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A Permanência de mulheres vítimas de violências conjugais nas relações abusivas: Representação social de Policiais Militares

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A PERMANÊNCIA DE MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIAS CONJUGAIS NAS RELAÇÕES ABUSIVAS: REPRESENTAÇÃO SOCIAL DE POLÍCIAIS MILITARESI

THE PERMANENCE OF WOMEN VICTIMS OF CONJUGAL VIOLENCES IN ABUSIVE RELATIONSHIPS: SOCIAL REPRESENTATION OF MILITARY

POLICE

Claudia GonçalvesII

Rosa Cristina Ferreira de SouzaIII

Resumo: O objetivo deste estudo foi descrever as representações sociais de policiais militares

sobre a permanência de mulheres vítimas de violências conjugais nas relações abusivas. Trata-se de uma pesquisa de campo exploratória de caráter qualitativo. Um questionário on-line foi enviado a oitenta policiais militares dos quais oito retornaram respondidos. Observa-se que a construção da representação social é objetificada nas figuras do homem “abusador”, apontado como responsável pela ocorrência da violência conjugal, e na figura de “vítima” para as mulheres. A análise revela que a esperança de que o companheiro mude o comportamento é o principal fator para a permanência nas relações violentas e a representação da mulher que permanece em relacionamento conjugal abusivo tem como ancoragem mais significativa “dependência” que estaria reforçada por “falta de apoio” e “desamparo”. Por fim, é necessário que exista mais estudos acerca deste tema, visto que a não aderência dos policiais à pesquisa é um ponto relevante, e mostra o tabu relacionado ao conteúdo de violência contra a mulher.

Palavras-chave: Violência conjugal. Polícia Militar. Representação social. Permanência relacionamentos abusivos. Mulheres.

INTRODUÇÃO

A violência conjugal é um fenômeno que engloba as violências que ocorrem no contexto das relações afetivas e amorosas, notadamente vinculada aos casais heterossexuais. Outros termos como “violência doméstica”, “violência intrafamiliar” e “violência de gênero”, também são utilizados para violências que são cometidas contra as mulheres, sem considerar o contexto relacional em que elas ocorrem. (BATISTA; MEDEIROS; MACARINI, 2017).

I Artigo apresentado como trabalho de conclusão de curso de graduação em Psicologia da Universidade do Sul de

Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Psicólogo (a).

II Acadêmico (a) do curso de Psicologia. E-mail: claudiaggrb@gmail.com

III Professor (a) orientador. Doutora em Ciências da Linguagem (Unisul). Mestre em Psicologia Social (UFSC).

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Após a década de 1970 os estudos sobre o impacto da violência conjugal sobre as mulheres se intensificaram. Até então se hesitava em intervir sob o pretexto de que se tratava de um assunto privado (HIRIGOYEN, 2006). Desta forma, vale ressaltar que a violência conjugal vem sendo discutida, a partir da década citada, com apoio dos movimentos feministas, que denunciavam o patriarcado e seus efeitos de opressão em relação às mulheres.

Estes movimentos contribuíram para a evolução histórica na luta das mulheres contra seus agressores, que culminou com a implementação da Lei Maria da Penha, Lei 11.340 (BRASIL, 2006), nome em homenagem à luta da professora universitária cearense Maria da Penha Maia que ficou paraplégica após tentativa de homicídio pelo marido. O caso chegou à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), que acatou, pela primeira vez, a denúncia de um crime de violência doméstica (MELLO, 2008).

A partir da evolução histórica na luta das mulheres, ocorreu a criação de serviços específicos como as Delegacias de Defesa da Mulher (DDM), as Casas-Abrigo e os Centros de Atendimento Multiprofissionais, focando, principalmente, a violência física e sexual, cometida por parceiros ou ex-parceiros, além de importantes mudanças na legislação nacional (SANTI; NAKANO; LITTIERE, 2010). Para Pasinato e Santos (2008, p.34), as Delegacias da Mulher “constituem ainda a principal política pública de enfrentamento à violência doméstica contra mulheres”. Desta forma, as delegacias são uma forma de mostrar que o Estado está consciente de que a violência contra a mulher é uma questão social e que requer ações públicas eficazes.

Visando as formas de proteção e auxílio às mulheres vítimas de violência, a atuação da Polícia Militar (PM) é imprescindível pois, na maioria dos casos ela é a primeira instituição a ser acionada. A PM é responsável pelo policiamento preventivo das ruas, e no que diz respeito às violências conjugais, realizam orientações à ambas as partes sobre seus direitos e como servir-se das medidas que a lei assegura.

Apesar de existirem diversas formas de ajuda e auxílio às mulheres vítimas de violência, a permanência destas em relações abusivas é alta, Garcia et al. (2008) observaram que aproximadamente 34% das mulheres que buscaram unidades de saúde, de segurança pública e serviços especializados de atendimento à mulher em situação de violência, voltaram a viver com o homem agressor com a esperança de melhorar o relacionamento conjugal.

Segundo Soares (2005) o rompimento de uma relação violenta pode levar anos, considerando que muitas mulheres podem continuar com seus companheiros devido a vários fatores: dependência financeira, ao medo de morrer já que sofrem ameaças à espera pela

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mudança do comportamento do companheiro, à vergonha de assumir o fracasso do relacionamento ou à dependência emocional.

O tema violência contra a mulher não é recente entretanto, estudos sobre a permanência de mulheres vítimas de violência conjugal em seus relacionamentos com o abusador na perspectiva de policiais militares não foram encontrados. A busca por artigos que trazem assuntos semelhantes à proposta desta pesquisa foi realizada em bases de dados, como: Google Acadêmico; Portal CAPES; BVS-Psi; BDTD e SCIELO. As palavras-chave utilizadas para tal busca foram: Mulher; Violência; Polícia Militar; Permanência, sendo localizado estudo envolvendo apenas a perspectiva de Psicólogos acerca do assunto (PORTO; MALUSCHKE, 2014).

No que se refere à perspectiva geral da violência contra mulheres, sem abordar a permanência em relacionamentos abusivos, há pesquisas abrangendo a perspectiva de outros profissionais, tais como: Policiais Civis (MARTINS; FELIPPE, 2016), Médicos (FERRANTE; SANTOS; VIEIRA, 2009) e Policiais Militares (SIGNORI; MADUREIRA, 2007).

Nesta pesquisa a proposta foi estudar as representações sociais de Policiais Militares sobre a permanência de mulheres vítimas de violências conjugais nas suas respectivas relações. Considerando que a Representação social é um conjunto de conceitos, explicações e afirmações que se originam na vida diária, no curso de comunicações interindividuais (MOSCOVICI, 1981), neste estudo busca-se no entendimento dos policiais em relação a tal fenômeno, o qual está presente em seu cotidiano direta ou indiretamente e, portanto, o que sabem, pensam e comunicam pode refletir em suas ações e intervenções. Assim, parte-se do seguinte questionamento: Qual a representação social de policiais militares que atuam na cidade Tubarão, Estado de Santa Catarina sobre a permanência de mulheres vítimas de violências conjugais nas suas respectivas relações? Para tanto, foram propostos como objetivos específicos: Identificar qual o significado de violência conjugal para policiais militares; identificar a percepção dos policias militares sobre mulheres agredidas pelos parceiros que permanecem na relação; destacar a concepção dos profissionais sobre os motivos que levam as mulheres a continuarem na relação abusiva e comparar as opiniões de policiais militares do sexo masculino e feminino sobre a permanência destas mulheres nas relações violentas.

VIOLÊNCIA CONTRA MULHER

A violência doméstica é definida por Barcellos (2003), Day et al. (2003), e Deslandes, Gomes e Silva (2000), como variadas formas de violência interpessoal (agressão física, abuso

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psicológico e negligência), que ocorrem dentro do território da casa. Cabe ressaltar que o agressor, nos casos de violência doméstica, é geralmente um membro componente da rede familiar (GARCIA, 2010), prevalecendo, no caso da violência contra a mulher, a ocorrência de violência perpetrada pelo parceiro íntimo (BALDUINO; ZANDONADI; OLIVEIRA, 2017).

A violência de gênero está caracterizada pela incidência dos atos violentos em função do gênero ao qual pertencem as pessoas envolvidas, ou seja, há a violência porque alguém é homem ou mulher. A expressão violência de gênero é quase um sinônimo de violência contra a mulher, pois são as mulheres as maiores vítimas da violência (KHOURI, 2012).

Partindo deste pressuposto, este estudo decidiu usar o termo violência conjugal, pois tem o intuito de englobar violências vivenciadas entre casais heterossexuais, que estejam vivendo juntos e que possuam vínculo afetivo. Hirigoyen (2006) afirma que a violência no âmbito conjugal tem sido apresentada como um fenômeno cíclico, ou seja, que se manifesta sob a forma de ciclos e que vai se modificando em forma de espiral e se intensificando ao longo do tempo. Tal ciclo possui, em seu padrão de funcionamento, quatro principais fases: a da tensão, da agressão, de desculpas e de reconciliação.

A fase da tensão é caracterizada pela irritabilidade do homem - a violência emanada dele se manifesta por olhares, mímicas, atitudes ou pelo timbre da voz. A mulher, por sua vez, procura acalmar a situação, renunciando aos seus desejos e procurando satisfazer o companheiro. Na segunda fase, da agressão ou explosão, o homem começa a perder o controle e apresenta comportamentos violentos através de gritos, insultos, ameaças, quebrando objetos da casa e, muitas vezes, chegando a agredir a mulher fisicamente. Esta violência física vai se dando de forma gradativa ao longo dos ciclos, começando por empurrões, passando por tapas e podendo chegar a homicídios em casos mais graves. Neste momento, após ser agredida, a mulher sente-se entristecida, impotente e com raiva do seu companheiro, sendo esta a ocasião em que ela busca forças para registrar denúncia da agressão sofrida (HIRIGOYEN, 2006).

A terceira fase, a das desculpas, ocorre quando o homem procura anular ou minimizar seu comportamento, por estar arrependido ou não, justificando-o através de meios externos (raiva, bebida, problemas do trabalho), bem como fazendo promessas de que irá mudar e que as agressões não se repetirão. Acatando a fala do companheiro, a mulher o perdoa, acreditando que não deve romper o relacionamento.

Por fim, na fase da reconciliação, também chamada de fase de lua de mel, o homem apresenta-se agradável, atencioso, gentil, carinhoso, procurando agradar a companheira. Já a mulher, acaba ficando esperançosa e volta a acreditar que ela é capaz de mudar o companheiro, já que os dois estão vivendo relativamente bem.

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Hirigoyen (2006) define a violência no casal a partir dos modos de interação que incluem a brutalidade produzida na conjugalidade, isto é, violência que ocorre nas mais diversas configurações de casais e implica em relação de poder imposta pela força.

A violência é um ato que pode ser expresso sob diversas formas, física, moral, psicológica, sexual e patrimonial, bem como, existem vários enfoques sob os quais podem ser definidas: Trata-se de agressão injusta, ou seja, aquela que não é autorizada pelo ordenamento jurídico; é um ato ilícito, doloso ou culposo, que ameaça o direito próprio ou de terceiros, podendo ser atual ou iminente (ROSA FILHO, 2006, p. 55).

Existem cinco tipos de violências dentro da violência doméstica, estas podem ser: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.

TIPOLOGIAS DA VIOLÊNCIA

Conforme o Ministério da Saúde a violência física ocorre quando uma pessoa, que está em domínio de poder em relação a outra, causa ou tenta causar dano não acidental, por meio do uso da força física ou de algum tipo de arma que pode provocar ou não lesões externas, internas ou ambas. (BRASIL, 2002, p. 15).

Violência menos evidenciada e às vezes menos reconhecida do que a violência física, é a psicológica, a qual geralmente ocorre em uma proporção muito maior do que a física, podendo ser usada ainda como uma ferramenta de tortura.

A violência psicológica é toda ação ou omissão que causa ou visa causar dano à autoestima, à identidade ou ao desenvolvimento da pessoa. Inclui: ameaças, humilhações, chantagem, cobranças de comportamento, discriminação, exploração, crítica pelo desempenho sexual, não deixar a pessoa sair de casa, provocando o isolamento de amigos e familiares, ou impedir que ela utilize o seu próprio dinheiro. Dentre as modalidades de violência, é a mais difícil de ser identificada. Apesar de ser bastante frequente, ela pode levar a pessoa a se sentir desvalorizada, sofrer de ansiedade e adoecer com facilidade, situações que se arrastam durante muito tempo e, se agravadas, podem levar a pessoa a provocar suicídio. (BRASIL, 2006).

A terceira tipologia da violência é a sexual, está é a ação que obriga uma pessoa a manter contato sexual (físico ou verbal) ou participar de outras relações sexuais com uso da força, intimidação, coerção, chantagem, suborno, manipulação, ameaça ou qualquer outro mecanismo que anule o limite da vontade pessoal. Manifesta-se como: expressões verbais ou corporais que não são do agrado da pessoa; toques e carícias não desejados; exibicionismo e voyerismo; prostituição forçada; participação forçada em pornografia; relações sexuais forçadas - coerção física ou por medo do que venha a ocorrer (TAQUETTE, 2007).

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Ainda há a violência patrimonial, que se define como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades. E, por fim, violência moral, que “[...] está fortemente associada à violência psicológica, tendo, porém, efeitos mais amplos, uma vez que sua configuração impõe, pelo menos nos casos de calúnia e difamação, ofensas à imagem e reputação da mulher em seu meio social" (FELIX, 2014).

De todas as formas de violência há aquelas que culminam em grau extremo, podendo haver atentado contra a vida da mulher cuja motivação envolve a condição social de ser mulher, o que caracteriza o feminicídio.

FEMINICÍDIO

Menicucci, ministra-chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência relata que:

O conceito feminicídio surgiu na década de 1970 com o fim de reconhecer e dar visibilidade à discriminação, opressão, desigualdade e violência sistemática contra as mulheres, que, em sua forma mais aguda, culmina na morte. Essa forma de assassinato não constitui um evento isolado e nem repentino ou inesperado; ao contrário, faz parte de um processo contínuo de violências, cujas raízes misóginas caracterizam o uso de violência extrema. Inclui uma vasta gama de abusos, desde verbais, físicos e sexuais, como o estupro, e diversas formas de mutilação e de barbárie. (MENICUCCI, 2015).

O feminicídio no Brasil é um problema gravíssimo e que atinge mulheres de todas as classes sociais e idades. Em 2015 o Brasil sancionou a Lei 13.104/2015, que introduz uma qualificadora que aumenta a pena para autores de crimes de homicídio praticado contra mulheres. A aplicação da qualificadora eleva a pena mínima deste crime de 6 para 12 anos e a máxima, de 20 para 30.

Para configurar feminicídio, não basta que a vítima seja mulher. A morte tem que ocorrer por “razões de condição de sexo feminino” que, por sua vez, foram elencadas no § 2o-A do art. 121 do Código Penal como sendo as seguintes: violência doméstica e familiar contra a mulher, menosprezo à condição de mulher e discriminação à condição de mulher. (BIANCHINI, 2016).

Segundo Bonassoli (2019), além dos 26 casos de feminicídio registrados do início do ano até maio de 2019, chamou a atenção um dado trazido pela Polícia Militar que apontou a violência doméstica como o sexto maior número de ações da corporação, sendo 19.148 casos

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em 2018, ficando à frente, por exemplo, do tráfico de drogas com 10.337 casos. (BONASSOLI, 2019).

A PERMANÊNCIA DAS MULHERES EM RELAÇÕES ABUSIVAS

De acordo com Marques (2005) normalmente, diante de uma ameaça, a reação de um indivíduo deveria ser a evitação, contudo, no contexto conjugal pode-se observar o ciclo da violência, conforme já mencionado. Pontua Hirigoyen (2006) que, ocasionalmente, diferentes situações impedem que as mulheres encontrem alternativas para sair de seus relacionamentos violentos.

Soares (2005) afirma que deixar uma relação é um processo, e cada um tem seu tempo. Há algumas razões que levam as mulheres a continuarem com o abusador segundo o autor: Riscos de rompimento; vergonha e medo; esperança de que o marido mude de comportamento; isolamento; negação social; barreiras que impedem o rompimento; dependência econômica. Seguindo ainda o pensamento da autora, esse esforço de separação envolve idas e vindas, avanços e recuos, tentativas e desistências, acertos e erros. Essas oscilações são típicas de quem está em situação de violência.

Oliveira et al. (2015) explicita outros fatores importantes à permanência das mulheres em situações de violência doméstica, tais como baixo nível de escolaridade, situação socioeconômica, uso de álcool ou drogas ilícitas entre os parceiros, podendo exacerbar a magnitude do problema, desentendimentos domésticos ligados ao contexto familiar, à educação dos filhos, à organização da casa, à higiene e à limpeza, dentre outros.

Como já foi relatado, o feminicídio atualmente é um grande problema da sociedade, principalmente no Brasil. Orientar uma mulher a deixar um relacionamento violento e abusivo, sem existir uma rede de apoio e oferta mínima de segurança, é um ato de irresponsabilidade com a vítima (SOARES, 2005), visto que os riscos de rompimento e o medo são alguns dos motivos que levam-nas a permanecerem com o abusador.

Desta forma, embora a permanência de mulheres em relacionamentos regados por violência seja um fenômeno complexo, a ausência e fragilidade de redes de apoio que amparem mulheres e seus filhos, possibilitando o restabelecimento dos vínculos afetivos com a família e a comunidade podem também estar relacionados à permanência.

Nesta problemática, contudo, o que trata-se importante trazer além dos motivos que levam estas mulheres à permanecerem nas relações violentas, é o olhar dos policiais militares diante desta perspectiva, visto que em uma grande parcela, eles são os primeiros a atender

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situações de violência contra a mulher, e devem possuir a responsabilidade de dar os encaminhamentos legais cabíveis à situação atendida, como também de orientar a vítima sobre as alternativas que tem a seu dispor para enfrentar a situação.

POLÍCIA MILITAR E O ATENDIMENTO ÀS MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA

No art. 144 da Constituição Federal sobre a segurança pública da população, são salientados no parágrafo § 5º que aos polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública [...] além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.

No que se refere as mulheres que são vítimas de violências conjugais e domésticas, é ressaltado na Lei Maria da Penha art. 8º, inciso VII, a exigência de capacitação permanente da Polícia Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes, aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia, Lei nº 11.340, Jus Brasil, 2006. Como a PM geralmente é a primeira instituição a chegar no local do ato de violência, é essencial a capacitação para qualidade no atendimento das pessoas envolvidas. Constam como atribuições dos policiais militares:

[...] conduzem a vítima, o agressor e as testemunhas à delegacia de Polícia para registro do BO, ou para um hospital, quando o caso for de emergência. Após decreto n° 06/2011 da Secretaria de Segurança Pública do ES (SESP), os Policiais Militares devem tomar o depoimento do agressor no ato do flagrante e, e este depoimento deve constar nos autos do processo instaurado pelas autoridades competentes (BRASIL, 2006, 20, p. 46).

Partindo deste pressuposto, ressalta-se a importância de capacitação da polícia militar no que se refere ao fenômeno da violência conjugal e suas implicações subjetivas para que o atendimento às vítimas de violência, possa evitar outros agravos. O atendimento eficaz, nestes casos, pode permitir que a vítima tenha mais possibilidades de buscar instituições de apoio e serviços especializados da rede de atendimento às mulheres, tendo como consequência a quebra do ciclo da violência.

No ano de 2019 foi instaurada a Patrulha Maria da Penha – Guardiões da Vida, que, além de dar suporte incluindo o encaminhamento legal para às vítimas, visa policiamento direcionado para a prevenção à violência doméstica e familiar contra a mulher.

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Estas medidas asseguram às mulheres usufruir dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, tendo a oportunidade de viver sem violência, preservando a saúde física e mental. A Patrulha Maria da Penha tem a missão de fazer com que essas medidas sejam cumpridas e respeitadas. (PATRULHA..., 2019).

Como se trata de um projeto recente, atualmente existe apenas em cidades com mais de 100 mil habitantes. Na cidade de Tubarão/Santa Catarina, a polícia militar conta com um projeto, “Rede Catarina de Proteção à Mulher”. Esta foi lançada em 8 de julho de 2017, e visa à prevenção de crimes de violência doméstica contra a mulher e a integração de vários órgãos públicos para atender as necessidades de vítimas e oferecer condições para que elas denunciem as agressões e os autores de violência contra a mulher (SIEGA, 2018).

A Rede Catarina de Proteção à Mulher transcende os programas e projetos experimentados de patrulha Maria da Penha, pois é mais que uma patrulha, é mais que uma ronda de fiscalização de medidas protetivas. O programa é, de fato, a necessária atenção às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, que vai dar voz e dignidade a elas, a partir do conceito de que é possível fazer mais e melhor, de forma simples e efetiva (FIEDELER, 2019).

Portanto, há projetos executados pela Polícia Militar com o objetivo central de atendimento e prevenção à violência contra mulher, os quais possuem profissionais como rede de apoio mas, ainda é notável e preocupante o número de mulheres que continuam em relações abusivas, sem busca de ajuda e proteção.

Tratando-se desta realidade é importante buscar conhecer qual a representação social de Policiais Militares sobre essa perspectiva. Considerando que representações sociais caracterizam-se por ideias, conceitos, pensamentos e vivências de um determinado grupo, o conhecimento e entendimento dos policiais em relação a tal fenômeno é imprescindível, pois está presente em seu cotidiano direta ou indiretamente e, portanto, pode refletir nas suas ações e condutas perante os casos atendidos.

REPRESENTAÇÃO SOCIAL

O conceito de Representações Sociais designa uma forma de conhecimento particular, "o saber do senso comum".

A Representação Social é a construção social de um saber ordinário (de senso comum) elaborado por e dentro das interações sociais, através de valores, crenças, estereótipos, etc, partilhada por um grupo social no que concerne a diferentes objetos (pessoas, acontecimentos, categorias, objetos do mundo etc.), dando lugar a uma visão comum das coisas (ANADON; MACHADO, 2001, p. 87.).

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Assim, as representações vão sendo socializadas e compartilhadas em um determinado contexto cultural e integradas na vida cotidiana das pessoas. Esse processo acontece através dos discursos que se ouve de outras pessoas; do que é lido e/ou visto nos meios de comunicação e de todas as experiências sociais vivenciadas no decorrer da vida. Ou seja, uma representação é construída reunindo elementos dos universos reificados (conhecimentos científicos e teóricos) que façam parte do arcabouço dos indivíduos, adicionados às suas experiências pessoais, culturais, religiosas e, portanto, dos sistemas de crenças e significados que circulam nos grupos dos quais as pessoas participam/pertencem.

Portanto Representações Sociais são um conjunto de conceitos, proposições e explicações originados na vida cotidiana no decurso da comunicação interindividual (MOSCOVICI, 1981). Caracterizam-se por ser um sistema de valores, crenças, ideias, práticas, que permitem relembrar ou evocar um dado acontecimento, situação, pessoa ou objeto, sendo resultado do que há de mais comum a um determinado grupo de indivíduos numa determinada sociedade (MOSCOVICI, 2003).

A Representação Social possui um referido avanço teórico que leva ao questionamento de paradigmas da construção das Ciências Humanas, aprofundando-se na ideia de que os diversos elementos de uma representação não possuem o mesmo estatuto na economia de uma representação social: há elementos que são definidores ou necessários, enquanto outros são contingentes e acessórios (ANADON; MACHADO, 2001). Esses elementos definidores podem ser encontrados relacionados ao núcleo central da representação social.

O Núcleo Central da representação, é composto dos elementos que têm mais “força” na representação do objeto e em função de sua natureza e dos tipos de relações que o grupo mantém com ele – o que envolve também o sistema de normas sociais que constituem o grupo produtor da representação (ABRIC, 2000), os quais seriam denominados elementos centrais. E há outros elementos que se relacionam com os centrais, o qualificam, reforçam ou se distanciam, apontando para possíveis heterogeneidades, as quais poderão indicar que há mudanças à vista em relação ao objeto representado – são os elementos periféricos (ABRIC, 2000).

As pessoas produzem representações sociais para tornar o não-familiar em familiar – o desconhecido em conhecido. Ou seja, possibilitar um sentido ao objeto da representação, acomodá-lo cognitivamente. Isto é realizado através de dois processos: ancoragem e objetivação. “[...] Ancoragem é o processo de assimilação de novas informações a um conteúdo cognitivo-emocional pré-existente, e objetivação é a transformação de um conceito abstrato em algo tangível” (SAWAIA, 2004, p. 76). Esses processos permitem acomodar o objeto da representação no campo de significados dos sujeitos.

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Abric (2000) destaca outras funções das representações sociais:

[...] a função de saber, que permite uma maior compreensão da realidade e a capacidade de explicá-la, favorecendo que os atores sociais absorvam os saberes do senso comum em um quadro assimilável e compreensível, coerente com seu funcionamento cognitivo e os valores aos quais eles aderem; as funções identitárias das representações sociais definem a identidade e permitem a proteção da especificidade dos grupos. A função de orientação: As RS guiam os comportamentos e as práticas. A representação é prescritiva de comportamentos ou de práticas obrigatórias. Ela define o que é lícito, tolerável ou inaceitável em um dado contexto social. Já a função justificadora das representações sociais permite a justificativa das tomadas de posição e dos comportamentos. As representações têm por função preservar e justificar a diferenciação social, e elas podem estereotipar as relações entre os grupos, contribuir para a discriminação ou para a manutenção da distância social entre eles (ABRIC, 2000, p. 28).

Assim, almeja-se estudar como as representações sociais de policiais militares acerca da permanência da mulher em um relacionamento conjugal abusivo estão organizadas o que poderia dar indicadores de como podem justificar e orientar atitudes e comportamentos em relação ao assunto.

MÉTODO

O presente estudo é de caráter qualitativo e exploratório, focando nas singularidades e experiências individuais dos pesquisados. Assim, a pesquisa qualitativa ou naturalista, segundo Bogdan e Biklen (2003), envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a perspectiva dos participantes.

A pesquisa havia sido planejada com entrevistas semiestruturadas e, em função da obrigatoriedade do distanciamento social e demais medidas de combate ao Covid-19, foi necessário ajustar a proposta sendo utilizado um questionário na modalidade on-line, usando a plataforma: onlinepesquisa.com.br. Um link para o questionário foi enviado pelo grupo de WhatsApp do conjunto de policiais em média 80 participantes, obtendo-se oito questionários respondidos. Assim, os participantes da pesquisa foram 08 policiais militares da 8º RPM/5ºBPM – 5º Batalhão de Polícia Militar, localizado do munícipio de Tubarão/Santa Catarina.

O presente estudo foi submetido à avaliação CEP – Comitê de Ética em Pesquisa/ e atenderá aos preceitos estabelecidos na resolução 466/12 e 510/16 e obteve aprovação sob o protocolo no nº 4.092.028.

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A análise de dados foi desenvolvida utilizando-se a técnica de análise de conteúdo, para as questões abertas, reunindo-se as respostas por categorias agrupadas em função do sentido. Para Minayo (2001), a análise de conteúdo representa um conjunto de técnicas usadas na descrição do conteúdo de mensagens. É uma técnica que permite uma descrição das mensagens de forma objetiva, a fim de interpretar esses dados. Permite tornar os dados replicáveis e validados por meio de procedimentos especializados e científicos, reduzindo quaisquer interferências no processo de análise.

O processo de categorização foi desenvolvido a partir dos temas dos objetivos específicos: a representação social dos policiais militares sobre os motivos que levam mulheres a permanecerem em relações violentas, significado de violência conjugal, percepção dos policiais sobre as mulheres agredidas que permanecem nas relações.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os participantes são policiais militares de Tubarão/Santa Catarina com idades entre 30 e 43 anos, havendo apenas uma participante do sexo feminino. As áreas de atuação dos policiais foi dividida entre alguns setores, mas prevaleceu expediente administrativo e o radiopatrulhas. No que diz respeito ao tempo de atuação dos policiais mais da metade atuam de cinco a 10 anos, os demais há mais de 10 anos. Dos participantes apenas um é solteiro.

Quase todos afirmaram já terem atendido algum caso de violência contra a mulher, porém salientaram não receberem treinamento específico para lidar com situações envolvendo essa problemática. De acordo com Souza e Cortez (2014) essa carência de preparo pode ocasionar, em determinados casos, atendimentos que infringem alguns direitos das usuárias, assim como os direitos por um atendimento adequado, qualificado e respeitoso.

A polícia atua como mediadora entre a vítima e o agressor e, dentro dos limites legais, [...] cabe ao Policial Militar executar sua função, orientar as pessoas envolvidas na situação e fazer os encaminhamentos necessários para que se dê andamento ao procedimento burocrático. (SIGNORI; MADUREIRA, 2007).

É necessário ressaltar importância de capacitação da polícia militar no que se refere ao fenômeno da violência conjugal e suas implicações subjetivas para que o atendimento às vítimas de violência, possa evitar outros agravos. O atendimento eficaz, nestes casos, pode permitir que a vítima tenha mais possibilidades de buscar instituições de apoio e serviços especializados da rede de atendimento às mulheres, tendo como consequência a quebra do ciclo da violência.

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O primeiro objetivo deste estudo foi identificar o significado de violência conjugal para os policiais militares. Observa-se que a representação está objetificada, principalmente na construção da figura do abusador, ancorada no termo “Covardia”, presente nas evocações de seis participantes, sendo reforçada pelos termos “machismo”, “ignorância” e “abuso”, com menos ênfase, mas associadas, ainda, à figura do homem perpetrador de violência.

A representação é objetificada também na figura da vítima com as evocações “medo”, “desamparo” e “fragilidade”. Um dos participantes cita “Atenção”, “cuidar”, “apoiar”, também termos relacionados à mulher em situação de violência, entretanto, ancorada na necessidade de assistência à vítima, o que, também reforça a perspectiva de “desamparo”.

Nesse contexto é possível observar que a violência contra a mulher está objetificada em uma figura masculina dominadora (covarde e machista) e em uma figura feminina que “teme” por sua vida. Os participantes enfatizaram a ligação com o machismo, segundo Soares (2005) os homens não são naturalmente violentos, aprendem a ser. A associação entre masculinidade, guerra, força e poder é uma construção cultural. Da mesma forma, a paz, a emoção e a vocação para cuidar não são qualidades naturais da mulher. Também são aprendidas.

Machismo também é associado à relação desigual entre os sexos onde haveria predomínio do sexo masculino sobre o feminino, sendo que

historicamente, o homem sempre foi considerado o detentor único do poder, e as mulheres sempre se viram excluídas dele, isso condicionou o modo de pensar de ambos, desde o berço: é assim, porque sempre foi assim! Essa representação social, partilhada por todos, ainda mantém os estereótipos, apesar da evolução dos costumes (HIRIGOYEN, 2006, p. 75).

A este respeito, a visão sobre o homem dominador e a mulher submissa é algo ainda muito presente em discursos explícitos ou velados em muitos contextos sociais, funcionando em alguns desses contextos como algo natural. No âmbito dessa pesquisa, não se evidenciou expressões que possam denotar posicionamento machista por parte dos participantes, mas o reconhecimento de machismo como indicador da base da violência do homem contra a mulher na relação conjugal.

No que se refere a percepção dos policiais militares dos motivos que levam essas mulheres à permanecerem nas relações violentas, a resposta mais recorrente refere-se à esperança de mudança quando o parceiro diz que vai procurar tratamento, ao fato de temer por sua vida caso deixe o companheiro e, à dependência financeira.

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A este respeito, explicam Bruschini e Unbehau (2002) que, na expectativa de que o companheiro mude de atitude com relação à violência, em nome dos filhos e por temor de assumir as consequências de uma possível separação, a mulher suporta os maus-tratos.

Minetti (2005) explica que uma pessoa abusiva ainda pode dizer que ama seu parceiro e que irá mudar, para que o parceiro não o deixe. No entanto, quanto mais vezes a pessoa o aceita, maior será o controle do abusador sobre o abusado.

Portanto, considerando a representação da violência conjugal e dos motivos de permanência, ao participantes entendem que se trata de uma relação onde há um dominador que manipula a situação de violência aproveitando-se da condição emocional do dominado, que deseja e acredita na relação afetiva, mas se depara com a ameaça de não sobreviver seja pela intensidade da violência seja pelo rompimento e a implicação disso na condição financeira. A representação denota assim, um contexto de impotência da vítima.

Em se tratando dessa representação da mulher que permanece em relacionamento conjugal abusivo, quando solicitadas evocações sobre o assunto, a ancoragem mais significativa é atribuída à “dependência” que estaria reforçada pelos termos “falta de apoio” e “desamparo”, os quais evocam “medo” e “desespero”. Na sequência, “família/filhos” e “dinheiro/financeiro” completam a configuração da representação. Há também evocações que relacionam estado emocional: “sentimental”, “confusa” e “submissa”.

Portanto, há uma perspectiva de compreensão da mulher como alguém em situação de

dependência, ligada ao impedimento para deixar a relação por falta de apoio, o que geraria o

medo, retroalimentando o ciclo. Há necessidade de um apoio mais efetivo às mulheres vítimas de violência física, para que elas compreendam que têm direito sobre seu próprio corpo, sobre sua própria vida e para que vejam que a violência não deve funcionar como punição por algo de que elas julguem ser "merecedoras". Isso requer a intervenção de diferentes profissionais e instituições — do setor jurídico ao pedagógico, do psicológico ao setor de Saúde Pública. (SOUZA e ROSA, 2006).

Os direitos só adquirem existência social à medida que são enunciados em normas, legislações e tratados, configurando o espaço da cidadania formal, que não se confunde com o da cidadania efetiva e cuja fronteira não tem um traçado definitivo (BRUSCHINI e UNBEHAUM, 2002). Todavia, não basta que o sistema exista perante a legislação, é necessário que elas o exerçam e para que isso ocorra, elas precisam ter conhecimento da existência destes e ter condições que as possibilitem exercê-los.

É possível que “sentimental”, “confusa” e “submissa” reforcem o estado emocional da mulher em sua permanência na relação. Sentimental pode estar relacionada à compreensão da

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permanência na relação por acreditar na mudança do parceiro e, em meio às promessas, submeter-se uma vez mais e uma vez mais o que a torna confusa entre seus sentimentos e pensamentos, impedindo busca de decisões favoráveis à descontinuidade do ciclo.

A esse respeito, Hirigoyen (2006) explica que a mulher exposta, durante algum tempo, com a violência perpetrada pelo parceiro, geralmente, tem um comprometimento psicológico, como a dificuldade de mudar sua realidade, uma vez que “a pessoa sob jugo não é mais senhora de seus pensamentos, está literalmente invadida pelo psiquismo do parceiro e não tem mais um espaço mental próprio” (HIRIGOYEN, 2006, p. 182). Por esta razão ela necessita de uma ajuda externa que a auxilie a criar mecanismos para mudar sua realidade e superar as sequelas deixadas pelo processo de submissão às situações de violência. (HIRIGOYEN, 2006).

Explica Moscovici (2012, p. 34), que as Representações Sociais convencionalizam objetos, pessoas e acontecimentos e “as localizam em uma determinada categoria e gradualmente as colocam como um modelo de determinado tipo”. Assim, por meio das experiências profissionais e pessoais, os/as policiais identificam as mulheres vítimas de violência como aquelas que sofrem violência porque, de alguma forma, dependem desta relação e deste homem, sendo considerada muito sentimental ou por ser submissa, portanto se acomodam a esta forma de vivência e, assim, sucumbem à violência.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A violência conjugal, evidencia-se em problema gravíssimo que carece ser discutido e enfrentado em todas as camadas da sociedade, visto que, atualmente, configurou-se como um problema de saúde pública. É imprescindível que este tema não seja compreendido em nível privado, mas como uma questão de direitos humanos, pois, além de afrontar a dignidade da pessoa humana, impede o desenvolvimento pleno da mulher, afetando seu aspecto físico, cognitivo e emocional.

O objetivo deste estudo foi identificar qual a representação social de policiais militares sobre a permanência destas mulheres nas relações abusivas. A partir das respostas foi possível constatar que as Representações Sociais acerca da mulher em situação de violência conjugal estão objetificadas na imagem do abusador, ancoradas na cultura do machismo e na imagem de mulheres como vítimas, sendo ancoradas em medo e fragilidade.

Os participantes consideram que a dependência, tanto afetiva quanto financeira são os motivos principais para a permanência nas relações violentas, visto que as redes de apoio à

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estas mulheres são insatisfatórios, gerando então o ciclo do medo e fragilidade quanto ao rompimento desta relação.

Durante muito tempo, o sistema de saúde brasileiro esteve tradicionalmente mais voltado para ações curativas do que para ações preventivas. É essencial as políticas públicas voltarem-se para a saúde, a fim de auxiliar na diminuição da violência contra a mulher. Iniciativas de promoção a saúde para os Policiais Militares, para capacitá-los nesta problemática, poderiam auxiliar no atendimento adequado às situações de violências.

Como limitação do estudo destaca-se a impossibilidade de comparação da representação entre os gêneros, considerando que a maioria dos participantes foram homens, visto que um dos objetivos do estudo era identificar se existia diferenças nas representações. Ainda, a prevalência da baixa adesão dos policiais perante a pesquisa é muita alta, visto que havia perspectiva de se obter participação de, aproximadamente 50 PMs, não alcançando nem 20% desta proposta. Portanto, é possível observar que o tema Violência Conjugal ainda é novo e que ainda existe um tabu para falar sobre este assunto. Inclusive, os PM salientam que não possuem treinamento específico para lidar com estes casos, reforçando a necessidade de capacitação.

Por fim, sugere-se que novas pesquisas sejam realizadas, de modo que haja maior apropriação acerca das peculiaridades do trabalho policial e da rede de atendimento à mulher em situação de violência conjugais. Enfatizando, as atitudes que estes profissionais entendem serem cabíveis nestas situações, as compreensões que possuem sobre seu papel neste contexto e qual avaliação fazem perante as políticas públicas atuais.

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