta a uma dicotomia já há muito identificada, notadamente nos desenvolvimentos teóricos de René Descartes, que separava corpo e mente. Tal divisão possibilitou um sem número de desenvolvimentos, inclusive o próprio avanço das pesquisas com o organismo humano, no entanto, causou uma cisão artificial do campo dos afetos e pensamentos, demonstrações da subjetividade, com a objetividade do organismo vivo da espécie humana.

Esta cisão criou áreas específicas de interesse e a divisão de responsabilidades e trabalhos entre os profissionais, fazendo com que as ações voltadas ao sujeito humano se dessem de forma compartimentalizada, apoiada em disciplinas específicas que visavam o entendimento sobre um recorte do humano, sem que tal área sequer reconhecesse suas fronteiras e necessidades de diálogo com outros campos do conhecimento.

Afirmar que a saúde mental não é dissociada da saúde física, não é afirmar falta de especificidades no manejo do sofrimento psíquico. É apenas reconhecer que o sofrimento psíquico liga-se de forma direta com outras dimensões da vida do sujeito humano. Logo, muitas das queixas que aparecem nos serviços de atenção básica em saúde revelam demandas de saúde mental, pois, geram sofrimento, atrapalham a autonomia, dificultando para o sujeito/usuário em lidar com a própria vida.

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profissionais incorporem ou aprimorem competências de cuidado em saúde mental na sua prática diária, de tal modo que suas intervenções sejam capazes de considerar a subjetividade, a singularidade e a visão de mundo do usuário no processo de cuidado integral à saúde”. (BRASIL, 2013, p. 11)

Em seu livro Saúde Mental e Atenção Psicossocial (2007), Paulo Amarante apresenta as quatro dimensões de um processo social complexo, aqui contextualizadas no campo da Atenção Psicossocial: dimensão teórico-conceitual (epistêmica), dimensão técnico-assistencial, dimensão jurídico-política, e dimensão sociocultural, sendo que cada uma delas apresenta questões de suma importância para se pensar o campo da saúde mental e as ações que nele são efetivadas.

Com relação especialmente às duas primeiras dimensões, o autor cita a atitude epistêmica, ou seja, atitude de produção de conhecimento, de colocar a doença entre parênteses. Ao contrário da perspectiva da psiquiatria clássica – baseada no modelo das ciências naturais – que, em detrimento do sujeito, priorizava a doença e sua classificação, as práticas em saúde mental não negam a existência de processos que causam sofrimento (as doenças ou transtornos), mas se atém prioritariamente à experiência humana, ao sujeito e suas vicissitudes. Quanto aos serviços em que estas práticas são gestadas “devem ser entendidos como dispositivos estratégicos, como lugares de acolhimento, de cuidado e de trocas sociais. Enquanto serviços que lidam com as pessoas, e não com as doenças, devem ser lugares de sociabilidade e produção de subjetividades”. (AMARANTE, 2007, p. 69).

Deste modo, espera-se que as práticas em saúde mental na atenção básica reconheçam as características de singularidade e pluralidade como constitutivas das experiências humanas, e, por conseguinte, da subjetividade. Mas como reconhecer e materializar nas práticas de uma unidade de saúde tais conceitos? O desenvolvimento de estratégias pautadas nas tecnologias leves demonstra-se ser um caminho viável.

O que são e quais tipos de tecnologias de cuidado existem? Segundo Merhy (2000), o profissional médico, que aqui pode ser representado por qualquer outro profissional de saúde, utiliza no encontro com os sujeitos que são atendidos três tipos de valises, que implicam em três tipos de tecnologias: duras, leve-duras e leves.

A primeira diz respeito às ferramentas tecnológicas, qualquer equipamento que está ao alcance da mão do trabalhador e que depende de um domínio técnico para o seu bom uso. Essas tecnologias produzem, com seus equipamentos, imagens, exames, etc. Já as tecnologias leve-duras constituem-se como uma rede de saberes bem estruturados e que de forma conceitual se fazem presentes no contato entre profissional e sujeito/usuário. São estes saberes que permitem ao profissional de saúde fazer um recorte específico de uma situação, implicando num modo particular de se apropriar e significar as necessidades e demandas do sujeito/usuário. A epidemiologia e a clínica são exemplos deste tipo de tecnologia.

Por último, as tecnologias leves, presentes no espaço relacional entre trabalhador e usuário, envolvem o modo de produzir relações entre dois ou mais sujeitos e só tem materialidade em ato. “Os processos produtivos em saúde que ocorrem neste espaço, só se realizam em ato e nas interseções do médico e do usuário. É este encontro que dá, em última instância, a singularidade do processo de trabalho do médico enquanto produtor de cuidado” (MERHY, s/p, 2000).

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enquanto produto, se dá por intermédio de várias mãos, pela presença essencial de um outro, que se torna mediador para significação da condição de um sujeito frente ao adoecer. O cuidado produzido na relação entre profissional e sujeito/usuário evoca a lógica de que na saúde se lida com sujeitos e seus adoecimentos e não com doentes.

As tecnologias leves implicam no envolvimento calculado do profissional de saúde. Ao mesmo passo que produz efeitos para o usuário, gera a necessidade do processo de trabalho ser questionado, redimensionado e reorganizado de acordo com as necessidades impostas a partir dos encontros entre profissional e sujeito/usuário. Ao priorizar ações em saúde pautadas em tecnologias leves, o profissional não é reconhecido como um produtor de procedimentos, mas como um produtor de cuidado. Para Merhy (s/p., 2000), na medicina tecnológica há um empobrecimento da valise das tecnologias leves, deslocando-se o eixo do arranjo tecnológico para uma articulação especial entre a valise das tecnologias leve-duras com a das tecnologias duras, de um jeito a mostrar uma relação cada vez mais focal da competência da ação do médico, a ponto de o mesmo praticamente reduzir-se a uma unidade de produção de procedimentos.

O Curso de Formação em Saúde Mental (crack, álcool e outras drogas) para Agendes Comunitários de Saúde (ACS), Auxiliares e Técnicos de Enfermagem (ATEnF) das Equipes de Saúde da Família (ESF), que faz parte do projeto Caminhos do Cuidado foi uma importante iniciativa de formação para o reconhecimento das tecnologias leves, das práticas em saúde mental já realizadas pelas equipes de ESF e para proposição de novas possibilidades e práticas em saúde mental na atenção básica. O curso priorizou a atenção as categorias profissionais que atuam na atenção básica e que têm disponíveis menos recursos provenientes do saber biomédico. À eles foram ofertadas possibilidades de pensar as práticas em saúde a partir de referenciais teóricos e práticos do campo da atenção psicossocial e como estes unidos aos potenciais de conhecimento de território e possibilidades de formar vínculos, poderiam resultar em práticas efetivas e sem necessariamente contar com recursos das tecnologias leve-duras e duras.

“A Atenção Básica considera o sujeito em sua singularidade e inserção sociocultural, buscando produzir a atenção integral” (BRASIL, 2013, p.19). A saúde mental potencializa essa vocação da atenção básica de possibilitar uma atenção integral. A atenção básica (atenção primária) nasce como estratégia de reorientação do modelo de saúde (hospitalocêntrico). A saúde mental também! Ambas nascem com o objetivo de implementar práticas em saúde que resgatam a condição humana dos usuários de serem autores e atores de suas próprias vidas, de acordos com as possibilidades de cada um. Tais práticas pautam-se na ideia de produzir a condição de sujeito e não somente trabalhar com doenças e transtornos. Alçar a condição de sujeito é tarefa permanente, pois nunca está de antemão garantida, visto a evidente condição de objeto frequentemente relatada pelos usuários sobre seus laços sociais, onde sua voz não veicula uma enunciação, mas enunciados que não se fazem ser ouvidos e não passam de detalhes, por vezes desapercebidos, em meio ao enorme ruído que caracteriza a comunicação entre humanos.

REFERÊNCIAS:

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BRASIL, Ministério da Saúde. CAMINHOS DO CUIDADO: Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde; Fundação Oswaldo Cruz, Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde; Grupo Hospitalar Conceição, Centro de Educação Tecnológica e Pesquisa em Saúde - Escola GHC. Brasília: Ministério da Saúde, 2013.

MERHY, Emerson Elias. Um ensaio sobre o médico e suas valises tecnológicas: contribuições para compreender as reestruturações produtivas do setor saúde. In: Interface (on-line version), v.4, n.6, Botucatu, 2000 <http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832000000100009>

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